Acórdão nº 43/17.5YFLSB de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 23 de Janeiro de 2018

Magistrado ResponsávelPIRES DA GRAÇA
Data da Resolução23 de Janeiro de 2018
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam na secção do contencioso do Supremo Tribunal de Justiça AA, NIF ..., residente na Av. ..., tendo tido conhecimento da deliberação do Conselho Plenário do Conselho Superior da Magistratura (CSM), de 09.05.2017, pela realização do Movimento Judicial Ordinário de 2017 ao qual devia concorrer por alegadamente não poder permanecer no lugar em que estava colocada como juiz, vem, “ao abrigo do disposto nos artigos 168º e seguintes do Estatuto dos Magistrados Judiciais (EMJ), aprovado pela Lei nº 21/85, de 30 de Julho, apresentar recurso contencioso (rectius, ação administrativa) para o Supremo Tribunal de Justiça, o que faz nos termos e com os fundamentos seguintes: I - Objeto e pressupostos do recurso 1° O ato impugnado é, como se disse, a decisão de que não pode permanecer no lugar em que atualmente se encontra colocada como juiz efetiva e que por isso deve concorrer ao Movimento Judicial Ordinário de 2017 - cf. Aviso (extrato) nº 5332/2017, publicado no Diário da República, 2ª série, de 15.05.2017, págs. 9248-9253, e retificado pela Declaração de Retificação nº 337/2017, publicada no Diário da República, 2- série, de 26.05.2017, pág. 10526 [de que, para comodidade de consulta, se junta fotocópia como docs. 1 (no qual - a pág. 9249 - se sublinha a inclusão em causa) e 2] 2º A A. é diretamente visada e lesada pela douta deliberação impugnada, pelo que tem legitimidade.

3º A deliberação impugnada foi publicada em 15.05.2017, pelo que está em tempo (artigo 169° do EMJ).

4º O Tribunal é competente, nos termos do disposto no artigo 168º, nº 1, do EMJ.

  1. Dos factos 5º Como se referiu, o Plenário do CSM, na sua sessão de 9 de maio de 2017, deliberou pela realização do Movimento Judicial Ordinário de 2017.

6º Nos termos do referido Aviso (extrato) nº 5332/2017 esse Movimento está, nomeadamente, subordinado aos seguintes termos, critérios e designações: (...) 20) As notações a considerar no âmbito do processamento do presente movimento judicial, são as que estiverem em vigor, forem deliberadas ou homologadas, sem reclamação ou impugnação dos interessados, à data da sessão do Conselho Plenário e Permanente Ordinário de 6 de junho de 2017, sendo igualmente esta a data a considerar nos termos e para os efeitos previstos no artigo 183,º da LOS], designadamente para contabilização da antiguidade e da aferição da perda de requisitos a que alude o n.º 5 deste artigo 21) Os juizes que se encontrem na situação a que alude o nº 5 do artigo 183.º da LOSJ deverão apresentar requerimento ao presente movimento judicial.

(...) 34) O prazo para o envio dos requerimentos eletrónicos inicia-se na data de publicação do presente aviso no Diário da República e termina, no dia 31 de maio de 2017.

(...) 38) A sessão plenária que deliberará sobre a proposta do movimento judicial ordinário de 2017 terá lugar a 11 de julho de 2017.

(...) 7º A A. encontra-se colocada nos Juízes Criminais do Porto há cerca de 20 anos, 8º Em 11.09.2014 a A. foi colocada como efetiva no Tribunal Judicial da Comarca do Porto, Instância Local Porto, Secção Criminal, Juiz 4.

9º Por deliberação, de 04.10.2016, o Conselho Permanente do CSM atribuiu à A. a classificação de serviço de "Suficiente" (doc. 3).

10º Embora entendesse que tal classificação era injusta, a A. decidiu não reclamar nem impugnar, por várias razões designadamente porque a mesma em nada afetava a permanência no lugar em que estava colocada como efetiva.

III. Do direito 11º A douta deliberação impugnada padece de ilegalidades várias. Aqui referir-se-ão apenas aquelas que afetam o caso concreto da A, a) Violação do princípio da unicidade estatutária 12° 0 nº1 do artigo 215° da Constituição da República estabelece que [os] juízes dos tribunais judiciais formam um corpo único e regem-se por um só estatuto.

13º De acordo com este princípio constitucional estabelece o artigo 1º, nº 1, do EMJ que [os] juízes dos tribunais judiciais constituem a magistratura judicial, formam um corpo único e regem-se por este Estatuto.

14º A unicidade de estatuto, tal como está constitucionalmente consagrada, pressupõe duas características essenciais: (a) um estatuto unificado, constituído por um complexo de normas que são apenas aplicáveis aos juízes dos tribunais judiciais; (b) um estatuto específico, no sentido de que são as suas disposições, ainda que de natureza remissiva, que determinam e conformam o respetivo regime jurídico-funcional.

15 Ora, embora a deliberação não explicite diretamente, pela referência no corpo do Aviso ao artigo 183º da Lei nº 62/2013, de 26 de agosto, na redação dada pela Lei nº 40-A/2016, de 22 de dezembro, e, designadamente, nos n°s 20 e 21 do mesmo Aviso, parece seguro concluir que se trata de uma perda superveniente dos requisitos do titular.

16º Estabelece o referido artigo 183º Colocação de juízes 1- Os juízes a colocar nos tribunais de competência territorial alargada e nos juízos referidos nas alíneas a), c) e f) a j) do n.º 3 do artigo 81º são nomeados de entre juízes de direito com mais de 10 anos áe serviço e classificação não inferior a Bom com distinção.

2- Os juízes a colocar nos juízos referidos nas alíneas b), d) e e) do n.º 3 do artigo 81.º são nomeados de entre juízes de direito com mais de cinco anos de serviço e classificação não inferior a Bom.

3 Constituem fatores atendíveis na nomeação, por ordem decrescente de preferência, a classificação de serviço e a antiguidade.

4- Na falta de juízes de direito com os requisitos constantes dos n.ºs 1 e 2, à nomeação é aplicável o disposto no número anterior.

5- A perda dos requisitos exigidos pelos n.ºs 1 e 2 determina que o lugar seja posto a concurso no movimento judicial seguinte.

17° Acontece que tal norma não consta do EMJ".

18º Logo a norma constante do referido artigo 183º, nº 5, nunca poderia ser aplicada sem que o EMJ fosse alterado.

19° Tendo sido aplicada sem essa alteração, verifica-se, assim e desde logo, a violação do referido princípio constitucional da unicidade estatutária dos magistrados judiciais.

b) Violação dos princípios da inamobilidade [inamovibilidade] dos juízes e da independência dos tribunais 20º O n° 1 do artigo 216º da Constituição da República estabelece que [os] juízes são inamovíveis, não podendo ser transferidos, suspensos, aposentados ou demitidos senão nos casos previstos na lei.

21º De acordo com este princípio constitucional, estabelece o artigo 6º do EMJ que [os] magistrados judiciais são nomeados vitaliciamente, não podendo ser transferidos, suspensos, promovidos, aposentados, demitidos ou por qualquer forma mudados de situação senão nos casos previstos neste Estatuto.

22° Acontece que o EMJ não prevê a perda do lugar em que um juiz está colocado efetivo por perda da classificação de serviço que tinha anteriormente.

23° Logo a norma constante do referido artigo 183º, nº 5, nunca poderia ser aplicada sem que o EMJ fosse alterado.

24° Tendo sido aplicada sem essa alteração, verifica-se, assim e também, a violação do referido princípio constitucional da inamobilidade [inamovibilidade]dos magistrados judiciais.

25º A inamobilidade [inamovibilidade]dos magistrados judiciais, a par da irresponsabilidade e da dedicação exclusiva, constituem componentes necessários da independência dos tribunais, princípio basilar de um Estado de Direito democrático, que assim foi também violado.

  1. A perda do lugar como sanção disciplinar ilegalmente aplicada 26º A perda do lugar em que um juiz está colocado como efetivo por causa imputável ao próprio juiz só é admissível face ao EMJ como sanção disciplinar.

    27ºNa verdade, prevê na alínea c) do artigo 85º, a pena de transferência que o artigo 88° define nos seguintes termos: A pena de transferência consiste na colocação do magistrado em cargo da mesma categoria fora da área de jurisdição do tribunal ou serviço em que anteriormente exercia funções.

    28°Porém, como sanção disciplinar, a transferência não acarreta descida do escalão do vencimento uma vez que é para cargo da mesma categoria.

    29°Assim, a perda do lugar pela A. constitui uma verdadeira sanção, mais grave que a transferência, em sede disciplinar, sem que sobre ela a A. tenha sido ouvida ou sequer tenha sido instaurado processo disciplinar, o que acarreta a sua invalidade por violação das garantias constitucionalmente garantidas ao arguido - artigo 32°, designadamente nºs 1 e 1O.º d) V iolação do princípio da tutela da confiança 30º Como se referiu, foi por deliberação de 04.10.2016 que o Conselho Permanente do CSM atribuiu à A. a classificação de serviço de "Suficiente".

    31º Por outro lado, o nº 5 do referido artigo 183º foi introduzido pela Lei nº 40-A/2016, de 22 de dezembro.

    32º Como também se referiu, embora achasse injusta a classificação atribuída, o A. decidiu não reclamar nem a impugnar, já que a mesma em nada afetava a permanência no lugar em que estava colocado como efetivo.

    33° Na verdade quando foi proferida a deliberação havia a certeza que a classificação de serviço de "Suficiente" não tinha qualquer consequência legalmente prevista.

    34º Ao aplicar agora tal norma ao lugar em que a A, está colocada como efetiva há violação flagrante do princípio constitucional da tutela da tutela da confiança ínsito no princípio do Estado de Direito democrático, Termos em que deve a presente ação ser julgada procedente e, em consequência, ser a douta deliberação declarada nula ou pelo menos anulável por violação dos princípios constitucionais de unicidade estatutária dos magistrados judiciais, da sua inamobilidade [inamovibilidade]e independência e da tutela da confiança; tudo com as legais consequências.

    Para tanto, requer-se que seja citado o Conselho Superior da Magistratura, com sede na Rua ..., para, querendo, responder, seguindo-se os demais termos.” O Conselho Superior da Magistratura (CSM), ao abrigo do preceituado no artigo 174.º, n.º 1, do Estatuto dos Magistrados Judiciais (EMJ), apresentou a sua resposta nos termos e com os fundamentos que se reproduzem: “I) ENQUADRAMENTO 1º)...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO
2 temas prácticos
2 sentencias

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT