Acórdão nº 3310/11.6TBALM.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 08 de Março de 2018

Magistrado ResponsávelFONSECA RAMOS
Data da Resolução08 de Março de 2018
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Proc.3310/11.8TBALM.L1.S1 R-642[1] Revista Acordam no Supremo Tribunal de Justiça AA e mulher BB, intentaram, em 18.5.2011, no Tribunal de Comarca e de Família e Menores de ..., com distribuição ao 3º Juízo de Competência Cível, agora Comarca de Lisboa ... – Inst. Central – 2ª Secção Cível – Jl acção declarativa, sob a forma comum de processo (originalmente, sob a forma de processo experimental), contra: 1. CC, Lda.

  1. DD, S.A, actualmente e por fusão, designada EE, S.A.

  2. FF, Lda.

  3. GG, S.A, relativamente à qual a instância foi extinta por inutilidade superveniente da lide consequente à respectiva declaração de insolvência.

  4. HH, S.A., actualmente denominada II, S.A.

    Pediram que pela procedência da acção as rés sejam solidariamente condenadas no pagamento ao autor marido de uma indemnização por danos não patrimoniais no valor de Euros 250.000,00 (duzentos e cinquenta mil euros) e à autora mulher de uma indemnização por danos não patrimoniais no valor de Euros 80.000,00 (oitenta mil euros), bem como juros de mora desde a data da citação até integral pagamento.

    Para tanto, alegaram, em síntese: ·No dia 16 de Junho de 2008, o autor encontrava-se no exercício da sua actividade profissional de serralheiro ao serviço e sob as ordens da ré CC, Lda. numa obra de construção civil do edifício ..., no ..., ..., de que era empreiteira a GG, S.A.

    ·Foi necessário um meio que permitisse a montagem de estruturas metálicas em altura e por indicação do encarregado geral da obra ao serviço da GG, foi montada uma plataforma metálica para o efeito.

    ·Quando o autor desempenhava as suas funções em cima dessa estrutura, a mesma, por não ter resistência suficiente, cedeu, tendo ele caído desamparado de uma altura de cerca de 10 metros no piso inferior do parque de estacionamento.

    ·O autor esteve uma hora e meia em agonia num local inacessível, do qual foi transportado para o hospital, tendo sido sujeito a duas cirurgias e sofrido várias fracturas, luxação e lesão vertebro-medular completa que lhe provocou paraplegia.

    ·Ficou privado da capacidade de locomoção, sendo obrigado a utilizar, primeiro, cadeira de rodas e actualmente canadianas e está dependente de terceiros para as tarefas básicas do dia-a-dia.

    ·Está também privado da função sexual, não podendo mais ter filhos, o que lhe causa profunda tristeza e frustração.

    ·Também para a autora resultaram desse sinistro danos, consequentes à impossibilidade de ter relações sexuais com o seu marido e ter mais filhos.

    ·A ré CC, Lda. celebrou com a ré DD, S.A um seguro pelo qual transferiu para esta a responsabilidade pelos riscos como os que se verificaram no referido sinistro.

    ·A montagem da estrutura que se desmantelou e deu origem à queda do autor foi efectuada por funcionários da GG, que havia transferido a sua responsabilidade para a ré HH, S.A.

    ·O autor subiu à estrutura e montava o sistema de exaustão no âmbito da relação de trabalho subordinado que mantinha com a ré CC, Lda.

    ·O mesmo efectuava o seu trabalho seguindo ordens e indicações que lhe eram dadas pelo encarregado da GG e pelo engenheiro ao serviço da ré FF, Lda.

    ·A construção civil configura uma actividade perigosa pela sua natureza e pelos meios que utiliza, sendo aplicável ao caso o disposto no nº2 do art. 493º do Código Civil.

    Todas as rés apresentaram contestações, tendo-se defendido, no essencial, da seguinte forma: (i) A ré DD, S.A, excepcionando a incompetência material do tribunal com fundamento na caracterização do sinistro como acidente de trabalho e, no mais, impugnando por desconhecimento a factualidade articulada.

    (ii) A ré CC, Lda., invocando o sentenciado no Tribunal de Trabalho, a incúria do autor no cumprimento de ordens e regulamentos existentes na empresa, tendo ele formação em segurança no trabalho. Impugnou parcialmente a factualidade articulada, concluindo pela exclusão da sua responsabilidade ao abrigo do disposto no art. 570º do Código Civil.

    (iii) A ré HH, S.A contestou aceitando a transferência de responsabilidade da co-ré GG, e sustentando que foi o autor que deu causa ao sinistro por ter, de forma livre e consciente, optado por executar os trabalhos numa plataforma que não estava apta para o efeito, a qual, por esse motivo, se partiu.

    (iv) A ré FF, Lda. defendeu-se invocando que não teve qualquer intervenção na disponibilização de meios ou na montagem dos andaimes/plataforma, não tendo praticado, por acção ou omissão, qualquer facto lícito ou ilícito susceptível de desencadear a sua responsabilidade pelo sinistro. Requereu a intervenção principal provocada, como sua associada, da seguradora JJ, S.A para a qual disse ter transferido a responsabilidade civil emergente do exercício da sua actividade.

    Convidados para o efeito, os autores responderam por escrito às excepções deduzidas nas contestações, refutando as mesmas.

