Acórdão nº 0366/11 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 19 de Fevereiro de 2014

Magistrado ResponsávelDULCE NETO
Data da Resolução19 de Fevereiro de 2014
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo: 1.

O MINISTÉRIO PÚBLICO e a A………………, S.A., com os demais sinais dos autos, recorrem para este Supremo Tribunal da sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra que julgou improcedente a impugnação judicial que esta deduziu contra o acto de indeferimento tácito da “reclamação graciosa” interposta contra o acto de autoliquidação de IVA relativo ao mês de Abril de 2004.

As alegações dos recursos mostram-se rematadas com o seguinte quadro conclusivo: 1.1.

Recurso da A………………, S.A.

  1. O montante da taxa de exibição deve ser excluído do valor tributável para efeitos de IVA, porquanto assim o impõem o artigo 16.°, n.° 1 e n.° 6, al. c) do CIVA, o artigo 11º A, n.º 1, al. a) e nº 3, al. c) da Sexta Directiva (Directiva 77/388/CE do Conselho, de 17.05.1977) e bem assim a Jurisprudência emanada do TJCE.

  2. A taxa de exibição devida pelos anunciantes é liquidada, por substituição tributária, pelos operadores ou distribuidores de televisão que a tem que entregar ao Estado no prazo referido pelo artigo 52.° do Decreto-lei n.° 227/2006, e informar o mesmo sobre: teor das exibições, identificação dos anunciantes, importância sobre a qual recaiu a taxa e montantes de contribuição liquidados a cada anunciante.

  3. No caso em apreço não ocorre retenção na fonte, contrariamente ao pressuposto de que parte o M.° Juiz a quo e que normalmente está associado ao mecanismo da substituição.

  4. A melhor doutrina considera haver substituição tributária quando a lei determina que um dado sujeito passivo se substitua àquele relativamente ao qual se verificou o facto tributário, ocupando o seu lugar na obrigação de imposto e, via de regra, beneficiando do direito de haver aquilo que pagou.

  5. Alexandre do Amaral distingue claramente entre o sujeito passivo por débito próprio e o sujeito passivo por débito alheio, sendo o sujeito passivo por débito próprio aquele em que confluem as qualidades de sujeito passivo e contribuinte, enquanto o sujeito passivo por débito alheio é aquele que, sendo embora sujeito passivo, não é contribuinte. O ilustre autor dá como exemplo deste último caso o substituto tributário, qualidade que a ora Recorrente assume por força da lei no presente caso.

  6. Todos os autores são unânimes em considerar que substituição fiscal não se confunde com retenção e em afirmar que a substituição não é ditada por nenhum princípio de equilíbrio ou justiça, mas tão só por um princípio de eficácia, ou seja, por razões de natureza técnica (vg. um pagamento mais rápido ao Estado, a redução do número de sujeitos, etc.).

  7. De acordo com o probatório, a Recorrente prestou serviços de publicidade, emitiu facturas aos seus clientes anunciantes, exigiu-lhes a taxa de 4% a que alude o Decreto-lei n.° 227/2006 e liquidou IVA sobre o valor dos serviços prestados e ainda sobre o montante arrecadado dos 4%, entregando-o ao Estado.

  8. Mais se provou que em Abril de 2004 a Recorrente contabilizou os montantes referentes à taxa de exibição acima referida em contas de terceiros, i.e., em contas transitórias referentes a cada um dos próprios clientes.

  9. Não obstante a prova dos referidos factos, entendeu o M.° Juiz a quo não se dever aplicar ao caso em apreço o disposto na al. c) do n.° 6 do artigo 16º do CIVA, porquanto, na sua óptica, o obrigado, ao efectuar a liquidação do tributo aos anunciantes e na medida em que recebe as quantias apuradas, fica constituído na posição de devedor do mesmo e, não suportando o encargo tributário, não pode pretender que tais quantias pagas aos titulares do crédito sejam efectuadas em nome e por conta do destinatário do serviço.

  10. Ora, salvo o devido respeito, não tem o M.° Juiz a quo razão e desde logo porque, receba ou não (e em tempo) dos anunciantes, a Recorrente tem sempre que entregar o montante da contribuição ao Estado, o que resulta expressamente do artigo 52.° do Decreto-lei nº. 227/2006, além de que sempre que a Recorrente recebe tais montantes - e é o mais comum - recebe-os a título de direito de regresso sobre os seus clientes.

  11. O substituto realiza uma prestação que constitui objecto de uma obrigação alheia, i.e., do substituído, que é quem realiza o facto tributário. O substituto, embora seja devedor, “não preencheu o facto tributário, mas outro pressuposto de facto conexo ao facto gerador” (Diogo Leite de Campos, ob. cit.).

  12. Ao indicar ao Estado o nome dos anunciantes, ao calcular o valor das contribuições devidas pelos mesmos, ao recolher junto deles tais valores e entregá-los ao Estado, é evidente que a Recorrente entrega uma contribuição em nome e por conta de outrem.

  13. O momento exacto em que essa recolha é feita - antes ou depois do prazo definido no artigo 52.° do referido Decreto-lei n.° 227/2006 para entrega ao Estado, ou seja, saber se estamos perante um adiantamento ou perante um reembolso do anunciante devidamente registado nas já aludidas contas de terceiros transitórias - não pode alterar o facto de, perante o Estado, tratar-se sempre de um pagamento que, embora obrigatório, é feito em nome e por conta de outrem.

  14. Assim entendeu a Advogada-Geral no Processo n.º C-98/05, do Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias (TJCE), a respeito da interpretação do artigo 11º A, n.º 3, al. c) da Sexta Directiva: “O momento em que o imposto deve ser pago não representa, pelo contrário, um critério distintivo em si mesmo ... Se, designadamente, o imposto for de qualificar como valor a registar na conta transitória, na acepção do artigo 11° A, n.º 3, alínea c) da Sexta Directiva, não é incluído na matéria colectável, ainda que o fornecedor o tenha pago antes da entrega”.

  15. Por conseguinte, fica claro que o momento em que o tributo é recolhido junto do cliente (substituído) não contende com o enquadramento desse montante na al. c) do nº 3 do artigo 11º, A da Sexta Directiva.

  16. É certo que a Recorrente, quando liquida e entrega ao Estado as quantias devidas pelos anunciantes, fá-lo no interesse de terceiros e por isso mesmo é tão feliz a expressão “sujeito passivo por débito alheio” de Alexandre do Amaral.

  17. Só em face do exposto se atenderá ao princípio da qualificação dos factos de acordo com a sua substância económica, aliás consagrado no n.° 3 do artigo 11º da LGT.

  18. Em face do exposto, o entendimento consagrado pelo M.° Juiz a quo contraria o disposto na al. c) do nº 6 do artigo 16.° do CIVA e a al. c) do n.° 3 do artigo 11.° A da Sexta Directiva, sendo certo que de acordo com a...

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