Acórdão nº 255/14.3T8AGD.P1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 11 de Fevereiro de 2016

Magistrado ResponsávelANTÓNIO LEONES DANTAS
Data da Resolução11 de Fevereiro de 2016
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça: I AA veio intentar a presente ação declarativa de condenação, com processo comum, contra o MUNICÍPIO DE ..., pedindo: 1. Que seja reconhecida e declarada a existência de um contrato de trabalho entre A. e R., na qual aquele assume a posição de trabalhador subordinado deste, desde 1 de junho de 2006; 2. Que seja declarada a ilicitude do despedimento do A. e, consequentemente, seja o réu Município de ... condenado a: 2.1. Pagar ao A. a indemnização legal devida por ter obstado culposamente ao gozo de férias (no montante de € 8.610,00 (oito mil seiscentos e dez euros), ou, em alternativa a pagar ao A. o montante equivalente a 105 dias de férias, cujo valor ascende a € 2.870,00 (dois mil oitocentos e setenta euros); 2.2. Pagar ao A. o montante correspondente a 182 dias a título de subsídio de férias, no montante de € 4.974,67 (quatro mil novecentos e setenta e quatro euros e sessenta e sete cêntimos) e a quantia de € 6.696,66 (seis mil seiscentos e noventa e seis euros e sessenta e seis cêntimos) a título de subsídios de Natal; 2.3. Pagar ao A. a indemnização legal devida pela ilicitude do despedimento, em montante que, atento o grau de ilicitude e a antiguidade do A. se requer que seja fixada em € 10.038,77 (dez mil e trinta e oito euros e setenta e sete cêntimos); 2.4. Pagar ao A. as retribuições devidas pelo serviço prestado nos meses de maio, junho e julho de 2014, no montante de € 2.460,00 (dois mil quatrocentos e sessenta euros); 2.5. Reembolsar o A. na quantia de € 7.732,55 (sete mil setecentos e trinta e dois euros e cinquenta e cinco cêntimos) a título de pagamentos em excesso (por culpa exclusiva do R.) pagos ao Instituto de Segurança Social; 2.6. Pagar ao A. as prestações salariais vencidas desde 30 dias antes da propositura da presente ação até trânsito em julgado da decisão final e que ascendem já a € 820,00 (oitocentos e vinte euros); 2.7. Pagar ao A. juros de mora sobre as prestações em dívida até efetivo e integral pagamento.

Invocou como fundamento da sua pretensão, em síntese: 1. O autor é titular do curso técnico profissional de desenhador projetista (desenho e projeto) de construção civil.

  1. Em 30 de junho de 2006 foi apresentado pelo R. ao A. o contrato denominado “contrato de prestação de serviços em regime de avença”, com efeitos retroativos a 1 de junho de 2006, nos termos do qual o A. se obrigava a prestar serviços de assessoria ao gabinete de desenho do R..

  2. O aludido contrato, de duração mensal, renovável por iguais períodos no caso de não ser denunciado por qualquer das partes com aviso prévio de 60 dias úteis, conferia ao A. o direito à retribuição mensal da quantia de 820,00 €, valor este acrescido de IVA.

  3. O A. passou a laborar para o R. sob as suas ordens, direção e fiscalização, desempenhando as funções próprias da categoria profissional de desenhador projetista em regime de subordinação.

  4. Através de carta datada de 2 de maio de 2014, o R. remeteu ao A. uma missiva com o assunto “denúncia de contrato de prestação de serviços em regime de avença”, fazendo cessar a relação contratual.

  5. O A. sempre foi tratado como trabalhador da autarquia, tendo mesmo o Município passado declarações nesse sentido e existindo despachos municipais que o comprovam.

  6. Com efeito, o ora A. desde 1 de junho de 2006 passou a, mediante a aludida retribuição de 820,00 €, prestar a sua atividade, na sede do R., com materiais e equipamentos deste, no interesse e por determinação do R., sob a autoridade e direção do mesmo.

  7. O A. não foi alvo de qualquer processo disciplinar.

  8. No que concerne a prestações pecuniárias verifica-se que se encontra também o R. em dívida relativamente ao A. quanto a retribuições, férias, subsídio de férias e subsídio de Natal.

    O réu contestou, invocando a incompetência absoluta do Tribunal, a impossibilidade de procedência do pedido, e impugnando os factos, ao que o autor respondeu pugnando pela improcedência das exceções.

    Foi proferido despacho, datado de 27 de novembro de 2014, julgando procedente a invocada exceção da incompetência absoluta do Tribunal, absolvendo o réu da instância.

    Inconformado com este despacho dele recorreu o Autor para o Tribunal da Relação do Porto, que veio a conhecer do recurso interposto por acórdão de 15 de junho de 2015, que integra o seguinte dispositivo: «Pelo exposto, acorda-se em julgar procedente a apelação, revogando-se a decisão recorrida, substituindo-se pelo presente acórdão que julga o Tribunal “a quo” materialmente competente para conhecer dos pedidos formulados nos autos, determinando-se a prossecução dos mesmos para seu conhecimento.

    Custas pela ré.» Irresignado com o assim decidido, veio o Réu interpor recurso de revista para este Supremo Tribunal, integrando nas alegações apresentadas as seguintes conclusões: «1. O A. nos autos, ora Recorrido, pretende o reconhecimento da existência de uma alegada relação de trabalho subordinado com o ora Recorrente, regulada pelo Código do Trabalho, iniciada em 1/06/2006 e que se manteve ininterruptamente até julho de 2014.

