Acórdão nº 539/13.8TTCSC.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 30 de Junho de 2016

Magistrado ResponsávelRIBEIRO CARDOSO
Data da Resolução30 de Junho de 2016
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça ([1]) 1. RELATÓRIO AA, residente em …, propôs a presente ação, emergente de contrato de trabalho, contra BB, S.A., com sede em …, peticionando o seguinte: a) Que se declare a ilicitude do seu despedimento, por não se ter verificado a caducidade do contrato de trabalho, na medida em que o mesmo, fruto das renovações ocorridas, já se tinha convertido em contrato de trabalho sem termo e que em consequência seja ordenada a sua reintegração no seu posto de trabalho; b) E/ou em alternativa, e apenas com o expresso consentimento do trabalhador, proceder à substituição da reintegração pelo pagamento de uma compensação ao Autor em valor a arbitrar nos termos do art.º 391.º do Código de Trabalho; c) a condenação da R. no pagamento das seguintes quantias: - € 1.718,85 - proporcionais dos prémios não pagos nas férias, subsídio de férias e subsídio de Natal de 7.4.2010 a 6.10.2012; - € 21.901,88 - 1 ano de retribuições (1.09.2012 a 30.9.2012) - art.º 390.º n.º 1 do C.T.; - € 4.140,00 - parte da remuneração, parte em dinheiro e outra em espécie, que o Autor deixou de receber durante um ano em virtude da invocada ilicitude da caducidade do contrato de trabalho; - € 38.800,00 - a título de danos patrimoniais; - € 5.000,00 - danos não patrimoniais sofridos; - € 477,77 - Juros de mora vencidos, tudo num total de € 72.038,50; d) A condenação da R. no pagamento das retribuições que o Autor venha a ter direito que se vierem entretanto a vencer, bem como nos juros de mora vincendos, custas e demais procuradoria, bem como de todos os encargos do processo.

Alegou para tanto que o seu contrato de trabalho já se tinha convertido em definitivo quando a R. o veio denunciar, pelo que foi vítima dum despedimento ilícito, com as legais consequências. Em virtude dessa cessação, com que não contava, sofreu danos patrimoniais porquanto assumiu compromissos bancários que depois não pôde cumprir, tendo sofrido psicologicamente com a situação. Alegou ainda que não lhe foram pagos os proporcionais dos subsídios relativamente aos prémios auferidos.

Na contestação, a R. invocou que o contrato de trabalho foi celebrado com termo, porquanto se destinava à abertura de um novo stand. Foi objeto de três renovações normais e de uma quarta ao abrigo da Lei n.º 3/2012, de 10 de janeiro. As comissões pagas estavam dependentes do alcance de objetivos específicos. Relativamente aos prémios, eram montantes que discricionariamente a R. decidia dar aos seus colaboradores, sem que os mesmos pudessem ser exigidos. Quanto à atribuição de viaturas aos vendedores era um instrumento de trabalho, sendo a R. a principal interessada em que os seus trabalhadores circulassem nas viaturas que deveriam promover e vender. Inexiste qualquer nexo de causalidade entre a cessação do contrato e os danos patrimoniais que o A. alega ter tido.

Após a realização da audiência de discussão e julgamento foi proferida sentença que decidiu nos seguintes termos: «Pelo exposto, julgo a presente acção parcialmente procedente, por provada, e, em consequência: a) Declaro que entre A. e R. existe um contrato de trabalho sem termo; b) Declaro que a R. despediu ilicitamente o A; c) Consequentemente, condeno a R. a reintegrar o A. no mesmo estabelecimento sem perda de antiguidade e de categoria; d) Condeno a R. a pagar ao A: 1. Retribuições que aquele deixou de auferir desde o despedimento até ao trânsito em julgado da presente decisão, a que serão deduzidas: a) As importâncias que o A aufira com a cessação do contrato e que não receberia se não fosse o despedimento; b) A retribuição relativa ao período decorrido desde o despedimento até 30 dias antes da propositura da acção, uma vez que esta foi intentada nos 30 dias subsequentes ao despedimento; e c) O subsídio de desemprego atribuído ao trabalhador no período referido no n.º1, devendo o empregador entregar essa quantia à segurança social.

  1. € 2.500,00 (dois mil e quinhentos euros), a título de indemnização por danos não patrimoniais; 3. Juros legais à taxa de 4%, desde a data do trânsito da presente sentença até integral pagamento. e) Absolvo a Ré do mais peticionado.» Inconformados, apelaram Autor e Ré tendo o Tribunal da Relação de Lisboa deliberado: «Face ao exposto, julgam-se improcedentes os recursos interpostos e confirma-se a sentença recorrida, ainda que, com a rectificação acima enunciada, pelo que a decisão recorrida, na alínea d) n.1b) passará a ter a seguinte redacção: “… b) A retribuição relativa ao período decorrido desde o despedimento até 30 dias antes da propositura da acção, uma vez que esta não foi intentada nos 30 dias subsequentes ao despedimento.” Custas na proporção do vencimento.» De novo inconformada, dela recorreu a R. de revista excecional para este Supremo Tribunal, a qual foi admitida por deliberação da formação prevista no art. 672º, nº 3 do CPC.

