Acórdão nº 44/10.4TTVRL.G1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 12 de Maio de 2016

Magistrado ResponsávelGONÇALVES ROCHA
Data da Resolução12 de Maio de 2016
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça: 1--- Veio AA intentar uma acção com processo especial de impugnação judicial da regularidade e licitude do seu despedimento, demandando BB – Companhia de Seguros, S.A. pedindo que se declare ilícito o seu despedimento.

Regularmente citada, veio a R contestar, invocando para o efeito que o A. praticou os factos que lhe são imputados na nota de culpa e que a gravidade da sua conduta tornou inviável a manutenção da relação laboral. Termina, reiterando a validade do processo disciplinar e pedindo a improcedência da acção com a consequente absolvição do pedido.

A este articulado veio o A. apresentar a sua contestação e deduzir pedido reconvencional, invocando em primeiro lugar os vícios formais e substanciais existentes no procedimento disciplinar e impugnando quer os factos que lhe são directamente imputados, alegando a impossibilidade de se ter apercebido das irregularidades por estes praticadas, atenta a sobrecarga de tarefas de que estava incumbido, quer na agência, quer no exterior.

Termina, concluindo que o procedimento disciplinar que lhe foi movido não dispõe de fundamentos suficientes para sustentar o despedimento que lhe foi aplicado, pelo que o mesmo deverá ser julgado ilícito e, como tal, deverá a R ser condenada a pagar-lhe a quantia de € 163.556,38, a título de indemnização pelos danos patrimoniais e não patrimoniais decorrentes do mesmo.

Em resposta à contestação do trabalhador, veio a R impugnar as excepções deduzidas por este, concluindo pela validade do procedimento disciplinar e pela improcedência dos pedidos por ele formulados, reiterando a factualidade já exposta no seu articulado anterior.

Após prolação do despacho saneador, foi realizada audiência de discussão e julgamento, vindo a ser proferida decisão de que foi interposto recurso para o Tribunal da Relação do Porto, que proferiu acórdão a anular o julgamento.

E realizado este, proferiu-se nova sentença a julgar a acção parcialmente procedente e em consequência, condenou-se a R. a pagar ao A. o montante de € 4.551,64 (quatro mil quinhentos e cinquenta e um euros e sessenta e quatro cêntimos), a título de férias e de subsídio de férias, acrescida dos respectivos juros de mora, à taxa legal, vencidos desde a citação e dos vincendos até integral pagamento, sendo os demais pedidos julgados improcedentes, deles se absolvendo a R.

Inconformado, apelou o A, pedindo a revogação da decisão com total procedência da acção.

Entretanto, e acompanhando a apelação da decisão final, interpôs o A recurso de dois despachos interlocutórios, que haviam sido proferidos em 02-09-2013, e em 08-01-‑2014.

Por seu turno, a R seguradora, não se conformando com o despacho de 10-10-‑2014, que havia indeferido a junção das suas contra alegações, dele apelou também, pedindo a sua revogação.

Apreciando os recursos interpostos, veio o Tribunal da Relação de Guimarães a proferir acórdão, que contém um voto de vencido quanto à questão da justa causa de despedimento do trabalhador, decidindo julgar: “

  1. A apelação interposta pelo Trabalhador parcialmente procedente e, em consequência: 1. Modificar a matéria de facto; 2. Modificar a sentença declarando a ilicitude do despedimento e condenando a Recvdª a pagar ao Recvte. a quantia de quarenta e seis mil novecentos e quarenta e nove euros e doze cêntimos (46.949,12 euros), acrescida de juros de mora à taxa anual de 4% desde a partir da notificação da reconvenção até integral pagamento.

  2. A apelação da Empregadora improcedente, confirmando, em consequência, a decisão recorrida.

    Custas da 1ª apelação por ambas as partes, na proporção de 1/5 para o apelante e 4/5 para a apelada.

    Custas da 2ª apelação pela apelante.” Inconformada, traz-nos a R revista, concluindo a sua alegação do seguinte modo: “1ª. O Recorrido tinha a categoria profissional de Chefe de Serviços e entrou ao serviço da Recorrente em 1 de Janeiro de 1986, tendo 24 anos de actividade ao serviço do Recorrente aquando do despedimento.

    2ª. O Recorrido tinha como funções gerir a Delegação da Recorrente em Vila Real.

    1. A Delegação de Vila Real da Recorrente tinha somente quatro trabalhadores: o Recorrido e mais três trabalhadores.

    2. Eram, nomeadamente, funções do Recorrido, enquanto responsável pela gestão da delegação da Recorrente de Vila Real, gerir a delegação, garantir os processos administrativos e visar os processos e caixas.

    3. Foi verificado que na Delegação de Vila Real, não foram verificados os procedimentos instituídos pela Recorrente, e que eram do conhecimento do Recorrido, nomeadamente: levantamentos frequentes em numerário do caixa, regularização desses levantamentos com emissão de "vales à caixa".

    4. Era obrigação funcional do Recorrido verificar o "caixa" diariamente, que tinha que visar.

    5. Foram elaborados pelos ex-trabalhadores CC e DD 110 (Cento e dez) processos, genericamente com assinaturas falsificadas.

    6. Verifica-se que desses processos em 15 deles os recibos dos pretensos pagamentos não se mostram assinados pelo segurado e/ou sinistrado.

    7. Verifica-se ainda que desses processos em 45 deles não se mostra a documentação que justificaria o pretenso pagamento feito.

    8. Tal actuação é altamente lesiva da imagem da Recorrente num meio pequeno como é Vila Real e com elevados prejuízos patrimoniais - mais de € 8.000 (Oito mil Euros).

