Acórdão nº 09P0392 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 19 de Março de 2009

Magistrado ResponsávelFERNANDO FRÓIS
Data da Resolução19 de Março de 2009
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: I - No Círculo Judicial de Seia, no processo comum colectivo nº 152/03.8 TASEI, foi o arguido: AA, divorciado, empregado bancário, nascido a 21/11/1961, filho de A... P... C... e de I... V... A..., natural de Pinhanços, Seia, e residente que foi na Avenida ..., nº ..., Pinhanços, Seia, e actualmente preso no Estabelecimento Prisional de Viseu - - - - Submetido a julgamento perante tribunal colectivo, acusado da prática, em concurso real, dos seguintes crimes: - 27 crimes de burla qualificada, p. e p. pelos artigos 217º-1 e 218º-1 e 2-a), em referência ao artigo 202º-b), todos do Código Penal; - 29 crimes de falsificação de documento, p. e p. pelos artigos 255º-a) e 256º-1-a) e b), do Código Penal; - 1 crime de abuso de confiança agravado, p. e p. pelos artigos 205º-1 e 4-a), em referência à alínea a) do artigo 202º-1, do Código Penal; - 1 crime de abuso de confiança agravado, sob a forma continuada, p. e p. pelos artigos 30º-2 e 300º-1 e 2-a) (redacção de 1982), agora p e p. pelos artigos 3º-2 e 205º-1 e 4-a) e b), em referência ao artigo 202º-a) e b), todos do Código Penal; - 1 crime de branqueamento de capitais, p. e p. pelo artigo 2º-1-a) do DL 325/95, de 2.12, alterado pelas Leis 65/98, de 2.9, 104/2001, de 25.8, 5/2002, de 11.1 e 10/2002, de 11.2 e pelo DL 323/2001, de 17.12, agora p. e p. pelos artigos 368º-A, nºs 1 e 2, do Código Penal (cfr. Lei 11/2004, de 27.3).

A final, foi proferido acórdão em 25 de Junho de 2008, que decidiu: Condenar o arguido AA, pela prática dos seguintes crimes, nas seguintes penas (além do mais): a) - Pela prática de 27 crimes de burla qualificada p. e p. pelos artigos 217º-1 e 218º-1 e 2-a), em referência ao artigo 202º-b), todos do Código Penal, nas penas parcelares de 4 anos e 6 meses de prisão; 4 anos e 6 meses de prisão; 5 anos de prisão; 4 anos e 6 meses de prisão; 4 anos e 8 meses de prisão; 4 anos e 8 meses de prisão; 4 anos e 6 meses de prisão; 4 anos e 6 meses de prisão; 4 anos e 6 meses de prisão; 4 anos e 5 meses de prisão; 3 anos de prisão; 4 anos de prisão; 4 anos de prisão; 4 anos de prisão; 4 anos de prisão; 4 anos de prisão; 3 anos e 6 meses de prisão; 4 anos e 6 meses de prisão; 4 anos e 6 meses de prisão; 3 anos e 3 meses de prisão; 4 anos e 5 meses de prisão; 4 anos e 8 meses de prisão; 3 anos e 6 meses de prisão; 3 anos e 8 meses de prisão; 3 anos e 6 meses de prisão; 3 anos de prisão e 4 anos e 6 meses de prisão; b) - Pela prática de 29 crimes de falsificação de documento, p. e p. pelos artigos 255º-a) e 256º-1-a) e b), do Código Penal, nas penas parcelares de 1 ano de prisão; 1 ano e 2 meses de prisão; 1 ano e 2 meses de prisão; 1 ano e 2 meses de prisão; 1 ano e 3 meses de prisão; 1 ano e 3 meses de prisão; 9 meses de prisão; 9 meses de prisão; 7 meses de prisão; 7 meses de prisão; 8 meses de prisão; 8 meses de prisão; 8 meses de prisão; 7 meses de prisão; 8 meses de prisão; 1 ano de prisão; 1 ano de prisão; 1 ano e 2 meses de prisão; 1 ano e 2 meses de prisão; 1 ano e 2 meses de prisão; 1 ano de prisão; 8 meses de prisão; 1 ano e 3 meses de prisão; 7 meses de prisão; 7 meses de prisão; 8 meses de prisão; 7 meses de prisão; 6 meses de prisão e 8 meses de prisão; c) - Pela prática de 1 crime de abuso de confiança na forma agravada, p. e p. pelo artigo 205º-1 e 4-a), do Código Penal, em referência à alínea a) do artigo 202º, do mesmo diploma, na pena de 3 anos de prisão; d) - Operado o cúmulo jurídico, foi o arguido condenado na pena única de 11 anos de prisão.

Mais foi decidido absolver o arguido da prática: - de um crime de um crime de abuso de confiança agravado, sob a forma continuada, previsto e punido pelo art. 30.°, n.º 2 e 300.°, n.ºs 1 e 2, al. a) (redacção de 1982), actualmente p. e p. pelos arts. 30.°, n.° 2 e 205.°, n.ºs 1 e 4, als. a) e b), em referência ao art. 202.°, als. a) e b), todos do mesmo diploma legal; - de um crime de branqueamento de capitais, p. e p. pelos arts. 2.°, n.º 1, al. a), do Decreto-Lei n.º 325/95, de 2.12, alterado pelas Leis n.ºs 65/98 de 2.9, 104/2001, de 25.8, 5/2002, de 11.1 e 10/2002, de 11.2 e pelo Decreto-Lei n.º 323/2001, de 17.12, agora p. e p. pelos arts. 368-A.º, n.ºs 1 e 2, do Código Penal (cfr. Lei n.º 11/2004, de 27.3).

Inconformados com tal condenação o MºPº e o arguido AA interpuseram recurso para o Tribunal da Relação de Coimbra, pugnando ambos pela revogação do acórdão condenatório.

Pretendia o MºPº a condenação do arguido também pela prática de crime de branqueamento de capitais, em pena não inferior a 5 anos de prisão e, refazendo o cúmulo jurídico, entende que deve o arguido ser condenado em pena única não inferior a 16 anos de prisão ou, caso não se considere cometido o crime de branqueamento de capitais, sempre a pena única resultante do cúmulo jurídico operado no acórdão recorrido deveria ser alterada e fixada em medida não inferior a 14 anos de prisão.

Pretendia o arguido que os factos provados integram a prática de um crime de abuso de confiança agravado em concurso real com um crime de falsificação, ambos praticados na forma continuada e, em consequência, entende que não lhe deveria ser aplicada pena de prisão superior a 8 anos.

Por acórdão de 05.11.2008, do Tribunal da Relação de Coimbra, foi julgado improcedente o recurso do arguido e parcialmente procedente o recurso do MºPº, tendo o arguido sido condenado (pela prática dos 27 crimes de burla qualificada, 29 crimes de falsificação de documento e 1 crime de abuso de confiança na forma agravada, na pena única de 13 anos de prisão.

Novamente inconformado com tal decisão, o mesmo arguido BB interpôs o presente recurso para este STJ, pugnando pela revogação do acórdão da Relação de Coimbra e pela sua substituição por outro que lhe aplique uma pena de prisão não superior a 8 anos.

Na sua motivação, formula as seguintes - - - - - - - - Conclusões: 1) Os factos provados tipificam a prática de um crime de abuso de confiança agravado em concurso real com um crime de falsificação, ambos praticados na forma continuada.

2) Não existem elementos nos autos que permitam integrar os delitos do arguido no tipo legal do crime de burla, por apenas se ter demonstrado que ele garantiu a clientes do Banco taxas mais elevadas (o que faz qualquer gerente bancário) que acabou por não poder dar, o que constitui uma simples mentira e não qualquer ardil ou conduta particularmente engenhosa.

3) Por outro lado, não é exacto que o arguido tenha querido enriquecer ilegitimamente, mas tão só arranjar dinheiro para jogar e, com o jogo, obter ganhos que lhe permitissem restituir aos lesados as quantias que deles recebeu, o que também exclui a burla.

4) Não se descortina qualquer razão para que o Tribunal recorrido tenha afastado a disciplina do crime continuado do art° 30 nº 2 do C. Penal, porquanto ficaram demonstradas situações exteriores que diminuem sensivelmente a sua culpa do arguido, como sejam a sua qualidade de gerente bancário, a facilidade que tinha em movimentar dinheiro, a decisiva doença ou patologia do vício do jogo (e não apenas vicio ou tendência) e até a mera existência de Casinos.

5) Acrescentando-se que o vício do jogo só não constitui factor de diminuição da culpa (mas até de agravamento) quando não resulta de uma doença do foro psíquico, o que não é o caso, como se depreende de todos os relatórios e pareceres médicos juntos aos autos, que qualificam o arguido como psiquicamente enfermo.

6) Decidido que seja que o arguido praticou os seus actos ilícitos de forma continuada, a pena a aplicar-lhe não pode ser superior à correspondente à conduta mais grave que integra a continuação e que no caso tem um limite máximo de 8 anos (vide artº 205 nº 4 al. b) e 218 nº 2 al. a) do C. Penal).

7) Em qualquer caso, sempre o Tribunal recorrido deveria ter atenuado especialmente a pena do arguido, de acordo com o disposto nos artigos 72 a 74 do C. Penal, uma vez que a isso obrigava a sua doença ou patologia, a relativa e até duvidosa necessidade de pena, atento o período de prisão preventiva já sofrido, a evidência dele jamais poder trabalhar na Banca e ter acesso fácil a dinheiro para satisfazer o seu vicio, a reparação parcial e possível dos prejuízos que causou e o longo tempo já decorrido desde a prática dos factos (os primeiros já ocorreram há 11 anos).

8) Ao valorizar o parecer do Conselho Médico Legal do IML, atribuindo-lhe erradamente natureza pericial e ao ignorar os relatórios e os depoimentos prestados em audiência por três clínicos especialistas / doutores F... S... C..., S... de J... e E... M..., o douto Acórdão recorrido incorreu em erro notório de apreciação da prova e violou o principio da livre valoração das provas (artº 129 do CPP), que não permite transformar em credível o que é incompreensível (emissão de parecer sobre a personalidade de uma pessoa que não se viu ...).

9) Isto porque roça a discricionariedade atribuir-se credibilidade a um escrito de alguém (mesmo sendo uma eminente personalidade) que não foi contraditado em julgamento e, pior que isso, não examinou o arguido, não falou com ele, não o sujeitou a nenhum teste, e não usou quaisquer meios técnicos de diagnóstico, como fizeram os seus outros colegas de profissão.

10) Do processo constam já todos os elementos de prova que permitem julgar verificado o erro notório na sua apreciação, modificar a matéria de facto relativamente a essa concreta questão e atribuir ao arguido um grau de imputabilidade sensivelmente diminuída, com as consequências devidas em termos de atenuação especial da pena e de enquadramento da sua actuação no crime continuado (artº 30 do C. Penal).

11) A pena de prisão de 13 anos aplicada ao arguido é desproporcionada e desajustada aos factos praticados, à sua gravidade e a casos similares ao seu (vide Ac. do STJ de 05/09/2007 - Proc. 06P4798; Ac. STJ de 10/07/2008, Proc. 06P772; Ac. do STJ de 29/10/2003, Proc. 03P2012; Ac. do STJ de 30/01/2003, Proc. 02P3118; Ac. do STJ de 05/06/2006, Proc. 06P1618 03/07/2008...

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