Acórdão nº 947/11.9TTPRT.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 16 de Junho de 2014
Magistrado Responsável | PAULA LEAL DE CARVALHO |
Data da Resolução | 16 de Junho de 2014 |
Emissor | Court of Appeal of Porto (Portugal) |
Procº nº 947/11.9TTPRT.P1 Apelação Relator: Paula Leal de Carvalho (Reg. 755) Adjuntos: Des. Rui Penha Des. Maria José Costa Pinto Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação do Porto: I. Relatório: Na presente ação emergente de acidente de trabalho, instaurada aos 17.06.2011, em que é A., a sinistrada B…, que, por requerimento de 24.04.2014 (fls. 199 a 203), constituiu mandatário judicial e sendo, até então, patrocinada pelo Digno Magistrado do Ministério Público, e Ré, Companhia de Seguros C…, SA, procedeu-se, na fase conciliatória do processo, a exame médico singular à mencionada sinistrada, bem como a tentativa de conciliação.
Em tal exame, levado a cabo por Sr. perito médico do Instituto de Medicina Legal, considerou-se, conforme laudo de fls. 111 e 112, que as sequelas que a sinistrada apresenta são causa de incapacidade permanente absoluta para a sua atividade habitual (IPATH), tendo-a, ainda, considerada afetada do coeficiente de desvalorização de 80,4631% de IPP (resultante do coeficiente de desvalorização de 0,5364208, multiplicado pelo fator de bonificação de 1,5), com efeitos a partir de 28.05.2013.
Na tentativa de conciliação que se lhe seguiu, a que se reporta o auto de fls. 121 a 123, as partes acordaram quanto à existência do acidente, sua caracterização como acidente de trabalho, retribuição auferida pelo sinistrado, transferência da responsabilidade pela reparação dos danos emergentes do acidente para a ré seguradora, nexo de causal entre o acidente e as lesões e data da alta definitiva.
Não se tendo, porém, as partes conciliado por discordância da Ré Seguradora que, aceitando embora que a A. se encontra afetada de IPATH, apenas aceitou a IPP residual de 53,642%, não aceitando também o pagamento da prestação suplementar de assistência de 3ª pessoa que havia sido reclamada pela sinistrada.
Requerido exame por junta médica, entenderam os Srs. Peritos médicos, por unanimidade, que a sinistrada é portadora de IPATH com um coeficiente de desvalorização de 80,463 de IPP, resultante este do coeficiente de 0,5364 de IPP multiplicado pelo fator de bonificação de 1,5; mais entenderam que a sinistrada carece de “ajuda de 3ª pessoa de 2 horas diárias”.
Após, aos 23.01.2014, foi proferida sentença que decidiu nos seguintes termos: “--condenar a “Companhia de Seguros C…, S.A.” a pagar à sinistrada B…, com efeitos a partir de 29 de Maio de 2013 (dia seguinte ao da alta) a pensão anual, vitalícia e actualizável, de € 4.589,55€, acrescida dos juros moratórios calculados à taxa legal de 4 % ao ano desde a respectiva data de vencimento até integral pagamento; --condenar a referida Seguradora a pagar à sinistrada a quantia de € 5.209,43, a quantia mensal de € 461,14 x 14 meses, e a quantia de 35,00 € acrescidas dos juros moratórios calculados à taxa legal desde as respectivas datas de vencimento até integral pagamento.”, mais decidindo fixar o “Valor da acção para efeitos de custas: € 16.289,94”.
Inconformada, veio a Ré Seguradora recorrer, formulando, a final das suas alegações, as seguintes conclusões: “1 – Os peritos médicos, no respectivo exame pericial por Junta, consideraram, com base na aplicação da Tabela Nacional de Incapacidades, que o sinistrado apresenta IPP de 53,64% com IPATH; 2 – O Tribunal recorrido entendeu corrigir a IPP atribuída, pela aplicação do factor de bonificação, invocando para tal idade da sinistrada superior a cinquenta anos.
3 – E assim, condenou a ora recorrente a pagar pensão anual e vitalícia ao sinistrado, com base na IPP de 80,4631% com IPATH.
4 – Todavia, no caso em apreço, não se cumula a pensão por IPATH com a aplicação do factor de bonificação por idade da sinistrada superior a cinquenta anos 5 – pois isso implicaria reparar duas vezes o mesmo dano.
6 – Assim, a condenação decidida nos termos da conclusão terceira deste recurso, significou, por parte do tribunal recorrido, inadequada interpretação e aplicação do ponto 5.º, alínea a) das Instruções Gerais da Tabela Nacional de Incapacidades 7 – e violação do disposto no art.º 473 n.º 1 do Código Civil, disposição que proíbe o enriquecimento sem justa causa.
Por outro lado, 8 – os artigos números 53, n.ºs 1 e 2 e 54 n.º 1 da Lei 98/2009, de 4 de Setembro devem ser interpretados no sentido de que aí se estabelece um tecto máximo dentro do qual, consoante o número de horas requeridas, se gradua e determina o montante de prestação suplementar para compensar encargos com assistência de terceira pessoa.
9 - Está, provado, no caso concreto, que a sinistrada carece de ajuda diária de terceira pessoa, de cerca de duas horas.
10 – Apesar disso, o tribunal A QUO decidiu atribuir à autora uma pensão mensal de €461,14 x 14 (ou seja, catorze vezes superior ao limite máximo previsto na lei).
11 – Com isso, violou de forma manifesta o art.º 54.º n.º 1 da Lei 98/2009, não só por ter excedido o limite máximo aí previsto, mas também porque não graduou, dentro do aludido limite, a prestação suplementar a atribuir em função das duas horas diárias (apenas) de que a sinistrada carece da ajuda de terceira pessoa.
12 – Pois a prestação suplementar para ajuda de terceira pessoa ajustada e bastante, a atribuir à autora, deverá, salvo o devido respeito, ser da ordem dos €115,285.
TERMOS EM QUE MERECE PROVIMENTO A PRESENTE APELAÇÃO E, POR VIA DELA, DEVERÁ SER PARCIALMENTE REVOGADA A DOUTA SENTENÇA RECORRIDA E SUBSTITUÍDA POR DECISÃO QUE A - CONDENE A RÉ A PAGAR PENSÃO AO SINISTRADO APENAS COM BASE NA IPP DE 53,64% COM IPATH B - REDUZA O MONTANTE MENSAL DE PRESTAÇÃO SUPLEMENTAR POR AJUDA DE TERCEIRA PESSOA, PARA A QUANTIA MENSAL DE €115,285, (…)”.
A Recorrida, ainda patrocinada pelo Ministério Público, contra-alegou pugnando pelo não provimento do recurso e tendo formulado, a final das suas alegações, as seguintes conclusões: “1º - Não há qualquer incompatibilidade entre a aplicação do factor 1,5 e a atribuição à sinistrada de IPATH; 2º - A aplicação de tal fator incide sobre a maior ou menor capacidade residual para o exercício de outra profissão compatível, sendo certo que a pensão ficará, em qualquer caso, sempre compreendida entre os limites de 50% e 70% da retribuição anual da sinistrada à data do acidente, nos termos do artº 48º, nº 3, alínea b), da Lei nº 98/2009, de 4 de setembro; 3º - Ao fixar à sinistrada uma IPP de 80,4631%, com IPATH, a Mª Juíza nesta instância apreciou livremente os laudos periciais constantes dos autos, nomeadamente, a perícia por Junta médica, em que os peritos, por unanimidade, à semelhança do que já acontecera na fase conciliatória com o perito médico do INML do Porto, consideram a sinistrada afetado com aquela incapacidade; 4º - Não há na decisão recorrida qualquer dupla valoração e indemnização de danos; 5º - A pensão fixada está conforme às regras legais e de acordo com a IPP de 80,4631%, com IPATH; 6º - Também, face ao disposto nos artigos 53º e 54º, ambos da Lei nº 98/2009, de 4 de setembro, não merece qualquer reparo a fixação da prestação suplementar para assistência a terceira pessoa no montante máximo legalmente permitido de € 461,14 x 14 meses; 7º - Na verdade a lei não estabelece um critério rigoroso e definido para a fixação daquela prestação, estabelecendo, apenas, o seu limite máximo e acrescentando que o seu valor será atualizado anualmente na mesma percentagem em que o for o IAS; 8º Tal prestação destina-se, nos termos da Lei a compensar os encargos com assistência de terceira pessoa em face da situação de dependência em que se encontre o sinistrado, concretizando-se tal dependência na impossibilidade de o sinistrado não poder, por si só, prover à satisfação das suas necessidades básicas diárias, tais como a sua higiene pessoal, a sua alimentação e locomoção; 9º - Daí que, não pode, com o faz a recorrente, na fixação de tal prestação, ater-se apenas ao período de ajuda diário que se entendeu necessário para, a partir daí, com base numa operação meramente matemática, se calcular um valor; 10º - Tendo ficado provado que a sinistrada ficou afetada com a incapacidade de 80,4631%, com IPATH e que necessita de ajuda de terceira pessoa durante cerca de duas horas diárias, e, resultando, também, dos autos que a sinistrada tinha um rendimento anual de € 6.944,14, é viúva, nasceu a 04/02/1952, era empregada doméstica e ficou com dependência de ajuda de terceira pessoa para as tarefas diárias de higiene, vestuário, limpeza e alimentação e de seguimento regular em consultas de urologia e psiquiatria, aquele montante parece – nos justo e adequado à finalidade de tal prestação; 11º Como também não merece qualquer reparo o fato de tal prestação ser prestada por 14 meses, sendo certo que a terceira pessoa que vier a prestar a assistência à sinistrada tem direito, nos temos da lei laboral, ao pagamento de 14 retribuições, nelas se incluindo os subsídios de férias e de Natal; 12º De todo o modo, e mesmo que se entenda que o montante mensal fixado é excessivo, sempre nos parece, que o montante mensal avançado pela recorrente na sua douta alegação de recurso, é insuficiente, e não se mostra de acordo com a lei, o seu espírito e teleologia, não chegando, face ao que dito fica, para que a sinistrada satisfaça os encargos com a assistência, não devendo tal montante mensal ser fixado em valor inferior a € 350,00 x 14 meses; 13º - A douta decisão recorrida está, por isso, conforme a lei e o direito, pelo que nenhuma censura merece.”.
Aberta vista, o Exmº Sr. Procurador Geral Adjunto junto desta Relação não emitiu parecer por a sinistrada ser patrocinada pelo Ministério Público.[1] Colheram-se os vistos legais.
*II. Matéria de facto dada como provada pela 1ª instância: “Por acordo das partes
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O acidente sofrido pela Sinistrada, em 02 de Junho de 2011, tem natureza laboral.
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Existe nexo de causalidade entre o acidente e as lesões sofridas por tal trabalhadora, e bem assim entre estas e a sua situação actual.
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A responsabilidade infortunística pelo acidente em causa encontra-se transferida da sua entidade...
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