    9. O Recorrido dentro das suas obrigações funcionais devia ter verificado os processos em causa e aperceber-se da falta ou/e irregularidades apontadas.

    10. Verifica-se que o ex-trabalhador EE, em Janeiro de 2009 e seguintes, fez movimentos no "caixa" através dos quais movimentou quantias que ascenderam a: - € 3.500,00, em 17.01.2009; -€ 5.628,10, em 18.01.2009; - € 5.628,10, em 31.01.2009; - € 1.250,00, em 17.02.2009, utilizando até uma despesa de viagem do Recorrido, no valor de € 250,00.

    11. Verifica-se que em 2008 o ex-trabalhador EE, retirou do caixa em numerário as quantias de: - 21.2.2008 - € 650,00 - 25.2.2008 - € 250,00 - 16.4.2008 - € 16,80 - 26.6.2008 - € 500,00 14ª. Verifica-se que em 2008 e 2009 o ex-trabalhador EE teve em seu poder, ilicitamente, quantias elevadas, a saber: Ano de 2008: Janeiro - 792,31 euros; Fevereiro - 1.406,60 euros; Março - 1.715,62 euros; Abril -: 2.223,37 euros; Maio - €: 4.512,57; Junho - 3.979,35 euros; Julho - €: 3.684,37; Agosto - 2.747,86 euros; Setembro - €: 2.870,36; Outubro - 2.207,38 euros; Novembro - 1.492,48 euros; Ano de 2009: Janeiro - 5.000,00 euros; Fevereiro - €: 5.469,00; Março - 5.696,96 euros; Abril - €: 250,00.

    12. O acerto de contas na Recorrente faz-se no final de cada ano, daí que nem o Recorrido, nem o EE tenha qualquer valor na sua posse nessas datas.

    13. Em Abril de 2009, em consequência da Auditoria, o EE reteve na sua posse o que era normal para o desempenho da sua actividade - € 250,00 ( Duzentos e cinquenta Euros).

    14. Como provado, era obrigação funcional do Recorrido controlar, diariamente, o caixa, o que lhe permitia verificar as irregularidades ocorridas em relação ao EE.

    15. O próprio Recorrido procedeu a levantamentos do caixa, sem justificação, a saber: - Em 2008 - Em 20 dias - € 2.750,00 - Em 29.05.2008 - € 250,00 - Em 30.05.2008 - € 250,00 - Em 02.06.2008 - € 750,00 - Em 02.06.2008 - € 250,00 - Em 05.06.2008 - € 500,00 Total em sete dias ----------------------- € 2.000,00 - Em 16.6.2008 ---------------- € 500,00; e - Em 17.6.2008 ---------------- € 250,00; Total em dois dias ----------------------- € 750,00 - Em 2009 - Em 11 dias - € 3.150,00 - Em 09.02.2009 - € 250,00 - Em 09.02.2009 - € 650,00 - Em 10.02.2009 - € 250,00 - Em 11.02.2009 - € 250,00 - Em 12.02.2009 - € 250,00 - Em 13.02.2009 - € 250,00 - Em 16.02.2009 - € 250,00 - Em 17.02.2009 - € 250,00 - Em 18.02.2009 - € 250,00 - Em 19.02.2009 - € 250,00 - Em 20.02.2009 - € 250,00 19ª. Em Fevereiro de 2009 e aquando do despoletar da auditoria, o Recorrido tinha em seu poder € 3.162,64, quantias que levantou sem justificar a respectiva necessidade.

      Repetindo: 20ª. O Recorrido, enquanto delegado e chefe de serviços da Recorrente, responsável pela Delegação de Vila Real, tinha obrigação de gerir a delegação, o respectivo pessoal, os serviços em geral, controlar os processos e o caixa.

    16. Tinha instruções estritas de funcionamento.

    17. Face ao reduzido quadro de pessoal e de negócio tinha obrigação de controlar os processos e o caixa, o que não fez.

    18. Permitiu que trabalhadores que dirigia ficcionassem processos de sinistro, falsificando assinaturas de segurados e/ou sinistrados, apropriando-se dos quantitativos titulados pelos recibos falsos.

    19. Tinha obrigação de controlar os processos e aperceber-se que havia processos sem qualquer justificação documental dos quantitativos pagos.

    20. Com recibos sem assinaturas.

    21. - De aperceber-se de movimentos fraudulentos no Caixa.

    22. Utilizou sem justificação quantias elevadas pertencentes à Recorrente.

    23. O Recorrido não cumpriu com as suas obrigações, de forma diligente e zelosa ou cumpriu-as de forma grosseiramente negligente.

    24. Não é exigível nem a Recorrente pode manter ao seu serviço o Recorrido face aos factos julgados provados.

    25. O despedimento declarado pela Recorrente deve ser julgado lícito com justa causa.

    26. O Acórdão Recorrido fez errada aplicação da matéria julgada provada violando o artigo 351°, nºs. 1 e 2, alínea d) do Código do Trabalho.

    27. O Acórdão recorrido violou os artigos 260°, n°.1-b) e 351°, n°.1 e 2, d) ambos do Código do Trabalho.” Pede assim a revogação do acórdão recorrido, mantendo-se a sentença da 1ª instância.

      O A também recorreu, rematando a sua alegação com as seguintes conclusões: “1 – 1ª Questão – Da nulidade do despacho de 12/06/2013: 1- O Tribunal de Relação de Guimarães violou o artigo 64° do C.P.T., e os termos da alínea b) do nº 1 do artigo 668º do CPC, aqui aplicável por remissão da parte final do artigo 721°, nº 2 do CPC.

      2 - O despacho datado de 12-06-2013, que indeferiu que fossem chamadas a depor as pessoas em causa, viola o artigo 3º, nº 3 do Código de Processo Civil...

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