Acórdão nº 1180/10.2JAPRT.P1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 17 de Março de 2016

Magistrado ResponsávelSOUSA FONTE
Data da Resolução17 de Março de 2016
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam na Secção Criminal do Supremo Tribunal de Justiça 1.Relatório 1.1. No processo em epígrafe, da comarca do Porto, Vila do Conde – Inst. Central – 2ª Secção Criminal – J3, responderam, com outros, os arguidos – AA, nascido em ...., filho de ... e de ... solteiro, residente na Rua ..., e – BB, nascido em ... em ..., filho de ... residente na ..., sob a acusação de cada um deles ter praticado, em co-autoria material e concurso real, 3 crimes de roubo, na forma consumada, p. e p. pelos arts. 210º, nºs 1 e 2-alínea b), e 204º, nº 2-alíneas e) e g), do CPenal.

A final, cada um deles foi condenado, pela prática de três crimes de roubo agravado, p. p. pelos arts. 210°, n°s 1 e 2-alínea b), e 204º, n° 2- alíneas d) e e), do CPenal, – em 7 (sete) anos de prisão, pelo crime de roubo cometido na pessoa da ofendida CC; – em 5 (cinco) anos de prisão, pelo crime de roubo cometido na pessoa da ofendida DD; – em 5 (cinco) anos de prisão, pelo crime de roubo cometido na pessoa do ofendido EE.

Em cúmulo jurídico foi, cada um dos Arguidos, condenado na pena conjunta de 10 anos de prisão (acórdão de fls. 2229 e segs.).

1.2. Inconformados, ambos interpuseram recurso para o Tribunal da Relação do Porto que, pelo acórdão de 30.09.2015, fls. 2563 e segs., lhes negou provimento e confirmou a decisão da 1ª Instância.

1.3. Ainda inconformados, recorreram para o Supremo Tribunal de Justiça, tendo terminado as respectivas motivações com as seguintes conclusões que transcrevemos: 1.3.1. O arguido BB (fls. 2636 e segs.): «i PRINCÍPIO “ IN DÚBIO PRO REO” 1. Cita o douto Acórdão: - O Recorrente BB alega que "a sentença recorrida, para além da não relevância e enquadramento em que os factos se passaram, peca, ainda pelo exagero da pena aplicada" e que "o tribunal a quo não teve em consideração as declarações do arguido, e assim violando o princípio "in dúbio Pró Reo”; mais adiante, tece considerações sobre o depoimento de Maria de Fátima Dias, verificando-se que o enquadramento dos factos que refere mais não é do que a apreciação que faz desse depoimento.

- Diz ainda o Recorrente BB que "o tribunal "a quo" não teve em consideração as declarações do arguido, e assim violando [o] princípio "in dubio pro reo'' que deve ser tratado como erro na apreciação da prova.

- Como já se referiu na apreciação do recurso do arguido AA, o que resulta do princípio “in dubio pro reo” é que, quando o tribunal fica na dúvida quanto à ocorrência de determinado facto, deve daí retirar a consequência jurídica que mais beneficie o arguido, o que não ocorreu, pois do acórdão recorrido não decorre nem da matéria de facto dada como provada, nem da sua fundamentação, que o tribunal “a quo” tenha tido alguma dúvida que tenha resolvido em prejuízo do recorrente. A verdade é que o tribunal “a quo” não teve qualquer hesitação quanto à valoração da prova, não tendo fixado qualquer facto que pudesse questionar a prática do ilícito cometido pelo recorrente, pelo que não tinha de fazer apelo ao aludido princípio.

- As declarações do Recorrente não mereceram credibilidade ao tribunal a quo, mas isso não significa a alegada violação do princípio “in dubio pro reo”, como flui do acabado de referir a propósito. Nem poderiam merecer credibilidade, perante o acervo da prova produzida.

  1. A argumentação do Acórdão que se recorre assenta, fundamentalmente, no raciocínio de que o Tribunal da 1.ª instância não teve qualquer hesitação quanto à valoração da prova, pelo que não tinha de fazer apelo ao princípio do “in dúbio pro reo”.

  2. Visto que, perante a prova produzida não decorre nem da matéria de facto dada como provada, nem da sua fundamentação, qualquer dúvida.

  3. Concluindo que, as declarações do Recorrente não merecem credibilidade e que isso não significa a existência da violação do princípio “in dubio pro reo”.

  4. Este princípio é um corolário da presunção de inocência, consagrada constitucionalmente no artigo 32.º, n.º 2 da Constituição da República Portuguesa.

  5. Constitui um dos direitos fundamentais dos cidadãos, conforme o disposto no artigo 18.º, n.º 1 da Constituição da República Portuguesa, artigo 11.º da Declaração Universal dos Direitos do Homem, artigo 6.º, n.º 2 da Convenção Europeia para a Proteção dos Direitos e Liberdades Fundamentais, e artigo 14.º, n.º 2 do Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos.

  6. Estabelece este princípio uma imposição dirigida ao julgador no sentido de se pronunciar de forma favorável ao arguido, quando não tiver certeza sobre os factos decisivos para a decisão da causa.

  7. Assim, um non liquet na questão da prova tem de ser sempre valorado a favor do arguido, sendo com este sentido e conteúdo que o referenciado princípio se afirma.

  8. No caso concreto, o tribunal de 1.ª instância baseou a sua convicção da prova dos factos, que deu como provados no reconhecimento pessoal levado a cabo pela Ofendida CC.

  9. Já que o depoimento [das] demais testemunhas da acusação, como sendo FF, GG e HH, que referiram ter visto junto à residência dos ofendidos, uma viatura da marca VW, modelo Golf, branco, antigo, com indivíduos no seu interior (entre 3 a 4), pelas 6:30h/7:00h a dormir, e pelas 8:30h/9:00h junto ao mesmo.

  10. Nem reconheceram o Recorrente quando confrontados com o mesmo em sede de audiência de julgamento.

  11. O Recorrente negou a prática dos factos que lhes eram imputados.

  12. Não entende o Recorrente o facto de o tribunal ignorar as suas declarações e, firmar a sua convicção com base num só depoimento.

  13. Perante a prova produzida, o tribunal deveria ter ficado em estado de dúvida quanto a esse mesmo reconhecimento.

  14. Na sua essência a prova produzida resulta do depoimento da Ofendida/Assistente CC, que, por sua vez, está em clara contradição com o depoimento do Recorrente.

  15. Assim, erradamente defende o douto Acórdão quando menciona que o tribunal “a quo” não teve qualquer hesitação quanto à valoração da prova e quando refere que as declarações do Recorrente não merecem credibilidade.

  16. Violando, por isso, o princípio “in dubio pro Reo” por não se ter feito prova rigorosa do crime de roubo, consequência da insuficiência da prova.

    SEM PRESCINDIR ii. EXCESSIVA MEDIDA DA PENA 18. Para determinação do cálculo da medida da pena aplicável, em concreto, defende o Tribunal de 1.ª Instância que o n.º 1 do artigo 71.° do CP vincula o julgador aos critérios da culpa do agente e da exigência de prevenção, devendo atender-se preponderantemente à medida da necessidade de tutela dos bens jurídicos em concreto violados, pelo que, cabe à prevenção geral positiva ou de integração e não à culpa, fornecer a sub-moldura de prevenção correspondente à tutela dos bens jurídicos e á estabilização das expectativas comunitárias na validade ou reafirmação contrafáctica da norma violada. Dentro da sub-moldura encontrada actuará, depois, o princípio da culpa consagrado no artigo 13.° do CP, fixando o limite máximo da medida concreta da pena.

    E, atendendo aos factores descritos no n.° 2, do artigo 71.º do CP, actuando em ambivalência no sentido de, entre os diversos elementos que constituem um factor poderem alguns relevar, não só para a culpa, como também para a prevenção, assim como, de o mesmo elemento quando duplamente relevante poder assumir significado antinómico, importa referir: – A favor dos arguidos AA e BB releva a ausência de antecedentes criminais (no que se reporta a decisões proferidas por tribunais portugueses).

    – Em desfavor desses mesmos arguidos: i. a actuação dos arguidos, totalmente desproporcionada, como já dissemos, aos fins visados – subtracção de dinheiro e objectos de valor que no interior da residência dos ofendidos se encontrassem; ii. o uso totalmente gratuito, de violência física e limitação da liberdade de acção dos ofendidos, atendendo a que as vítimas eram pessoas de idade, o que era óbvio aos olhos do arguido, que se encontravam já no recato do seu lar, já a descansar ou a preparar-se para o efeito, não representando assim qualquer ameaça para aqueles agressores; iii. ainda a circunstância dos arguidos abandonarem a residência sem que antes, e já após a subtracção dos apontados bens, tenham deixado manietados e amarados a móveis da casa, os ofendidos, abandonados à sua sorte; iv. a intensidade do dolo, directo.

    – Todos estes pontos evidenciam profundas exigências de prevenção geral que no caso se fazem sentir, atento o alarme social que situações como as dos autos causam sempre no seio de uma comunidade, nomeadamente atento o número crescente de idosos que residem sozinhos.

    – Também exigências de prevenção especial se tornam prementes, a fim de fazer notar aos arguidos, mormente ao arguido AA, atenta a sua jovem idade, que há que "arrepiar" caminho, actuando em conformidade com as regas vigentes, em respeito com os demais direitos dos cidadãos e bens jurídicos penais devidamente tutelados.

    – Frise-se ainda que a actuação dos arguidos em relação a cada um dos ofendidos, merece censura diferente, uma vez que as lesões que cada um deles apresentou é de gravidade diversa.

    – Tudo ponderado, atendendo aos limites abstractos das penas, têm-se por ajustadas e proporcionais, as seguintes penas: (…) – para o arguido BB, pela prática, em co-autoria material, de um crime de roubo (agravado), na pessoa da ofendida CC, uma pena de 7 (sete) anos de prisão, na pessoa da ofendida DD, uma pena de 5 (cinco) anos de prisão e na pessoa do ofendido António, uma pena de 5 (cinco) anos de prisão.

    – Pena única de concurso: i. Por força do disposto no artigo 77.° Código Penal, temos que o agente que praticou vários crimes numa situação de concurso de crimes, antes de transitar em julgado a condenação por qualquer deles, é condenado numa única pena tendo esta como limite máximo a soma das penas concretamente aplicadas aos vários crimes, não podendo ultrapassar 25 anos tratando-se de pena de prisão e 900 dias tratando-se de pena de multa e como limite mínimo, a mais elevada das penas concretamente aplicadas aos vários...

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