Acórdão nº 8514/12.3TBVNG.P2.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 07 de Dezembro de 2016

Magistrado ResponsávelOLINDO GERALDES
Data da Resolução07 de Dezembro de 2016
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: I – RELATÓRIO AA instaurou, em 3 de outubro de 2012, na então 1.ª Vara Mista da Comarca de Vila Nova de Gaia (Instância Central de Vila Nova de Gaia, Secção Cível, Comarca do Porto) contra Fundo de Garantia Automóvel, ação declarativa, sob a forma de processo ordinário, pedindo que o Réu fosse condenado a pagar-lhe a quantia de € 227 101,40, bem como as despesas médicas e medicamentosas que haja de fazer e ainda o prejuízo na sua pensão de reforma.

Para tanto, alegou, em síntese, que em resultado do acidente de viação, ocorrido no dia 23 de dezembro de 2010, pelas 17:30 horas, na EN n.º 109-2, envolvendo um veículo ligeiro, de matrícula desconhecida, e o seu veículo, matrícula ...-...-PO, e com culpa exclusiva do condutor do primeiro veículo, que o atingiu violentamente, quando se encontrava fora do veículo que estacionara junto à berma da estrada do lado direito, sofreu graves lesões corporais e elevados danos patrimoniais, designadamente resultantes da incapacidade para o trabalho, e danos não patrimoniais.

Contestou o R., por impugnação.

Realizada a audiência de discussão e julgamento, foi proferida, em 27 de março de 2015, a sentença que condenou o Réu a pagar ao Autor a quantia de € 22 000,00, acrescida de juros, à taxa legal, desde a citação até integral pagamento, sobre a quantia de € 10 000,00, e desde 27 de março de 2015 até efetivo pagamento, sobre a quantia de € 12 000,00.

Inconformado, apelou o Autor para o Tribunal da Relação do Porto, que, por acórdão, de 2 de junho de 2016, dando procedência parcial ao recurso, condenou o Réu a pagar ao Autor a quantia de € 112 650,00 e no que se viesse a liquidar em “execução de sentença” relativamente aos factos referidos em 60.

De novo inconformado, o Autor recorreu para o Supremo Tribunal de Justiça e, tendo alegado, formulou essencialmente as conclusões:

  1. Desde a data do acidente, deixou o A. de poder trabalhar na sua atividade profissional, não lhe sendo também possível desempenhar outra similar, por manifesta incapacidade funcional.

  2. O valor indemnizatório deste dano deve ser calculado em função da sua efetiva incapacidade para desempenhar a sua atividade profissional, não podendo, de modo algum, a IPG que lhe foi determinada, erigir-se em critério válido com base no qual deve ser determinado o quantum indemnizatório deste dano.

  3. A indemnização, relativa à perda de ganho futuro, não obedece aos desígnios da lei, que manda reparar o dano atendendo aos ganhos que o lesado deixa de obter em consequência da lesão (art. 562.º, 653.º, 564.º e 566.º do CC).

  4. Atento o rendimento, à data do acidente, o A. deve ser ressarcido com um capital, que adicionado do juro remuneratório, lhe propicie um rendimento idêntico e se esgote aos 65 anos, nomeadamente na quantia de € 134 891,40.

  5. Quanto aos danos não patrimoniais, o acórdão recorrido ficou aquém do razoável, tendo em consideração a máxima culpabilidade do lesante, a inexistência de culpa do lesado e a gravidade dos danos, vivenciada no passado, presente e futuro, para além do seu caráter sancionatório, pois o lesante fugiu, deixando o A. inanimado na estrada, devendo ser atribuída a compensação pedida de € 25 000,00.

    Pretende o Recorrente, com a revista, a substituição da decisão do acórdão por outra que condene o Recorrido nos termos alegados.

    Também inconformado, recorreu o Réu, que, tendo alegado, formulou em resumo as conclusões:

  6. Não cabe qualquer indemnização, a título de frustração de ganho.

  7. A atribuição ao A. da quantia de € 34 440,00, a título de perda de ganho, é manifestamente excessiva.

  8. Os critérios plasmados na Portaria n.º 377/2008, de 26 de maio, não podem deixar de se erigir em referente para o julgador, pois reduzem a incerteza e a subjetividade da decisão e asseguram um melhor tratamento igual entre todos os lesados.

  9. Tais critérios resultam de uma ponderação prudencial, médico-legal e económica e social e devem, por isso, ser considerados.

  10. Não ficou provado que o A. tivesse ficado incapacitado para além do rebate profissional e esforço acrescido correspondente ao dano corporal que sofreu – de 12 pontos.

  11. Donde, a indemnização pelo dano de perda de ganho futuro decorrente da incapacidade deve fixar-se em € 10 000,00.

  12. Por erro de interpretação, o Tribunal violou os arts. 562.º e 566.º do CC.

    Pretende o Recorrente, com a revista, a substituição da decisão recorrida por outra que condene apenas nos termos alegados.

    1. e R. contra-alegaram no sentido de ser negada a revista contrária, para além do R. ter suscitado ainda a inadmissibilidade do recurso do A., por efeito da dupla conforme.

    Corridos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.

    Nos recursos, está essencialmente em discussão, para além da questão prévia da inadmissibilidade do recurso do Autor, o valor da indemnização emergente de acidente de viação, quer por danos patrimoniais, resultantes da incapacidade para o trabalho, quer por danos não patrimoniais.

    II – FUNDAMENTAÇÃO 2.1. Estão dados como provados os seguintes factos: 1.

    No dia 23 de dezembro de 2010, pelas 17:30 horas, na estrada EN n.º 109-2, perto do cruzamento que dá para o centro da freguesia de Lever, concelho de Vila Nova de Gaia, ocorreu um embate entre o veículo ligeiro, de matrícula portuguesa desconhecida, e o veículo de matrícula ...-...-PO, propriedade do A. e por este conduzido.

    1. O A., um pouco depois de passar o dito cruzamento, estacionou o automóvel, junto à berma da estrada do lado direito, sentido sul/norte, ocupando apenas uma pequena parte da faixa de rodagem e deixando livre um espaço de 2,90 metros dessa faixa.

    2. O veículo de matrícula desconhecida, que circulava no sentido Sul/Norte, colidiu na parte esquerda do veículo do A. e, seguidamente, contra o A., que se encontrava fora do veículo voltado de frente para o mesmo.

    3. O veículo automóvel de matrícula desconhecida atingiu o A. violentamente no seu lado direito, projetando-o alguns metros para diante e deixando-o caído, inanimado, na berma da estrada.

    4. O condutor desse veículo fugiu.

    5. O R. indemnizou o A. dos danos causados no seu automóvel e entregou-lhe a quantia de € 100,00 para pagamento de deslocações de táxi relativas a sessões de fisioterapia.

    6. O A. nasceu em 15 de agosto de 1953.

    7. Após embate, o A. esteve em estado inconsciente durante algumas horas.

    8. Em consequência do embate, o A. sofreu traumatismo craniano do lado direito, traumatismo dos membros inferiores, traumatismo da bacia e fratura do acetábulo direito e traumatismo no joelho esquerdo.

    9. Foi socorrido no Hospital Santos Silva, em Vila Nova de Gaia, e aí esteve internado com tração esqueléctica do membro inferior direito durante 27 dias, tendo tido alta hospitalar ao fim de 31 dias.

    10. Após a...

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