Acórdão nº 0148/14 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 20 de Março de 2014

Magistrado ResponsávelFERNANDA MAÇÃS
Data da Resolução20 de Março de 2014
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam na Secção do Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo 1.

A…………, Procurador-Adjunto no Tribunal Judicial de ………, vem, “como preliminar de acção administrativa especial para impugnação de acto”, ao abrigo dos art.s 2.º, nº 2, al. m), e 112º do CPTA, requerer suspensão de eficácia da Deliberação do Plenário do CONSELHO SUPERIOR DO MINISTÉRIO PÚBLICO (CSMP), proferida em 03/12/2012, que manteve a deliberação da Secção Disciplinar, de 12/07/2013, de lhe aplicar a sanção disciplinar de 150 dias de suspensão de exercício [art.s 166º, nº 1, al. d), art. 170º, nºs 1 e 2, e 175º, todos do EMP], assim como a transferência para a Comarca de ………….

  1. Em síntese alega quanto aos pressupostos da providência requerida: - verifica-se fumus boni iuris, nos termos da alínea a) do nº 1 do art.120º do CPTA, já que é manifesta a ilegalidade do acto suspendendo, porquanto está ferido de vários vícios geradores de nulidade insanável e de anulabilidade, a saber: i) ininteligibilidade ou impossibilidade lógica do objecto do acto suspendendo, por o seu conteúdo ser indeterminável ou contraditório, gerando a nulidade da decisão punitiva em apreço (artº 133º, nºs 1 e 2, al. c), do CPA)” ou, no mínimo, impossibilidade de reconstituição do percurso lógico do decisor, gerando a anulabilidade dessa mesma decisão, por falta de clareza e incongruência manifesta da respectiva fundamentação (cfr. art.s 123º, nº 1, al. d), e 124º, nº 2, e 135º, CPA); ii) violação de lei por erro nos pressupostos, determinantes da sua anulação; iii) erro notório nos pressupostos e ilegalidade manifesta; iv) violação dos princípios da culpa e da proporcionalidade; v) violação dos arts. 1º e 266º, nº 1, da CRP, bem como o art. 5º, nº 2, do CPA; vi) notória ofensa do princípio ne bis in idem, consagrado no art. 29º, nº 5 da CRP – ou, se assim não se entender, é pelo menos anulável, por erro nos pressupostos e vício de violação de lei (quanto às sanções respeitantes à sua actuação nos processos de inquérito nºs 3.682/07.9……, 606/05.1…… e 2.227/07.5……, bem como ao seu desempenho nos processos de inquérito nºs 646/06.1……, 1.115/98.9…… e 2.023/05.4……; vii) ilegalidade da deliberação suspendenda por não ter sido suspensa a execução da pena de suspensão de exercício bem como a sanção de transferência; - quanto ao periculum in mora, a não suspensão do acto, atento os efeitos que são atribuídos à pena de suspensão de exercício com a consequente perda de remuneração, associado à pena de transferência para outra comarca, é susceptível de lhe causar graves prejuízos patrimoniais e morais, porque fica privado do seu vencimento com acréscimo de despesas e sem condições para suprir as suas necessidades e as do seu agregado familiar.

    Alega ainda o desgaste de forma notória da imagem e prestígio pessoal e profissional, gerando evidente perturbação psíquica, com consequências psicológicas negativas de natureza irreparável e, nessa medida, uma situação de facto consumado; - quanto à ponderação de interesses, refere, em suma, que a suspensão de eficácia requerida não acarretaria danos superiores aos que podem resultar da sua recusa, pois continua a ser respeitado na comarca de ………, onde tem actualmente uma produtividade normal, inexistindo qualquer interesse público que seja mais digno de tutela do que aquele que se pretende salvaguardar através do presente procedimento, pelo menos em termos de tornar desproporcionada a tutela pretendida.

  2. Citada a Entidade requerida, veio deduzir oposição alegando, em síntese, que: - quanto aos pressupostos da providência requerida, entende que não se verificam, refutando os argumentos invocados pelo Requerente para sustentar a manifesta ilegalidade do acto suspendendo e, portanto, o fundamento previsto na alínea a) do nº 1 do art. 120º do CPTA, não se considerando igualmente preenchido os requisitos exigidos pela alínea b) do nº 1 e pelo nº 2 do referido preceito legal; - não é pelo facto de a sua conduta não ter dado azo a alarme social que a continuidade do Requerente no exercício de funções na comarca de ……… deixa de causar graves prejuízos para o interesse público na boa administração da justiça e para o prestígio da magistratura do Ministério Público; - o Requerente abalou indelevelmente a imagem e o prestígio da magistratura do Ministério Público; - o Requerente tem ainda pendente um outro processo disciplinar por falhas cometidas na tramitação de outros inquéritos, o que evidencia a sua falta de disposição para mudar de rumo e indicia que, se não cumprir de imediato a pena que lhe foi aplicada, continuará a cometer as mesmas faltas e a prejudicar gravemente o interesse público numa boa administração da justiça; - da ponderação dos interesse públicos e privados em presença resulta que os danos para o interesse público resultantes da concessão da providência requerida são manifestamente superiores àqueles que da sua recusa podem resultar para o Requerente, o que impede que seja adoptada a providência, nos termos do artigo 120º, nº 2, do CPTA.

  3. Foi junta aos autos resolução fundamentada do CSMP, emitida em 19/2/2014 (doc 4 de fls. 176/181) a qual foi notificada pessoalmente ao Requerente em 20/2/2014.

  4. O Requerente veio, a fls. 159 a 171, suscitar o incidente previsto nos nºs 4 e 5 do art. 128º do CPTA.

  5. Respondeu o Conselho Superior do Ministério Público pugnando pela improcedência do incidente.

  6. Sem vistos, dada a natureza urgente do processo, impõe-se apreciar e decidir.

    II- FUNDAMENTAÇÃO 2. DE FACTO Com interesse para a decisão, consideram-se provados os seguintes factos: a) O requerente ingressou na magistratura do Ministério Público em 1989; b) O requerente é actualmente Procurador-Adjunto; c) O serviço prestado pelo Requerente durante o período em que exerceu funções na magistratura do Ministério Público, obteve 4 classificações de “Bom” devidamente homologadas; d) O magistrado foi alvo de processo disciplinar no ano de 2008 (registado como nº4/2008), que culminou com a aplicação da pena de 60 dias de multa, autorizado a pagar em 24 prestações; e) Na sequência de inspecção ao Requerente, iniciada em 10/10/2012, por despacho do Senhor Vice Procurador-Geral, de 14-02-2013, foi instaurado processo disciplinar ao Requerente; f) O identificado processo disciplinar culminou com o Relatório Final, (Doc.3, fls 67 a 83/v…) de 3 de Maio de 2013 – que lhe imputou a prática de 33 infracções, e propôs a aplicação da pena de 150 dias de suspensão de exercício – nos termos que aqui se dão por expressamente reproduzidos; g) A pena proposta foi homologada pelo CSMP, Secção Disciplinar, por acórdão de 12/07/2013, que, considerando os fundamentos do Relatório referido na al. f), deliberou aplicar-lhe a pena disciplinar de 150 dias de suspensão de exercício e a sua transferência para cargo idêntico, na comarca de ……… (fls.61), documento que aqui se dá por expressamente reproduzido; h) O Requerente reclamou para o Plenário do CSMP; i) Por acórdão de 3 de Dezembro de 2013, que aqui se dá por reproduzido, o Plenário do Conselho Superior do Ministério Público manteve o acórdão reclamado, fls. 39 a 41/v; j) O Requerente foi notificado desse acórdão em 30 de Janeiro de 2014 (Doc.); l) O Requerente veio requerer, no STA, a suspensão de eficácia do acórdão referido na al. i); m) O Requerente, veio pedir a declaração de ineficácia de actos de execução indevida, (a fls. 159 a 171); n) O CSMP proferiu a Resolução Fundamentada, nos termos que se seguem: “RESOLUÇÃO FUNDAMENTADA 1. O Conselho Superior do Ministério Público (CSMP), Requerido na Providência Cautelar interposta por A………… no Supremo Tribunal Administrativo, a correr termos pela 1.ª Secção, sob o n.° 148/14, com pedido de suspensão de eficácia da deliberação do Plenário do CSMP de 3 de Dezembro de 2013, que confirmou, em sede de reclamação, a deliberação da Secção Disciplinar do CSMP de 12 de Julho de 2013, que aplicou ao Requerente a pena disciplinar de 150 dias de suspensão do exercício e a transferência para a comarca de ………, vem apresentar resolução fundamentada, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 128.° n.° 1 do Código de Processo dos Tribunais Administrativos (CPTA).

  7. Independentemente das razões de ilegalidade que o Requerente aponta à deliberação punitiva, que se contestarão em sede própria, a interposição da providência cautelar de suspensão de eficácia de tal deliberação implica para o CSMP a proibição de prosseguir a respectiva execução, salvo se reconhecer que o diferimento da mesma é gravemente prejudicial para o interesse público.

  8. A materialidade que se apurou no processo disciplinar que precedeu a deliberação punitiva revela que a conduta do Requerente, não só consubstancia graves violações dos seus deveres funcionais, algumas a título de dolo, por um lado geradoras de graves atrasos e, por outro lado, motivadas pelo propósito deliberado de ocultar as graves consequências desses atrasos, caracterizando-se também por dar azo a prescrições do procedimento criminal e das coimas, o que tudo é gravemente lesivo dos interesses dos cidadãos, da administração da justiça e da imagem do Ministério Público aos olhos dos cidadãos.

  9. Assim sucede, por exemplo, com os aspectos da conduta do Requerente que a seguir se resumem: a) — Os factos descritos nos nºs 16 a 57 do Acórdão da Secção Disciplinar mostram que o Requerente demorou injustificadamente 4 anos e 37 dias para proferir a proferir despacho final num inquérito com vários arguidos, suspeitos de vários crimes cujo procedimento criminal prescreveu em 2010, tendo proferido o despacho em 2012 com fundamento apenas em falta de inícios, assim ocultando o facto de os crimes se encontrarem prescritos e omitindo deliberadamente o seu dever funcional de comunicar superiormente a ocorrência das prescrições; b) — Os factos descritos nos nºs 58 a 82 do mesmo acórdão mostram que o Requerente demorou injustificadamente 4 anos e 9 dias para deduzir acusação num inquérito, e manipulou os factos e a sua...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT