Acórdão nº 08P3175 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 26 de Novembro de 2008

Magistrado ResponsávelRAUL BORGES
Data da Resolução26 de Novembro de 2008
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

No âmbito do processo comum colectivo n.º 924/97.0PBVIS do 1º Juízo Criminal de Viseu, o arguido AA melhor identificado nos autos, foi submetido a julgamento por factos cometidos em 7 de Agosto de 1997 (roubo) e 9 de Junho de 1998 (ofensas), sendo condenado, por acórdão do Colectivo do Círculo Judicial de Viseu, de 1 de Abril de 2004, como autor de um crime de roubo, p. p. pelo artigo 210º, n.ºs 1 e 2, alíneas a) e b) do Código Penal, na pena de 6 anos e 6 meses de prisão, e de um crime de ofensa à integridade física, p. p. pelo artigo 143º, n.º 1, do Código Penal, na pena de 10 meses de prisão, e em cúmulo jurídico, na pena única de 7 anos de prisão.

Interposto recurso para o Tribunal da Relação de Coimbra, por acórdão de 14-07-2004 (fls. 1198 a 1201 do 6º volume), foi o mesmo rejeitado por intempestivo e por acórdão do STJ, de 09-12-2004 (fls. 1269/1271), foi rejeitado por manifesta falta de fundamento.

Posteriormente, em acórdão do Colectivo do Círculo Judicial de Viseu (fls. 1476 a 1482 do 7º volume), de 3-10-2005, foi realizado cúmulo jurídico com as penas impostas no presente processo e nos processos 93/99 do 2º Juízo de Santa Comba Dão, 103/00.1TBSPS do Tribunal Judicial de São Pedro do Sul, 67/99.2GCTND, do 1º Juízo de Tondela, 63/00.9PECBR do 3º Juízo do Tribunal Judicial de Coimbra e 5/01.4TATND do Tribunal Judicial de Tondela (ex-81/2001), tendo sido fixada a pena única de 8 anos e 6 meses de prisão.

Na sequência do requerimento apresentado pelo arguido em 05-12-2007, a fls. 1735 dos autos e ao abrigo do disposto no artigo 371°-A, do C.P.P., foi realizada a audiência a que alude o artigo 472° do C.P.P.

Por acórdão de 14 de Março de 2008, constante de fls. 1801 a 1806, foi deliberado: - Reformular o cúmulo jurídico já efectuado no âmbito dos presentes autos (no acórdão de 3 de Outubro de 2005) e, consequentemente, condenar o arguido nas seguintes penas únicas: - Na pena única de 9 anos e 10 meses de prisão decorrente do cúmulo jurídico efectuado entre as penas parcelares que lhe foram aplicadas no C.C. 94/99.0OTATND (2 anos de prisão e 1 ano e 8 meses de prisão), nos presentes autos (6 anos e 6 meses de prisão e 10 meses de prisão) e nos processos n.º 93/99, do 2º Juízo do Tribunal de Santa Comba Dão (7 meses de prisão), n.º 67/99.2GCTND (1 ano de prisão) e n.º 63/00.9PECBR (4 meses de prisão por cada um dos dois crimes).

- Na pena única de 8 meses de prisão decorrente do cúmulo jurídico efectuado entre as penas aplicadas nos processos n.º 103/00.1 do Tribunal Judicial de S. Pedro do Sul e n.º 5/01.4TATND, do 1º Juízo do Tribunal Judicial de Tondela, a cumprir sucessivamente.

- No cômputo das duas penas únicas aplicadas ao arguido, a cumprir autónoma e sucessivamente, ter-se-á em conta o tempo de prisão já sofrido pelo arguido à ordem dos processos cujas penas foram englobadas nos respectivos cúmulos (sublinhados nossos).

Inconformado, o arguido interpôs recurso para o Tribunal da Relação de Coimbra, apresentando a motivação de fls. 1861/2, que remata com as seguintes conclusões (em transcrição): 1. Considerando-se que houve violação das regras dos art.° 77.° 1 e 2 e art.° 78.° n.º s 1 e 2 do C.P. e violação do principio da aplicação de lei mais favorável para o arguido.

  1. Devia ter sido aplicado o regime anterior.

  2. Uma vez que não teve o douto acórdão em conta o total das penas já cumpridas.

  3. Assim deveria ter entrado para efeitos de cúmulo a referida pena a condenação sofrida no processo 104/91 e tal não aconteceu.

  4. Numa primeira teoria deveria ter sido em conta a pena, consequentemente já não, não se percebendo afinal a fundamentação.

  5. O mesmo se passou para efeitos de realização de dois cúmulos jurídicos.

  6. E o segundo cúmulo jurídico feito com base numa pena suspensa, que não foi revogada, processo n.º 103/00.1 do Tribunal Judicial de S. Pedro do Sul e 5/01.4 TAND do 1.º Juízo Criminal do Tribunal de Tondela.

  7. O douto Tribunal entendeu que seria de fazer dois cúmulos jurídicos o que se entende que só prejudica o arguido, não é a lei mais favorável a aplicada, ao contrário do afirmado.

  8. A lei anterior é a mais favorável.

  9. Assim pede Justiça e que seja anulado o segundo cúmulo jurídico efectuado e seja aplicada uma pena única, resultante de um único cúmulo jurídico.

  10. De 8 anos e seis meses de acordo com o cúmulo jurídico anterior a cumprir a partir 2002.

No provimento do recurso, pede a revogação do acórdão, refazendo-se o cúmulo, e que seja aplicada uma pena única de 8 anos e seis meses.

O Ministério Público junto do Tribunal a quo apresentou resposta, dirigida ao STJ, de fls. 1866 a 1869, concluindo: 1- O novo cúmulo jurídico foi efectuado ao abrigo do art. 371º-A do CPP, ou seja, no pressuposto que da aplicação da nova lei o condenado sairia beneficiado, pois de outro modo não havia razão para substituir a decisão; 2 - Em sede de punição do concurso de crimes, a única alteração produzida desde a anterior decisão sobre o cúmulo jurídico de penas, em relação à lei anterior, decorreu da Lei 59/2007 que, de acordo com o novo art. 78º, nº 1 do C. Penal, impõe que, agora, também, as penas cumpridas sejam incluídas no cúmulo jurídico; 3 - Assim, resultando dessa alteração uma pena que no seu conjunto é mais benéfica ao condenado, não pode deixar-se de aplicar o preceito alterado; 4 - Não pode, a propósito da reabertura da audiência, ao abrigo do art. 371º A do CPP, alterar-se a decisão anterior com base em diferente entendimento sobre a interpretação de preceitos que não sofreram qualquer alteração.

Entende que deve improceder o recurso, mantendo-se a decisão proferida.

Por despacho de fls. 1870, foi admitido o recurso a subir para o Tribunal da Relação de Coimbra.

Por despacho de fls. 1884, foi ordenada a remessa dos autos ao STJ, por ser o Tribunal competente para o recurso.

Neste Supremo Tribunal de Justiça o Exmo. Procurador-Geral Adjunto emitiu douto parecer de fls. 1889 a 1893, defendendo não haver lugar à consideração da pena do processo 104/91, impor-se a efectivação de dois cúmulos por não merecer censura a rejeição do cúmulo por arrastamento, inexistirem obstáculos à inclusão no cúmulo de penas suspensas na execução, o novo regime apresentar-se mais favorável ao arguido, posto que dele resulta uma redução de 2 meses de prisão relativamente ao anterior cúmulo, não merecendo censura as penas únicas fixadas nos dois cúmulos.

