Acórdão nº 8/12.3JALRA.C1. S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 21 de Janeiro de 2016

Magistrado ResponsávelARMINDO MONTEIRO
Data da Resolução21 de Janeiro de 2016
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam em conferência na Secção Criminal do Supremo Tribunal de Justiça: Em processo comum com intervenção do tribunal colectivo, sob o n.º 8/12.3JALRA.C1, da Comarca de ..., J2, Instância Central, Secção Criminal, AA foi submetido a julgamento e, a final, condenado nas penas de 4 anos e 6 meses de prisão pela prática, em autoria material, de um crime de abuso sexual de crianças agravado, de trato sucessivo, p.e p. pelos art.ºs 172º, nº 1, e 177º, nº 1, alínea a), do Código Penal, na pessoa de BB, e na pena de 7 anos de prisão pela prática de um crime de abuso sexual de crianças agravado, de trato sucessivo, p. e p. pelos art.ºs. 171º, nºs 1 e 2, e 177º, nº 1, alínea b) do Código Penal, na pessoa de CC; em cúmulo jurídico foi-lhe aplicada a pena única de 8 anos e 6 meses de prisão.

Foi, também, condenado a pagar à demandante, assistente, sua filha, BB, a quantia de € 3.000,00 a título de indemnização por danos morais causados.

  1. Inconformado, o arguido interpôs recurso para a Relação, que confirmou o acórdão proferido em 1.ª instância, de novo interpondo recurso para este STJ, extraindo-se da motivação as seguintes conclusões: 1. O Tribunal fez um Julgamento incorreto da matéria de facto, cujo erro notório se alcança do acórdão recorrido, que impõe alteração aos factos provados e decisão diversa da recorrida em matéria penal, erro de julgamento em matéria de direito por inobservância de dispositivos do Código Penal e de Processo Penal, e inobservância de princípios basilares do Processo Penal, designadamente do principio da Presunção de inocência do arguido e do Principio “in dúbio pro reo”.

    1. Sendo certo que o Recurso para o Supremo Tribunal de Justiça, nos termos do artigo 432º, nº 1 alínea c) do CPP, visa exclusivamente o reexame da matéria de direito, nos termos do artigo 434º do CPP em conjugação com o artigo 410º nº 2 e 3 CPP, o presente recurso visa a apreciação do erro notório na apreciação da prova, o que desde já se invoca nos termos do artigo 410º, nº 2 alínea c) do CPP.

    2. O Acórdão recorrido padece de nulidade insanável por violação do direitos consagrados no artigo 61º, nº 1 alínea c), 358º e 359º todos do CPP, e artigo 32º, nº1 e 5 da CRP/76, violador dos direitos de defesa e do principio do contraditório.

    3. A avaliação da matéria provada que é feita pelo Tribunal Recorrido, no que respeita ao arguido/recorrente, merece, salvo melhor entendimento, ampla censura, desde logo porque interpreta incorretamente a prova produzida que, em circunstância alguma, suporta a matéria assente e, consequentemente, sustentar a condenação do recorrente.

    4. Baseando-se fundamentalmente no relatório pericial efetuado ao arguido, que quanto aos factos nada esclarece.

    5. No entender do recorrente, o acórdão recorrido revela um profundo desrespeito pelas regras e princípios fundamentais que informam a Lei Penal e processual e a própria Constituição da Republica, que conduziu à decisão injusta e, a nosso ver, insustentável da condenação do Arguido na pesada pena de prisão efetiva que lhe foi imposta, 7. Realizada a audiência de julgamento, o Tribunal a quo nos termos e para os efeitos do disposto no artº 358º, nºs 1 e 3 e 359º, ambos do Código de Processo Penal, em 6/1/2015 na diligencia de leitura de acórdão, foi comunicada ao arguido a possibilidade de alteração não substancial e substancial de factos relativamente à actuação do arguido e em 20/1/2015, reaberta novamente a audiência de julgamento para leitura de acórdão, foi novamente o arguido surpreendido agora com uma alteração não substancial dos factos.

    6. O recorrente insurge-se contra a ocorrida alteração substancial e não substancial dos factos de 6/1/2015 e 20/1/2015, e mantida pelo acórdão recorrido porquanto a mesma não foi pessoalmente consentida pelo arguido, sendo que a sua defensora, enquanto defensora oficiosa, não tem poderes especiais para o efeito, 9. O arguido não manifestou o seu acordo expresso, em sede de audiência de julgamento, o que se poderia alcançar caso a sessões de audiência de julgamento ocorrida no dia 6/1/2015 e mesmo a de 20/1/2015, tivessem sido gravadas conforme agora é imposto pela Lei processual penal, o que não foi o caso.

    7. Das actas de audiência de julgamento não se alcança sequer que ao arguido pessoalmente tivesse sido colocada a questão de aceitação ou não das alterações substanciais e não substanciais dos factos.

    8. Alguma doutrina e jurisprudência tem entendido que o acordo deve ser dado pessoalmente ou pelo seu defensor munido de poderes especiais para o efeito, e que o silencio do arguido não vale como acordo para continuação do julgamento quando o tribunal comunica estar-se perante uma alteração substancial ou não substancial dos factos-Cfr. Ac. Da Relação de Lisboa de 26-2-2003, Coletânea de Jurisprudência ano XXVII, tomo 1, página 146.

    9. O arguido não manifestou o seu acordo expresso, em sede de audiência de julgamento, o que se poderia alcançar caso as sessões de audiência de julgamento ocorridas no dia 6/1/2015 e mesmo a de 20/1/2015, tivessem sido gravadas conforme agora é imposto pela Lei processual penal, o que não foi o caso, não existindo documentação de declarações orais prestadas, em sistema de audio disponível na sala de audiências, conforme impõe o artigo 364º do CPP, 13. Verificando-se a nulidade prevista no artigo 363º do CPP e que se invoca.

    10. Quer a alteração substancial ou a não substancial dos factos, são nulas atenta a falta de fundamentação, 15. Quer a comunicação da alteração não substancial dos factos, quer a comunicação da alteração substancial dos factos, deve ser fundamentada, concretizando os novos factos indiciados e respetivos meios de prova de onde resulte essa indiciação, única forma e meio de salvaguardar ao arguido os seus direitos de defesa.

    11. Em momento algum se faz referência quanto aos meios probatórios concretos que permitiram ao Tribunal concluir pela existência desses indícios.

    12. Esta referencia radica num dever de fundamentação desse despacho e esta completa ausência de fundamentação demonstra uma clara e notória postergação dos direitos do arguido que assim vê claramente esbatidas as suas hipóteses de defesa em clara violação do artigo 61º, nº1 e 99ºº do CPP e ainda do artigo 205º da Constituição da Republica Portuguesa.

    13. A decisão não deu cumprimento fiel ao exigido, pois não concretiza ou sequer alude quais os meios de prova de onde resulta a indiciação dos novos factos com relevo para a decisão..

    14. A comunicação da alteração substancial ou não substancial não integra um ato decisório ou um ato de mero expediente, conforme realça o acórdão agora posto em crise, mas as proceder-se a uma alteração substancial ou não substancial dos factos, haveria no modesto entender do recorrente que tal alteração decorre das declarações prestadas por tal pessoa, ou analise de tal documento….enfim como se de uma nova acusação se tratasse, onde são indicadas as provas recolhidas que indiciam a pratica deste ou daquele crime, 20. A comunicação efetuada apenas transmitiu os factos, sem explicitar quais os meios de prova atendidos para os indícios do crime… 21. Esta comunicação é a única forma e meio de salvaguardar ao arguido os direitos consignados no artigo 61º, nº1 alínea c), 358º, nº1 do CPP e 32º, nº1 e 5 da Constituição da República Portuguesa, e a omissão de todo dos meios de prova indiciários é violador, pois, dos direitos de defesa e do principio do contraditório que assiste ao arguido.

    15. O principio do acusatório é um dos princípios estruturantes da nossa constituição processual penal, que exige que a decisão final há-se incidir apenas sobre a acusação, havendo o Tribunal de ajuizar dos fundamentos dela, pronunciando ou não o arguido, condenando-o ou absolvendo-o pelos factos acusados, e só esses, de modo a permitir-se que alguém só pode ser julgado por qualquer crime precedendo acusação por parte de orgão distinto do julgador, sendo tal acusação condição e limite do julgamento.

    16. Ora o caso dos autos em apreciação, está ferido de nulidade, pois importa uma clara violação do direito de defesa e do princípio do acusatório, e como tal insanável, e invocável a todo o tempo.

    17. Nesta medida, pode afirmar-se e concluir-se que a condenação do recorrente-ínsita na sentença- pelos factos que não integravam a acusação, constitui a nulidade do artigo 379º, nº1, alínea b) do CPP, pois esta condenação ocorreu fora do acaso e condições do artigo 358º e 359º do mesmo diploma legal.

    18. Atento ao exposto, deverão ser de anular todos os actos subsequentes à comunicação da alteração substancial e não substancial dos factos do dia 6/1/2015 26.

      No presente processo, o Tribunal, no modesto entender do recorrente, exorbita a prova que lhe foi apresentada e perante si produzida, para chegar a uma decisão sobre matéria de facto, que largamente ultrapassa o que lhe seria permitido concluir.

    19. A apreciação da matéria de facto realizada pelo Tribunal recorrido afigura-se ilegitimo, decorrendo da prova produzida em Audiência de Julgamento elementos insuficientes para que se tomassem determinados factos como provados.

    20. O julgamento incorreto da matéria de facto impõe alteração aos factos provados e decisão diversa da recorrida, o que se constata do teor do acórdão recorrido, como erro notório.

    21. Percorrendo a fundamentação da sentença recorrida, constata-se que a imputação dos crimes de que o arguido vem acusado, não têm sustentação, primando apenas por conclusões infundadas e uma incorreta interpretação da prova, que nunca poderiam ter culminado na condenação do recorrente como efetivamente sucedeu.

    22. O Acórdão não tomou em linha de conta a certidão junta à contestação como doc nº 1, e extraída do processo 95/10.9 TAPMS, onde a ofendida CC declarou junto do Ministério Publico de Porto de Mós que nunca tinha sido abordada pelo arguido no sentido de praticar consigo atos de cariz sexual.

    23. O Acórdão não considerou as declarações da CC e constantes no processo nº 1203/08.5pblra, cuja certidão se...

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