Acórdão nº 2002/12.5TBBCL.G1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 08 de Novembro de 2016

Magistrado ResponsávelFONSECA RAMOS
Data da Resolução08 de Novembro de 2016
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça AA BB CC DD, e EE, intentaram, em 22.6.2012, no Tribunal Judicial da Comarca de ..., com distribuição ao 1º Juízo Cível, acção declarativa de condenação com processo ordinário, contra: SEGURO FF S.A.

Para tanto alegaram em síntese: - A Autora AA nasceu em 00.00.1944 e casou, em 25.05.1969, com GG, sem convenção antenupcial e segundo o regime supletivo de comunhão de adquiridos e desse casamento nasceram os demais autores, filhos daqueles, BB, em 00.00.1971, CC, em 00.00.1973, DD, em 00.00.1974, e EE, em 00.00.1982.

- Que no dia 14 de Outubro de 2002 faleceu GG, em virtude de lesões sofridas no acidente de viação e que por morte do referido GG, sucederam-lhe como herdeiros legitimários a Autora AA, na qualidade de cônjuge sobrevivo e os demais Autores BB, CC, DD e EE, acima identificados, como descendentes.

-Mais alegam que no dia 14 de Outubro de 2002, pelas 19 horas e 30 minutos, ao km 23,200 da Estrada Nacional 000, na freguesia da ..., concelho de ..., verificou-se um acidente de viação, com atropelamento de dois peões (o referido GG, que veio a falecer, e a Autora AA) e em que foi interveniente o veiculo automóvel ligeiro, de matrícula 00-00-XX.

- Que tal atropelamento ocorreu por culpa exclusiva do condutor do veículo automóvel de matrícula 00-00-XX, seguro na Ré, que, tendo avistado os peões a atravessar, não abrandou a sua marcha prosseguindo à mesma velocidade excessiva colhendo os referidos peões.

- Que do acidente resultaram para o falecido GG traumatismos que lhe determinaram a morte e lesões para a Autora AA que lhe provocaram diversos danos.

Entendem ainda os Autores que a conduta do condutor o veículo de matrícula 00-00-XX integra ilícito penal para o qual a lei estabelece prazos de prescrição não inferiores a dez anos e como tal é esse o prazo que deve ser considerado para o exercício de direitos pelos Autores.

Pedem os Autores a condenação da Ré a pagar-lhes, na proporção alegada na petição inicial, a indemnização global de € 150.000,00, acrescida de juros de mora, à taxa legal, contados desde a citação até integral pagamento, bem como as custas e ainda a indemnização que se vier a liquidar em execução de sentença.

O Instituto da Segurança Social IP veio formular pedido de reembolso da quantia de € 22.828,99 respeitante a subsídio por morte e pensões de sobrevivência no período de Junho de 2004 a Junho de 2012, alegando que continuará a pagar à Autora AA a pensão de sobrevivência enquanto esta se encontrar nas condições legais cujo valor mensal actual é de € 152,40, tendo a segurança Social direito ao reembolso dos montantes dos responsáveis pelo acidente.

A Ré, regularmente citada, veio contestar invocando a prescrição uma vez que o acidente ocorreu em 14/10/2002 e apenas foi citada para a presente acção em 26/06/2012 e alegando que o atropelamento ocorreu de forma diversa da relatada pelos Autores, tendo sido os peões que surgiram de forma súbita e inesperada a menos de cinco metros, não conseguindo o condutor do veículo seguro evitar o embate, pelo que o atropelamento ocorreu por culpa exclusiva da Autora AA e de seu falecido marido.

No que toca ao pedido do Instituto da Segurança Social veio também invocar a prescrição e no mais dar por reproduzido o já alegado na contestação apresentada ao pedido dos Autores.

A Ré requereu a intervenção de HH, condutor do veículo, pois a provar-se o alegado pelos Autores terá direito de regresso sobre aquele uma vez que se mostra alegado que o condutor do veículo seguro na Ré actuou com dolo.

Os Autores vieram apresentar articulado de réplica a fls. 74 e seguintes, pronunciando-se no sentido da improcedência da excepção de prescrição por se aplicar o prazo de prescrição previsto na lei penal e reiterando o alegado na petição inicial.

Por despacho proferido a fls. 84 a 85 foi admitida a intervenção principal de HH.

HH veio apresentar articulado de contestação invocando também a excepção de prescrição e alegando que o atropelamento ocorreu por culpa exclusiva da Autora e de seu falecido marido.

Os Autores vieram responder a fls. 126 a 127 no sentido da improcedência da excepção de prescrição por se aplicar o prazo de prescrição previsto na lei penal e ainda que o despacho final de arquivamento no processo de inquérito não foi notificado a todos os Autores como herdeiros da vítima.

Foi proferido despacho saneador no qual se julgou improcedente a excepção de prescrição, delimitado o objecto do processo e enunciados os temas da prova.

O Interveniente HH interpôs recurso de apelação do despacho saneador, na parte em que julgou improcedente a excepção de prescrição, tendo sido proferido Acórdão, transitado em julgado, pelo Tribunal da Relação de … que decidiu revogar o despacho proferido relegando-se para final a apreciação da excepção de prescrição.

*** Foi proferida sentença que decidiu: a) - Julgar verificada a prescrição do direito dos Autores AA, BB, CC, DD e EE e, consequentemente, absolver a Ré do pedido formulado nos presentes autos pelos mesmos; b) Julgar parcialmente verificada a prescrição do direito de reembolso do Instituto da Segurança Social IP e consequentemente condenar a Ré a pagar as quantias pelo mesmo pagas a título de pensão de sobrevivência à Autora AA entre 14/09/2012 e Junho de 2012, acrescida de juros de mora a contar da notificação e até integral pagamento; c)- Absolver o Interveniente HH dos pedidos formulados pelos Autores e pelo Instituto da Segurança Social IP.

*** Inconformados, os Autores apelaram para o Tribunal da Relação de …, que, por Acórdão de 3.12.2015 – fls. 583 a 609 – julgou a apelação improcedente, confirmado a sentença recorrida.

*** Inconformados, os Autores interpuseram recurso de revista excepcional para este Supremo Tribunal de Justiça, e, para o caso de não ser admitida, pediram que fosse admitido recurso de revista normal.

A Formação prevista no art. 672º, nº3, do Código de Processo Civil, por Acórdão de 7.4.2016 – fls. 753 a 755 –, não admitiu o recurso de revista excepcional, por ter considerado não existir dupla conforme, considerando que o fundamento do recurso é a existência da nulidade assacada ao Acórdão da Relação, vício originário[2] alegadamente cometido na 2ª Instância, faltando, por isso, a apreciação sequencial confirmatória, postulada pela existência de dupla conformidade.

O recurso foi admitido como de revista normal.

*** Alegando, as Recorrentes formularam as seguintes conclusões: 1 - Deve ser admitido o presente Recurso de Revista Excepcional nos termos ias alíneas a) e b) do n° 1 do artigo 672° do Código de Processo Civil, porquanto: a) - Nos presentes autos está em causa uma questão cuja apreciação, pela sua relevância jurídica, se revela necessária para uma melhor aplicação do direito; e b) - Porque estão em causa interesses de particular relevância social.

2 - Ou então, em alternativa, deve ser, nos termos do n.°5 do artigo 672° do Código de Processo Civil, admitido o Recurso de Revista nos termos gerais, pois no douto Acórdão Recorrido é rejeitado o recurso por alegadamente não ter sido cumprido o disposto no artigo 640° do Código de Processo Civil, sendo, só com esse fundamento, confirmada a douta sentença proferida em Primeira Instância, foi entendido que se verificava a prescrição do direito dos Autores e consequentemente a Ré Seguradora foi absolvida do pedido.

3 - Assim, no douto acórdão proferido verifica-se omissão de pronúncia quanto à alegada e requerida reapreciação da matéria de facto, o que constitui nulidade nos termos alegados e atento o disposto no artigo 615°, n° 1 alínea d) do Código de Processo Civil.

4 - Na verdade, entendem os Recorrentes que deram cumprimento ao disposto no artigo 640° do Código de Processo Civil, e que, quer somente dos factos dados por provados, quer ainda com a alteração, decorrente da reapreciação da prova, dos factos não provados, resulta que o comportamento do condutor do 00-00-XX integra, pelo menos, a prática de dois crimes, designadamente o previsto no artigo 137°, nº2 do Código Penal (homicídio por negligência grosseira punível com pena de prisão até 5 anos) e o previsto no artigo 148°, n.° 3 do Código Penal, em que o prazo de prescrição é de 10 anos, como resulta do artigo 118°, n.° 1, alínea b) do Código Penal.

5 - Aliás, como resulta evidente dos factos dados por provados e da documentação dos autos, estamos antes e inequivocamente perante um crime de homicídio por negligência grosseira, pelo que acção foi intentada em tempo.

6 - Assim, o douto acórdão do Tribunal da Relação de ..., salvo melhor opinião, contem erro na determinação das normas aplicáveis e na apreciação da matéria de facto dada por provada, com omissão de pronúncia que constitui nulidade nos termos do artigo 615°, n.°1, d) do Código de Processo Civil, pois que se acha cumprido o disposto no artigo 640° do Código de Processo Civil.

7 - Na verdade, o condutor deve sempre regular a sua velocidade em termos de poder deter a marcha no espaço livre e visível à frente e de evitar qualquer obstáculo que surja em condições normalmente previsíveis.

8 - Ora, o condutor do XX não adequava a sua velocidade condução às condições da via, não podendo ignorar, dentro de um padrão normal de comportamento de um condutor, bom pai de família, que a sua distracção, a desatenção à via e demais utentes e o não respeito aos sinais existentes (passadeira ou local de travessia de peões, localidade e sinais de perigo) era susceptível de ser causa de acidente com consequências graves.

9 - Acresce que o condutor do XX não podia ignorar, antes sabia que decorria de imposição legal e designadamente do código da estrada, que a condução deve ser efectuada pela hemi-faixa direita e o mais próximo da berma, embora sem fazer perigar quem ali transite a pé.

10 - Desde logo ficou a conclusão irrefutável de que o veículo era conduzida em contravenção à mais elementar regra de condução estradai, ou seja era conduzido bem longe da berma, sem respeitar os...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO
5 temas prácticos
5 sentencias

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT