Acórdão nº 1408/12.4TTPRT.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 02 de Junho de 2014

Magistrado ResponsávelEDUARDO PETERSEN SILVA
Data da Resolução02 de Junho de 2014
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Processo nº 1408/12.4TTPRT.P1 Apelação Relator: Eduardo Petersen Silva (reg. nº 351) Adjunto: Desembargadora Paula Maria Roberto Adjunto: Desembargadora Fernanda Soares Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação do Porto: I. Relatório B…, advogado, residente no Porto, veio intentar contra C…, S.A.”, com sede em Lisboa, a presente acção emergente de contrato individual de trabalho, pedindo, na sua procedência que seja: - declarado nulo e sem qualquer efeito o contrato de estágio celebrado entre A. e R. e assim declarar-se aquele como vinculado a esta desde 14.10.2007 como sendo trabalhador por tempo indeterminado; OU - declarado nulo o motivo justificativo indicado no contrato a termo por falta de concretização do mesmo e em consequência ser declarado o contrato que vinculava o A. e R: como sendo sem termo; OU - declarado o contrato que vinculava o A. e R. como sendo sem termo pelo facto deste exceder a duração máxima do contrato a termo tendo em conta a duração do estágio conforme alegado em 30 a 34, PELO QUE DEVERÁ SER DECLARADO ILÍCITO O DESPEDIMENTO PROMOVIDO PELA R. E EM CONSEQUÊNCIA SER ESTA CONDENADA NO PAGAMENTO AO A.:

  1. Da quantia de €6210,00 a título de indemnização pela ilicitude do despedimento; b) Das retribuições desde da data do despedimento até à data do trânsito em julgado da sentença que declara a ilicitude do despedimento; c) Da quantia de €5904,00 referente ao complemento de advocacia, que era paga a todos os advogados desde Outubro de 2009 à excepção do A.

  2. Da quantia de €626,85 referente às horas de formação não ministradas.

  3. Da quantia de €1000,00 referente a danos morais.

    Alegou o A., em síntese, que foi admitido ao serviço da Ré em 15.10.2007 sob um pretenso contrato de estágio por 6 meses, renovado por outros 6 meses.

    No dia seguinte ao termo do contrato de estágio renovado, foi celebrado um pretenso contrato de trabalho a termo certo por 12 meses, também ele renovado por duas vezes, para o exercício das funções de Técnico Superior.

    A Ré invocou a caducidade do contrato com efeitos a 14.10.2011.

    O A. é advogado.

    Durante o pretenso estágio, o A. exercia as suas funções na Direcção de Serviço Integrado de Cobrança – Recuperação de Crédito e Contencioso), ficando a seu cargo um determinado número de processos judiciais em que era parte a C2…, C3…, S.A. e até a C4…, S.A.

    Os processos eram distribuídos por um funcionário e o A. praticava os actos próprios da sua profissão, com independência e autonomia técnicas.

    No período de estágio nunca o A. teve quaisquer acções de formação. Formalmente, o responsável pela sua orientação e supervisão era um engenheiro. O texto do contrato de estágio indica que este é um complemento da formação ministrada pela Faculdade (…) no curso de Direito, o qual o A. terminou em 2002, efectuando estágio obrigatório na Ordem dos Advogados e exercendo ainda as funções de Procurador Adjunto substituto e tendo também exercido actividade profissional de advogado num escritório de advogados entre 2005 e 2007.

    A Ré optou pela admissão do A. porque este já detinha os conhecimentos próprios e necessários para as funções, o A. nunca foi sujeito a aprovação nas peças que elaborava ou nas diligências que efectuava.

    Face à inexistência, de facto, de estágio, ter-se-á de concluir que a admissão do A. na Ré se deu na data em que, ao abrigo do pretenso contrato, iniciou as suas funções, as quais foram sensivelmente as mesmas até que a Ré invocou a caducidade, exercidas no quadro de sujeição a poder de direcção (com salvaguarda da autonomia técnica), horário e disponibilização de vários instrumentos de trabalho.

    Se porém se considerar que o estágio era válido, sempre se dirá que o respectivo período deve entrar no cômputo da duração máxima do contrato de trabalho a termo, conforme artigo 148º nº 5 do CT 2009, uma vez que as funções eram exactamente as mesmas. E assim sendo, existe ultrapassagem da duração máxima legal do contrato a termo, e o contrato deve considerar-se por tempo indeterminado.

    Relativamente ao contrato a termo, a menção da justificação do termo aposto não menciona expressamente os factos que o integram, sendo o texto confuso e vago, não permitindo saber em que consistem as necessidades temporárias.

    Por outro lado, mesmo antes da invocação de caducidade, o A. foi incumbido de um projecto que perdurou para além da sua saída, não havendo pois necessidade temporária mas permanente, e no mesmo sentido pouco antes da sua saída foi admitida, por tempo indeterminado e para funções similares, uma jurista, e foi igualmente renovado o contrato a termo de outra jurista que ali exercia funções similares e veio entretanto a celebrar contrato por tempo indeterminado.

    Acresce que tendo em atenção as funções desempenhadas pelo A., muito dificilmente as mesmas poderiam ser incluídas no esboço de concretização do motivo justificativo invocado.

    Assim, este contrato deve considerar-se sem termo.

    A Ré atribuiu um complemento salarial para pagamento de quotas a todos os advogados que nela exercessem funções, considerando que a sua inscrição na Ordem dos Advogados era um imperativo legal para o exercício das funções que lhes atribuía, porém, exercendo o A. as funções de advogado, era ele o único no departamento do Porto que, discriminatoriamente, não recebia tal complemento.

    Atenta a consideração do contrato como por tempo indeterminado, a invocação da caducidade pela Ré constitui um despedimento ilícito, com as legais consequências, optando o A. por uma indemnização em substituição da reintegração, que deve ser calculada à razão de 45 dias/ano. Por outro lado, o A. tem direito a formação profissional que não lhe foi ministrada, no total de 105 horas (35 horas x 3). Acresce que o A. sofreu enorme angústia, teve de recorrer a familiares e ficou agitado e nervoso, o que deve ser compensado com uma indemnização de 1.000,00€.

    Após uma suspensão inicial para negociações, a Ré veio a contestar, concluindo pela total improcedência da acção, e invocando em sua defesa, sinteticamente, que: - o A. era advogado há mais de dois anos e meio antes da assinatura do contrato de estágio, pelo que não é crível que se deixasse enganar nem que não tenha compreendido nem querido as cláusulas negociais que aceitou, e ao vir agora pô-las em causa litiga de má-fé, em abuso de direito e em inaceitável venire contra factum proprium.

    - o contrato de estágio celebrado possibilitava ao Autor a sua participação e colaboração em práticas reais em contexto de trabalho, reconhecendo ambas as partes que era complemento da formação ministrada na Faculdade de Direito. A Ré faz parte do Grupo C1…, que é um dos maiores e mais importantes, e a sua dimensão e a interligação entre as várias empresas do Grupo, bem como o funcionamento interno da Ré, só são possíveis através do recurso a sofisticados sistemas e aplicações informáticas. Por isso, o A., e todos os demais colaboradores que desenvolvem estágios na empresa, têm, antes de mais, de perceber a respectiva dinâmica orgânica e funcional, conhecer as aplicações, aprender a trabalhar com elas. Depois, há um segundo momento, que consiste em o estagiário passar a utilizar as aplicações informáticas à sua especialidade. Depois, há um terceiro momento em que o estagiário desenvolve a sua actividade tendo, em paralelo, atenção à autonomia da sua função e à especificidade da empresa e da sua forma de trabalhar.

    Deste modo, o A. confunde estágio de advocacia com estágio profissional, o que resulta de várias passagens da petição inicial, sendo certo que obviamente não podia ter um estágio de advocacia, mas sim estagiou no contexto real, o que significa que recebeu formação, foi orientado e esteve em contexto real, aprendendo a orgânica e funcionamento da empresa, a sua estrutura, as aplicações informáticas e a praticá-las, assim como o modo como se intercala e relaciona uma grande empresa, tendo ainda tido formação on the job, o que significa que teve acesso a informação específica da área jurídica da empresa, dos processos, dos contactos e da forma de trabalhar, e finalmente teve um conjunto de iniciativas de formação, umas e-learning outras presenciais. Assim, as funções que exerceu no estágio nada têm a ver com a situação contratual a termo.

    O contrato de estágio foi celebrado com um fundamento diferente do contrato a termo, a execução não se concretizou no mesmo posto de trabalho e o objecto dos dois contratos é distinto. Não há pois violação da duração máxima do contrato a termo.

    O acréscimo excepcional de actividade referido no contrato de trabalho a termo surgiu em concreto devido a alterações legislativas, a saber do artigo 10º da Lei 23/96 de 26.6 que por via da Lei 12/2008 de 26.2 reduziu o prazo de prescrição e alterou o ónus de prova, obrigando a Ré a accionar judicialmente milhares de clientes, quer através de acções declarativas quer de injunções, e por via disto, surgiram outros tantos procedimentos, centenas de contactos com os clientes que procuravam os serviços jurídicos, tratamento de reclamações, reuniões com clientes, instrução de processos. Esse foi o fundamento da contratação a termo do Autor, que se manteve aliás tendo em atenção o prazo médio de pendência desse tipo de processos, entre 2 a 3 anos, fundamentando-se assim as renovações do contrato do Autor.

    O contrato caducou porque se verificou um decréscimo de processos entrados em juízo, deixou de haver acumulação de processos urgentes, o agravamento das custas para os grandes litigantes obrigou a Ré a reduzir os procedimentos judiciais, foram adjudicadas acções executivas a advogados externos (mais de sessenta mil processos), e era necessário gerir os espaços e reorganizar os serviços para contenção de custos muito elevados e com grande margem de incobráveis. O trabalho do A. tornou-se assim desnecessário.

    Também na questão da contratação a termo o A. litiga vindo contra o facto próprio da sua qualidade de advogado e do conhecimento e vontade, livre e esclarecida, sobre o contrato...

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