Acórdão nº 1364/06.8TBBCL.G1.S2 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 16 de Junho de 2016

Magistrado ResponsávelTOMÉ GOMES
Data da Resolução16 de Junho de 2016
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam na 2.ª Secção do Supremo Tribunal de Justiça: I – Relatório 1. AA (A.) instaurou, em 24/03/2006, junto do Tribunal Judicial de Barcelos, ação declarativa, sob a forma de processo ordinário, contra a BB – Companhia de Seguros, S.A, entretanto substituída pela CC – Companhia de Seguros, S.A. (R.), alegando, no essencial, que: .

Em 26/01/2005, pelas 13h00, ocorreu, na EN n.º 103, em …, Barcelos, um acidente de viação, em que o veículo automóvel ligeiro de mercadorias, com a matrícula ...-...-IJ, conduzido por DD, atropelou a A., quando esta se encontrava a meio da passadeira para proceder à travessia da estrada; .

De tal atropelamento resultaram lesões físicas para a A., que lhe determinaram doença e incapacidade para o trabalho até 31/12/2005, data em que teve alta, ficando, apesar de clinicamente curada, com uma incapacidade permanente para o trabalho de, pelo menos, 23,5%; .

Após o acidente, a A. ficou completamente incapacitada de trabalhar e ainda de tratar das lides domésticas e de cuidar de si própria, pelo que teve de contratar outra pessoa para a ajudar nessas tarefas, tendo pago por esse trabalho a quantia de € 600,00 (€ 150,00/mês), para além da importância de € 1.320,00 que a R. lhe pagou; .

Durante o tempo em que esteve com baixa, perdeu remunerações no valor de € 9.763,50, assim como subsídios de férias e de Natal no montante de € 1.698,00; .

A responsabilidade civil relativa à circulação do veículo atropelante encontrava-se transferida para a R. Seguradora.

Concluiu pedindo a condenação daquela R. a pagar-lhe: a) - a quantia de € 35.000,00, a título de danos patrimoniais; b) - a quantia de € 30.000,00 pelos danos não patrimoniais; c) – os montantes de € 169,50, € 525,00 e € 420,00, por despesas que suportou em exames, consultas médicas e transportes.

  1. A R. contestou a ação a impugnar alguns dos factos alegados pela A. e, embora aceitando o alegado quanto à dinâmica do acidente e à culpa do segurado, sustentando que: .

    A A. foi acompanhada pelos serviços clínicos da R., que lhe prestou tratamento médico e liquidou as despesas de tratamentos; .

    A IPP da A. foi fixada em 7,55% pelos seus serviços clínicos; .

    Pagou diretamente a terceira pessoa os serviços por prestados à A.; .

    É exagerada e desajustada a liquidação dos danos peticionados.

    Concluiu no sentido de se julgar a ação conforme com a prova que viesse a ser produzida.

  2. Findos os articulados, foi proferido saneador tabelar e selecionada a matéria de facto tida por relevante com a organização da base instrutória, conforme despacho de fls. 96-103, de 13/10/2006.

  3. Realizada a audiência final, foi decidida a matéria de facto controvertida pela forma constante do despacho de fls. 655-661, após o que foi proferida a sentença a fls. 661-681, datada de 28/05/2014, a julgar a ação parcialmente procedente, condenando-se a R. a pagar à A. as seguintes quantias: a) – € 15.762,74 (€ 14.750,00 + 1.035,74), a título de danos patrimoniais, acrescida de juros de mora desde a citação; b) - € 8.000,00, a título de danos não patrimoniais, acrescida de juros de mora desde a data da sentença.

  4. Inconformadas com tal decisão, tanto a A., em via principal, como a R., subordinadamente, recorreram para o Tribunal da Relação de Guimarães que, através do acórdão de fls. 864-877/v.º, de 17/09/2015, acabou por julgar improcedente a apelação da R. e parcialmente procedentes a apelação da A., alterando a decisão a decisão da 1.ª instância no sentido de condenar a R. a pagar à A. as seguintes quantias: a) – O total de € 21.246,29, a título de danos patrimoniais, resultante da soma de € 14.750,00, pelo défice funcional, 1.036,29, por despesas, e € 5.460,00 relativos a ITA, subtraída do montante recebido da Segurança Social, acrescido de juros de mora desde a citação; b) – € 10.000,00, pelos danos não patrimoniais, mantendo os juros de mora desde a data da sentença da 1.ª instância. 6.

    Novamente inconformadas, tanto a A., a título principal, como a R., por via subordinada, interpuseram revista, em que formulam as seguintes conclusões: 6.1.

    A A., dizendo que: 1.ª - O presente recurso tem por objeto nulidades do acórdão recorrido por violação do preceituado na alíneas b) e c) do n.º 1 do art.º 615.º do CPC; 2.ª - O referido acórdão, no que se refere à indemnização por ITA e às remunerações de férias, subsídios de férias e de Natal, decidiu ter a A. direito ao valor de € 5.460,0,00, subtraído do montante recebido pela Segurança Social, reportado no ponto xx), a liquidar.

    1. - Da materialidade dada como provada, resulta que a Segurança Social abonou à A. as férias, subsídio de férias e subsídio de Natal correspondentes ao período de doença natural e relativamente aos quais é responsável - os relativos ao ano de 2004.

    2. - Deixando, por conseguinte, a Segurança Social de abonar à A. as férias, subsídio de férias e subsídio de Natal correspondentes ao período de incapacidade temporária para o trabalho por doença direta - os de 2005 e 2006, uma vez que não é responsável pelo pagamento das mesmas.

    3. - Assim, a decisão recorrida está em oposição com os fundamentos constantes da materialidade dada como provada, o que consubstancia a nulidade processual prevista no art.º 615.º, n.º 1, alínea c), por referência ao art.º 666.º, n.º 1, do CPC, que expressamente se invoca e que terá que ser suprida, com a necessária remessa destes autos ao Tribunal da Relação para apreciação e prolação de nova decisão sobre o valor das retribuições de férias e subsídio de férias e de Natal.

    4. - Se assim não fosse, o que não se aceita e se trata por mero dever de patrocínio, e caso se entenda que ao valor de € 5.460,00, deve ser subtraídos o montante reportado no ponto xx) e relativo aos períodos de incapacidade subsequente ao acidente, estaríamos perante um manifesto excesso de pronúncia, cfr. última parte da alínea d) do n.º 1 do art.º 615.º do CPC, o que, sem prescindir, se invoca para todos os efeitos legais.

    5. - Note-se que, verificado o teor de todos os articulados nem a Segurança Social, IP, nem a R. CC alguma vez peticionaram que à A. fossem subtraídas as ditas quantias, fosse a que título fosse.

    6. – Mais, ao entender que a A. reclama montantes relativos a férias e respetivo subsídio e subsídio de Natal referentes somente ao ano de 2004, o que não se aceita, estaríamos perante uma manifesta situação omissão de pronúncia prevista na primeira parte da alínea d) do n.º 1 do art.º 615.º do CPC, o que, sem prescindir, se invoca para todos os efeitos legais.

    7. - Pois, do sobredito entendimento resultaria que a A. deixava de ter direito a auferir, no período correspondente à convalescença do acidente - de 26/01/2005 a 26/10/2006 (341 dias de incapacidade temporária total ou absoluta - ITA), qualquer quantia a título de férias e respetivo subsidio e subsidio de Natal, quantias que esta sempre peticionou.

    8. - Em matéria de indemnização por danos patrimoniais, resulta do acórdão recorrido que se considera justo e ajustado o valor fixado pelo tribunal recorrido a este título que assim se mantêm, e que era de € 14.750,00; 11.ª - A recorrente não se conforma com tal decisão por, antes de mais, a mesma assentar, em erro de cálculo sobre os raciocínios matemáticos que a mesma apresenta.

    9. - O acórdão recorrido refere-se à taxa de 3% quanto à taxa de juro o capital. Todavia, a taxa de juro de capital, fixada a 3% é manifestamente inferior ao índice de aumento do salário mínimo nacional, nesta data fixado em € 505,00 (424,50€x3%=437,50), sendo este o que se deve considerar para todos os efeitos legais.

    10. - Desta feita, e de acordo com o raciocínio matemático apresentado no acórdão recorrido, seria o cálculo do valor da indemnização pelo défice funcional o seguinte: Rendimento anual: € 505,00 x 14 = € 7.070,00; Perda resultante da IPG de 6 pontos: € 7.070,00 x 6% = € 424,20; esperança de vida da recorrente após o acidente: 41 anos (80-39); perda resultante do acidente: € 424,20 x 41 = € 17.392,20.

    11. - O que, em conformidade com os dizeres da jurisprudência invocada no acórdão recorrido, nunca poderia o valor da indemnização pelo défice funcional ser fixado em quantitativo inferior a € 17.392,20.

    12. - Decidindo fixar o valor da indemnização por défice funcional em € 14.750,00, o acórdão recorrido está em oposição com os fundamentos que usou, cfr. art.º 615.º, n.º 1, alínea c), por referência ao art.º 666.º, n.º 1, do do CPC, nulidade que expressamente se invoca e que terá de ser suprida com a necessária remessa destes autos ao Tribunal da Relação para apreciação e prolação de nova decisão sobre o valor da indemnização por défice funcional; 16.ª - Acresce que, a recorrente não se conforma com o “quantum” fixado a título de indemnização devida por défice funcional.

    13. - A afetação do ponto de vista funcional, na envolvência do que vem sendo designado por "dano biológico", determinou à recorrente consequências negativas a nível da sua atividade geral e profissional.

    14. - Essa incapacidade funcional ou "dano biológico", numa perspectiva sistémica da teoria geral da indemnização, implica a ressarcibilidade, enquanto dano patrimonial futuro.

    15. - Muito embora se tenha presente que as sequelas sofridas em consequência do acidente são, em termos de rebate profissional, compatíveis com o exercício da atividade habitual, mas implicam esforços suplementares; 20.ª - A verdade é que, no caso dos autos, a A. nunca mais pode regressar ao seu trabalho, por não reunir condições físicas que o permitam, e somente exerce as suas funções de dona de casa com significativas limitações.

    16. - Assim, a indemnização, por défice funcional (dano patrimonial futuro), deve ser arbitrada em quantia nunca inferior a € 35.000,00, por se adequada e proporcional aos danos resultantes do acidente conjugados demais critérios atendíveis.

    17. - Decidindo fixar o valor da indemnização por défice funcional em € 14.750,00, o Tribunal da Relação proferiu decisão somente pelo facto de considerar justo e ajustado o valor fixado pelo tribunal...

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