Acórdão nº 01664/05.4BEPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 16 de Outubro de 2008

Magistrado ResponsávelDr
Data da Resolução16 de Outubro de 2008
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: 1.

RELATÓRIO “CAIXA GERAL DE DEPÓSITOS, SA”, inconformada, veio interpor recurso jurisdicional da decisão do TAF do Porto, datada de 31/05/2007, que julgou procedente a acção administrativa especial contra a mesma instaurada por J..., devidamente identificado nos autos, na qual este peticionava a anulação da deliberação do Conselho de Administração da CGD de 18/05/2005 que decidiu aplicar ao Autor a sanção disciplinar expulsiva de despedimento com justa causa.

Formula, nas respectivas alegações (cfr. fls. 135 e segs.

- paginação processo em suporte físico tal como as referências posteriores a paginação salvo expressa indicação em contrário), as seguintes conclusões: “… 1. Aos trabalhadores ligados à Caixa Geral de Depósitos por vínculo de função pública aplica-se o Regulamento Disciplinar dos Funcionários Civis, aprovado pelo Decreto de 22 de Fevereiro de 1913 e o Decreto n.º 19.468, de 16 de Março de 1931.

  1. Impõe-se saber se a decisão de “despedimento” sem justa causa aplicada ao Recorrido, pela ora Recorrente, constitui um acto administrativo inválido, ou se, pelo contrário, constitui um acto administrativo válido.

  2. No Plano substantivo não é relevante a discrepância terminológica entre a pena de demissão (artigo 6.º, n.º 10.º do Regulamento de 1913) e a sanção de despedimento imediato sem qualquer indemnização ou compensação (alínea e) do n.º 1 do artigo 27º RJCC Trabalho, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 64-A/89, de 27 de Fevereiro).

  3. A sanção de despedimento aplica-se, em geral, ao “comportamento culposo do trabalhador que, pela sua gravidade e consequências, torne imediata e praticamente impossível a subsistência da relação de trabalho”, (artigo 9.º do regime aprovado pelo citado Dec-Lei n.º 64-A/89).

  4. São especialmente determinantes da aplicação da pena de demissão os “factos ou actos desonrosos”, a “aceitação de promessas ou dádivas, ou participação em lucros antes da marcha ou resolução de negócios pendentes na repartição em que servir o empregado” e a “repetida prática de actos de manifesta deslealdade contra a República” (ou no caso, contra a CGD).

  5. A dualidade terminológica nada acrescenta, pois os efeitos da sanção de despedimento e da pena de demissão são os mesmos.

  6. Com a demissão impõe-se ao agente o afastamento definitivo e completo do serviço, rompendo-se todas as relações estabelecidas.

  7. Com o despedimento extingue-se o contrato, rompendo-se a relação contratual estabelecida.

  8. A extinção da relação jurídica de emprego (pena de demissão) é precisamente aquilo que também marca o conteúdo jurídico da sanção de despedimento.

  9. Assim, ao aplicar uma sanção disciplinar, dita de despedimento, ao Recorrido, o Conselho de Administração da Recorrente não violou o artigo 6.º do Decreto de 22 de Fevereiro de 1913.

  10. Com efeito, a demissão, enquanto pena disciplinar, e o despedimento por justa acusa, enquanto sanção disciplinar, significam a constituição do mesmo efeito jurídico na esfera do destinatário: cessação do vínculo de emprego fundada em grave incumprimento culposo do trabalhador que torne prática e imediatamente impossível a subsistência das relações que tal vínculo supõe.

  11. A possibilidade de o funcionário demitido ser contratado para lugar diferente, está prevista no Regulamento Disciplinar da função pública de 1984, mas tal Regulamento não é aplicável na Caixa Geral de Depósitos, pelo que não releva como parâmetro de validade, ou de invalidade, do acto jurídico a que foi dado o nome de despedimento.

  12. A admissibilidade de reabilitação profissional após o decurso de seis anos, também não integra o regime disciplinar aplicável na CGD, pois tal figura está integrada, apenas, no Estatuto Disciplinar aprovado pelo Dec-Lei n.º 24/84, que, repete-se, não se aplica na CGD.

  13. A possibilidade de revisão das penas encontra-se prevista nos artigos 40.º a 44.º do Regulamento de 1913, aplicável na CGD, mas também este tópico não releva como parâmetro de validade do acto jurídico a que foi dado o nome de despedimento, 15. Pois, se mais tarde, depois de lhe ter sido aplicada a pena de despedimento o respectivo funcionário vier requerer a revisão do processo disciplinar, e essa revisão lhe fosse recusada, tal eventual recusa constituiria um acto administrativo viciado de violação de lei por erro num pressuposto de direito.

  14. Quanto às circunstâncias atenuantes, previstas e enumeradas no artigo 8.º do Regulamento de 1913 o certo é que a lei laboral não enumera qualquer circunstância atenuante, 17. Assim, se tiverem sido invocadas circunstâncias atenuantes pelo arguido e o Conselho de Administração da Recorrente não as tiver ponderado, sendo as mesmas relevantes para a determinação e graduação da pena, haverá, ou não, um défice de ponderação, com a consequente invalidade da decisão disciplinar, consoante tais circunstâncias atenuantes não tenham sido, ou tenham sido, ponderadas.

