Acórdão nº 01504/05.4BEVIS de Tribunal Central Administrativo Norte, 02 de Abril de 2009

Magistrado ResponsávelDr
Data da Resolução02 de Abril de 2009
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: 1.

RELATÓRIO ESTADO PORTUGUÊS, representado pelo MINISTÉRIO PÚBLICO, inconformado, veio interpor recurso jurisdicional da decisão do TAF de Viseu, datada de 27/07/2008, que no âmbito da acção administrativa comum, sob a forma ordinária, para efectivação de responsabilidade civil extracontratual contra o mesmo movida por V…, devidamente identificado nos autos, o condenou a pagar a este a quantia de 8500,00€ (oito mil e quinhentos euros e zero cêntimos), quantia essa acrescida de juros de mora, à taxa legal, desde a citação e até integral pagamento.

Formula o recorrente nas respectivas alegações (cfr. fls. 450 e segs.

- paginação processo suporte físico tal como as referências posteriores a paginação salvo expressa indicação em contrário) as seguintes conclusões que se reproduzem: “...

1 - O Autor pretende efectivar a responsabilidade civil extracontratual por acto ilícito, decorrente do despacho n.º 63/2002 do Comandante Geral da GNR de 15/11/2002, determinando a transferência do Autor da Brigada de Trânsito para a Unidade Territorial e que veio a ser revogado em 18/11/2003 por despacho do Secretário de Estado Adjunto do Senhor Ministro da Administração Interna, por ter entendido que se encontrava inquinado de vício de forma por falta de fundamentação.

2 - Trata-se da responsabilidade civil extracontratual prevista no DL 48051 de 21 de Novembro, a qual, com é consabido, de acordo com jurisprudência constante do STA, assenta nos mesmos pressupostos civilísticos - constantes do art. 483.º e seguintes do Código Civil.

3 - São eles: o facto, a ilicitude, a culpa, o dano e o nexo de causalidade entre a prática do facto (acto ou omissão) e o dano apurado.

4 - Ora, no caso concreto, não se verificam se verifica a ilicitude e o nexo de causalidade entre os factos e os danos.

5 - O acto revogatório teve como fundamento apenas o vício de falta de fundamentação do despacho de 15/11/2002 6 - A ser assim, este vício de forma na modalidade de insuficiência de fundamentação, que torna o acto anulável, não dá origem a qualquer direito de reparação por eventuais danos subsequentes.

7 - Com efeito, reconhecida a ilegalidade apontada, o órgão de que profanou sempre o poderia reelaborar, expurgando-o do vício que o afectava, uma vez que este não extingue necessariamente todos os efeitos consequentes ao acto revogado, podendo ser retomado o procedimento para a prática de acto isento de deficiência; o que não ocorreu neste caso em virtude de, expressamente, a entidade competente ter restituído o interessado à situação anterior à sua execução - Neste sentido GOMES CANOTILHO, in “O Problema da Responsabilidade do Estado por Actos Ilícitos”, pág. 75, e MÁRIO ESTEVES OLIVEIRA, in CPA, Anotado, 2.ª edição, Almedina, pág. 692 - Anotação ao art. 145.º, n.º 2. 8 - Além disso o conceito de ilegalidade é diferente do da ilicitude, exigindo-se para a verificação deste, pelo menos que o fim das normas violadas seja também o da defesa dos lesado e haja violação dos direitos subjectivos e outras posições jurídicas positivas que justifiquem o pagamento da indemnização reclamada - vide Ac. STA de 1/7/97, Rec. 41588.

9 - A não ser assim, o mero vício de forma prevalecente não gera a obrigação de indemnizar, visto que não se pode seriamente inferir, atentos os elementos disponíveis, que a decisão seria diversa, se adoptado a correcto formalismo procedimental - ibidem.

10 - É, pois, entendimento pacífico, quer na doutrina, quer na jurisprudência, “a falta de fundamentação dos actos administrativos, em princípio, apenas é idónea para suportar o pedido de indemnização daqueles danos que para o destinatário do acto decorram da falta de explicitação dos motivos de facto e de direito de decisão administrativa em causa. Não podendo ser erigida em causa de pedir quando se pretenda o ressarcimento dos efeitos desfavoráveis decorrentes do conteúdo decisório do acto considerado, isto é, da lesão (privação total ou parcial) das utilidades de carácter substantivo, pretensamente adjudicadas ao sujeito em causa pelo ordenamento jurídico (os seus direitos ou interesses legalmente protegidos) ” (cf., neste sentido, por todos, Ac. do STA, de 8/5/97 (Recurso n.º 029943)) 11 - Nesta conformidade, tendo o despacho do Senhor Comandante da GNR, que o Autor reputa lesivo dos seus interesses, sido revogado, expressamente, com fundamento em vício de forma, por deficiente fundamentação, e não possuindo tal vício, por si só, aptidão para afectar, negativamente, no plano substantivo, o conteúdo decisório do acto, os danos que o Autor invoca não são ressarcíveis.

12 - A sentença recorrida violou, pois, o disposto no art. 483.º, n.º 1 do Código Civil que contém o princípio geral da responsabilidade civil por factos ilícitos.

13 - Igualmente não ficou, a nosso ver, demonstrado que exista um nexo de causalidade entre a conduta que o autor reprova, da Administração, e os danos que reclama.

14 - Refere o art. 563.º do Código Civil que “a obrigação de indemnizar só existe em relação aos danos que o lesado provavelmente não teria sofrido se não fosse a lesão”, consagrando assim a teoria da causalidade adequada.

15 - Como bem observa a Dra. Margarida Cortez, em comentário ao Ac. do STA, de 1/7/97 - Rec 41588 (in Cadernos de Justiça Administrativa, n.º 7, pág., 38 - “(…) os vícios de forma não constituem uma ilegalidade sob o ponto de vista da ilicitude (…) Nestes casos, para “além de falecer o pressuposto da ilicitude, está também ausente (…) o da causalidade, porquanto a ilegalidade em questão não figura sequer como condição - e muito menos como causa adequada - do prejuízo eventualmente sofrido que se teria verificado independentemente dela”, esclarecendo mais adiante que: “no âmbito da actualidade jurídica da Administração, a relação de causalidade se estabelece, não entre o dano o acto administrativo no seu todo, mas entre o dano e a específica ilegalidade cometida”, acabando por concluir que “a ilegalidade formal não pode ser havida como causa adequada dos danos, nem sequer como condição deles, uma vez que eles teriam ocorrido ainda que a actuação da Administração fosse irrepreensível sob o ponto de vista da legalidade”.

16 - Na senda desta doutrina, e de acordo com o entendimento nela veiculado, verificamos que o tribunal a quo, não deveria ter considerado que os danos peticionados foram consequência adequada do acto administrativo praticado pela Administração.

17 - Falece, pois, o nexo causal, em termos de causalidade adequada, motivo pelo qual a acção não deveria ter sido julgada procedente, como foi.

18 - Por todo o exposto, inexistindo o nexo causal entre o facto lícito e os danos, não deverá o Réu ser condenado a indemnizar … Autor…, devendo, antes, ser absolvido do pedido.

19 - Foram violados, para além dos acima citados, os arts. 483.º, n.º 1, e 563.º do Código Civil ...

”.

O A., aqui recorrido, apresentou contra-alegações (cfr. fls. 463 e segs.), nas quais conclui [corrigida a sua numeração, oficiosamente dado o manifesto lapso de escrita, a partir da repetição dos n.ºs 4) e 5)] nos seguintes termos: “… 1 - A actuação do réu foi ilícita, culposa, e lesiva dos direitos do autor, como resulta dos factos considerados provados na douta sentença recorrida; 2 - Desta actuação resultaram danos na esfera jurídica do autor que merecem tutela jurídica; 3 - Assim foi o entendimento da douta sentença recorrida, que condenou o réu, Estado Português, a pagar ao autor €5.000 por danos morais, €2.000 por danos patrimoniais, bem como €1.500,00 por acréscimo de despesas com alimentação e deslocação, perfazendo um total de €8.500,00, quantia acrescida de juros de mora, à taxa legal, devidos a partir da citação e até integral pagamento; 4 - Vem invocar o réu, ora recorrente, sumariamente, que o acto administrativo sub judice não teria sido ilícito, e menos culposo, apenas ilegal por vício de forma assente na falta de fundamentação, pelo que não haveria responsabilidade civil e, consequentemente, não haveria obrigação de indemnizar; 5 - Esta tese assenta no pressuposto de que o acto administrativo que determinou a transferência do militar, ora autor recorrido padecia apenas dos vícios que a própria Administração lhe reconheceu para o revogar: vícios formais, designadamente, de falta de fundamentação; 6 - Contudo, como se retira dos factos considerados provados, o acto padecia ainda de outros vícios: falta de audiência prévia, falta de notificação, desvio de poder, violação do princípio da igualdade, vícios estes que consubstanciam ilicitude, culpa, danos na esfera jurídica do autor e nexo de causalidade; 7 - Na verdade, a suposta fundamentação apresentada no Despacho do Exm.º Sr. Comandante da BT não tem qualquer razão de ser nem apresenta um mínimo de sustentabilidade, como bem demonstra o facto de o referido Despacho ser exactamente igual, com excepção do nome do militar a quem vai dirigido, aos restantes 150 Despachos exarados com o mesmo objectivo pelo Exm.º Sr. Comandante da BT, destinados a cada um dos vários militares transferidos pelo mesmo Despacho do Exm.º Sr. Comandante Geral, o que revela a inexistência de um mínimo de correspondência entre o seu teor e a verdade (a não ser que a conduta de todos os militares agora transferidos fosse exactamente igual e padecendo exactamente dos mesmos defeitos, o que nos parece ser, não só pouco plausível, mas mesmo totalmente impossível, como muito bem faz eco a douta sentença do tribunal a quo, de que o réu ora recorre; 8 - A confirmar, sem sombra para dúvidas, quer a inveracidade das acusações patentes no Despacho do Exm.º Sr. Comandante da BT, quer a inexistência de reais razões para a transferência do autor, está o facto de o réu não lhe ter, nem aberto um processo disciplinar, nem o ter sujeito a novo acto de transferência para fora da BT; 9 - Verifica-se ter-se tratado de uma verdadeira transferência com intenções...

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