    Formulou a recorrente as seguintes conclusões, as quais, como se sabe, delimitam o objeto do recurso ([2]) e, consequentemente, o âmbito do conhecimento deste tribunal: ”1ª O presente recurso abrange tudo o que na decisão proferida pelo Tribunal a quo foi desfavorável à Recorrente, tudo aquilo em que esta foi condenada, devendo decretar-se, pelas razões a seguir sintetizadas, não existir entre a Recorrente e o Recorrido um contrato de trabalho sem termo, não ter sido o Recorrido ilicitamente despedido (houve apenas caducidade do contrato a termo), revogando-se então a condenação da Recorrente em reintegrar o Recorrido no mesmo estabelecimento, sem perda de antiguidade e de categoria, revogando-se a condenação no pagamento ao Recorrido das retribuições que este deixou de auferir desde o despedimento até ao trânsito em julgado da decisão e ao valor de € 2.500,00 a título de danos morais, revogando-se ainda a condenação da Recorrente em juros de mora desde o trânsito da decisão até integral pagamento; 2ª Por força do disposto no artigo 674.º, n.º 1, alíneas a) e b) do CPC (aplicável ex vi artigo 1.º do CPT), é fundamento do recurso de revista a apreciação de violação por parte do Tribunal a quo de lei substantiva ou de lei processual, sendo que no caso em apreço, na fixação do facto provado 10, houve violação das regras legais de distribuição do ónus da prova (artigos 342.º e ss. do Código Civil), bem como de regras processuais quanto à determinação de factos admitidos por acordo das partes; 3ª O douto Acórdão proferido pelo Tribunal a quo encontra-se em contradição direta com outro, já transitado em julgado, proferido (também) pelo Tribunal da Relação de Lisboa, no domínio da mesma legislação, sobre a mesma questão fundamental de Direito, preenchendo-se, assim a previsão da alínea c) do n.º 1 do artigo 672.º do Código de Processo Civil e sem que haja Acórdão Uniformizador de Jurisprudência sobre essa matéria.

    1. Na verdade, no Acórdão fundamento, de que adiante se junta cópia e se protestará juntar certidão, proferido em 21/05/2014 no processo n.º 665/12.0TTBRR.L1-4 (in www.dgsi.pt), debruça-se precisamente sobre essa mesma legislação e, mais concretamente, sobre essa exata temática da articulação de regimes, sendo que em ambos os arestos está em causa responder a uma mesma questão essencial de Direito: em caso de renovações extraordinárias nos termos da Lei n.º 3/2012, de 10 de janeiro, a renovação que seja por período igual ao que estava em curso carecem de redução de forma escrita, ou prescindem dessa forma escrita? 5ª Ora, o Acórdão em crise responde afirmativamente a essa questão, considerando a Recorrente que o Acórdão fundamento responde negativamente (e neste caso bem), pois que circunscreve a necessidade de redução a escrito aos casos em que há uma renovação por período diferente - justamente a solução que se encontra no Código do Trabalho e que a referida legislação extravagante não derrogou. É no Acórdão fundamento que a Recorrente expressamente se louva.

    2. A presente revista excecional é também admissível por nela estarem em causa matérias que pela sua relevância e complexidade jurídica, clamam, com a devida vénia, por melhor aplicação do Direito.

    3. Na verdade, para além de estarmos perante uma contradição jurisprudencial que interessa superar, a questão jurídica essencialmente em causa nos autos tem um âmbito de aplicação que em muito extravasa as fronteiras do caso concreto, tal a potencialidade da aplicação da interpretação a fazer no universo de dezenas de milhar de contratos a termo renovados ao abrigo da Lei n.º 3/2012 e, bem assim, ao facto de estarmos perante legislação recente, de conteúdo pouco claro e quanto à qual inúmeros casos estarão neste momento a ser discutidos pelos nossos tribunais.

    4. A tudo acresce que a decisão proferida pelo Tribunal a quo não tem, com todo o respeito por melhor opinião, suporte literal na Lei n.º 3/2012 ou no Código do Trabalho, o que por si só justifica uma apreciação e revisão dogmáticas mais aprofundadas por parte do Supremo Tribunal de Justiça - sendo enfim neste sentido que o artigo 672.º do CPC deve ser interpretado e aplicado.

      Isto posto, 9ª O artigo 607.º, n.º 4, do CPC determina que na fixação dos factos dados como provados o juiz deve ter em consideração os factos admitidos por acordo das partes, sendo que tal norma decorre da obrigação do Réu de tomar posição na Contestação sobre os factos alegados pelo Autor na Petição Inicial, impugnando aqueles com os quais não concordar (artigo 574.º do CPC). Porém, no caso em apreço, o Tribunal a quo entendeu que a matéria constante do facto provado 10 não era controvertida, tendo sido aceite por ambas as partes, quando, na verdade, a mesma tinha sido alegada pelo A. na petição inicial e expressamente impugnada (através de impugnação especificada) pela R. na Contestação - pelo que, ao assim ter decidido, o Tribunal a quo violou a regra processual decorrente do artigo 607.º, n.º 4, e do artigo 574.º, ambos do CPC; 10ª Na linha do sufragado no acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 7 de fevereiro de...

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