Cumprido o artigo 417.º, n.º 2, do CPP, o recorrente apresentou a peça de fls. 1903/4, repetindo a posição de que a pena suspensa não deve ser integrada, enunciando alguns princípios como os constantes dos n.ºs 14 «O artº 371.º - A, é um art.º para que as penas abaixo dos 5 anos possam passar a penas suspensas e não para fazer cúmulos» e 15 «Como diz que as penas devem ser todas incluídas no cúmulo, mas num só cúmulo e não em dois como fizeram», mais insistindo em que a pena do processo 104/99 (quererá referir-se a 104/91), já está extinta, foi suspensa e não foi revogada, repetindo a pretensão já expressa no recurso e requerendo, a final, que sejam remetidos a este Tribunal todos os processos onde o arguido foi condenado, para se verificar as penas em que foi condenado, bem como os cúmulos jurídicos a que já foi sujeito.

Colhidos os vistos, cumpre apreciar e decidir.

Está-se face a decisão final de tribunal colectivo, sendo fixada pena superior a 5 anos, pretendendo-se o reexame apenas de matéria de direito, pelo que é este Supremo Tribunal competente para conhecer do recurso - artigo 432º, nº 1, alínea c), do CPP.

A decisão recorrida é uma decisão cumulatória com a especificidade de ter sido realizada a pedido do arguido ao abrigo dos artigos 2.º, n.º 4, do Código Penal e 371º - A, do CPP e daí que se coloque o problema do tratamento mais favorável.

A última definição do estatuto do arguido face às condenações sofridas fora realizada pelo acórdão de 3-10-2005.

Cumpria decidir da eventual aplicação do novo regime das regras do cúmulo jurídico, na medida em que de acordo com a actual redacção do artigo 78° do Código Penal, introduzida pela Lei n.º 59/2007, de 4 de Setembro de 2007, devem ser incluídas no cúmulo jurídico as penas cujos crimes estão em concurso, mesmo aquelas que estejam cumpridas.

Questões a decidir Face às conclusões extraídas pelo recorrente, são as seguintes as questões a decidir: 1 - A não integração no cúmulo da pena aplicada no processo 104/91; 2 - A realização de dois cúmulos jurídicos - Afastamento do cúmulo por arrastamento; 3 - A integração no segundo cúmulo de pena de prisão suspensa na sua execução; 4 - A medida da pena única; regime mais favorável.

O acórdão recorrido sustentou a decisão cumulatória no seguinte quadro: No cúmulo jurídico já efectuado tiveram-se em conta as seguintes condenações sofridas pelo arguido: I- No âmbito dos presentes autos, por decisão de 1/4/2004, transitada em julgado, e por factos ocorridos em Agosto de 1997, foi o arguido condenado como autor de um crime de roubo, p. e p. pelo art.210°, n° l e 2, als. a) e b), do C. Penal, na pena de 6 anos e 6 meses de prisão e de um crime de ofensa à integridade física, p. e p. pelo art.l43°,n°l, do C. Penal, na pena de 10 meses de prisão.

II- No âmbito do processo n°93/99, do 2º juízo do tribunal judicial da comarca de Santa Comba Dão, por factos ocorridos em 2/6/98, foi o arguido condenado, por acórdão de 30/1/2001, como autor de um crime de ofensa à integridade física, p. e p. pelo art.1430, do C. Penal, na pena de 7 meses de prisão.

III- No âmbito do processo 103/00.1 TBSPS, do tribunal judicial de São Pedro do Sul, por factos de 12/12/2000, foi o arguido condenado como autor de um crime de desobediência, p. e p. pelo art.348°, n° l, b), do C. Penal, por sentença de 29/10/2001, transitada em julgado em 23/10/2002, na pena de 3 meses de prisão.

IV- No âmbito do processo n° 67/99.2GCTND, do 1º juízo do tribunal judicial de Tondela, por factos de 3/3/99, foi o arguido condenado, por acórdão de 30/11/2001, transitado em 1/7/2002, como autor de um crime...

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