Acórdão nº 514/12.0TBBCL.G1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 29 de Setembro de 2016

Magistrado ResponsávelLOPES DO REGO
Data da Resolução29 de Setembro de 2016
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: 1- AA (Fundação BB) instaurou acção de condenação, sob forma de processo ordinário, contra o Estado Português (Ministério da Agricultura, Desenvolvimento Regional e Pescas), alegando que é dona do prédio misto denominado Quinto CC, situada em …, descrito na Conservatória do Registo Predial sob o nº 85… e inscrito na matriz urbana sob o artigo 114.º e na rústica sob o artigo 227.º: Na sequência de um protocolo que celebrou com o R., cedeu-lhe, em 06/09/1989, o direito de superfície sobre o referido imóvel, pelo prazo de cem anos. Esse contrato ficou subordinado, entre outras, às seguintes condições:

  1. Ser pelo R. edificado e instalado no mencionado prédio um Centro de Formação Profissional Agrícola, da responsabilidade da Direcção Regional de Agricultura de entre Douro e Minho; b) Poder o R. efectuar as obras e edificações urbanas indispensáveis ao funcionamento do fim a que se destinava a tomada de posse efectiva de tais bens, com excepção da alteração da estrutura externa das edificações já existentes.

  2. As obras a realizar seriam aquelas que foram incluídas no Programa de Instalação de Centro de Formação Profissional Agrícola para a Região de Entre o Douro e Minho, no âmbito do PEDAP, financiado pela Comunidade Económica Europeia; d) A título de compensação pela cessão do direito de superfície, o serviço do R. (Direcção Regional) pagaria à A., anualmente, a quantia de cento e vinte mil escudos, com vencimento no dia trinta de Dezembro de cada ano e com actualização de dois em dois anos, de acordo com a taxa de inflação fixada pelo Instituto Nacional de Estatística para cada biénio; e) O pagamento da contribuição Autárquica (actual IMI) ficou a cargo do R; f) A cedência à A. de uma sala do edifício para a realização das reuniões normais ou extraordinárias da sua Direcção, bem como a manutenção do Arquivo que estava na denominada casa do Caseiro; g) O direito da A. a nomear cinco alunos pobres, naturais do concelho de Barcelos, para frequentarem os cursos que se realizassem no Centro Profissional.

    O R. tomou posse do prédio, na sua totalidade, e nele construiu, no extremo sul, um edifício destinado ao ensino e formação de agricultores e empresários agrícolas, dotando-o de salas de aula, quartos para internato, refeitório e tudo o mais necessário à função acordada. Aí foram ministrados vários cursos até 1995/1996.

    Porém, a partir de então, deixaram de ser ministrados mais cursos de formação agrícola no edifício, deixando de ser utilizado por alunos jovens agricultores, quer o refeitório, quer os quartos de dormir, quer as salas.

    O edifício passou a ser utilizado para outras actividades.

    Além disso, na restante parte da quinta, que possui mais de 8 hectares, nada mais foi construído destinado ao “Centro de Formação Agrícola”. Apenas, alguns anos mais tarde, sem o seu conhecimento, o R. instalou cavalos na mesma quinta e construiu uns barracões e cavalariças, edificados sem projecto, - construções precárias e sem acabamentos. Nada disto, porém, se destina a servir, sequer de complemento, a qualquer curso agrícola.

    Por outro lado, o R. só lhe pagou as compensações anuais até ao ano de 1993.

    Assim, entende que o R. violou o citado contrato, porquanto: - Não lhe pagou, desde o ano de 1994, inclusive, a aludida prestação em dinheiro como compensação do direito de superfície de que goza; - Realizou no prédio em causa diversas construções, barracões e cavalariças, sem a sua autorização.

    - Deixou de ministrar os cursos de formação agrícola no edifício e de o utilizar para fins previstos no contrato.

    - Por fim, o R. também violou o contrato ao ocupar, passados que foram os primeiros dez anos, não só o terreno dos barracões e cavalariças como a quase totalidade da quinta, nomeadamente com pastagem dos cavalos, em vez de se limitar a fruir apenas os 2100m2 ocupados pelo edifício e área envolvente ao mesmo.

    Embora estas violações justificassem resolução do contrato pela sua parte, pretende que o mesmo seja mantido.

    Pede, no entanto, que o R. seja condenado:

  3. A reconhecer o seu direito de propriedade sobre a descrita Quinto CC, a demolir as construções não autorizadas, nomeadamente os barracões e cavalariças, e a abster-se de usar os terrenos com pastagem ou outras actividades, bem como os edifícios antigos existentes, e respeitar o seu direito, não o voltando a violar; b) A fruir o edifício que construiu e terreno envolvente com ocupação apenas da área de 2100m2 incluindo coberta e descoberta e destiná-lo exclusivamente à efectiva actividade regular de ensino e formação agrícola para enriquecimento e desenvolvimento da Agricultura, Pecuária ou Florestal; c) A pagar-lhe a quantia de 23.153,62€, relativa às prestações em divida a que se obrigou contratualmente; d) A dar cumprimento a todos esses actos no prazo de noventa dias.

    Contestou o R., excepcionando prescrição dos cânones superficiários relativos aos anos de 1994 a 2007, tendo, ademais, impugnado a matéria invocada pelo A.

    O A. replicou, concluindo, em suma, como na petição inicial.

    Findos os articulados, afirmou-se a regularidade da instância e julgou-se imediatamente procedente a excepção de prescrição invocada pelo R.

    Teve lugar a audiência final, após a qual foi proferida sentença, que termina com o seguinte dispositivo: “Pelo exposto, julgo a presente acção parcialmente procedente, por provada apenas em parte e, consequentemente:

  4. Declaro o autor AA (Fundação BB) proprietário do prédio misto denominado Quinto CC, composto de casa de dois pavimentos e junto terreno de lavradio e mato, com dependências agrícolas, descrito na Conservatória do Registo Predial de Barcelos sob o n° 85…/Barcelinhos e inscrito na matriz urbana sob o art.° 114 e na rústica sob o art. ° 227.º; b) Condeno o réu Estado Português (Ministério da Agricultura, Desenvolvimento Regional e Pescas) a limitar a sua fruição do prédio referido em a) ao edifício que construiu e ao terreno envolvente, com ocupação de apenas 2.100m2 incluindo coberta e descoberta, assim como a destiná-lo exclusivamente à efectiva actividade regular de ensino e formação agrícola.

  5. Condeno o réu Estado Português (Ministério da Agricultura, Desenvolvimento Regional e Pescas) a demolir as construções não autorizadas - barracões e cavalariças - e a abster-se de usar os terrenos com pastagem ou outras actividades, assim como os edifícios antigos existentes; d) Condeno o réu Estado Português (Ministério da Agricultura, Desenvolvimento Regional e Pescas) a pagar ao autor AA (Fundação BB) a quantia de 2. 697.87€ (dois mil seiscentos e noventa e sete euros e oitenta e sete euros), a título de cânones superficiários relativos aos anos de 2008 a 2011, bem como os vincendos após a propositura da acção; e) Absolvo o réu do demais peticionado.

    1. - Inconformado com a sentença, dela apelou o R., tendo a Relação fixado o seguinte quadro factual, subjacente ao litígio: 1- A Autora é dona do prédio misto denominado Quinto CC, composto de casa de dois pavimentos e junto terreno de lavradio e mato, com dependências agrícolas, descrito na Conservatória do Registo Predial de Barcelos sob o n° 85…/Barcelinhos, e inscrito na matriz urbana sob o art.º 114.° e na rústica sob o art.º 227.°.

    2- A Autora adquiriu o referido prédio por compra que fez, em 22 de Junho de 1931, a DD e mulher.

    3- Desde essa data, que a autora passou a exercer a exploração e uso do prédio, e construiu, ainda nos anos 30 do século XX, novas instalações agrícolas, eira, habitação de feitor e anexos, cedeu também a terceiros a fruição agrícola, temporariamente, mediante o recebimento de prestações em dinheiro, ou rendas.

    4- A vista de toda a gente, sem oposição de ninguém, sem interrupção, há mais de setenta anos, com a consciência de exercer o direito próprio de dono.

    5- Encontra-se a aquisição do referido direito de propriedade registada na Conservatória do Registo Predial de Barcelos a favor da autora, através da inscrição n.º 21.446.

    6- Na sequência de um protocolo, reduzido a escrito particular, de 14 de Novembro de 1988, celebrado entre a autora e réu, foi outorgado em 06 de Setembro de 1989, sob escritura pública, um contrato entre ambos, intitulado de “Constituição de Direito de Superfície” sobre a referida Quinto CC, pelo prazo de 100 anos, constante de fls. 17 a 21 e que aqui se dá por reproduzido.

    7- Esse contrato ficou subordinado, entre outras, às seguintes condições:

  6. Ser pelo réu edificado e instalado no mencionado prédio um Centro de Formação Profissional Agrícola, da responsabilidade da Direcção Regional de Agricultura de Entre Douro e Minho.

  7. Poder o réu efectuar as obras e edificações urbanas indispensáveis ao funcionamento do fim a que se destina a tomada de posse efectiva de tais bens, com excepção da alteração da estrutura externa das edificações existentes obrigando-se a manter tais estruturas tal como se encontram.

  8. As obras a realizar serem aquelas que foram incluídas no Programa de Instalação de Centro de Formação Profissional Agrícola para a Região de Entre o Douro e Minho, no âmbito do PEDAP, financiado pela...

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