Acórdão nº 07B2373 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 29 de Janeiro de 2008

Magistrado ResponsávelMARIA DOS PRAZERES PIZARRO BELEZA
Data da Resolução29 de Janeiro de 2008
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam, no Supremo Tribunal de Justiça: 1. Em 14 de Julho de 2003, AA e mulher, BB, intentaram, no Tribunal da Comarca de Lousada, uma acção de divisão de coisa comum contra CC e mulher, DD.

Para o efeito, alegaram que, por escritura pública de partilha da herança de EE e FF, lavrada em 23 de Agosto de 1983, lhes foi adjudicada "metade indivisa do prédio urbano descrito na verba 1, em anexo à referida escritura (...) sendo que a outra metade foi adjudicada ao aqui Réu marido"; que, de qualquer modo, "sempre por si e antepossuidores haviam adquirido a respectiva propriedade por usucapião", que disseram invocar "para todos os devidos e legais efeitos", por estarem na sua posse, por si, "há mais de 15 anos" e, "por si e antepossuidores (...) há mais de 20 anos", durante os quais ininterruptamente se comportaram, objectiva e subjectivamente, como seus proprietários, publicamente e sem qualquer oposição, e na convicção de não causar prejuízo a ninguém; que actualmente, o prédio, descrito na Conservatória do Registo Predial de Lousada "sob parte no nº 20.607, fls. 32, Livro B-4, e inscrito na matriz urbana (nova) sob o artigo 1540, da freguesia de Meinedo", se encontra "ainda uno e indiviso, é composto por duas casas, distintas, com capela, anexos e logradouros juntos e caminho de servidão"; que já tinham "apresentado na Conservatória do Registo Predial de Lousada o registo a seu favor, da transmissão de metade do citado prédio"; e, finalmente, que o "imóvel é passível de divisão".

Pediram, assim, que se decidisse que o prédio é divisível e que se procedesse à respectiva divisão em substância, nos termos dos artigos 1052º e segs. do Código de Processo Civil.

Na contestação, os réus vieram dizer que, apesar de sempre ter havido acordo entre todos os herdeiros no sentido de que a metade poente do prédio ficasse a pertencer ao autor e a metade nascente ao réu, a adjudicação foi feita em comum porque o "prédio estava inscrito num único artigo matricial, não sendo então possível dividi-lo em concreto e adjudicar separadamente cada uma das duas partes.

Segundo afirmaram, essa vontade comum a todos os herdeiros constava já de um contrato-promessa de partilha celebrado, após a morte de sua mulher, EE, entre FF e seus filhos, em 11 de Agosto de 1976, data a partir da qual o autor AA e o réu CC "entraram na posse da sua metade do prédio em causa que, por acordo entre todos os herdeiros, assim foi concretizada e aos mesmos foi adjudicada", e que desde então, a passaram a utilizar, ininterrupta, pacífica e publicamente, como "verdadeiros proprietários", realizando obras de conservação e melhoramento e nela fazendo a sua residência, "com conhecimento e consentimento de todos os herdeiros", com a consciência de não estarem a prejudicar ninguém.

Disseram, ainda, que as duas metades do prédio eram divididas por um caminho que se situava na parte deles, réus, e que era utilizado como servidão pelos autores.

Deste modo, "se outro título não tivessem, os Réus contestantes teriam adquirido, por usucapião, o direito de propriedade sobre a descrita metade nascente do prédio (...), o que expressamente se invoca, para os legais efeitos", tal como, "do mesmo modo e em circunstâncias idênticas, os Autores adquiriram o direito de propriedade sobre a mencionada metade poente do prédio em causa".

Consequentemente, sustentaram que o pedido de divisão não podia proceder porque o prédio já se encontrava dividido desde 11 de Agosto de 1976, data da promessa de partilha.

Finalmente, os réus descreveram as diversas obras que realizaram na parte do prédio que consideram sua (nomeadamente transformando em casa de habitação uma construção nela existente), e que entendem ter valor muito superior a essa mesma parte, o que sempre lhes permitiria adquirir a correspondente propriedade por acessão imobiliária.

Replicando, os autores, por entre o mais, alegaram que, em 3 de Junho de 1988, os réus propuseram contra eles uma acção de divisão do mesmo prédio, que não veio a ser julgada quanto ao mérito por ter sido declarada extinta a instância, mas cuja propositura revelaria, por um lado, que os agora réus consideravam então que o prédio se encontrava em regime de compropriedade e, por outro, que as partes não estavam de acordo quanto ao modo de efectuar a divisão; que o caminho referido pelos réus "é um caminho de servidão", na verdade, mas que também serve outros prédios, como ficou estabelecido na escritura de partilha, e que onera o prédio comum; que contestaram muitas das obras realizadas pelos réus, assim se opondo à posse que estes vêm exercendo sobre o lado nascente do prédio; e que os réus não registaram a seu favor qualquer aquisição.

Pelo despacho de fls. 93, foi determinado que a acção prosseguisse, nos termos do nº 3 do artigo 1053º do Código de Processo Civil.

Por sentença de 17 de Fevereiro de 2006, de fls. 255, a acção foi julgada improcedente, por não se verificar "um dos requisitos essenciais para a procedência da presente acção - a compropriedade".

O tribunal entendeu que os réus provaram a aquisição, por usucapião, do direito de propriedade sobre a metade nascente do prédio; e que os próprios autores, ao alegar a aquisição, também por usucapião, reconheceram a falta daquele mesmo requisito; não tendo, porém, pedido que fosse reconhecido, a seu favor, o direito de propriedade correspondente, restava-lhes, se assim entendessem, propor uma acção de reivindicação para o efeito.

Esta sentença veio, porém, a ser revogada pela Relação do Porto de 12 de Dezembro de 2006, de fls. 332.

Em primeiro lugar, e na sequência da impugnação, pelos apelantes, da decisão sobre alguns pontos da matéria de facto, a Relação alterou a decisão da 1ª instância relativamente a determinados factos e concluiu que "Assim fixado o quadro de facto sobre que deve aplicar-se o direito, verifica-se que os réus não demonstraram factos de que resulte terem exercido sobre a metade nascente do mencionado prédio, posse boa para usucapião. Efectivamente, para além da referida oposição do autor, o réu actuou sem revelar que agia com intenção de exercer, como seu titular, o direito de propriedade sobre a metade nascente do prédio. Antes pelo contrário, em acção dirigida contra os aqui autores, foi a juízo pedir a divisão do prédio, pretensão que baseou na alegação de que o mesmo estava indiviso. Consequentemente, a acção, enquanto se sustenta em que o aludido prédio está em compropriedade, deve ter êxito, pelo que, nesse âmbito, o recurso é bem fundado".

Em segundo lugar, a Relação, considerando que "a questão da divisibilidade é de conhecimento oficioso" e que "pode resultar de prescrição da lei", julgou que o prédio era indivisível, porque, "visto o disposto no (...) artº 6º do DL 555/99, de 16 de Dezembro, o prédio a dividir tem de confrontar com uma via pública, o que aqui não se verifica".

Assim, julgou "a apelação procedente na parte respeitante à questão da indivisão do prédio", revogando a sentença recorrida; mas julgou "a acção improcedente quanto ao pedido de divisão em substância", e determinou que os autos prosseguissem "nos termos do artº 1056º nº 2 do C.P.C.", apesar de os autores apenas terem pedido a "divisão em substância"(cfr. nº 1 do artigo 1052º do Código de Processo Civil).

  1. Quer os autores, quer os réus, recorreram para o Supremo Tribunal de Justiça; ambas as revistas foram admitidas, com efeito devolutivo e subida imediata, nos próprios autos.

    O recurso interposto pelos autores veio, todavia, a ser julgado deserto, por falta de alegações (cfr. despacho de fls. 379).

    Os réus concluíram a sua alegação da seguinte forma: "1º- O prédio em causa já não se encontra em compropriedade, tendo sido dividido por acordo constante da promessa de partilha outorgada entre os herdeiros de EE, entre os quais os aqui Autores e Réus, em 11-8-1976, ficando a pertencer ao Autor...

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