Acórdão nº 430/13.8TBPVZ.P1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 13 de Outubro de 2016

Magistrado ResponsávelANTÓNIO DA SILVA GONÇALVES
Data da Resolução13 de Outubro de 2016
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça A “Sociedade Imobiliária AA, S.A.” intentou ação declarativa de simples apreciação contra a “BB - Revestimentos, Ldª”, pedindo que "seja declarada, de forma definitiva, a perda de interesse da Ré nos bens móveis existentes nas instalações da Autora e a correspondente livre disposição, por esta, dos mesmos bens".

Alega, em síntese, ser proprietária de especificado imóvel que, em parte, foi arrendado à Ré e esta não procedeu ao pagamento das rendas que se venceram, desde março de 2009 até à data em que ocorreu a sua declaração de insolvência, em 15.06.2010. Na ação de despejo que intentara contra a Ré em que pedia a resolução do contrato por falta de pagamento de rendas, foi, em 22.01.2012, celebrada uma transação, homologada por sentença, em que acordaram pôr termo ao contrato de arrendamento, tendo a A. prescindido das rendas vencidas e, em contrapartida, a Ré comprometeu-se a entregar o imóvel livre de pessoas e bens, autorizando-a a A. a guardar os bens, que se encontram no locado, até 31.12.2012, mas ficando consignado que a Ré perdia o interesse sobre todos aqueles bens se não procedesse ao levantamento dos mesmos até aquela data.

Mais alega que a Ré, apesar de instada para o efeito, continua sem proceder ao levantamento dos bens, impedindo-a de fruir o imóvel.

A Ré contestou, sustentado ser nula a transação efectuada com a A, por falta de legitimidade substantiva do Administrador do processo de insolvência que a outorgou, por inviabilizar o plano de insolvência e, ainda, por violar o princípio da igualdade dos credores em sede de processo de insolvência.

Concluiu pela improcedência da ação e em reconvenção pede que se julgue nula e de nenhum efeito a transação celebrada no processo n.º 171/10.8TBPVZ, homologada por sentença, por violar o princípio da igualdade dos credores em sede de processo de insolvência e, bem assim, por os outorgantes em nome e representação da massa insolvente da Ré (e da própria Ré) não terem legitimidade substancial e material para a celebração da dita transacção, por ser contrária a plano de insolvência aprovado e homologado no processo de insolvência.

A A. replicou concluindo pela improcedência da reconvenção e pedindo a condenação da Ré como litigante de má fé Na audiência prévia foi proferido saneador, no qual se admitiu a reconvenção e se fixou o valor da ação em € 31.000,00.

Definiu-se o objeto do litígio e foram elencados os temas de prova, tendo-se, desde logo, fixado os factos assentes.

Após realização da audiência de julgamento foi proferida sentença do modo seguinte:

  1. Julgou a ação parcialmente procedente e válida a transacção efectuada, considerou que a Ré perdeu, de forma definitiva, o interesse nos bens móveis que não removeu das instalações da A, absolvendo-a do demais peticionado; b) Julgou a reconvenção improcedente e dela absolveu a A.

Inconformada, recorreu a ré para a Relação do Porto que, por acórdão de 17.03.2016 (cfr. fls. 405 a 418), julgou a apelação parcialmente procedente e, revogando a sentença recorrida, julgou a ação improcedente e parcialmente procedente a reconvenção, declarando a ineficácia da transação celebrada no processo n.º 171/10.8TBPVZ e homologada por sentença, referida sob o n.º 17 dos factos provados.

Desagradada, recorre agora para este Supremo Tribunal a autora “Sociedade Imobiliária AA, SA”, que alegou e concluiu pelo modo seguinte:

  1. No pedido reconvencional a Ré deduziu o pedido de nulidade da transação celebrada no âmbito do processo n.º 171/10.8 T8 PV Z, por alegada violação do principio da igualdade dos credores da insolvência, princípio esse previsto no artigo 194.º, do CIRE.

  2. O Tribunal a quo entendeu, conforme também o havia feito a 1.ª Instância, que a transacção em causa não padecia do vício de nulidade (ou de qualquer outro), não sendo violadora do invocado princípio da igualdade.

  3. O Tribunal partiu para a análise da questão da ineficácia da transação em causa por, alegadamente, a mesma não ter sido precedida da autorização da comissão de credores, nos termos do disposto nos artigos 161.º e 163.º, ambos do CIRE.

  4. A questão da ineficácia da transação excede os limites do pedido e da causa de pedir da reconvenção, os quais se traduzem, por um lado, na declaração de nulidade da transação e, por outro lado, na circunstância de tal transação ser violadora do princípio da igualdade de credores da insolvência, nos termos do artigo 194.º do CIRE.

  5. Não é sindicável, no caso dos presentes autos, a jurisprudência fixada pelo Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 23.01.2001, publicado no DR I S-A, n.º 34, de 09.02.2001, pois a questão de direito analisada nesse acórdão é diversa da questão analisada nos presentes autos.

  6. A Ré, nos presentes autos, não errou apenas na qualificação jurídica dos efeitos pretendidos, tendo configurado, de facto, um pedido e uma causa de pedir que, a serem julgados procedentes, por provados, antes impunham a nulidade do negócio jurídico.

  7. A Autora não respondeu, retius, não tinha que responder, em sede de réplica, à questão da ineficácia por falta de autorização da comissão de credores (nos termos dos artigos 161.º e 163.º, ambos do CIRE), mas apenas à questão da nulidade por violação do princípio da igualdade dos credores, previsto no artigo 194.º do CIRE, uma vez que aquela primeira questão não foi trazida à lide.

  8. Assim, e porque a ineficácia não é de conhecimento oficioso, o Tribunal, ao proferir a decisão recorrida, fê-la incorrer no vício de nulidade, por excesso de pronúncia, o qual se encontra previsto no artigo 615.º n.º 1, al. d), do C.P.Civil.

  9. Não é imputável à transação em causa nos presentes autos, a insusceptibilidade de recuperação Ré.

  10. Durante mais de 10 (dez) meses (período compreendido entre a data de aprovação do plano e a data de celebração da transacção), nada foi feito ou implementado efeitos de recuperação da Ré.

  11. A Ré não nomeou nova gerência (o Senhor CC ou qualquer outro) no prazo de 30 dias (conforme previsto no ponto 3.1. do plano junto aos autos).

  12. A Ré não celebrou o contrato de exploração comercial (conforme previsto no ponto 3.2 do plano, junto aos autos).

  13. A Ré não aumentou o capital para 500.000,00 EUR (quinhentos mil euros) - (conforme previsto no ponto 3.3.1. do plano, junto aos autos).

  14. A terceira entidade, DD, que se pretendia, nos termos do plano de insolvência, assumisse a exploração do estabelecimento, estava insolvente.

  15. A insusceptibilidade de recuperação da Ré apenas a esta poderia ser imputável e, bem assim, aos seus credores, porquanto apresentou e aprovaram um plano de insolvência que sabiam, à partida, ser inviável, dado encontrar-se em curso uma acção de despejo, sabendo perfeitamente a Ré que a Autora não pretendia manter o vínculo contratual, quando foi apresentado e homologado o Plano de Insolvência, e que não havia pago uma única renda.

  16. É marginal e abusiva a conduta processual da Ré no sentido de protelar o pagamento das suas dívidas lançando mão a expedientes manifestamente dilatórios para se eximir do cumprimento das suas obrigações.

  17. A transação em questão nos presentes autos não preenche o requisito do especial relevo para a insolvência, nos termos do artigo 161.º, do CIRE.

  18. A transacção em causa nos presentes autos foi alcançada após o Senhor Administrador de Insolvência ter informado os autos de insolvência de que o Plano de insolvência havia fracassado, não tendo sido implementadas, por motivos alheios à Autora, quaisquer medidas de recuperação.

  19. Nos termos da transacção, a Autora abdicou do montante relativo às rendas vencidas (5.2000,00 EUR, até à data da declaração de insolvência) e permitiu/tolerou à Ré ocupar o locado durante cerca de mais um ano (a custo zero. e sem, por isso, poder dispor do mesmo locado, nomeadamente. arrendando-o a quem tivesse interesse e disponibilidade para pagar) sendo que a única contrapartida que recebia era 3 desocupação cio imóvel até à data de 31 de dezembro de 2012.

  20. Ou seja, a Autora abdicou, não só das rendas vencidas (até à data da transacção), como de rendas vincendas (ou seja, num total de, pelo menos, 146.250,00 EUR).

  21. Tendo havido incumprimento, como houve, do plano de insolvência, as medidas do plano não seriam aplicáveis, nomeadamente, no que respeita à sua incidência nos créditos comuns.

  22. No caso de procedência da ação de despejo (caso não tivesse havido transação) a Autora/Recorrente poderia ter discutido e votado o plano em causa. Dado que o plano dependeria do seu acordo, sempre o plano teria sido reprovado, e portanto o crédito de 52.000,00 EUR da Autora manter-se-ia intacto e sem a redução prevista no plano então reprovado.

  23. No caso de improcedência da ação de despejo, duas conclusões se retirariam: (i) não havia rendas em dívida pois aquilo que era alegado pela Ré era a inexistência de contrato de arrendamento e (ii) sempre o imóvel teria que ser desocupado por não...

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