Acórdão nº 39/13.6GDGDM de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 23 de Novembro de 2016

Magistrado ResponsávelOLIVEIRA MENDES
Data da Resolução23 de Novembro de 2016
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça No âmbito do processo comum com intervenção do tribunal colectivo n.º 39/13.6GDGDM, da Comarca do ... – Instância ... – ...ª Secção Criminal – ..., foi condenado, entre outros, AA, com os sinais dos autos, como autor material, em concurso real, de dez crimes de furto qualificado, sendo nove consumados e um tentado, bem como de um crime de furto simples, na pena conjunta de 9 anos de prisão[1].

O arguido interpôs recurso para este Supremo Tribunal de Justiça.

É do seguinte teor o segmento conclusivo da respectiva motivação: 1. O douto acórdão "a quo" não teve em linha de conta a forma de crime continuado, que efectivamente corresponde às situações ocorridas, aos sucessivos factos praticados pelo agente.

  1. Entendeu os crimes como sendo individuais e sem ligação causal entre os mesmos, o que não se entende como correcto.

  2. Porém, todas as condutas do arguido se traduziram num modus operandi idêntico numa área geográfica, circunscrita a ..., ao longo de pouco mais de 10 meses estando assim presente a conexão temporal e espacial entre as diversas acções, que serve para caracterizar a unidade do objectivo do acção.

  3. Por outro lado, as diversas acções, nos quais não se manifesta a conexão de continuidade objectiva, correspondem a uma única resolução tomadas ao longo de 10 meses (Setembro de 2014 a Agosto de 2015).

  4. Do comportamento do arguido pode-se afirmar, portanto, também na consideração do período de tempo abrangido pela sua conduta, que as diversas resoluções se conservaram numa linha psicológica continuada ou, dito de outro modo, que se verificou um dolo continuado.

  5. Ou seja, dos factos provados permite a afirmação duma unidade do injusto pessoal da acção.

  6. Finalmente, o pressuposto fundamental para a unificação dos condutas - a actuação no quadro da solicitação de uma mesma situação exterior que diminua consideravelmente a culpa do agente - está absolutamente presente nos factos provados.

  7. No realização de sucessivos furtos em área geográfica circunscrita a ..., manifesta por parte do arguido disposição exterior das coisas que, de maneira considerável, facilitou a repetição da actividade criminosa, tornando cada vez menos exigível ao recorrente que se comportasse de maneira diferente .

  8. A forma homogénea como executou os referidos furtos e o quadro da solicitação de uma idêntica situação exterior com que se deparou, acabou por determinar o renascimento de uma única resolução criminosa por si susceptível de fazer diminuir consideravelmente a culpa do agente.

  9. Demonstrando a clara existência de um circunstancialismo exógeno que conformou a persistência de uma situação exterior que facilitou o execução e, por isso, fundamentou uma considerável diminuição da culpa do recorrente, devendo a sua conduta ser subsumida à figura de crime continuado refletindo-se tal na medida da pena aplicada ao arguido.

  10. Mas ainda que assim V.Exas não entendam a verdade é que quer as penas parcelares quer a pena única aplicada ao recorrente são exageradas e desproporcionais por não refletirem a ponderação da situação concreta de um arguido que conta com o apoio da sua família, designadamente da sua companheira e dos familiares próximos de ambos.

  11. E que tem hábitos de trabalho e vontade em adquirir novas competências.

  12. Efectivamente do seu CRC constam 4 condenações por crimes de diferente natureza cujas penas (três das quais penas de multa) se mostram na íntegra extintas pelo cumprimento.

  13. A verdade é que o recorrente necessita de uma oportunidade e não de prisão, pelo que, faria todo o sentido que as penas aplicados bem como a pena única aplicada fossem muito Inferiores sendo inclusive de ponderar a aplicação de uma pena única muitíssimo inferior.

  14. É evidente que, o tribunal deverá correr um risco prudente, uma vez que esperança não é seguramente certeza. Ou seja, ninguém pode assegurar que um arguido a quem é aplicado uma pena de prisão suspensa não venha, de futuro, e mesmo no decorrer do período da suspensão, a cometer um novo crime.

  15. Porém há sempre que correr algum risco, embora um risco calculado, devendo atender-se na prognose a efectuar à personalidade do arguido, às suas condições de vida, à conduta anterior e posterior ao facto punível e às circunstâncias deste, ou seja, devem ser valoradas todas as circunstâncias que tornam possível uma conclusão sobre a conduta futura do arguido.

  16. O recorrente mereceu pelo menos o juízo positivo de quatro instâncias formais de acompanhamento, revelando vontade em adquirir hábitos de trabalho, sendo que presenta sentimentos de dedicação aos seus familiares.

  17. Estamos, assim, em crer que existe uma prognose social favorável ao arguido em termos que permitem ser-lhe aplicadas penas parcelares Inferiores bem como uma pena única claramente informar à ora aplicada, 19. Pode, assim, afirmar-se que relativamente ao arguido é possível formular um juízo favorável no tocante às exigências de prevenção de futuras delinquência, podendo formular-se um Juízo de prognose social favorável tendo o arguido interiorizado a gravidade do actos praticados no passado, contando, para tal, com o apoio incondicional da sue família.

  18. Assim, as penas aplicados ao arguido bem como a pena única teriam, por conseguinte, que se situar mais próximas do limite mínimo legalmente prevista, consideradas os condições económicos e sociais bem como os demais elementos que não fazendo parte do tipo de crime dispõe a favor do arguido.

  19. Pelo que tudo ponderado, entende-se como suficiente, proporcional e adequado aplicar ao arguido as seguintes penas: I. NUIPC 181/14.6GGDGDM. pela prática de um crime de furto qualificado, na forma consumada, em co-autoria, nos termos dos arts. 203º, nºl, e 204º, nº2, al. e), do CP, a pena de 2 anos de prisão.

    1. NUIPC 97/14.6GBVLG pela prática de um crime de furto qualificado, na forma consumada, em co-outoria, nos termos dos arts. 203º, nºl. e 204°, nº2, al. e), do CP, ao qual corresponde a pena concreta de 2 anos de prisão.

    2. NUIPC 193/14.0GBVLG pela prática de um crime de furto qualificado, na forma consumada, em co-autoria, nos termos dos arts. 203°, nºº1, e 204º, nº2, al, e), do CP, ao qual corresponde a pena de 2 anos e 3 meses de prisão.

    3. NUIPC 156/l4.5GBVLG prática de um crime de furto qualificado, na forma consumada, em co-autoria, nos termos dos arts. 203°, nºl, e 204º, nº2, al. e), do CP, na pena de 2 anos de prisão.

    4. NUIPC 50/14.0P6PRT prática de um crime de furto simples, em co-autoria, na forma consumado, nos termos dos arts. 203°, nº1, e 204°, nº1, al. f), por aplicação da previsão do art. 204°, nº4, do CP, na pena de 3 meses de prisão.

    5. NUIPC 183/14.2GBVLG prática de um crime de furto qualificado, na forma consumado, em co-autoria, nos termos dos arts. 203°, nº1, e 204°, nº2, al. e), do CP, ao qual corresponde a pena de 2 anos de prisão.

    6. NUIPC 287/14.1 .GBVLG prática de um crime de furto qualificado, em co-autoria, na forma consumada, nos termos dos arts. 203°, nºl, e 204°, nº2, al. e), do CP na pena de 2 (dois) anos de prisão.

    7. NUIPC 704/l4.0PBVLG prática de um crime de furto qualificado, em co-autoria, na forma consumada, nos termos dos arts. 203°, nºl. e 204°, nº2, al. e), do CP, ao qual corresponde a pena de 2 anos e 3 meses de prisão.

    8. NUIPC 1164/14.1PHMTS prática de um crime de furto qualificado, nos termos do art. 203°, nº1 e 204°, nº1, al. 2), na forma tentada, ao qual corresponde a corresponde a pena de prisão de 1 (um) ano.

    9. NUIPC 409/14.2GBVLG prática de um crime de furto qualificado, em co-autoria, na forma consumada, nos termos dos arts, 203°, nº1, e 204º, nº2. al, e), do CP, ao qual corresponde a pena de 2 anos de prisão.

    10. NUIPC 452/l4 pela prática de um crime de furto qualificado, em co-outoria, na forma consumada, em co-autoria, nos termos dos arts. 203º, nº1, e 204º, nº2, al. e), do CP. aplicável a pena de 2 anos de prisão.

  20. Quanto à pena única, para ser fixada na medida justa, adequada e necessária, seria suficiente a aplicação de uma pena única, nunca superior a 6 anos, sendo esta suficiente para se atingir os fins insertos na norma incriminadora e contribuir para a plena socialização do arguido, sendo que satisfaz ainda às necessidades de prevenção geral e especial tão necessárias á sociedade.

    Princípios e disposições legais violadas ou incorrectamente aplicadas: * Artigos 30.°, n.º 2 e 79,° n.º 1 do Código Penal; * Artigos 40.°,70.°,71.0,72.º,73.° e 77.º,78.º do Código Penal; Na contra-motivação o Ministério Público formulou as seguintes conclusões: 1.

    Ao praticar os sucessivos furtos qualificados, penetrando em espaços cujo acesso lhe estava vedado, mais das vezes instalações fabris e/ou comerciais, de distribuição de energia eletrica de alta voltagem, situadas em lugares isolados e por vezes afastados de aglomerados habitacionais, nenhumas circunstâncias exteriores se impuseram ao arguido, provocando as suas diferentes e múltiplas resoluções criminosas.

    Antes pelo contrário, o arguido procurou essas circunstâncias, mapeando a zona geográfica onde actuou, na busca dos alvos mais favoráveis à execução e fuga, mantendo-se nessa área por conhece-la muito bem, facilitando a execução dos furtos e o esconderijo dos valiosos bens furtados, quando tal se tornava necessário.

  21. No presente caso, não resultando dos factos provados qualquer circunstancialismo exterior ao agente que tenha determinado o arguido à prática dos crimes, tendo sido antes este a agir de acordo com um seu desígnio interno e tendo sido o próprio a criar/procurar as condições favoráveis em que actuou, não pode concluir-se que tenha actuado com “considerável diminuição da culpa”.

  22. Não se verifica, no caso sub judice, o principal pressuposto do crime continuado, qual seja uma situação exterior ao arguido, facilitadora da execução do crime e redutora da culpa em grau considerável, pelo que deverá manter-se a condenação pelo concurso efetivo de crimes, como bem se decidiu no Acórdão recorrido.

  23. As...

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