    O incidente de intervenção principal deduzido pela ré FF, Lda. foi indeferido liminarmente por falta de pagamento da taxa de justiça inerente.

    Realizou-se audiência preliminar, na qual foi proferido despacho que julgou improcedente a excepção de incompetência material do tribunal. Posteriormente foram declaradas improcedentes as excepções de ilegitimidade e falta de causa de pedir supervenientemente invocadas pela ré DD, S.A.

    *** Após julgamento, foi proferida sentença com o seguinte dispositivo: “Face ao exposto, tudo ponderado de facto e de Direito, decide-se julgar parcialmente procedente o pedido formulado pelos autores AA e BB e, nessa mesma medida: I.

    Condena-se a Ré JJ, S.A. a pagar ao autor AA a quantia de Euros 250.000,00 (duzentos e cinquenta mil euros) de compensação por danos não patrimoniais, acrescida de juros de mora, calculados à taxa legal de juros civis, desde a presente data até integral pagamento.

    II. Condena-se a Ré II, S.A. a pagar à autora BB a quantia de Euros 17.000,00 (dezassete mil euros) de compensação por danos não patrimoniais, acrescida de juros de mora, calculados à taxa legal de juros civis, desde a presente data até integral pagamento.

    III. Absolvem-se as Rés CC — …, Lda., EE, S.A. e FF — …, Lda. dos pedidos contra elas formulados na acção.” *** Não se conformando com a decisão, dela apelou a Ré II, S.A, para o Tribunal da Relação do Porto que, por Acórdão de 12.9.2017 – fls. 1163 a 1182 verso: – Julgou parcialmente procedente a apelação, reduzindo a indemnização devida ao Autor para € 135 000,00 (cento e trinta e cinco mil euros) e a indemnização devida à Autora para € 15 000,00 (quinze mil euros), mantendo-se no mais o decidido em primeira instância.

    *** Inconformados, recorreram para este Supremo Tribunal de Justiça, os Autores e, subordinadamente, a Ré II, S.A.

    Os Autores, alegando, formularam as seguintes conclusões: 1.ª - Salvo o devido respeito, que é obviamente muito, o douto aresto prolatado, em sede de apelação, pelo Venerando Tribunal da Relação de Lisboa e do qual vem interposto o presente recurso enferma de dois erros que urge reparar e que subjazem à interposição deste; 2.ª O douto decisório recorrido julga parcialmente procedente a apelação e reduz a indemnização devida aos AA., ora Recorrentes, respectivamente a Eur 135.000,00 e a Eur 15.000,00, mantendo no mais o decidido em primeira instância; 3.ª - A primeira instância, o Insigne Juízo Central Cível de ..., do Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa, havia mui doutamente decidido julgar parcialmente procedente o pedido formulado na acção e condenar a Ré “II – …, S.A.” a pagar aos AA., a título de compensação por danos não patrimoniais, os valores de Eur 250.000,00 e Eur 20.000,00[2]; 4.ª - A redução dos valores indemnizatórios pelo Venerando Tribunal da Relação de Lisboa tem subjacentes duas razões: (l) a quantificação dos danos não patrimoniais, e (2) a valorização da culpa do lesado;

    1. A quantificação dos danos 5.ª - No que concerne à quantificação dos danos, o Venerando Tribunal a quo imputa ao decisório da Primeira Instância um ostensivamente inexistente “erro de raciocínio e de metodologia”; 6.ª - Para determinação do valor da indemnização, o Tribunal de Primeira Instância recorre, primacialmente, aos critérios previstos no n.°4 do artigo 496.º, e no artigo 494.° do Código Civil, complementando-os, instrumental e não vinculadamente, com as tabelas aprovadas pela Portaria n.°377/2008, de 26 de Maio, na redacção que lhe foi conferida pela Portaria n.°679/2009, de 25 de Junho; 7.ª - A Portaria em apreço fixa critérios e valores orientadores especificamente para apresentação de proposta razoável de indemnização por dano corporal aos lesados em acidente de automóvel, e deixa claro, no seu preâmbulo que “...o objectivo da portaria não é a fixação definitiva de valores indemnizatórios mas (…) o estabelecimento de um conjunto de regras e princípios que permita agilizar a apresentação de propostas razoáveis…”.

      8.ª - Daí que o n.°2 do artigo 1.º da mesma acautele que “As disposições constantes da presente portaria não afastam o direito à indemnização de outros danos, nos termos da lei, nem afixação de valores superiores aos propostos.” 9.ª - Para a quantificação da indemnização, o Tribunal de primeira instância entendeu – deliberadamente e à luz dos critérios previstos no artigo 496.º do Código Civil recorrer à tabela prevista na Portaria a que supra se alude e não aplicar estritamente os valores da tabela mas fazer uma operação de cálculo da indemnização devida aos AA., ora Recorrentes, utilizando como referencial o valor do salário médio nacional no ano de 2015, e não o valor do salário mínimo que aquele diploma toma por referência, por entender ser a fórmula que leva a solução de melhor Justiça; 10.ª - Mal, o douto aresto recorrido sustenta que a aplicação do valor do salário médio foi “…um erro de raciocínio e metodologia…”, como se se houvesse a Mm.ª Juiz da primeira instância enganado na operação aritmética de cálculo da indemnização e devesse ter obrigatoriamente recorrido aos critérios previstos na referida tabela, ao valor do salário mínimo; 11.ª - Todavia...

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