Acórdão nº 01316/13 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 21 de Agosto de 2013
Magistrado Responsável | FRANCISCO ROTHES |
Data da Resolução | 21 de Agosto de 2013 |
Emissor | Supremo Tribunal Administrativo (Portugal) |
Recurso jurisdicional da sentença proferida no processo de reclamação de actos do órgão de execução fiscal com o n.º 1758/12.0BELRS 1. RELATÓRIO 1.1 A sociedade denominada “A……….., S.A.” (adiante Executada, Reclamante ou Recorrente) reclamou para o Juiz do Tribunal Tributário de Lisboa, ao abrigo do disposto nos arts. 276.º a 278.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), da decisão do Chefe do Serviço de Finanças de Lisboa 10, que indeferiu o pedido de que fossem declaradas prescritas as obrigações tributárias correspondentes às dívidas provenientes de Imposto sobre o Valor Acrescentado (IVA) dos anos de 1988 a 1992 que lhe estão a ser exigidas em execução fiscal.
1.2 O Juiz do Tribunal Tributário de Lisboa julgou a reclamação judicial improcedente por considerar que as dívidas não estavam prescritas.
1.3 A Executada não se conformou com essa sentença e dela recorreu para este Supremo Tribunal Administrativo, apresentando com o requerimento de interposição do recurso a respectiva motivação, que resumiu em conclusões do seguinte teor: « A) Vem o presente recurso interposto da Sentença notificada a 27 de Maio de 2013, proferida no âmbito do processo de Reclamação Judicial que correu termos no Tribunal Tributário de Lisboa sob o n.º 1758/12.0 BELRS; B) Na referida Sentença (nova), o Tribunal a quo, considera que as dívidas de IVA dos anos de 1989, 1991 e 1992 ainda não se encontram prescritas, uma vez que o prazo prescricional foi interrompido por diversas vezes e sujeito, igualmente, a suspensões; C) Todavia, considera aplicável o regime de prescrição previsto no CPT; D) Ora, aplicando o regime prescricional do CPT, está devidamente comprovado nos autos que se devia reconhecer a prescrição das dívidas em crise.
E) Com efeito, não obstante ter ocorrido a interrupção dos prazos prescricionais com a instauração da execução, esse efeito interruptivo cessou em virtude da paragem, por mais de um ano, do processo por facto não imputável à ora Recorrente pelo que a instauração da Impugnação judicial não tinha qualquer efeito interruptivo dado que o prazo já estava interrompido, vide Acórdão do STA de 13 Janeiro 2010, Proc n.º 11148/09 “…estando interrompido o prazo prescricional pela ocorrência de algum facto a que a lei associa esse efeito, a posterior verificação eclosão de outro é inócua pela impossibilidade de interromper o que já está interrompido...” F) Termos em que, retomando a contagem dos prazos um ano após essa data e somando-se aos mesmos o tempo já decorrido até à autuação da execução, chegamos à conclusão que se verificou a prescrição de todas as dívidas, aqui em questão, designadamente em 1 de Julho de 2002, em 1 de Janeiro de 2003 e em 2 de Janeiro de 2004.
G) Pois, os regimes legais da prescrição devem ser aplicados em “bloco”, pelo que inexiste base legal para o Tribunal a quo considerar suspensões dos prazos de prescrição não previstas no CPT.
H) Ainda que assim não se entenda, ou seja, que se siga o entendimento da não aplicação dos regimes de prescrição “em bloco”, o certo é que algumas das causas suspensivas do prazo de prescrição invocadas pelo Tribunal a quo ocorreram em data anterior à entrada em vigor da LGT, por um lado, sendo que, repita-se, o CPT não previa causas suspensivas do prazo de prescrição, e as restantes causas suspensivas alegadas sucederam quando os prazos de prescrição já tinham ocorrido; I) Pelo que, a decisão prolatada faz aplicação retroactiva do regime da prescrição previsto na LGT a factos ocorridos – totalmente – no decurso da vigência do CPT, o que é ilegal; J) Nestes termos, a douta sentença recorrida deverá ser revogada, pois resultou comprovado nos autos e demonstrado nas presentes alegações de recurso que as dívidas de IVA relativas aos anos de 1989, 1991 e 1992 encontram-se prescritas, respectivamente, desde 1 de Julho de 2002, em 1 de Janeiro de 2003 e em 2 de Janeiro de 2004, nos termos do disposto no art. 34.º do CPT.
