Acórdão nº 2472/05.8 TBSTR.E1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 27 de Fevereiro de 2018
Magistrado Responsável | FÁTIMA GOMES |
Data da Resolução | 27 de Fevereiro de 2018 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Acordam no Supremo Tribunal de Justiça I. Relatório 1.
AA e BB, por si e na qualidade de únicos herdeiros de CC e DD, intentaram a acção declarativa de condenação contra a Companhia de Seguros EE, S.A., Companhia de Seguros FF, GG e HH, Lda., pedindo a sua condenação no pagamento da importância de €214.301,31, a título de indemnização por danos não patrimoniais e de alimentos, a qual foi julgada parcialmente procedente.
A Ré Companhia de Seguros EE, S.A foi absolvida do pedido por ter sido considerado existir uma situação de autoridade de caso julgado.
Inconformada com o decidido, recorreu a demandada Companhia de Seguros FF.
Contra-alegou a demandada Companhia de Seguros EE, S.A.
, votando pela manutenção do decidido.
2.
O recurso foi apreciado pelo Tribunal da Relação de Évora, que circunscreveu o seu objecto à apreciação da invocada “não verificação de uma situação de autoridade de caso julgado”.
O Tribunal da Relação confirmou a sentença recorrida, por entender que a anterior posição firmada pelo STJ quanto à responsabilidade pela causa do acidente – decisão transitada em julgado – tem de ser respeitada, mesmo fora do processo em que foi proferida.
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Nas conclusões do recurso indica (por transcrição): 1º - O Tribunal a quo violou o preceituado nos artigos 580° e 581° ambos do CPC.
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- Com efeito, mesmo que se verificasse a excepção de autoridade de caso julgado, o que a ora Recorrente entende não suceder, deveria sempre a mesma ser relativamente à decisão respeitante ao processo nº 2365/03.3TBSTR e não ao Proc. n.º 1175/04.5TBSTR; 3º - Efectivamente, sendo aquele mais antigo, discutindo-se nele o acidente dos autos e também a culpa na produção do mesmo e sendo a Ré EE, naquele como neste processo, Ré, parece evidente que, tendo tal processo transitado em julgado há mais tempo, terá que ser a decisão do mesmo proferida quanto à culpa a ditar a decisão a proferir nestes autos; 4º - Pelo que, a ser procedente a fundamentação constante do acórdão recorrido, sempre a decisão a proferir teria que ser no sentido da responsabilização da Ré EE em 70% do pedido apresentado pelos AA; 5º - Não se admitindo outro enquadramento; 6º - De qualquer modo, considera a ora Recorrente que não se verificam in casu os pressupostos para a verificação da excepção de autoridade de caso julgado, com referência ao proc. nº 1175/04.5TBSTR; 7º - A excepção de autoridade de caso julgado justifica-se para impedir que existam decisões contraditórias, que venham a afectar a certeza e segurança jurídicas. A maioria da jurisprudência considera que, para se verificar a autoridade de caso julgado não é necessária a tríplice identidade, podendo estender-se a outros casos, designadamente quanto a questões que sejam antecedente lógico necessário da parte dispositiva do julgado.
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- Porém, é pacífico que a parte decisória da sentença não se dissocia dos seus fundamentos. Ora, os fundamentos de facto que estiveram na base da decisão proferida no proc. nº 1175/04.5TBSTR, relativamente à dinâmica do acidente, são muito diferentes dos que estão em discussão nos presentes autos.
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- A acrescer, realce-se que o Supremo Tribunal de Justiça pronunciou-se por Acórdão de 30 de março de 2017, proferido no processo nº 1375/06.3TBSTR.E1.S1, respeitante ao acidente dos autos mas em que é Autora a ora Recorrente e Ré a EE, exactamente no sentido da inexistência de "autoridade de caso julgado, com os seguintes fundamentos constantes do Sumário, que aqui transcrevemos: "1. Quanto à eficácia do caso julgado material, importa distinguir duas vertentes: c) - uma função negativa, reconduzida à exceção de caso julgado, consistente no impedimento de que as questões alcançadas pelo caso julgado se possam voltar a suscitar, entre as mesmas partes em ação futura; d) - uma função positiva, designada por autoridade de caso julgado, através da qual a solução nele compreendida se torna vinculativa no quadro de outros casos a ser decididos no mesmo ou noutros tribunais.
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A exceção de caso julgado requer a verificação da tríplice identidade estabelecida no artigo 581º do CPC: a identidade de sujeitos, a identidade de pedido e a identidade de causa de pedir, 7. Já a autoridade de caso julgado, segundo doutrina e jurisprudência hoje dominantes, não requer aquela tríplice identidade, podendo estender-se a outros casos, designadamente quanto a questões que sejam antecedente lógico necessário da parte dispositiva do julgado.
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A autoridade do caso julgado implica o acatamento de uma decisão proferida em ação anterior cujo objeto se inscreve, como pressuposto indiscutível, no objeto de uma ação ulterior, obstando assim a que a relação jurídica ali definida venha a ser contemplada, de novo, de forma diversa.
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Quando, em duas ações instauradas por autores distintos contra seguradoras também diferentes, em que se discutiu o mesmo acidente de viação, tenha sido proferidas decisões a atribuir, em termos divergentes, a responsabilidade, a título de culpa, aos condutores dos veículos intervenientes, não é lícito conferir autoridade de caso julgado a qualquer delas no âmbito de uma terceira ação instaurada 10º - Pelo que, deve ser revogado o acórdão recorrido no sentido de conceder "autoridade de caso julgado" ao processo nº 2365/03.3TBSTR, que transitou em julgado antes do processo nº 1175/04.5TBSTR ou, caso assim não se entenda e conforme já foi decidido por esse douto Tribunal Superior, deverá considerar-se que não se verifica tal excepção nos presentes autos, devendo os mesmos baixar à primeira instância para ser proferida decisão de mérito atenta a prova que nos autos foi produzida, assim se garantindo uma tutela efectiva.
Nestes termos, nos mais de Direito e sempre com o mui douto suprimento de V. Exas. deve dar-se provimento ao presente recurso, revogando-se o Acórdão recorrido em conformidade com as presentes alegações, assim se fazendo JUSTIÇA”.
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A Companhia de Seguros EE, S.A apresentou contra-alegações.
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Fundamentação 5.
Na sentença recorrida foram considerados provados os seguintes factos: 1 - O Autor AA nasceu a ... de 1975, sendo filho dos falecidos DD e CC; 2- O Autor BB nasceu a 3 de março de 1980, sendo filho dos falecidos DD e CC; 3 - DD tinha, à data do falecimento, 52 anos de idade; 4 - CC tinha, à data do falecimento, 47 anos de idade; 5 - O veículo de matrícula ...-NQ é de passageiros de aluguer, no qual os pais dos Autores AA e BB eram transportados, por contrato de aluguer com condutor, e cuja responsabilidade civil se encontrava assumida pela demandada Companhia de Seguros FF, através de contrato de seguro, titulado pela apólice nº ...; 6 - O referido veículo era conduzido por II e transportava, para além dos pais dos demandantes, JJ, LL, MM, NN, OO e PP 7 - Em consequência do embate, a CC sofreu lesões traumáticas graves, ao nível da cabeça, traduzidas no esfacelo daquela, com fratura do frontal e perda total de massa encefálica; 8 - Estas lesões foram causa necessária e direta da sua morte, que ocorreu às 3 horas e 45 minutos; 9 - Igualmente em consequência do embate, o DD sofreu lesões traumáticas graves ao nível da cabeça, as quais se traduziram na fratura muti-esquirolosa do occipital, parietais, temporais e frontal, hemorragia cerebral, cerebelosa e meníngea grave, com extensos focos de contusão cerebrais e laceração da massa encefálica, fratura dos ossos próprios do nariz, lesões traumáticas na cavidade torácica, traduzidas por hemopericárdio, originado tamponamento cardíaco, rotura da aurícula esquerda e edema e congestão pulmonar; 10 - Estas lesões foram a causa direta e necessária da sua morte, que ocorreu às 3 horas e 45 minutos; 11- Também em virtude do embate, II, condutor do veículo, veio a falecer, bem como JJ, ocupante; 12- À data do acidente, os demandantes vivia com os pais, havia um bom relacionamento e constituíam uma família feliz e unida; 13 - À data do acidente, o Autor QQ exercia atividade remunerada; 14 - O Autor BB...
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