Acórdão nº 63/09-3PECBR.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 13 de Novembro de 2009

Magistrado ResponsávelDR. GOMES DE SOUSA
Data da Resolução13 de Novembro de 2009
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

S Meio Processual: RECURSO PENAL Decisão: CONFIRMADA PARCIALMENTE Legislação Nacional: ARTIGOS 129º, C).174º,249º E 250º CPP Sumário: 1. A partir do momento em que o arguido, abordado pelos agentes de autoridade, exibe o objecto furtado estão verificados os pressupostos da revista.

  1. Quando se afirma no art.º 129º, c)do CPP que “se o depoimento resultar do que se ouviu dizer a pessoas determinadas, o juiz pode chamar estas a depor” está a exigir-se ao juiz que preside ao julgamento um primeiro juízo sobre a credibilidade do depoimento indirecto, justificativo, ou não, de uma possível futura valoração desse mesmo depoimento. Se conclui que o depoimento indirecto não tem objecto ou credibilidade para fundar a sua convicção futura não terá que chamar a depor o “meio de prova” directo.

  2. Não se trata de um simples “poder”, sim de um “poder dever”. Se o Juiz entende que o depoimento indirecto tem suficiente credibilidade, não lhe é lícito desprezá-lo. Em obediência ao princípio de investigação que enforma a audiência, deve chamar a depor aquelas pessoas determinadas.

    Decisão Texto Integral: A - Relatório: Na Vara de Competência Mista e Juízos Criminais de Coimbra – 1º Juízo Criminal - correu termos o processo sumário supra numerado, no qual é arguido D..., solteiro, desempregado, residente no Bairro …, Carregal do Sal, sendo a final lavrada sentença que condenou o arguido pela prática, como autor, de um crime de furto qualificado p. e p. pelo art. 204°, nº 2 al.. e) do Código Penal, na pena de dois anos e 8 meses de prisão, suspensa na sua execução por idêntico período, com regime de prova.

    * O arguido apresentou contestação escrita, invocando a nulidade da revista efectuada ao arguido, porquanto, diz, nos autos não havia qualquer indício de que o revistado ocultava na sua posse quaisquer objectos relacionados com o crime ou que pudessem servir de meio de prova nem se verificavam os demais requisitos de que o arts. 174° nº 1 e o art. 251º do CPP fazem depender a revista de pessoas.

    E, uma vez que a detenção do arguido foi feita com base na revista nula, é também nula a detenção, assim como as apreensões feitas.

    Relegou-se para o momento da sentença o conhecimento das nulidades invocadas, por se ter entendido que a decisão das mesmas não tinha de ser prévia ao julgamento.

    * Lavrada sentença, inconformado, interpôs o arguido o presente recurso, com as seguintes conclusões: 1. Foram dados como provados na douta sentença os factos constantes das alíneas a), b), c), d) e), e f) quando não o deveriam ter sido, pelo que vão expressamente impugnados, 2. A Mmª juiz a quo concatena o testemunho do agente policial quanto a declarações do arguido, com o depoimento da ofendida e com o auto de apreensão constante dos autos como elementos probatórios para fundamentar a decisão objecto de recurso, 3. É método proibido de prova, não podendo ser levado em consideração, como foi feito na sentença em análise, o depoimento do agente de polícia criminal M... quanto a declarações informais do arguido posteriores á sua constituição como tal, por violadoras do seu direito ao silêncio, que de contrário se frustra 4. De facto, este e só este refere, não estando de qualquer outra forma documentado (a momentos 7:34 a 7:48 da gravação do seu depoimento registado em suporte fonográfico sob a referência 25-03-2009 14:5007), que "o mesmo (D...) confirmou, ou disse-nos, que tinha sido o autor do ilícito numa residência e que aqueles produtos eram fruto da prática do ilícito", e que (ao momento 8:19 de tal depoimento) "ele confessou ser o autor do crime".

  3. Sendo que o mesmo refere que a deslocação ao local e "reconstituição" do sucedido (que não foi sequer precedida de despacho) foi feito por uma brigada junto da residência, dizendo (ao minuto 8:26) "não fomos nós os dois que estávamos junto com ele, foi uma brigada confirmar junto de residência" e "foram outros colegas, uma vez que estávamos a tratar de (. . .) que confirmaram que tinha havido o furto", à revelia aliás do que consta no auto de detenção, em que o agente autuante, não presente em audiência, e a testemunha dizem ter-se deslocado ao local .....

  4. Sendo, nomeadamente nesta parte, depoimento de ouvir dizer, assim inutillzàvel.

    De todo o modo, 7. Os órgãos de polícia criminal apenas podem efectuar apreensões no decurso de revistas ou de buscas (. . .) sendo que a apreensão operada nos autos foi feita com base em revista já declarada nula, nomeadamente por não ter sido autorizada por autoridade competente.

  5. Assim, o termo de apreensão do computador nos presentes autos, feito com base em tal revista nula, é também ele nulo e de nenhum efeito, não podendo servir como meio de prova o objecto dele constante.

  6. O arguido não entregou tal computador voluntariamente nem acompanhou voluntariamente os agentes. A ilegal abordagem e força persuasiva da polícia foi e é suficientemente perturbadora da sua livre actuação, que de outra forma não teria tido.

  7. Toda a actuação do opc, ilegal desde a abordagem feita ao arguido, na altura insuspeito, faz de toda a prova obtida prova proibida, (art. 126°, nº 1, alínea a), in fine, alínea c) e 3 do cpc) 11. No demais, nenhuma prova, senão de depoimento de ouvir dizer não suprido pelo declarantes, se produziu em audiência que identifique o arguido como autor do furto ou sequer como suspeito.

    Caso assim não se entenda, 12. A factualidade dada como provada na sentença não refere factos típicos ilícitos bastantes da qualificação do crime de furto (mormente arrombamento, escalamento ou chaves falsas), que permitam sancionar tal conduta como tal, não sendo bastante a mera referência ao facto provado “através de um meio não apurado, abriu a porta do 1 ° andar do n°110".

  8. Subsidiária e finalmente, pelo despacho não fundamentado - de que ora se recorre -, que relegou para a sentença final o conhecimento das nulidades arguidas em sede de contestação (o que determinaria a ausência de alguns dos factos e prova constantes da acusação) privou-se o arguido, durante a fase de julgamento, do cabal conhecimento dos factos que lhe eram definitivamente imputados.

  9. De facto, pelo desconhecimento de todos os factos conformadores da acusação e do art. 61°, nº 1 al c) do cpp, perturba-se o arguido das correlativas garantias de defesa, uma vez que não pode este defender-se na sua plenitude, quando o tribunal reserva para si e para final a definição do objecto do processo.

  10. Dentro de tais garantias de defesa inclui-se o direito a uma confissão integral e sem reservas. Tais reservas subsistem enquanto tal objecto não estiver definitivamente fixado, o que força o arguido ao silêncio em detrimento de uma confissão de factos abstractos que ainda estão em concreto dependentes de apreciação do Mmº juiz, assim contendendo com a validade do julgamento.

  11. Foram violados os artigos 61°, nº 1 al c, 126°, n°3, 129°, 174, n°3, 178, n°4, 343, n°1, 355°, e 374, n°2, todos do cpp, bem como os artigos 1°, n°1 e 10° do cpenal e o artigo 32, nº 1 da crportuguesa.

    Nestes termos deverá o presente recurso ser julgado procedente, e em consequência:

    1. Revogar-se a sentença recorrida, substituindo-a por outra que absolva arguido do crime de que vem acusado por total ausência de prova; b) Quando assim não entenda, revogar-se a sentença na medida em que condena o arguido pelo crime de furto qualificado (mormente por falta de factos típicos ilícitos consubstanciadores de tal crime).

      Assim se fazendo justiça.

      * Respondeu a Digna Magistrada do Ministério Público junto Vara de Competência Mista e Juízos Criminais de Coimbra concluindo que deve ser negado provimento ao recurso e manter-se na íntegra a douta sentença recorrida: O Exmº. Procurador-geral Adjunto neste Tribunal da Relação emitiu douto parecer no sentido da improcedência do recurso.

      Foi cumprido o disposto no artigo 417º n.º 2 do Código de Processo Penal e o arguido apresentou resposta.

      * É o seguinte o teor do despacho sobre a nulidade da revista: «De acordo com o disposto no art. 174° nº 1 do CPP, "quando houver indícios de que alguém oculta na sua pessoa quaisquer objectos relacionados com um crime ou que possam servir de prova, é ordenada revista".

      Em regra, as revistas e as buscas são autorizadas ou ordenadas pela autoridade judiciária competente (art. 174°, nº 3, do C. Processo Penal).

      Porém, os órgãos de polícia criminal podem efectuar revistas e buscas sem aquela autorização ou ordem, nos casos, a) de terrorismo, criminalidade violenta ou altamente organizada, quando haja fundados indícios da prática de crime que ponha em grave risco a vida ou a integridade física de qualquer pessoas, b) em que o visado consinta desde que o consentimento fique, por qualquer forma, documentado, c) e aquando de detenção em flagrante delito por crime a que corresponda pena de prisão (nº 5 do art. 174°, do C. Processo Penal). Nos casos previstos em a), a realização da diligência é, sob pena de nulidade, imediatamente comunicada ao juiz de instrução e por este apreciada a fim de a validar, ou não (n° 6 do art. 174°, do C. Processo Penal).

      No âmbito das medidas cautelares e de polícia - que não são actos processuais mas de polícia, embora possam ser anteriores ou contemporâneos do processo (cfr. Prof. Germano Marques da Silva, Curso de Processo Penal, Vol. III, 2ª Ed., 63 e ss.) aos órgãos de polícia criminal compete, mesmo antes de qualquer ordem da autoridade judiciária para procederem a investigações, praticar os actos cautelares necessários e urgentes para assegurar os meios de prova designadamente, compete-lhes proceder a exames dos vestígios do crime e assegurar a sua manutenção, colher as informações que facilitem a descoberta dos agentes do crime e a sua reconstituição, e...

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