Acórdão nº 53/14.4PAETZ.E1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 12 de Maio de 2016

Magistrado ResponsávelISABEL SÃO MARCOS
Data da Resolução12 de Maio de 2016
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)
  1. Relatório 1.

Na Comarca de ... – Secção Cível e Criminal – ..., o arguido AA foi julgado e, a final, condenado, por acórdão de 11.05.2015, e no que releva para o caso aqui em apreciação, pela prática, em autoria material e na forma consumada, de um crime de homicídio qualificado, previsto e punido pelos artigos 131.º e 132.º, números 1 e 2, alínea l), do Código Penal, na pena de 23 (vinte e três) anos de prisão.

Mais foi o arguido AA condenado a pagar: A - Aos demandantes BB e CC o montante de € 70.000,00 (setenta mil euros), na proporção de metade para cada um, pela perda do direito à vida da falecida Dra. DD; B - Aos demandantes BB e CC o montante de € 10.000,00 (dez mil euros), na proporção de metade para cada um, pelos danos morais sofridos pela falecida Dra. DD em consequência das agressões a que foi sujeita por parte do demandado até à morte; C - Ao demandante BB a quantia de € 25.000,00 (vinte e cinco mil euros), pelos danos não patrimoniais sofridos em consequência do falecimento da Dra. DD; D - Ao demandante CC o montante de € 30,000,00 (trinta mil euros), pelos danos não patrimoniais sofridos em consequência do falecimento da Dra. DD; E - Ao demandante CC o montante de € 48,000,00 (quarenta e oito mil euros), pelos danos patrimoniais sofridos em consequência do falecimento da Dra. DD.

Montantes a que acrescem juros de mora, à taxa legal, desde a data da notificação até ao efectivo e integral pagamento (artigos 805.º e 559.º números 1 e 2 do Código Civil).

  1. Inconformado com esta decisão, o arguido AA interpôs recurso para o Tribunal da Relação de Évora que, por acórdão de 03.11.2015, decidiu negar provimento ao recurso e, em consequência, manter a decisão recorrida.

  2. Irresignado com o assim decidido pelo Tribunal da Relação de Évora, o arguido AA interpôs, então, recurso para o Supremo Tribunal de Justiça, tendo extraído, da motivação que apresentou, as seguintes conclusões: “1) O Requerente foi condenado, pela prática, em autoria material e na forma consumada, de um crime de homicídio qualificado, p. e p. pelo disposto nos artigos 131.º e 132.º, n.ºs 1 e 2, alínea I) do Código Penal, na pena de 23 (vinte e três) anos de prisão.

    2) Foi ainda condenado a pagar aos demandantes BB e CC o montante de € 70.000,00 (setenta mil euros), na proporção de metade para cada um, pela perda do direito à vida da falecida Dra. DD.

    3) A pagar aos demandantes BB e CC o montante de € 10.000,00 (dez mil euros), na proporção de metade para cada um, pelos danos morais sofridos pela falecida Dra. DD em consequência das agressões a que foi sujeita por parte do demandado até à morte.

    4) A pagar ao demandante BB a quantia de € 25.000,00 (vinte e cinco mil euros), pelos danos não patrimoniais sofridos em consequência do falecimento da Sra. Dra. DD.

    5) A pagar ao demandante CC o montante de € 30,000,00 (trinta mil euros), pelos danos não patrimoniais sofridos em consequência do falecimento da Sra. Dra. DD.

    6) A pagar ao demandante CC o montante de € 48,000,00 (quarenta e oito mil euros), pelos danos patrimoniais sofridos em consequência do falecimento da Sra. Dra. DD.

    Aos montantes supra referidos acrescem juros de mora, à taxa legal, desde a data da notificação até ao efectivo e integral pagamento (artigos 805.º e 559.º n.ºs 1 e 2 do Código Civil).

    7) Absolver o demandado civil AA no demais peticionado pelos demandantes BB e CC.

    8) Inconformado, o recorrente recorreu da pena aplicada para o Venerando Tribunal da Relação de Évora, e porque não atendido ao sufragado naquele recurso, foi mantida a decisão.

    9) - Continua o recorrente a não se conformar com a douta decisão proferida, pelas razões ora vertidas na presente motivação.

    10) - O douto acórdão (e o douto aresto) não reconheceu da possibilidade de haver violação do " Princípio In dubio Pro Reo ".

    11) - A pena de 23 (Vinte e três) anos de prisão mostra-se claramente excessiva e desajustada.

    12) - Salvo o devido respeito pelo tribunal "a quo" e pelo tribunal ora recorrido, mal andaram ao aplicar ao recorrente uma pena desta dimensão.

    13) - Tal decisão configura-se excessiva face ao quadro comportamental e personalítico do arguido, e, nessa medida, violador do princípio ressocializador da finalidade das penas.

    14) Violou, pois, o aresto recorrido o disposto nos artºs 70.º, 71.º, 72.º do Código Penal.

    15) Houve assim, com a condenação do recorrente, uma clara violação da garantia constitucional que lhe é outorgada, pelo artigo 32.º, n.º. 2, da Constituição da República, uma vez que a acusação não realizou em fase de julgamento qualquer actividade que visasse confirmar definitivamente a indiciação que impendia sobre o arguido através da acusação.

    16) Há que considerar que o douto Tribunal recorrido violou o Principio do “ln dubio pro reo”: 17) Mas ainda assim, e caso assim não se entenda, o que por mera hipótese se admite, o douto Acórdão enferma do Vicio de Erro Notório da Apreciação da Prova: Existiu, sem dúvida, pelo exposto, um afastamento das regras das presunções naturais o que integra o vício de erro notório na apreciação da prova, previsto no artigo 410.º, nº 2, alínea c), do CPP, que desde já se argui.

    18) Pelo que, sendo aplicada ao arguido uma pena de prisão mais adequada, justa e proporcional ao circunstancialismo descrito.

    19) Do supra descrito se conclui que os doutos Tribunais recorridos violaram os artºs 127.º, 410.º, n.º 2, aI c), do CPP, 71.º, 72.º, 73.º do C. Penal e 13.º, 32.º da CRP.

    20) Os pedidos de indemnização civil, deverão ser reduzidos na medida da sua real dimensão”.

    Rematou o recorrente sustentando que deverá ser concedido provimento ao recurso, ou, quando assim se não entenda, “decidir-se pela verificação de dúvida razoável da intencionalidade do arguido neste crime, e do facto da vítima se encontrar viva aquando da sua remoção do local dos factos, afastando a violação do Principio do “ln Dubio pro Reo”, e condenando o arguido em pena inferior”, ou, se assim também não se entender, “ordenar-se o reenvio dos autos para novo julgamento, nos termos do art.º 426.º do CPP, a fim de ser suprido o vício, invocado”.

  3. Ao motivado e assim concluído pelo recorrente, responderam: 4.1 - O Ministério Público junto do Tribunal da Relação de Évora, que concluiu nos seguintes moldes: “1º - Foi o Recorrente AA condenado em 1ª instância pela prática, como autor material e na forma consumada, de um crime de homicídio qualificado, p. e p. pelo disposto pelos artºs 131.º e 132.º, n.ºs 1 e 2, alínea l),do Código Penal, na pena de 23 (vinte e três) anos de prisão e em pertinentes quantias a título de indemnização civil.

    1. - Desta decisão interpõe recurso para este Tribunal da Relação de Évora.

    2. - Douto Acórdão de 3 de Novembro de 2015 negou provimento ao recurso, mantendo a decisão recorrida.

    3. - Deste Acórdão o Recorrente/Arguido novamente interpôs Recurso, desta feita para esse Alto Supremo Tribunal de Justiça, sendo o mesmo admitido.

    4. - Invocou a violação deste princípio pela verificação de dúvida razoável quanto à sua intencionalidade na prática do crime por que foi condenado.

    5. - Contudo, tal princípio não tem aplicação no caso dos autos, como pretende o Recorrente, uma vez que não se colocou qualquer dúvida sólida ao Tribunal de julgamento relativamente aos factos que deu como assentes, como resulta da leitura da fundamentação da sua decisão que se mostra conforme com as regras da experiência comum.

    6. - Igualmente considera o Recorrente que a pena imposta é excessiva, violando os critérios ínsitos nos artºs 70.º, 71.º e 72.º, todos do Cód. Penal, impondo-se a sua redução 8º - Porém, ao contrário do defendido pelo Recorrente, a pena imposta não merece reparo, pelo que também neste ponto, deve improceder a pretensão do Recorrente.

    7. - Já relativamente à pretensão de que o pedido de indemnização civil seja graduado em montante inferior, não cumpre ao Ministério Público tomar posição quanto à questão de natureza cível em debate, uma vez que, neste âmbito inexiste decisão que tenha interesse em contradizer ou impugnar, carecendo, por isso, de interesse em agir.

    8. - A decisão impugnada, no que respeita à parte crime, não desrespeitou qualquer preceito legal, designadamente os artºs 127º do Cód. Processo Penal, 71º, 72º e 73º do Cód. Penal e 13.º e 32.º da Const. Rep. Portuguesa.

    9. - Deve, pois, nessa parte, ser mantida nos seus precisos termos”; 4.2 - Os Assistentes BB e CC que, em resumo, pugnaram pela manutenção do acórdão recorrido; 4.3 - A Ordem dos Advogados que, em suma, pugnou no sentido de que, não merecendo provimento o recurso, deverá manter-se integralmente a decisão recorrida.

  4. Subidos os autos ao Supremo Tribunal de Justiça, o Senhor Procurador-Geral-Adjunto, na oportunidade conferida pelo número 1 do artigo 416.º do Código de Processo Penal, pronunciou-se no sentido de que o recurso deve ser rejeitado no segmento atinente às questões de facto, e julgado improcedente no que concerne à medida da pena.

    E isto, em suma, na consideração de que: “1. É pacífico que as questões relativas à matéria de facto mostram-se definitivamente resolvidas pela Relação, escapando aos poderes de cognição do STJ.

    Assim, deve o recurso ser rejeitado no que respeita ao reexame do alegado vício do artigo 410.º, n.º 2, alínea c) do CPP, questão que se mostra estabilizada com a decisão da Relação de fls. 1518-1520.

  5. Por outro lado, como acentua a Ex. ma Procuradora-Geral Adjunta na sua resposta, citando pertinente jurisprudência deste Supremo Tribunal, não ocorre, no caso, violação do princípio in dubio pro reo, porquanto a Relação procedeu a uma correcta interpretação e aplicação do mesmo.

    Como refere a fls. 1520, parte final e 1521, é óbvio, da simples leitura da decisão recorrida que o tribunal não teve qualquer dúvida acerca dos pontos de facto que deu como assentes, dúvidas que este tribunal de recurso também não vislumbra.

    No caso em análise a formação da convicção esteve em consonância com as regras da lógica e da experiência comum e baseou-se em...

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