  9. A ser assim, esse alegado contrato individual de trabalho celebrado entre as partes em 1/06/2006 converteu-se em contrato de trabalho em funções públicas em 1/01/2009, nos termos conjugados das Leis n.ºs 12-A/2008, de 27/02, e 59/2008, de 11/09, mantendo-se como tal até ao seu término em 2014.

  10. Ou seja, o alegado contrato subordinado que o A pretende que exista vigorou durante oito anos, dos quais dois anos e meio terão sido sob a égide do direito privado (tudo isto, sempre, na ótica do A.), contra os restantes cinco anos e meio de vigência, nos quais o alegado contrato teve que assumir necessariamente, por força da lei, a natureza de vínculo público.

  11. Deste modo, quanto aos montantes peticionados pelo A., o montante decorrente do período de vigência do alegado contrato que pode considerar-se contrato individual de trabalho (entre 1/06/2006 e 1/01/2009) é de € 11.258,51; enquanto que o montante resultante do período de vigência do alegado contrato após conversão legal em contrato de trabalho em funções públicas (entre 1/01/2009 e julho de 2014) é de € 30.074,14.

  12. É, pois, inequívoco que o Tribunal do Trabalho (Secção do Trabalho) não é competente para apreciar a parte substancial do pedido do A., no caso concreto, considerando o tempo de vigência antes e após a conversão do alegado contrato de trabalho em contrato em funções públicas e os montantes peticionados que se referem a cada um desses momentos temporais.

  13. No mesmo sentido, apreciando a questão, qualitativamente, pedido a pedido: a) Para o 1º pedido (falta de gozo de férias entre 2007 e 2014), o Tribunal do Trabalho é competente para conhecer das férias vencidas em 2006, 2007 e 2008 e o Tribunal Administrativo e Fiscal é competente para conhecer das férias vencidas em 2009, 2010, 2011, 2012, 2013 e 2014; b) Para o 2.° pedido (subsídios de férias e de Natal), o Tribunal do Trabalho é competente para conhecer dos subsídios vencidos em 2006, 2007 e 2008 e o Tribunal Administrativo e Fiscal é competente para conhecer dos subsídios vencidos em 2009, 2010, 2011, 2012, 2013 e 2014; c) Para o 3.°, 4.° e 6.° pedidos, é competente o Tribunal Administrativo e Fiscal, por serem referentes a factos ocorridos em 2014 (indemnização pelo alegado despedimento do A., retribuições devidas pelos meses de trabalho de maio, junho e julho de 2014 e prestações salariais vencidas desde 30 dias antes da propositura da ação até trânsito em julgado da decisão); d) Para o 5.° pedido (reembolso de quantias pagas pelo A. à Segurança Social entre 2008 e 2014) é competente o Tribunal do Trabalho quanto ao reembolso referente ao ano de 2008, competindo ao Tribunal Administrativo e Fiscal conhecer dos reembolsos dos anos de 2009, 2010, 2011, 2012, 2013 e 2014.

  14. Acresce ainda que, atendendo à factologia que enforma a causa de pedir, diversos factos alegados e cuja importância é manifesta enquanto indícios da existência de alegada relação laboral subordinada (sempre na ótica do A.) ocorreram após 2009, logo, após a conversão do alegado contrato em contrato de trabalho cm funções públicas: a) Horário de trabalho que o A. alega que cumpria, diariamente, entre as 9 horas e as 18 horas, fazendo pausa para almoço entre as 13 e as 14 horas, que apenas começou a vigorar no Município de ... a partir de outubro de 2013, por força da Lei n.º 68/2013, de 29/08, que veio aumentar para oito horas o período normal de trabalho dos trabalhadores da administração pública (cfr, doc. n.º 1 já junto aos autos), nunca antes de 2009; b) Documentos n.ºs 103 a 110, juntos pelo A. com a pi., mediante os quais aquele alega que solicitava e obtinha a concordância do Município para férias, todos posteriores a 2009; c) Documentos n.ºs 111 a 219, juntos pelo A. (relatórios) em sede de pi., através dos quais o mesmo pretende alicerçar a existência de uma alegada subordinação hierárquica e dependência técnica na execução do trabalho, datam de 2012 em diante, logo, todos posteriores a 2009; d) Documentos n.ºs 220, 221, 223, juntos pelo A. com a pi., que pretendem provar que aquele era alegadamente tratado como trabalhador subordinado do Município, todos posteriores a 1/01/2009.

  15. Deste modo, atenta a configuração da pi., a causa de pedir dominante, em que o A. alicerça a sua pretensão ou pedido dominante do reconhecimento da existência de um vínculo de caráter subordinado entre ele e o Município, cabe na competência do Tribunal Administrativo e Fiscal.

  16. Sob outro enfoque, as questões que integram o conteúdo essencial ou que enformam a alegada relação de trabalho subordinado existente entre A. e R. situam-se após 1/01/2009, logo, após a conversão da alegada relação em vínculo de natureza administrativa, para cujo julgamento é competente a jurisdição administrativa.

  17. O que vimos de afirmar resulta da jurisprudência deste Colendo Supremo Tribunal de Justiça, tirada inclusive em alguns dos arestos citados pelo...

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