Acórdão nº 1515/14.9TBFUN-B.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 14 de Dezembro de 2016

Magistrado ResponsávelFONSECA RAMOS
Data da Resolução14 de Dezembro de 2016
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Proc. 1515/14.9.TBFUN-B.L1.S1 R-575[1] Revista Acordam no Supremo Tribunal de Justiça AA, Lda., requereu Processo Especial de Revitalização (PER) tendo sido aprovado o plano de recuperação, junto a fls. 185 e segs., trazido aos autos pelo Administrador Judicial Provisório em 20.10.2014.

Por requerimento entrado em Tribunal, no dia 31.10 desse ano, e que se encontra a fls. 230 e segs., o BANCO BB, S.A.

, com os argumentos que aí expôs, requereu a não homologação do plano aprovado.

*** Foi proferida decisão que, considerando a pretensão inatendível, indeferiu liminarmente a pretensão do BANCO BB, SA., por este, contra o exigido no art. 216º, nº1, aplicável por força do art. 17º – F, nº5, ambos do CIRE –, não ter manifestado nos autos a sua oposição contra o plano antes da sua aprovação, pois que se limitou a votar contra ele.

Consequentemente, homologou, com invocação do disposto no art. 17º-F, nº6, o plano de recuperação em causa.

*** Inconformado, apelou o BANCO BB, SA., para o Tribunal da Relação de …, que, por Acórdão de 10.5.2016 – fls. 244 a 270 –, julgou a apelação procedente e, revogando-se a sentença, não homologou o plano aprovado.

*** Inconformada, a devedora AA recorreu para este Supremo Tribunal de Justiça, e alegando, formulou as seguintes conclusões: A. O presente Recurso de Revista é admissível nos termos dos arts. 14.° do CIRE, designadamente em virtude de o Douto Acórdão recorrido se encontrar em oposição com outros, proferidos no domínio da mesma legislação e sobre as mesmas questões fundamentais de direito, e sobre a quais não incidiram acórdãos de uniformização de jurisprudência.

  1. As matérias que a Recorrente pretende ver apreciadas, e que foram julgadas em contradição com o decido nos Acórdãos-fundamento são as relativas (i) à suficiência, ou insuficiência, para efeitos do n.°1 do art. 216.° do CIRE, do voto contra o plano aprovado/homologado e (ii) à violação, ou não, em virtude do tratamento diferenciado de créditos garantidos e privilegiados, do princípio da igualdade previsto no art. 194.° do CIRE.

  2. Em caso de admissão do recurso de revista excepcional, o Tribunal “ad quem” fica, independentemente do fundamento e/ou da extensão com que o recurso seja admitido, habilitado a conhecer de qualquer nulidade invocada pelo recorrente.

  3. Ao não efectuar a ponderação de interesses a que alude o Acórdão proferido por este Venerando Tribunal na data de 25/03/2014, no âmbito do Proc. 6148/12.ITBBRG.G1.S1, e por não ter apreciado a possibilidade da redução/conversão e/ou da ineficácia relativa do mesmo, o Douto Acórdão recorrido incorreu nos vícios de omissão de pronúncia, ou de falta de fundamentação, previstos nas alíneas d) e b) do n.°1 do art. 615.° do Código de Processo Civil.

  4. Dado que, por um lado, a invocação de um alegado direito de retenção serviu para justificar o tratamento diferenciado dos créditos do BANCO BB, S.A. e da BANCO CC, por outro, o mesmo direito de retenção não foi considerado suficiente para justificar o tratamento diferenciado dos créditos do BANCO BB, S.A. e do titular desse mesmo direito de retenção, o Douto Acórdão enferma de ambiguidade, ou obscuridade, insanáveis, e que, nos termos da alínea c) do n.° 1 do art. 615.° do Código de Processo Civil, determinam a nulidade do Douto Acórdão recorrido.

  5. A alínea a) do n.°1 do art. 216.° do CIRE estabelece, simultaneamente, a faculdade de solicitar ao Juiz a não homologação de um plano aprovado, e o ónus processual de manifestar nos autos a oposição à homologação do plano, anteriormente à respectiva aprovação/votação.

  6. Votar contra um plano não equivale a manifestar a sua oposição à respectiva homologação e encerra qualquer declaração relativa à eventual/alegada existência de um vício que obste a tal homologação, pelo que a não manifestação de oposição à homologação do plano previamente à sua aprovação, apenas pode significar uma renúncia ao (ou a preclusão do) exercício do direito de a requerer nos termos e com os fundamentos previstos nas alíneas a) e b) do n.° 1 do art. 216.° do CIRE.

  7. Tendo em conta que o n.°1 do art. 216.° do CIRE pressupõe que os credores conhecem, de antemão e integralmente, o conteúdo do plano aprovado, bem como que o requerimento que legitima o Tribunal a apreciar o respectivo pedido reveste a natureza de uma verdadeira petição inicial, da qual devem constar “os factos essenciais que constituem a causa de pedir e as razões de direito que servem de fundamento à acção” e o pedido (cfr. alíneas d) e e) do art. 552.° do Código de Processo Civil), os fundamentos da oposição à homologação do plano também devem ser manifestados/alegados anteriormente à aprovação do plano, sendo certo que, se assim não fosse, o disposto no n.°2 do art. 216.° do CIRE, e a excepção prevista no mesmo, seriam absolutamente dispensáveis.