  15. Só que, no caso sub judice, tal não aconteceu pois, quer o Instrutor do Processo Disciplinar, no Relatório Final, quer o Conselho de Administração da ora Recorrente, na Deliberação punitiva, fizeram uma ponderação expressa das circunstâncias atenuantes que concorriam a favor do arguido.

  16. Quanto à aplicabilidade da pena expulsiva de aposentação obrigatória, prevista no Decreto n.º 19.468, de 16 de Março de 1931, o certo é que tal pena só poderia ser aplicada, como castigo ou pena disciplinar, nos termos previstos no citado Decreto n.º 19.468, que não abrange a situação disciplinar que se discute nos autos.

    Com efeito, 20. De harmonia com o disposto no artigo 1.º, n.º 3.º, e parágrafos 1.º e 3.º do citado Decreto n.º 19.468, a “aposentação obrigatória” só pode ser aplicada “por castigo imposto ao funcionário em processo disciplinar de que não resulte a pena de demissão, ...” 21. E o respectivo funcionário tenha sido “punido, em processo disciplinar com qualquer das penas dos n.ºs 8.º e 9.º do artigo 6.º do regulamento disciplinar dos funcionários civis, de 22 de Fevereiro de 1913”, 22. E, ainda, “quando o funcionário tenha já adquirido o direito à aposentação”.

    Ora, 23. Se no caso sub judice, o Conselho de Administração da ora Recorrente tivesse aplicado ao Recorrido o regulamento disciplinar dos funcionários civis, de 22 de Fevereiro de 1913 e o Decreto n.º 19.468, de 16 de Março de 1931, caberia à infracção disciplinar cometida pelo Recorrido a pena disciplinar de demissão prevista no n.º 10.º do artigo 6.º daquele regulamento disciplinar, 24. Pois, dada a natureza e a gravidade das infracções cometidas pelo arguido e apuradas no Processo Disciplinar que lhe foi movido pela ora Recorrente, a única pena disciplinar que lhe poderia ser aplicada seria a pena de demissão, prevista no citado n.º 10.º do artigo 6.º do Regulamento de 1913 e nenhuma outra.

  17. Aliás, o Recorrido assume que se locupletou, em proveito próprio, com a importância global de 701,36 €, que pertencia à Recorrente, o que evidencia a comprovada gravidade da infracção disciplinar por ele cometida.

  18. A conduta do Recorrido, descrita nos artigos 1.º a 10.º da Nota de Culpa, para além de integrar a prática de infracções disciplinares graves, constitui ainda matéria para procedimento criminal, 27. Uma vez que o Recorrido se apropriou, de forma fraudulenta, abusiva, ilegítima e ilegal da quantia de 701,36€, que bem sabia não lhe pertencer, constituindo-se na obrigação de reembolsar a Caixa por aquela quantia.

    Ora, 28. Se se tivesse aplicado o Regulamento Disciplinar constante dos Decretos de 1913 e de 1931, supra identificados, o Recorrido teria sido punido, face à natureza das infracções disciplinares por si cometidas, com a pena de demissão prevista no n.º 10.º do artigo 6.º do Regulamento de 1913, 29.

    Ficando assim e desde logo afastada a possibilidade de lhe ser aplicada a pena de aposentação obrigatória prevista no Decreto de 1931, supra identificado.

    Mas mais, 30. Como decorre do parágrafo 3.º do artigo 1.º do citado Decreto n.º 19.468, de 16 de Março de 1931, a pena disciplinar de aposentação obrigatória também não lhe poderia ser aplicada por o Recorrido não reunir mais um dos requisitos considerado, pela lei, como requisito indispensável para a aplicação te tal pena: que o funcionário tenha já adquirido o direito à aposentação.

  19. Ora, o Recorrido não tinha ainda adquirido o direito à aposentação, pois, neste caso, e para os efeitos da aplicação da pena de aposentação obrigatória, prevista no Decreto n.º 19.468, de 16 de Março de 1931, era necessário que o Recorrido já tivesse 60 anos de idade e 36 anos de serviço, 32. O que efectivamente não sucedia (cf. Doc. n.º 1 junto com a p.i.), pois o Recorrido tinha apenas 38 anos de idade e 14 anos de serviço (protesta-se juntar documento da Caixa Geral de Aposentações, comprovativo destes dados).

  20. O Recorrido não reunia, pois, os requisitos necessários para que lhe pudesse ser aplicada a pena disciplinar de “aposentação obrigatória”, prevista no artigo 1.º, n.º 3.º, e parágrafo 3.º, do mesmo artigo, do Decreto n.º 19.468, de 16 de Março de 1931.

  21. Assim, o Conselho de Administração da ora Recorrente não tinha que fazer, nem aliás podia fazer, a ponderação sobre qual a pena expulsiva que deveria aplicar ao ora Recorrido: a pena de demissão, que efectivamente lhe aplicou (embora sob a designação de despedimento), ou a pena de aposentação obrigatória, que não lhe era aplicável.

  22. Não se verificou, pois, qualquer défice de ponderação.

  23. No plano procedimental, mais do que os preceitos formalmente invocados, do que a sua inserção no Direito Público ou no Direito Privado, aquilo que verdadeiramente importa é saber se as imposições decorrentes do Decreto de 22 de Fevereiro de 1913 e do Decreto n.º 19.468, de 16.03.1931 foram ou não integralmente observadas.

  24. No caso em apreço foram integralmente respeitadas todas as formalidades impostas pelo regulamento disciplinar de 1913 e pelo Decreto n.º 19.468, de...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT