Acórdão nº 08P578 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 02 de Abril de 2008

Magistrado ResponsávelSANTOS CABRAL
Data da Resolução02 de Abril de 2008
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça Os arguidos AA; BB; CC e DD interpuseram recurso da decisão proferida pelo Tribunal da Relação de Lisboa no segmento em que pela prática, em autoria material e na forma consumada, de um crime de tráfico de estupefacientes, p. e p. pelo art. 21º, n.º 1, do Dec.-Lei n.º 15/93, de 22-01, com referência às Tabelas I-A, I-B e I-C os condenou, respectivamente, na pena de de 6 (seis) anos de prisão; na pena de 4 (quatro) anos e 6 (seis) meses de prisão; na pena de 6 (seis) anos de prisão; na pena de 7 (sete) anos de prisão; As razões de discordância encontram-se expressas nas respectivas conclusões de motivação de recurso onde se refere que: AA 1° - Pelos motivos invocados considera o Recorrente que a medida da pena aplicada foi manifestamente exagerada; 2° - Que deveriam ter sido consideradas as circunstâncias retro referidas e cujo traslado se efectua, e que militam a favor do Recorrente; 3° - Peticiona o Recorrente que, até com base no artigo 70° do C.P., a medida concreta da pena lhe seja reduzida, de forma a permitir a aplicação da suspensão da execução nem que seja pelo período máximo, com o que de todo continuarão a satisfazer as necessidades de prevenção e constituirão decerto forma dissuasora da prática e continuação de actividade ilícita.

Arguida CC 1- O Tribunal não fez boa interpretação e aplicação do Direito, e da prova produzida em audiência de discussão e julgamento e demais elementos de prova constantes do processo, pelo que o acórdão recorrido nos merece ampla censura; 2- A Recorrida interpõe o presente recurso, pese embora a alteração da lei processual penal que sempre lhe seria mais desfavorável, ao abrigo do art. 400~ 410; 432° e 5° nº al.a) do CPP, este último que determina a aplicação da lei processual penal no tempo, e expressamente refere a não aplicabilidade imediata daquela no caso de agravamento da situação da Arguida e limitação ao seu direito de defesa, como aconteceria in casu.

3- Dos despachos proferidos pelo ExMº Sr. Dr. Juiz de Instrução dos presentes autos, foi expressamente omitida a ordem de destruição das intercepções telefónicas não transcritas para os autos, em violação do art.188° nº3 (ora nº6) do CPP.

4- A entendermos que tal meio de prova não foi destruído pelo eventual interesse probatório que reveste, sempre aquele só poderia relevar em beneficio da Recorrente e não em seu prejuízo.

5- A omissão de tal formalidade configura uma nulidade insanável, arguida em qualquer prazo, pois caso contrário estaríamos a esvaziar o art.189° do CPP (ora 190 de qualquer sentido, já que o que se pretende é estabelecer uma verdadeira proibição de prova de escutas telefónicas, caso as mesmas sejam utilizadas em detrimento de princípios basilares e constitucionais e em desrespeito das formalidades previstas na lei.

6- O Tribunal justifica a condenação da Recorrente em prova que resultou da confrontação do teor das escutas difundidas em audiência reaberta.

7- As intercepções telefónicas ouvidas naquela audiência, deviam, por força de lei, ter sido destruídas em momento oportuno, não se retirando daquelas qualquer matéria de relevo para os autos, antes se tratando de conversa que abrange o foro pessoal/profissional da Arguida, ora Recorrente.

8- Extrapola, por isso, o uso de tais sessões escutadas, o objecto dos autos e determina a ingerência do Tribunal em matérias da vida pessoal da Arguida, sendo que tais sessões sequer foram determinantes para aferir da prática do crime de que vem acusada a Arguida.

9- Para o Tribunal aferir da utilização dos dois números de telemóvel pela Arguida, com base unicamente na voz, teria sempre de tal confirmação ser sujeita a um juízo técnico e profissional, e não por meio de juízo discricionário e obtido mediante meio de prova ilegal.

10- O Tribunal violou a lei ao reabrir a audiência com fundamento que não cabe na previsão legal (Arts. 371° e 369° do CPP), inexistindo fundamento legal para a produção de prova nos termos ordenados pelo Tribunal.

11-Fez uso de prova obtida por meio contrário à lei, logo ilícita, utilizando um meio proibido de prova (arts.32° nº8, 34° da CRP, art, 126° nº3, 188° nº3 e 189° do CPP na anterior versão); 12- As intersecções telefónicas ouvidas em audiência constituem prova não valorável em termos adjectivos (art.188°nº3, 189° e 126° nº3 do Código de Processo Penal) que encontra consagração nos art.32° nº8 e 34° da nossa Constituição, e devem ser nesse prisma analisado, configurando, assim, violação dos direitos da Arguida, e como tal prova nula por ser prova proibida.

13- A decisão de que se recorre é sustentada em escutas telefónicas não confirmadas no terreno e desapoiadas de outros elementos, violando-se assim o principio da subsidiariedade daquelas, uma vez que o recurso às mesmas só deve ser ordenado quando indispensável à descoberta da verdade.

14- A escuta transcrita é entendida como prova documental junta aos autos, que não obstante não valerá como prova absoluta, necessitando de ser confirmada por outros elementos de prova. A escuta só prova a existência da conversa escutada, não a efectiva concretização daquela.

15- O Tribunal não apurou as quantidades de produto destinadas ao alegado tráfico e ao consumo próprio, os produtos em concreto consumidos, as pessoas envolvidas, renegando o poder de investigação que lhe está cometido.

16- O Tribunal não atendeu, a entender-se pela tese de trafico, factos fundamentais, que determinariam a qualificação dos factos ao abrigo de norma punitiva menos grave (art.26° ou 25~ traficante - consumidor ou tráfico de menor gravidade).

17-Sendo que os elementos que apodíctica e inabalavelmente constam do processo apontam sempre: para a situação de consumidor - dependente da recorrente; para envolvimentos de muito pequena escala, quer em volume de produto, quer pelos meios económicos envolvidos.

18- Não foram efectuadas buscas ou apreensões directamente à Arguida; a Recorrente é sempre referenciada como "companheira" de um seu co-arguido; é consumidora de produto estupefaciente, e fortemente dependente de heroína; destinava os produtos estupefacientes que adquiriu (transacções e quantidades não identificadas nem individualizadas) em parte ao seu consumo pessoal; iniciou tratamento no CAT de Leiria em 14.07.1999, tendo consultas médicas com regularidade e tratamento psicológico; não tem antecedentes criminais.

19- Tais elementos só poderiam configurar - a entender-se pela existência de matéria com dignidade penal - a previsão do artigo 26° do DL 15/93, ou na pior das hipóteses, na previsão do artigo 25° do mesmo diploma.

20- O tribunal não relevou factos que deu como provados, demonstrativos do anterior comportamento da Arguida, licenciada em Línguas e literaturas Modernas, não atendendo como devia aos valores que inspiram a determinação da medida da pena ( adequação da pena á medida da culpa e ás demais circunstâncias concretas do agente a da acção) e os fins das penas ( art . 40°, n° 1 e 2 do CP ); 21- Violou, por isso o Tribunal o disposto, entre outros, nos art.61.al. c), 126° nº3, 127,188°nº3, 189, 343, 355, 360. 361, 369° e 370° do CPP, art.70, 71 e 73° do Código Penal, arts.21, 25° e 26° do DL. 15/93 de 22 de Janeiro e arts.32 e 34° da CRP.

Arguido BB 1- O Arguido foi condenado pela prática, em autoria material e na forma consumada, de um crime de tráfico de estupefacientes, p. e p. pelo art. 21, nº 1 do Dec - Lei nº 15/93, de 22/01, com referência à tabela l-C ao mesmo, na pena de quatro anos e seis meses de prisão.

2- Foi apreendido produto estupefaciente ao arguido/recorrente - haxixe -, designado como uma "droga leve", por isso, considerado como um dos produtos estupefacientes menos perniciosos à saúde dos cidadãos.

3- Não foi considerado provado pelo tribunal recorrido da 1 a instância, que ao arguido/recorrente fosse imputada a venda directa de produto estupefaciente, designadamente haxixe, a consumidores.

4- O tribunal a quo considerou o arguido/recorrente como consumidor de haxixe, que efectivamente era desde muito novo.

5- O crime pelo qual foi qualificado, quanto a nós erradamente, o ilícito praticado pelo arguido/recorrente, encontra-se previsto e punido no artigo 21 do D.L. 15/93 de 22/01.

6- A base deste ilícito " ... está projectado para assumir a função típica de acolhimento dos casos de tráfico de média e grande dimensão, tanto pela larga descrição das variadas acções típicas, como pela amplitude dos limites da moldura penal, que indiciam a susceptibilidade de aplicação a todas as situações, graves e mesmo muito graves, de crimes de tráfico" (Cfr.Ac.do STJ de 4/512005, proferido no âmbito do Proc. 05P4737, in ); 7- Pelo que os factos provados devem ser subsumidos à regra do art.25° do Decreto-lei 15/93 de 22/1.

8- A circunstância de estar eu causa uma droga "leve", associada ao facto de não se ter provado que o arguido BB tenha colaborado a venda directa de estupefaciente aos consumidores, não se pode afigurar irrelevante ao contrario do que entende o douto acórdão recorrido.

9- Pois que, tais factos devem ser ponderados e não considerados irrelevantes para a determinação da medida da pena a aplicar ao arguido/recorrente 10- A ilicitude dos factos, salvo melhor entendimento, mostra-se consideravelmente diminuída, tendo em conta as circunstâncias específicas, objectivas e factuais, verificadas na acção concreta, sendo certo que, não se tendo provado que o arguido tivesse colaborado com o arguido AA, na venda de produto estupefaciente directamente aos consumidores.

11- Por outro lado, tal como resulta do disposto no art. 25° DL 15/93 de 22/1, o privilegiamento do crime de tráfico de estupefacientes verifica - se, atento a quantidade e qualidade de produto estupefaciente detido e as modalidades de cometimento do crime, tendo em conta que considera ainda que o douto acórdão recorrido que o grau de ilicitude é um pouco abaixo da média.

12- A pena aplicada ao arguido BB, atendendo ao caso em concreto não considera o referido no...

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