Acórdão nº 922/11.3TBPBL.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 18 de Março de 2014

Magistrado ResponsávelJOS
Data da Resolução18 de Março de 2014
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam na 3.ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Coimbra: 1.Relatório J… instaurou a presente acção declarativa comum, sob a forma ordinária, contra A…, S.A. peticionando a declaração da: a) a nulidade das deliberações aprovadas na Assembleia Geral de 26 de Março de 2011, porquanto tomadas em Assembleia Geral não convocada, de acordo com o artigo 56.º, n.º 1, alínea a), do Código das Sociedades Comerciais.

A título subsidiário: b) caso se entenda que se está apenas perante uma irregularidade na convocação da Assembleia Geral e não em face de uma não convocação da mesma, a anulabilidade das deliberações ao abrigo do preceituado no artigo 58.º, n.º 1, alínea a), do Código das Sociedades Comerciais, a título subsidiário: c) a ineficácia das deliberações aprovadas na Assembleia Geral de 26 de Março de 2011, de acordo com o disposto no artigo 397.º, n.º 3 do Código de Processo Civil.

A título subsidiário: d) a ineficácia da proclamação do resultado das deliberações em crise nestes autos pelo Presidente da mesa da Assembleia Geral.

A título subsidiário: e) caso se entenda que a proclamação é a última fase do processo deliberativo e que, em consequência, tem valor constitutivo da deliberação, a anulabilidade das mesmas deliberações por violarem o disposto no artigo 386.º do Código das Sociedades Comerciais, conforme dispõe o artigo 58.º, n.º 1, alínea a), do mesmo Código.

A título subsidiário: f) por não terem sido facultados ao Autor os elementos descritos na alínea e) do artigo 289.º do CSC, durante os quinze dias anteriores à reunião da Assembleia Geral da Ré, a anulabilidade das deliberações aprovadas sob os pontos 1 e 2 da ordem de trabalhos, conforme dispõe o artigo 58.º, n.º 1, alínea c), e n.º 4, alínea b), do Código das Sociedades Comerciais.

Alega, para tanto e em síntese, que por morte da accionista M…, casada com o accionista B…, no regime de comunhão geral de bens, ainda não foi efectuada a partilha do património conjugal do casal, titulares de 90,76% do capital social, sendo o remanescente repartido pelos três filhos do casal, sendo o autor um deles.

Mais aduz que a assembleia-geral da ré do dia 26 de Março de 2011 teve na sua génese a convocatória publicada em 24 de Fevereiro de 2011, e em que o accionista C… (filho do referido casal) figurava como sendo titular de 71,12% do capital social da ré, enquanto que os seus dois irmãos (sendo um deles o autor) figuravam, cada um, com 14,44% desse capital.

Refere que as propostas nessa assembleia foram aprovadas por maioria de 92% do capital social, com base no sentido de voto do accionista maioritário C…, tendo o autor votado contra as referidas propostas.

Por outro lado, a referida assembleia foi convocada pelo fiscal único da ré, carecendo de competência para a convocar, e como as referidas acções de M… não foram transmitidas nem para C…, nem para terceiro, tendo este apenas 3,08% do capital social, igualmente lhe falece legitimidade para requerer a sua realização.

Mais alega que no dia 17 de Fevereiro de 2011 foi publicada a convocatória para a assembleia-geral de 19 de Março de 2011, sendo certo que o autor instaurou providência cautelar especificada de suspensão das deliberações tomadas nesta, pelo que não poderiam os membros designados intervir na assembleia-geral de 26 de Março de 2011 uma vez que a sociedade foi citada para a suspensão daquela em 25/3/2011.

Conclui, referindo que na realidade as deliberações da assembleia-geral de 26 de Março de 2011 não foram aprovadas, em virtude de o accionista que votou favoravelmente apenas possuir 3,08% do capital social contra 6,16% de quem votou contra, bem como nos quinze dias anteriores à realização daquela assembleia não foram facultados ao autor os elementos pertinentes para tomar posição acerca das propostas apresentadas.

A ré A…, S.A. apresentou a sua contestação alegando, em síntese, que a referida providência cautelar foi indeferida liminarmente, relativamente às deliberações de 19 de Março de 2011, visando o autor apenas contestar a nova política assumida pela ré, a fim de prejudicar o seu pai, causando a ingovernabilidade da sociedade, não obstante esta ter vindo a gastar destaque, quer a nível nacional, quer a nível internacional, pelo que o autor está a fazer uma utilização reprovável do processo.

Mais invoca a ilegitimidade do autor na medida em que da procedência da acção não lhe advirá qualquer benefício, sendo certo que as deliberações ocorridas na assembleia de 26 de Março de 2011 foram aprovadas com o capital de 92% e os votos contra do autor e do seu irmão D…, com, cada um, 4% do capital.

Refere, igualmente, que as deliberações e votações foram realizadas de acordo com a titularidade de capital registada à data no livro de registo de acções.

Por outro lado, a aludida assembleia decorreu de forma lícita e em conformidade com a lei e sendo certo que as deliberações objecto da citada providência cautelar foram executadas e registadas antes da citação da ré, pelo que não podem ser suspensas.

No mais, explicita que o autor teve a possibilidade de conhecer previamente as informações e contas da ré referentes ao exercício de 2010 em virtude de ter sido até 19 de Março de 2011 administrador da ré, pelo que nem sequer existia um dever de conceder essa informação face ao acesso privilegiado que dispunha.

Mais aduz que a ré não tinha à data da convocatória um presidente de mesa em funções que o pudesse fazer, pelo que é da competência do fiscal único a sua convocação, e sendo certo que qualquer um dos accionistas o poderia fazer, pois de acordo com o livro de registo de acções encontra-se registada a transmissão de acções, datada de 18 de Janeiro de 2011, de molde a que C… era titular de 71,12% do capital social, sendo certo que tal transmissão já havia produzido efeitos à data da referida convocatória e que as propostas foram aprovadas de acordo com essa repartição de capital.

Conclui, peticionando a condenação do autor como litigante de má fé e no pagamento de multa condigna ao Tribunal e indemnização à ré a liquidar em incidente de liquidação de sentença. Ou, se assim não se entender, ser a ré condenada na renovação das deliberações sindicadas nos termos do artigo 62.º do CSC, em prazo não inferior a sessenta dias, de molde a que seja assegurada a governabilidade da ré.

A 1.ª instância produziu a seguinte decisão final: “Em face do exposto: a) julgo a presente acção parcialmente procedente, por provada, e, em consequência, declaro a ineficácia das deliberações aprovadas na Assembleia Geral de 26 de Março de 2011.

  1. absolvo o autor J… do pedido de litigância de má-fé.”.

2.O Objecto da instância de recurso O objecto do recurso acha-se delimitado pelas alegações da recorrente A…, S.A., que assim conclui: … O apelado, J…, autor nos autos, apresenta as suas CONTRA-ALEGAÇÕES desta forma: ...

A 1.ª instância considerou provados os seguintes factos: … 4. Direito A recorrente alega, desde logo, que a interpretação que o tribunal da 1.ª instância faz do artigo 381.º, n.º 3 do Código do Processo Civil – será o diploma a citar sem menção de origem - é contrária à interpretação propugnada na doutrina e jurisprudência, porquanto no dia em que foi a Ré citada do procedimento cautelar de suspensão das deliberações tomadas na assembleia geral de 19 de Março de 2013 estas já haviam sido registadas e, como tal, já haviam sido executadas.

Mais, uma vez que quer o procedimento cautelar, quer a acção principal, foram julgados improcedentes, inexiste qualquer possibilidade de fundamentar quer a ineficácia, quer a responsabilidade que daí derivaria, por isso, a decisão recorrida viola a autoridade de caso julgado decorrente da contradição com a sentença proferida no processo principal referente à assembleia geral de 19 de Março de 2011 que julgou válidas e eficazes as deliberações em crise.

Para isso, diz a apelante que os sujeitos e causa de pedir são idênticos nas duas acções, i.e., na presente acção e na acção que julgou válidas e eficazes as deliberações da assembleia-geral de 19 de Março de 2011.

Ainda, na eventualidade do Tribunal de recurso considerar as deliberações inválidas ou ineficazes, alega a Recorrente que sempre será possível a renovação das deliberações sociais nos termos do artigo 62.º do CSC.

Com interesse para o nosso decisório, escreveu a 1.ª instância: “Da ineficácia das deliberações aprovadas na Assembleia-Geral de 26 de Março de 2011 nos termos do art.º 397º, n.º 3 do CPC: Dispõe o art.º 397º, n.º 3 do CPC: “3 – A partir da citação, e enquanto não for julgado em 1ª instância o pedido de suspensão, não é lícito à associação ou sociedade executar a deliberação impugnada.” Ora, conforme tem sido entendido na jurisprudência, as deliberações sociais podem ser suspensas mesmo que já executadas, desde que sejam de execução contínua ou permanente ou, sendo de execução por um único acto, continuem a produzir efeitos danosos, ainda que tais efeitos constituam mero efeito mediato da deliberação (vide acs. do STJ de 12.11.87, in BMJ, 371, 378 e da RP de 12.02.96, in CJ, 96, I, 219 e de 11.03.96 in CJ 96, II, 191).

O que está em causa na referida providência é a suspensão dos efeitos da deliberação tomada na assembleia geral de 19 de Março de 2011 em que elegeu como presidente da mesa da assembleia geral o Dr. G… e como secretária a Dra. S…, sendo certo que este intervieram nessa qualidade na assembleia geral de 26 de Março de 2011, bem como a reformulação dos estatutos da sociedade e destituição dos membros dos órgãos sociais.

Conforme refere Abrantes Geraldes, apesar das divergências existentes na doutrina e jurisprudência parece avolumar-se o número de arestos que, privilegiando a função instrumental do direito, como sistema que deve responder às exigências da vida...

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