Acórdão nº 572/12.7PRPRT.P1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 03 de Março de 2016

Magistrado ResponsávelMANUEL BRAZ
Data da Resolução03 de Março de 2016
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam, em conferência, no Supremo Tribunal de Justiça: O tribunal de 1ª instância, após a realização da audiência a que se refere o artº 472º do CPP, com intervenção do tribunal colectivo, proferiu, em 15/10/2015, acórdão que, operando dois cúmulos jurídicos de penas, condenou o arguido AA, nascido em ...., nas penas únicas de 12 anos de prisão e de 5 anos e 3 meses de prisão.

Dessa decisão o condenado interpôs recurso directamente para o Supremo Tribunal de Justiça, concluindo a sua motivação nos termos que se transcrevem: «1 - Vem o arguido, aqui recorrente, condenado numa pena única de 12 anos de prisão resultante da acumulação das penas dos processos 96/10.7JACBR, 572/12.7PRPRT, 441/12.0PRPRT, 627/12.8SMPRT e 898/12.0PBMTS, e numa outra pena única de 5 anos e 3 meses de prisão resultante da acumulação das penas dos processos 480/12.1GAPVZ e 1749/12.0PPRT.

2 - Não se conformando com a douta decisão cumulatória vem desta interpor recurso, pretendendo em suma ver declarada a nulidade da mesma, ou caso assim não se entenda, a revogação das penas únicas fixadas, e a sua substituição por outras que respeitem os critérios e princípios legais e unanimemente aceites na doutrina e jurisprudência para a fixação de penas únicas em cúmulo jurídico.

3 - Na verdade, o douto acórdão recorrido padece de falta de fundamentação, limitando-se a descrever os factos provados, quer quanto ao número de processos, penas aplicadas e tipo de crime julgado, bem como descrevendo sumariamente os mesmos.

4 - Bem como se limita a transcrever o relatório social realizado ao arguido quanto às condições pessoais do mesmo.

5 - Em sede de fundamentação, o douto acórdão refere apenas e tão só que a convicção do tribunal se formou "segundo as regras da experiência e a livre apreciação convicção, bem como as excepções ao mesmo princípio, decorrentes também da lei, baseou-se essencialmente, numa análise global, conjugada e crítica de todas as provas produzidas em audiência de julgamento, mais concretamente, no teor do acórdão proferido nestes autos, das certidões juntas ao processo, conjugadas com a livre apreciação do relatório social e certificado do registo criminal juntos aos autos".

6- Deste modo, o douto acórdão não contem qualquer referência a uma qualquer ponderação ou conclusão do tribunal a quo acerca de uma valoração de conjunto, e aferição acerca de uma eventual conexão dos factos criminosos entre si, e entre estes e a personalidade do arguido, com vista a determinar se os factos expressam uma inclinação criminosa do arguido, ou se só constituem delitos meramente ocasionais sem relação entre si.

7 - Visão global esta defendida unanimemente pela doutrina e jurisprudência e plasmada na lei.

8 - Nem tão pouco se refere na mesma decisão qualquer valoração acerca do efeito da pena a fixar na vida futura do arguido, 9 - Desconhecendo-se, também, totalmente no acórdão recorrido quais as razões que levaram o tribunal a quo a fixar as penas na medida em que as fixou, não resultando minimente demonstrada a relação de proporcionalidade entre a pena conjunta e a avaliação conjunta dos factos e da personalidade.

10 - Ora, tal era claramente exigível, atenta até a ordem de grandeza das penas únicas fixadas.

11 - O acórdão recorrido nada diz, ainda, sobre a atitude assumida pelo arguido perante os factos, se confessou ou não a sua prática e se efectuou ou não alguma reparação.

12 - Igualmente, o acórdão recorrido nada adianta sobre a motivação do arguido, sobre os propósitos da conduta, e isto considerando a existência de um factor comum presente na quase totalidade dos seus comportamentos criminosos.

13 - Relativamente aos crimes de roubo, o acórdão, não transmite factos que indiquem a grandeza dos valores em causa, nem a real dimensão económica dos prejuízos causados com as condutas do arguido, a intensidade da ofensa, a dimensão da violação do bem jurídico ofendido ou o grau de lesão global, a violação dos direitos de personalidade ou a integridade física do lesado, se houve mera ameaça, ou pelo contrário, efectivação de agressões físicas, e neste caso qual a sua natureza, extensão e consequências.

14 - O douto acórdão recorrido ao fixar as penas únicas ao arguido, Imita-se a proceder a um mero exercido aritmético dentro da moldura penal encontrada para cada cúmulo a realizar.

15 - O douto acórdão viola assim as disposições contidas nos artigos 379º, nº 1, alínea a), e 374º, nº 2, do CPP, sendo pois nulo por falta de fundamentação, devendo por isso ser substituindo por outro que respeite e atenda aos princípios aí plasmados.

16 - Sem prescindir, não tendo as penas unitárias fixadas ao arguido surgido com base numa valoração, no seu conjunto inter conexão dos fados e personalidade do arguido, afiguram-se excessivas e violadoras dos artigos 71º, nº 3, 77º, nº 1, 124º e 127º do Código Penal, pelo que há que alterá-Ias por outras que respeitem a visão global imposta.

17 - Nesta conformidade, parecem-nos respeitar as normas acima referidas, bem como o princípio da proporcionalidade e da proibição do excesso, a pena única de 9 anos e 6 meses de prisão relativamente ao primeiro cúmulo, e a pena única de 3 anos de prisão relativamente ao segundo».

Respondendo, o MP junto do tribunal recorrido defendeu a improcedência do recurso.

Este foi admitido.

No Supremo Tribunal de Justiça o senhor Procurador-Geral-Adjunto pronunciou-se no sentido do provimento parcial do recurso, reduzindo-se a medida de ambas as penas.

Foi cumprido o artº 417º, nº 2, do CPP.

Não foi requerida a realização de audiência.

Colhidos os vistos, cumpre decidir.

Fundamentação: Foram dados como provados os seguintes factos (transcrição): O arguido foi julgado e condenado nos processos, pelos factos, nas circunstâncias e penas a seguir descriminados: 1.

No processo comum colectivo nº 96/10.7JACBR, da extinta Vara de Competência Mista de Coimbra – 2ª Secção: Factos: Junho de 2009 a Abril de 2010; Descrição dos factos: O arguido AA deu entrada no Estabelecimento Prisional de Coimbra (EPC) a 2 de Junho de 2009.

A partir dessa data, o arguido AA elaborou e pôs em prática um plano para venda de grandes quantidades de heroína, cocaína e haxixe a outros reclusos no interior do EPC, e assim obter significativos lucros.

Na concretização de tal plano o arguido recorreu, desde logo, à colaboração da arguida BB, sua companheira, e que o visitava assiduamente, de forma a que o produto estupefaciente fosse introduzido no interior do EPC.

Assim, nessas visitas reiteradas, a arguida BB forneceu ao arguido AA várias quantidades de cocaína, heroína e haxixe a fim de serem vendidas e difundidas pelo arguido AA, como efectivamente foram.

Na posse de tais produtos, com excepção dos que reservava ao seu consumo pessoal, o arguido AA Barros os restantes a número de reclusos não concretamente apurado (consumidores e toxicodependentes) pessoalmente ou através de pelo menos outros dois reclusos por si angariados.

Acórdão: 29/06/2012.

Trânsito em julgado: 20/09/2012.

Crimes: Tráfico de estupefacientes, agravado (com reincidência).

Pena: 9 anos de prisão.

  1. No processo comum singular n° 480/12.1GAPVZ, do 1º Juízo Criminal do Tribunal Judicial de Póvoa de Varzim: Factos: 10/10/2012; Descrição dos factos: No dia 10/10/2012, pelas 17h15, o arguido dirigiu-se à residência dos ofendidos --- e---, sita na Rua Professor José Rodrigues dos Santos, nº 472, em Amorim, tendo-se introduzido na mesma através de uma janela que se encontrava aberta, apenas com o estore descido, com o intuito de se apropriar de dinheiro ou objectos de valor que ali encontrasse.

    Em execução de tal propósito, o arguido subiu ao primeiro andar da casa e apropriou-se dos seguintes objectos e valores: -400,00 (quatrocentos euros) em notas do BCE; -um telemóvel de marca NOKIA, modelo X3, com o IMEI 353764047690072, no valor de cerca de € 60,00; -um telemóvel de marca Samsung, modelo 1900, com o IMEI 352819023567743, no valor de cerca de € 100,00.

    -uma pasta com um computador portátil; O arguido preparava-se para abandonar a residência, na posse de tais objectos, quando foi interpelado por ----, que se deslocara a casa para lanchar.

    Ao ver o arguido com a pasta do computador na mão, ---- retirou-a das mãos deste, que não ofereceu qualquer resistência e se encaminhou para a porta, para sair do local.

    Sucede que, ao sair, foi surpreendido pelo ofendido--- que estava a chegar a casa. Em acto imediato, o ofendido questionou o arguido sobre o que estava ali a fazer, e na sequência, o arguido exibiu-lhe uma faca, aparentando cerca de 15 cm de comprimento, dizendo-lhe “cala-te!”, conseguindo, assim, intimidar o ofendido e, consequentemente, fugir na posse dos objectos referidos, deixando para trás, apenas, a pasta contendo o computador portátil.

    Sentença: 02/05/2013; Trânsito em julgado: 13/09/2013; Crime: furto qualificado; Pena: 28 meses de prisão.

  2. No processo comum colectivo n° 441/12.0PRPRT, da extinta 4ª Vara Criminal do Porto: Factos: 23/05/2012 e 30/05/2012; Descrição dos factos: No dia 23 de Maio de 2012, pelas 15:45 horas, o arguido entrou no estabelecimento denominado “Godiva Chocolatier”, sito na Avenida Boavista, nº 1603, no Porto, e empunhou uma tesoura que se encontrava pousada no balcão do estabelecimento, a qual apontou ao pescoço da ofendida ----, funcionária do estabelecimento, ordenando-lhe que abrisse a caixa registadora, ao que esta acedeu por temer seriamente que o arguido a atingisse com a tesoura.

    Após aberta a caixa registadora pela ofendida, o arguido retirou do interior da mesma a quantia de € 114, 00 (cento e catorze euros), da qual se apoderou.

    De seguida, o arguido apoderou-se ainda de uma garrafa de espumante da marca “Charles Pelletier”, com o valor de € 8,10 (oito euros e dez cêntimos), que se encontrava exposta numa prateleira do estabelecimento e que se destinava à venda ao público.

    O arguido abandonou depois aquele estabelecimento, levando com ele a quantia monetária e a garrafa de espumante, que...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO
2 temas prácticos
  • Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça n.º 9/2016
    • Portugal
    • Supremo Tribunal de Justiça
    • Invalid date
    ...qual fui relator, e nas declarações de voto juntas aos acórdãos de 12/06/2014, CJ, acs. STJ, 2014, II, 217, de 03/03/2016, processo nº 572/12.7PRPRT.P1.S1, e de 17/03/20116, processo nº 7846/11.2TAVNG-B.S1, estes, como o primeiro, disponíveis em www.dgsi.pt.As regras relativas ao concurso d......
  • Acórdão nº 330/13.1PJPRT-A.P1-A.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 28 de Abril de 2016
    • Portugal
    • 28 de abril de 2016
    ...qual fui relator, e nas declarações de voto juntas aos acórdãos de 12/06/2014, CJ, acs. STJ, 2014, II, 217, de 03/03/2016, processo nº 572/12.7PRPRT.P1.S1, e de 17/03/20116, processo nº 7846/11.2TAVNG-B.S1, estes, como o primeiro, disponíveis em As regras relativas ao concurso de crimes est......
1 sentencias

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT