Acórdão nº 563/14.3TABRG.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 18 de Janeiro de 2018

Magistrado ResponsávelMAIA COSTA
Data da Resolução18 de Janeiro de 2018
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: I. RELATÓRIO AA, Juiz de Direito, foi condenado no Tribunal da Relação de Guimarães, funcionando como 1ª instância, por acórdão de 16.5.2017, como autor de um crime de falsidade de testemunho agravado, p. e p. pelo art. 360º, nºs 1 e 3, do Código Penal (CP), na pena de 400 dias de multa, à taxa diária de 20,00 €, e ainda no pagamento à assistente e demandante civil BB da quantia de 5 000,00 €, a título de danos não patrimoniais.

Deste acórdão recorreu o arguido, que alega em conclusão: 1) Porque o exercício do direito de defesa foi postergado em detrimento de uma valoração e interpretação pessoalizada no que concerne à análise da produção da prova dos factos alegados tanto em sede de pronúncia, como de contestação, tudo em clara violação do dever de isenção e equidistância das partes; 2) Porque nos presentes autos se deram como provados factos contraditórios com os que, em acção anterior estavam, igualmente, em apreço, verifica-se que os mesmos factos aqui dados por provados, haviam sido dados por não provados naquela outra acção bem como e especialmente nos presentes autos foram dados por não provados factos essenciais que estavam provados / assentes por acordo das partes, ou seja por acordo da aqui assistente; 3) Porque não se trata, por isso, de factos sujeitos a prova testemunhal ou documental, mas antes dos mesmos factos que a aqui Assistente havia confessado em anterior acção em que era parte (Ré) e em cujo âmbito foi prestado o depoimento pelo ora Recorrente; 4) Porque tendo sido deferido, no decurso da audiência de julgamento, a realização de diligências provatórias, concretamente a audição/leitura das declarações prestadas por testemunhas e Assistente naquela primeira acção, absteve-se o Tribunal a quo de realizar tais diligências que, com expressa concordância do MP, havia admitido mas cuja realização decidiu ter lugar em momento posterior; 5) Porque pelo requerimento formulado a fls. 2669, foi requerida a inquirição de uma testemunha que privara com o autor do testamento, no período posterior à data da última alta do IPO do Porto – Snr. CC – e bem assim de outra testemunha que tinha conhecimento da relação existente entre Assistente e o ora Recorrente, pelo que podia esclarecer os respectivos termos; 6) Porque, com tal indeferimento, o Tribunal postergou de forma incompreensível o disposto no artº 340º do CPP que reflecte, em sede de audiência a consagração do princípio da investigação ou da verdade material, traduzido no poder dever do Tribunal de procurar oficiosamente a verdade, entendida esta como verdade histórica ou verdade material; 7) Porque foi o mandatário impedido de formular requerimento em audiência de julgamento, ainda que na fase de declarações finais do arguido, foi, uma vez mais postergado o legítimo exercício do direito de defesa constitucionalmente conferido a qualquer arguido; 8) Porque, atenta a dimensão dos autos, a vastidão dos depoimentos prestados e necessária conjugação dos depoimentos prestados pelas mesmas testemunhas na referida acção cível com ostensivas contradições e mesmo oposições, a verdade é que para o efectivo exercício do direito conferido pelo disposto no artº 361º do CPP, era impossível a prestação imediata de tais declarações finais por parte do Recorrente, em termos da indispensável efectividade, não sendo tais declarações um mero acto formal e minudente 9) Porque as declarações finais constituem o derradeiro momento conferido ao arguido para dizer tudo quanto entenda alegar em sua defesa e a que está o Tribunal vinculado a ouvir em tudo o que for declarado a bem da sua defesa 10) Deve ser declarada a nulidade da audiência de julgamento por omissão posterior de diligências que se reputaram úteis e mesmo essenciais para a descoberta da verdade, ou pelo menos ordenada a sua reabertura para produção das diligências de prova admitidas e ordenadas, ainda que relegadas para momento ulterior em relação ao momento em que tal foi decidido, como 11) Deve ser admitida a inquirição das testemunhas requerida a fls 2669 por serem relevantes para a descoberta da verdade material e boa decisão da causa, ordenando-se a reabertura da audiência, declarando-se nulos todos os actos posteriores ao início da produção das alegações orais; 12) Porque quando foi conferido ao arguido o direito a produzir as suas alegações finais, conforme o disposto no artº 361º do CPP, foi igualmente determinado que teriam as suas últimas declarações de ser produzidas de imediato e logo após a produção das alegações finais por parte do MºPº e dos mandatários; 13) Porque esta interpretação da norma - no que concerne a terem de ser imediatamente produzidas pelo arguido as suas últimas declarações após as alegações orais - especialmente quando se trata de processo composto de cerca de três mil páginas, vários apensos e com depoimentos prestados em julgamento no total superior a 30 horas viola o disposto nos artºs 20º e 30º da Constituição da República Portuguesa, enfermando a referida interpretação normativa de incontornável inconstitucionalidade; 14) Porque existe manifesto erro notório na apreciação da prova e insuficiência para a Decisão da matéria de facto provada tal como existe contradição entre a fundamentação e a Decisão 15) Porque existe total ausência de qualquer elemento probatório que validamente contradite a versão do arguido e muito menos que a demonstre como inverídica ou impossível e antes se verifique que os factos por ele alegados podem ter-se verificado tem o Julgador de aplicar o princípio in dúbio pro reo e decidir em benefício do arguido 16) Porque a aferição da veracidade de um depoimento há-de passar necessariamente pela comparação entre aquilo que a testemunha declara e aquilo que ela própria percepcionou no momento dos factos 17) Porque considerando na devida conta os depoimentos prestados pelas testemunhas Dr DD, Drª EE e Drª FF, Drª GG e HH, deve este Tribunal alterar a matéria de facto dada como provada no acórdão recorrido, mais concretamente os constantes dos itens 8, 9,14, 15, 16, 17, 19, 21, 23, 25, 30, 32 a 36, 49, 51 e 52 18) Porque não incumbe ao arguido o ónus da prova da sua inocência nem demonstração da prova daquilo que alega, ónus estes que exclusivamente impendem sobre a Acusação 19) Porque existe manifesta contradição insanável entre o consignado no Acórdão quando nele se consignou que, “não constarão da enumeração dos factos provados ou não provados aqueles factos que extravasem a pronúncia, designadamente, factos relativos ao comportamento da assistente que a defesa, na sua estratégia de dispersar a atenção dos concretos factos imputados ao arguido, ensaiou na contestação e, em especial, no julgamento” e o que, em plena audiência foi expressamente dito pela mesma Snrª Juiz Presidente – cfr. acta de 8.11.16 e registo áudio 20161108101008_32805_536493 – que referiu ao minuto 01.11.16 ser a contestação uma peça que apesar de extensa está bem elaborada e dentro do objecto do processo, muito bem elaborada, na minha opinião 20) Porque se verifica contradição insanável entre a fundamentação e a decisão na medida em que naquela se invocam mensagens que não constam dos factos provados já que a única mensagem datada de 02/08/2011, tem a hora de 15h09m - cfr. facto provado elencado sob o nº 25 - pelo que se fica sem saber a que mensagem se alude na motivação da decisão de facto que lhe serviu de base; 21) Porque a aqui Assistente reconheceu em processo judicial anterior que seu Pai lavrou o testamento imediatamente após ter estado internado nos Hospitais de Coimbra e do IPO do Porto, donde saiu com o diagnóstico para morrer, uma vez que padecia de doença oncológica muito grave, sendo que nessa altura o testador estava incontinente e que era por intermédio de uma empregada, de nome ...., que lhe ministrava os necessários cuidados, além de que, nessa altura, o testador estava na total dependência de terceiros para executar toda e qualquer tarefa, designadamente para se alimentar, tomar medicação, tomar banho, mudar as fraldas, vestir-se, calçar-se e tudo o mais que é usual um ser humano fazer no dia-a-dia 22) Porque veio agora a Assistente neste processo dar o dito, por não dito, alterando radicalmente o que confessara e referindo que o seu Pai quando saiu do IPO estava em perfeitas condições de discernimento, ia à casa de banho pelo pé dele 23) Porque o acórdão recorrido não relevou, na conta devida, por um lado, os depoimentos das testemunhas Drª EE, Dr. DD e Drª II e, por outro lado, os depoimentos das testemunhas Drª GG e HH, que, precisamente, relatam, os primeiros, qual era a percepção da realidade que o arguido tinha sobre as faculdades mentais/faculdades intelectuais/estado psíquico do testador nos dias imediatamente anteriores à realização dos testamentos mencionados sob os itens 15º e 16º dos factos considerados provados, e, os segundos, sobre qual era essa mesma percepção por parte da assistente, 24) Porque as referidas testemunhas – Dr. DD e Drsª EE e FF – depuseram, de forma inequívoca, unânime e coincidente entre si, no sentido de o arguido lhes ter confidenciado, nos dias imediatamente seguintes ao da realização das escrituras de testamentos – 29 de Junho de 2010 -, que o testador não reunia as necessárias condições físicas e psíquicas para praticar tais actos notariais 25) Porque à luz das regras da experiência comum e, mesmo, da lógica, não faz qualquer sentido que o arguido, já depois de o relacionamento entre si e a assistente ter terminado, mas antes de ter deposto como testemunha no âmbito do processo cível que correu os seus termos pela extinta Vara Mista de Braga, tenha deposto, noutros dois processos cíveis, nos quais a assistente figurava como parte, precisamente de acordo com a versão dos factos alegados pela assistente nesses mesmos processos, que, aliás, ganhou inteiramente, engrandecendo, assim, o seu património 26) Porque estão juntos ao presente processo registos clínicos exarados...

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