Acórdão nº 703/12.7TVPRT.E1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 16 de Junho de 2016

Magistrado ResponsávelPIRES DA ROSA
Data da Resolução16 de Junho de 2016
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: AA – ACTIVIDADES HOTELEIRAS, UNIPESSOAL, LDA intentou, nas Varas Cíveis do Porto, onde recebeu o nº 703/12.7TVPRT, acção declarativa, na forma ordinária de processo, (hoje na Vara de Competência Mista de Setúbal) contra BB e mulher CC pedindo que os réus fossem condenados (i) a pagar à autora o valor de 24180,00 euros, acrescido de IVA, correspondente ao preço da obra de reposição do imóvel que lhes havia dado de arrendamento no estado inicial; ou, em alternativa, (ii) a pagar à autora uma indemnização de 41 064,80 euros, correspondente aos 23 meses de renda não pagos pelos réus durante aquele período de três anos, que a autora tinha a expectativa de receber.

Alegou, em síntese: em 14 de Janeiro de 2011, a autora celebrou com os réus contrato de sublocação de uma loja, com entrada pelo n.º … da Rua …, no Porto, tendo em vista o exercício da actividade de mediação imobiliária; a fracção encontrava-se montada, equipada e mobiliada pela autora e apta a funcionar como restaurante, pelo que os réus a desmantelaram e nela fizeram obras, adequando-a ao exercício daqueloutra actividade; o contrato teria a duração mínima de três anos, prevendo que, caso os réus lhe pusessem termo em momento anterior, ficavam obrigados a pagar à autora o valor de 4 500 euros, correspondente às três rendas iniciais que foram perdoadas, e a repor a fracção no estado em que a receberam; em 27 de Outubro de 2011, os réus denunciaram o contrato; em 07 de Novembro de 2011 a autora enviou carta aos réus e pediu-lhes o pagamento daquela quantia de 4 500 euros e a reposição do imóvel no estado anterior ou, em alternativa, o pagamento de 24 180,00 euros, acrescido de IVA, correspondente ao preço da obra, a efectuar por terceiro, dessa mesma reposição, no que insistiu por carta de 29 de Fevereiro de 2012; os réus já pagaram aquela quantia e entregaram o imóvel, mas não o repuseram no estado em que o receberam e não pagaram o valor necessário à respectiva obra.

Citada, a ré apresentou contestação, impugnando parte da matéria alegada pela autora e concluindo pela improcedência da acção e absolvição do pedido.

A 1ª Vara Cível do Porto declarou-se territorialmente incompetente e declarou competente o tribunal judicial da Comarca de Setúbal, para onde os autos foram enviados e aí distribuídos à Vara de Competência Mista.

Este Tribunal, na sequência e na conclusão do processo veio a proferir sentença que julgou a acção improcedente, absolvendo os réus dos pedidos.

Inconformada, a autora interpôs recurso de apelação e o Tribunal da Relação de Évora, por acórdão sem voto de vencido, revogou a sentença, condenando os réus a pagar à autora o valor correspondente ao custo da reposição da ligação feita em tubo spiro com colector duplo, da ligação do motor de frio e respectiva parte eléctrica, das ligações (esgotos, água fria e quente, gás com certificação da APCER, etc.), existentes em relação a todos os equipamentos existentes no restaurante e da reposição da decoração existente (pinturas, vinil, espelho, carpintaria) e toda a estrutura de software instalada no imóvel, valor este a apurar em liquidação de sentença.

Inconformados agora os réus, vêm interpor recurso de revista e formulam as seguintes conclusões: I. O presente recurso de revista é interposto do douto Acórdão do Tribunal da Relação de Évora tendo por fundamento a alínea a) do n.º 1 do artigo 674º do CPC.

  1. O objecto do presente recurso de revista consiste na apreciação das questões: a) Saber se é admissível o pedido do "custo de reparação" ou "indemnização pelo equivalente", ao invés de se optar pela restituição natural, quando esta é possível ou suficiente.

    1. Saber se existiu ou não incumprimento contratual por parte dos Réus, ora Recorrentes (questão levantada em sede de ampliação do objecto de recurso).

    2. Nulidade da sentença por violação do princípio do contraditório (questão "parcialmente apreciada" pelo acórdão recorrido); III. O Acórdão do Tribunal da Relação de Évora violou, além doutros, os artigos 562.º, 566º, 405º, 810.º e 811º, todos do Código Civil e ainda os artigos 3.º, n.º 3 e 5.º, n.º3 do Código de Processo Civil.

  2. O princípio da restituição natural apenas deverá ceder e ser substituído pela indemnização em dinheiro quando se encontrem verificados os pressupostos dessa substituição, articulados no nº 1 do art.º566º do Código Civil.

  3. Do confronto do artigo 562º com o nº 1 do artigo 566º ambos do Código Civil se concluiu que, no nosso ordenamento jurídico, se encontra consagrado o princípio da reposição natural, traduzido no dever que impende sobre o lesante de reconstituir a situação anterior à lesão; VI. A indemnização em dinheiro tem caracter subsidiário, tendo apenas lugar nas situações excepcionalmente previstas no n.º 1 do artigo 566º: i) quando seja inviável a reconstituição da situação anterior à lesão; ii) quando não repare integralmente o dano; iii) ou quando seja excessivamente onerosa para o devedor.

  4. A indemnização é fixada em dinheiro, sempre que a restituição natural não seja possível, não repare integralmente os danos ou seja excessivamente onerosa para o devedor.

  5. O ónus de alegar e demonstrar que a restituição natural não é possível era do Recorrido, o que não aconteceu e foi desconsiderado pelo Tribunal da Relação de Évora.

  6. No caso dos autos a Autora não solicitou por qualquer forma a reparação natural, optando logo por exigir uma indemnização por equivalente.

  7. A reposição natural é possível e não apresenta excessiva onerosidade para os Réus, por outro lado, nada tendo a Autora alegado e provado, como lhe competia, quanto à insuficiência ou ineficácia da reparação, há que concluir que não lhe assiste o direito de peticionar uma indemnização em dinheiro.

  8. O Acórdão recorrido admite, expressamente que não peticionaram a restituição natural, optando antes pelo pedido direito de uma quantia a título de indemnização pelo equivalente.

  9. O acórdão recorrido, ao fazer referência às situações descritas no artigo 566º, n.º 1, refere-se aos casos em que a reconstituição natural não seja possível, não repare integralmente os danos ou seja excessivamente onerosa para o devedor, nunca se tendo demonstrado a verificação de nenhuma dessas situações, as quais não foram alegadas nem tão pouco provadas.

  10. A restituição natural é possível.

  11. O acórdão recorrido conclui, em frontal oposição ao preceituado nos artigos 562º e 566º do Código Civil, que o disposto no n.º1 do art.º 566º do Código Civil não obsta a que o lesado opte entre a reparação natural e a indemnização em dinheiro.

  12. A Recorrida nunca alegou, nem tão pouco provou, qualquer facto do qual se retirasse a impossibilidade de se proceder à reparação natural.

  13. A conclusão que o Tribunal da Relação de Évora retira da interpretação do art.º 566º n.º 1, é capciosa, na medida em que entente que a indemnização ou montante - ou seja o que for - que é peticionado pelo Recorrido e a restituição natural são a mesma coisa, o que diametralmente oposto ao que se encontra estatuído nos artigos 562º e 566º do Código Civil.

  14. O princípio da restituição natural apenas deverá ceder e ser substituído pela indemnização em dinheiro quando se encontrem verificados os pressupostos dessa substituição, articulados no n.º 1 do art.º 566º do Código Civil.

  15. O Acórdão derroga a letra e o sentido de duas disposições legais constantes dos artºs 562º e 566º do CC, de forma directa, fechando os olhos ao princípio de aplicação geral estabelecido no art.º 562º do CC e ainda à remissão efectuada pelo artigo 566º, n.º 1 que confirma e consagra de forma absoluta a aplicação de tal princípio, admitindo a sua derrogação em situações específicas e legalmente tipificadas, as quais repete-se, não se verificam. Não foram alegadas. Não foram provadas.

  16. A lei distingue clara e expressamente duas realidades - a restituição natural e indemnização por equivalente pelo que não poderia o Tribunal da Relação de Évora entender, por interpretação, que são uma e a mesma coisa.

  17. A condenação dos Recorrentes encontra-se em frontal contradição com a fundamentação, também ela transcrita no acórdão recorrido, não se referindo, à anulação de decoração e muito menos de estrutura de software a qual não existia e não foi alvo de qualquer intervenção por parte dos Recorrentes.

  18. Conforme refere a sentença proferida em primeira instância " ... a Autora procedeu às obras de desmantelamento do restaurante e, por sua vez, os Réus encarregaram-se da tarefa de executar as obras de adaptação logo após a Autora ter retirado o equipamento, decoração e mobiliário que lá detinha." XXII. Considerando-se provado que foi a autora a desmobilizar e remover o mobiliário e decoração não existe razão para se pretender imputar tal custo aos Recorrentes.

  19. Tal facto configura uma contradição entre a matéria considerada provada e o juízo levado a cabo pelo Tribunal da Relação, na medida em que, apesar de se ter concluído que foi a Recorrida a remover o mobiliário e a decoração, condena os Recorrentes à sua reposição, o que consubstancia a nulidade do acórdão, nos termos do art.º 615º, n.º 1, alínea c).

  20. Recorrente e Recorrido estabeleceram especificamente uma cláusula penal, consubstanciada no pagamento de uma indemnização, para compensar a Recorrida pela cessação do contrato antes de decorrido o período de 3 anos.

  21. O contrato de sublocação objecto dos presentes autos acolhe uma Cláusula Penal onde se evidencia que o termo/fim da vigência do contrato antes de alcançada a data de 11 de Janeiro de 2014, em termos de consequência e/ou penalizações para os Recorridos, sempre estiveram adstritos apenas e só à obrigação de pagar a quantia fixada a título de cláusula penal - correspondente ao valor global das rendas dos meses correspondentes ao período de carência, inicialmente, concedido aos Recorridos.

  22. Os Recorridos decidiram denunciar o contrato, antes de decorrido aquele prazo, e, simplesmente, de acordo com os termos do contrato...

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