Acórdão nº 943/13.1TTLSB.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 15 de Setembro de 2016

Magistrado ResponsávelANTÓNIO LEONES DANTAS
Data da Resolução15 de Setembro de 2016
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça: I AA instaurou ação declarativa de condenação, com processo comum, contra o INAC - INSTITUTO NACIONAL DE AVIAÇÃO CIVIL, I.P., pedindo que este seja condenado a pagar-lhe a quantia de € 85.748,08 a título de subsídios de isenção de horário de trabalho, acrescida de juros de mora e das despesas judiciais e honorários do patrocínio a liquidar a final.

Para o efeito, alegou, no essencial, que desde 2 de março de 2000 até 31 de maio de 2012 exerceu funções como titular de órgão de estrutura do réu com a categoria de chefe de departamento, em regime de comissão de serviço e de isenção de horário de trabalho, não tendo o réu, até hoje, procedido ao pagamento do subsídio de isenção correspondente ao período compreendido entre 2 de março de 2000 e 31 de dezembro de 2008.

O réu contestou a ação, defendendo-se por exceção e por impugnação.

Por exceção, invocou a prescrição dos juros vencidos há mais de cinco anos.

Por impugnação, alegou que não pagou os subsídios de isenção de horário de trabalho reclamados porquanto não foram cumpridos os requisitos formais exigidos para a atribuição daquele complemento remuneratório.

A autora respondeu, concluindo pela improcedência das exceções invocadas.

No despacho saneador foi julgada improcedente a exceção de prescrição invocada pelo réu.

Realizou-se a audiência de discussão e julgamento, no decurso da qual a autora desistiu do pedido de condenação do réu no pagamento das despesas judiciais e honorários do patrocínio.

A ação foi decidida por sentença proferida em 3 de junho de 2014, que integra o seguinte dispositivo: «Julgo a ação totalmente procedente e condeno o INAC - Instituto Nacional de Aviação Civil, I.P. a pagar a AA € 85.748,08, acrescida de juros de mora computados à taxa de 4% desde a data do vencimento de cada prestação até integral pagamento.

» Inconformado com esta decisão, dela recorreu o réu para o Tribunal da Relação de Lisboa, pedindo a sua revogação e substituição por «acórdão que absolva o Recorrente do pagamento à Recorrida da quantia pelo qual vem condenado, relativa a suplemento de isenção de horário, bem como dos respetivos juros moratórios».

O Tribunal da Relação, por decisão proferida pelo relator, ao abrigo do disposto no art.º 652.º, n.º1, al. c) e 656.º do Código de Processo Civil, veio a conhecer do recurso interposto, decidindo: «Face ao exposto, confirma-se a sentença recorrida quanto à condenação da ré a pagar à autora a quantia de € 85.748,08, a título de retribuição devida pela isenção de horário de trabalho, desde de Março de 2000 a Dezembro de 2008.

Devem, no entanto, considerar-se prescritos os juros de mora que se mostrem vencidos cinco anos antes da data da citação, por força do efeito interruptivo desta, como resulta do disposto no n.º 1 do art.º 323 do Código Civil.

» O réu reclamou para a Conferência requerendo que sobre a matéria da referida decisão sumária singular recaísse acórdão.

Nessa sequência e por acórdão de 18 de novembro de 2015 (fls. 546-555), decidiu o Tribunal da Relação nos seguintes termos: «Face ao exposto, acorda-se em julgar improcedente o recurso, confirmando-se a sentença recorrida.» Contudo, o referido acórdão teve um voto de vencido, na parte em que não considerou prescritos os juros de mora vencidos cinco anos antes da citação.

Não se conformando com esta decisão, veio o réu interpor recurso de revista para este Supremo Tribunal, requerendo a sua admissão como revista excecional, nos termos do artigo 672.º do Código de Processo Civil, e integrando nas alegações apresentadas as seguintes conclusões: 1- O Acórdão da Relação é confirmativo, por unanimidade e sem fundamentação essencialmente diferente, da decisão proferida pelo Tribunal de 1.ª instância.

2- O presente recurso de revista excecional deverá ser admitido, ao abrigo do disposto na alínea a) do n.º 1 do art.º 672.º do C. P. Civil, por estar em causa uma questão cuja apreciação, pela Sua relevância jurídica, é claramente necessária para uma melhor aplicação do direito.

3- Estamos perante uma questão jurídica complexa, cuja solução exige um difícil e detalhado exercício interpretativo e de harmonização dos diversos diplomas legais, de natureza pública e privada, que regulam esta matéria.

4- A questão em apreço possui a necessária relevância jurídica para ser objeto de apreciação por esse douto Tribunal, quer pelo elevado número de funcionários envolvidos, quer pelos elevados montantes em causa, podendo ainda ser vista como paradigmática para outros Institutos Públicos, sujeitos, como o INAC, a uma diversidade de regimes jurídicos, de natureza pública e também privada, contraditórios entre si.

5- Pela sua importância e relevância, esta matéria deverá obter o maior consenso jurisprudencial possível, que permita, por um lado, uniformizar as várias decisões contraditórias já proferidas, e por outro, que sirva de orientação, quer para as pessoas que têm interesse directo na sua resolução, quer para as instâncias intermédias onde se encontram pendentes diversos processos iguais ao presente.

6- O interesse geral na boa aplicação do direito impõe que o presente recurso seja admitido, não deixando transitar em julgado uma decisão que contraria frontalmente, decisão já proferida por esse Tribunal e pendente de recurso no Tribunal Constitucional.

7- A boa aplicação da justiça impõe, também, a admissão deste recurso para que a mesma questão obtenha igual decisão por parte dos nossos tribunais, não sendo objeto de casos julgados contraditórios.

8- Pelos motivos expostos, deverão V. Exas. considerar que no presente recurso de revista está em causa uma questão, cuja apreciação, pela sua relevância jurídica, é claramente necessária para uma melhor aplicação do direito e produzir decisão que a admita, nos termos previstos no n.º 3, do art.º 672.º do C. P. Civil.

9- O pessoal do INAC,IP e mais concretamente o seu pessoal dirigente, ficou sujeito, a partir da sua nomeação como titular de cargo de órgão de estrutura do R. e até 01.01.2009 (data em que entra em vigor o Regime de contrato de trabalho em funções públicas) a um regime especial, enquadrado e moldado, pelos seus Estatutos e Regulamentos, pelas normas de direito público de carácter imperativo, constantes, designadamente, da Lei nº 3/2004, de 15.01. (Lei-Quadro dos Institutos Públicos, artigos 6º nºs 1 e 2, alínea a) e 34º nºs 1 e 4) da Lei nº 2/2004, de 15.01 (Estatuto do Pessoal Dirigente, cfr. artigo 1º nº 2 e artigos 13º a 17º, relativos ao exercício de funções pelo pessoal dirigente), da Lei nº 23/2004, de 22 de Junho (Regime jurídico do contrato individual de trabalho na administração pública cfr. art.º 6º) e subsidiariamente, e em tudo o que não seja afastado pelo regime estatutário, regulamentar ou de direito público imperativo vigente, pelo regime do contrato individual de trabalho.

10- Os artigos 13º a 17º do Estatuto do pessoal Dirigente, aprovado pela Lei nº 2/2004, de 15.01, consagram a sujeição normativa do pessoal dirigente ao regime de isenção de horário de trabalho, sem que, por isso, lhe seja devida qualquer remuneração por trabalho prestado fora do período normal de trabalho.

11- Embora no Regulamento de horário de trabalho se estabeleça que os Dirigentes estão isentos de horário de trabalho, nem neste Regulamento, nem no Regulamento de Carreiras e Regime Retributivo do INAC, IP se prevê o pagamento do subsídio de isenção de horário.

12- Não prevendo tal Regulamento, nem o Regulamento que estabelece o regime retributivo dos funcionários do INAC, o pagamento de subsídio de isenção de horário, não pode o mesmo ser invocado como base legal da condenação do R., ou fundamentar a existência de uma “Isenção Estatutária ou Regulamentar de horário de trabalho”.

13- Não pode, assim, haver lugar, na situação vertente, à aplicação subsidiária do regime geral constante do Código do Trabalho, relativo à remuneração do Regime de Isenção de Horário, como considerou o Acórdão recorrido, dado não se estar perante uma situação não regulada e omissa nos Estatutos do INAC, IP e por a tal se opor o regime especial de direito público a que o pessoal do INAC, IP se encontra sujeito.

14- A decisão recorrida efetuou, assim, incorreta interpretação e aplicação do disposto no DL nº 133/98, de 15 de Maio, Portaria nº 543/2007, de 30 de Abril, Despacho Conjunto nº 38/2000, de 28/10/1999, do Secretário de Estado dos Transportes e do Secretário de Estado do Orçamento, da Lei nº 3/2004, de 15.01 (Lei-Quadro dos Institutos Públicos, artigos 6º nºs 1 e 2, alínea a) e 34º nºs 1 e 4), da Lei nº 2/2004, de 15.01 (Estatuto do Pessoal Dirigente, Artigos 1º nº 2 e artigos 13º a 17º, relativos ao exercício de funções pelo pessoal dirigente) e da Lei nº 23/2004, de 22 de Junho..

15- O regime legal do C. do Trabalho, que prevê o pagamento do subsídio de isenção de horário, depende do cumprimento de requisitos legais que se não se verificam na situação em apreço, não podendo aceitar-se que os mesmos são irrelevantes (caso da não comunicação à IGT) ou se mostram ainda assim cumpridos (exigência de acordo das partes a instituir tal regime) como considerou a sentença recorrida.

16- A convicção que sempre existiu foi a de que a “isenção de Horário” a que o Regulamento de horário de trabalho se referia, apenas dispensava os Dirigentes do cumprimento de um horário de trabalho diário, nunca tendo sido reconhecido pelo INAC, nem pelos Dirigentes que tal situação lhes conferia o direito a auferir tal suplemento remuneratório, que, frisa-se, não se encontra previsto nos Estatutos, nem na Tabela Remuneratória especialmente aprovada para o pessoal do INAC, IP.

17- Não tendo a IGT competência para exercer a sua ação junto do R. nesta matéria, por se tratar de um Instituto Público, terá que se entender que o regime de isenção de horário previsto no C. do Trabalho não é aplicável a estes Dirigentes do R. pelo que o direito ao correspondente subsídio nunca se constituiu, nem nunca se...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT