Acórdão nº 1355/11.7TVLSB.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 12 de Dezembro de 2013

Magistrado ResponsávelÁLVARO RODRIGUES
Data da Resolução12 de Dezembro de 2013
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA: RELATÓRIO AA intentou a presente ação declarativa de condenação, com processo ordinário, contra BB, ambas com os sinais dos autos, pedindo que: – seja declarada nula e sem efeito a disposição testamentária de fls. 38 v.° § 5.° a fls. 39, § 1.°, sobretudo linhas 4 a 6 deste último parágrafo, e relativa à deixa à R. do direito de uso e habitação do apartamento correspondente à quota da A. na sociedade CC, Lda., NIPC …, constante do testamento lavrado no livro n° … do Cartório Notarial DD; – seja declarado nulo e sem efeito o direito da Ré ao uso e habitação do apartamento que corresponde à quota da A. (….° andar … do n° … da Avenida ..., em Lisboa) e, por consequência, – seja a R. condenada a cessar o uso e habitação do referido apartamento, e respectivo recheio, devendo, de imediato, entregar à A. o mesmo apartamento livre e devoluto de pessoas e bens.

Para tanto, alegou, em síntese: Ser sócia da CC -…, Lda., cujo objeto é a administração do prédio em que se situa a sua sede e do qual a mesma sociedade é única e plena proprietária; Cada uma das quotas dessa sociedade confere ao respectivo sócio o direito individual à habitação do fogo ou casa que corresponde à quota respectiva; A titularidade da quota que lhe pertence, confere à Autora o direito à habitação do oitavo andar direito; Por morte do sócio EE, ocorrida a 16/12/2010, a sociedade continuou com a Autora, sua única filha e herdeira, que deveria ter ficado a ser a titular dos direitos da quota respectiva e da usufruição da dita casa; Por testamento, o pai da Autora deixou à Ré o direito de uso e habitação da referida casa, o que constitui violação grosseira do seu direito de usufruir a casa, já que tal direito só por acto entre vivos poderia ser cedido.

A Ré contestou e pediu a sua absolvição do pedido, dizendo que: – o testamento feito por EE, feito em 2003 e mantido até à sua morte, evidencia o seu propósito de contemplar a ré com o direito de uso e habitação e respectivo recheio do apartamento que ambos habitavam; esta intenção presidirá à execução do testamento; – o testador, enquanto sócio da CC, tinha o direito exclusivo da usufruição da habitação do prédio relacionada com a sua quota; este direito abrange, segundo os estatutos da sociedade, o direito de transferir gratuita ou onerosamente, com carácter temporário e para fins habitacionais, a habitação correspondente à quota; esta faculdade foi usada pelo testador, por uma deixa cujo objecto é lícito, possível e determinável; – o legado feito à Autora preencheu a sua legítima, não tendo sido um legado em substituição da legítima; não tendo aceite o legado, a Autora não poderia ter registado para si a quota na sociedade.

Após a legal tramitação, foi realizado o julgamento da acção e proferida sentença que julgou a ação improcedente e absolveu a Ré do pedido. Inconformada, apelou a Autora para o Tribunal da Relação de Lisboa que, julgando procedente o recurso e a acção, deliberou: – declarar nula e sem efeito a disposição testamentária feita a favor da Ré no sentido da atribuição, a esta, do direito de uso e habitação do apartamento correspondente à quota da Autora apelante na CC - …, Lda., NIPC ...; – declarar que a Ré apelada não é titular do referido direito; – condenar a Apelada a cessar o uso e habitação do referido apartamento, devendo, de imediato, entregar à autora o mesmo apartamento livre e devoluto de pessoas e bens.

Inconformada com esta decisão, a Ré, BB, veio interpor recurso de Revista para este Supremo Tribunal de Justiça, rematando as suas alegações, com as seguintes: CONCLUSÕES 1- O presente recurso vem interposto da decisão do Tribunal da Relação de Lisboa que concedeu provimento ao recurso interposto pela ora Recorrida da decisão da 1ª instância que absolveu a Recorrente dos pedidos formulados na acção.

2- Considerou o Tribunal da Relação procedente os pedidos e em consequência declarou nula e sem efeito a disposição testamentária relativa à deixa concedida à ora Recorrente do direito de uso e habitação do apartamento correspondente à quota da Recorrida na sociedade CC, Lda constante do testamento lavrado no Cartório Notarial de DD; 3- Declarou nulo e sem efeito o direito da Ré ao uso e habitação do apartamento à sua quota (o … andar direito do n° … da Avenida …. em Lisboa e em consequência; 4.

E condenou a Recorrente a cessar o uso e direito de habitação do referido apartamento, devendo, de imediato entregar à Recorrida o mesmo livre e devoluto de bens.

5- Salvo o devido respeito pela decisão recorrida, não é correcta a conclusão extraída pelo tribunal da Relação e o dissentimento com o referido acórdão prende-se com o paradoxo entre a prova produzida e a fundamentação jurídica aí vertida.

6- O presente recurso de Revista centra-se na decisão da matéria de direito do douto acórdão recorrido.

7- Da matéria de facto, ficaram provados factos dos quais merecem relevo os seguintes: -A A. é sócia da CC- …, Lda, NIPC ..., com sede na Av. …, n° …, com uma quota no valor nominal de 997, 60 Euros.

-No caso concreto, da A. a titularidade da sua quota confere-lhe o direito de habitação do oitavo andar direito.

-Em 16/12/2010 faleceu o sócio EE.

O falecido deixou testamento, outorgado em 26 de Fevereiro de 2003, cujo teor se encontra acima integralmente reproduzido.

De acordo com a cl. 20° dos Estatutos da sociedade, por morte de qualquer sócio, a sociedade continua com o respectivo herdeiro ou herdeiros, que ficarão a ser titulares dos direitos da respectiva quota e da usufruição da respectiva casa.

Por testamento do pai da A. foi deixado à R. o direito de uso e habitação deste apartamento.

Estatui a cláusula 5ª dos mesmos Estatutos que cada sócio tem o direito de usufruir, sem restrições e com carácter exclusivo em relação aos demais sócios, a habitação do prédio relacionado com a quota de que é titular, que esse direito de usufruição faz parte do direito de propriedade à respectiva quota, sendo incindível, de modo que não é possível ceder o mesmo direito de usufruição mantendo o direito à quota, ou...

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