    I. O sentido e o conteúdo das oposições manifestadas pelos credores não são indiferentes para a economia e utilidade do plano e do processo, pois se o devedor e os restantes credores ficarem a saber, de antemão, que um dos credores entende que o plano a votação enferma de vícios que poderão obstar à sua homologação, os primeiros poderão alterar o conteúdo do plano nos termos e ao abrigo do art. 210.° do CIRE.

  8. Constituindo o voto do plano uma declaração negocial relativa à aceitação, ou rejeição, de um negócio jurídico, a mesma “vale com o sentido que um declaratário normal, colocado na posição do real declaratário, possa deduzir do comportamento do declarante, salvo se este não puder razoavelmente contar com ele” (cfr. art. 236.°, n° 1 do Código Civil), sendo certo que, sendo o plano um negócio formal, “não pode a declaração valer com um sentido que não tenha um mínimo de correspondência no texto do respectivo documento, ainda que imperfeitamente expresso” (cfr. art. 238.°, n.° 1 do Código Civil ).

  9. O n.°1 do art. 216.° do CIRE exige expressamente (1) uma manifestação de vontade, fundamentada em termos plausíveis, de oposição à homologação e (2) a sua apresentação antes da votação do plano, pelo que, procurar/encontrar no n.° 1 do art. 216.° do CIRE a interpretação que, afinal, tal manifestação de vontade não é exigível (ou indispensável), e/ou que pode ser exercida após o momento nele taxativamente previsto, equivale a “desconstruir” o teor literal e o sentido deste preceito e a presumir/assumir que o legislador expressou incorrectamente o seu pensamento.

    L. Não tendo o credor BANCO BB, S.A. manifestado tal oposição, oportuna e adequadamente, o Tribunal da Relação de … não podia/devia ter apreciado a oposição posteriormente apresentada, nem, tão pouco, recusado a homologação do plano nos termos e ao abrigo da alínea a) do n.° 1 do art. 216.° do CIRE, sendo certo que, ao fazê-lo, violou (e interpretou/aplicou incorrectamente) o art. 216.°, n.°1 do CIRE e os arts. , 236.° e 238.° do Código Civil.

  10. Ao considerar que é “inequivocamente diversa a situação dos dois credores”, o Tribunal da Relação de … não teve em conta que o crédito do credor DD, tal como foi reclamado e reconhecido nos autos principais, goza de preferência sobre o crédito do Credor BANCO BB S.A., bem como que, ainda que não existisse qualquer plano, este sempre poderia ser confrontado com tal direito de retenção caso promovesse a cobrança do crédito em causa por outras vias legais, designadamente a competente acção executiva/hipotecária.

  11. Não cabia ao plano, e muito menos à Devedora, decidir, a final, sobre a classificação definitiva do crédito do credor DD, nem tomar posição sobre a reclamação e créditos deste e/ou sobre a impugnação da lista de créditos provisórios deduzida pelo BANCO BB, S.A., sendo certo que estando em causa dois “créditos por obrigações de contratos bilaterais em que as contraprestações, recíprocas e sinalagmáticas, ainda não foram cumpridas os mesmos não poderiam “ser afectados pelo plano de recuperação, no âmbito do processo especial de revitalização (PER), sem o acordo da contraparte” (cfr. Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 10/09/2015).

  12. Tendo em conta que o plano não produz efeitos para além do prazo de vigência, se até ao termo do mesmo não existir qualquer decisão judicial relativa aos dois créditos em confronto, a questão não só deixa de relevar para efeitos da respectiva economia/execução, como será resolvida através das normas legais e imperativas, sendo certo que, face ao disposto nos arts. 195. °, n.°1, 196 ° e 197.° do CIRE, bem como à ausência de qualquer regulamentação expressa, a conclusão só pode ser que tais créditos não sofrem qualquer alteração, sendo reembolsados de acordo com as normas (e pelas vias) legais aplicáveis.

  13. O plano aprovado não prevê/permite a venda do imóvel hipotecado a favor do BANCO BB S.A em causa à revelia, ou sem o consentimento, do mesmo, nem permite a afectação do produto da respectiva venda ao reembolso de qualquer outro crédito, pelo que não contempla qualquer redução do âmbito da hipoteca e/ou do crédito garantido pela mesma, excepto as que resultem da lei aplicável e de decisões judiciais vinculativas.

  14. Ao contrário do decidido pelo Tribunal da Relação de …, não existiu qualquer tratamento discriminatório dos créditos em confronto, mas, tão só, um justo e correcto enquadramento dos mesmos, designadamente, à luz das regras e das decisões relativas à classificação dos créditos, das circunstâncias do caso concreto, e das regras processuais e substantivas relativas ao PER.

  15. O plano de recuperação dos autos foi aprovado pela esmagadora dos votos emitidos, sendo certo que os créditos do BANCO BB, S.A. representam apenas 4,2% do total dos créditos reconhecidos e relacionados, pelo que “ponderando que o PER tem como fim primordial a recuperação da empresa, a derrogação do princípio da igualdade dos credores é legítima num quadro de ponderação de interesses — o interesse individual por contraposição ao colectivo — se este se situar num patamar material e fundadamente superior em função dos direitos que devem ser salvaguardados...

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