Termos em que, com o Douto suprimento de Vossas Excelências deverá ser dado provimento ao presente recurso e, em consequência, revogada, por erro de julgamento, a Sentença, por já ter ocorrido, nos termos e com os fundamentos supra expostos a prescrição das dívidas de IVA dos anos de 1989, 1991 e 1992, com o seu consequente restituição, dado que, como explicitado, a exigência do pagamento, já, foi considerada ilegal pelo Acórdão do TCA Sul proferido no Processo n.º 6341/13» (Aqui, como adiante, porque usamos o itálico na transcrição, as partes que no original estavam em itálico surgem aqui em tipo normal, a fim de se respeitar o destaque que lhes foi concedido pelos autores.
).
1.4 O recurso foi admitido a subir imediatamente, nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo.
1.5 A Fazenda Pública não contra alegou.
1.6 Recebidos os autos neste Supremo Tribunal Administrativo, foi dada vista ao Ministério Público e o Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer no sentido de que seja concedido provimento ao recurso, revogada a sentença recorrida e substituída por acórdão que declare a prescrição das dívidas exequendas.
Isto, com a seguinte fundamentação «1. A determinação da lei aplicável, em caso de sucessão de leis que estabelecem distintos prazos de prescrição, resulta da ponderação do regime constante do art. 297.º n.º1 CCivil.
O art. 297.º CCivil não estabelece uma regra de aplicação global do regime prescricional mais favorável ao devedor, em paralelismo com o que sucede no âmbito do direito criminal, em que se estabelece a aplicação retroactiva do regime mais favorável ao arguido (...) a determinação do prazo de prescrição a aplicar faz-se no momento da entrada em vigor da nova lei (…) é nesse momento, com indiferença sobre o que se pode vir a passar, que se determina se é de aplicar o prazo da lei nova ou o a lei antiga; interessa o tempo que falta, em abstracto, sem ponderar a interferência de causas de suspensão ou interrupção da prescrição que possam vir a ocorrer na vigência da lei nova, só constatáveis a posteriori (Jorge Lopes de Sousa Notas sobre a aplicação no tempo das normas sobre prescrição da obrigação tributária 4.2.2. e 4.2.4; acórdão STA SCT 28.05.2008 processo n.º 154/08) Os efeitos interruptivos ou suspensivos de certos factos sobre o decurso do prazo de prescrição são determinados pela lei vigente na data da sua verificação (art. 12.º n.º 2 CCivil) A reclamação graciosa, o recurso hierárquico, a impugnação judicial e a instauração da execução interrompem a prescrição (art. 34.º n.º 3 CPT) A LGT (com início de vigência em 1.01.1999) aditou às citadas causas de interrupção a citação e o pedido de revisão oficiosa da liquidação do tributo (art. 49.º n.º 1 LGT) Na vigência da LGT (contrariamente ao que sucedia na vigência do CPT) a instauração de execução não é causa de interrupção da prescrição, apenas a citação produzindo o efeito interruptivo (art. 34.º n.º 3 CPT; art. 49.º n.º 1 LGT).
O efeito interruptivo cessa se o processo estiver parado por facto não imputável ao contribuinte durante mais de um ano, somando-se neste caso o tempo que decorrer após este período ao que tiver decorrido até à data da autuação (art. 34.º n.º 3 CPT: art. 49.º n.º 2 LGT) O facto interruptivo produz um duplo efeito: - instantâneo (inutilização do prazo decorrido até à sua verificação) - suspensivo (o novo prazo, idêntico ao da prescrição primitiva, só começa a correr após a decisão final do processo administrativo; a decisão que puser termo ao processo de execução fiscal ou a declaração em falhas; o trânsito em julgado da decisão que puser termo ao processo judicial (arts. 326.º n.ºs 1/2 e 327.º n.º 1 CCivil; Jorge Lopes de Sousa Notas sobre a aplicação no tempo das normas sobre prescrição da obrigação tributária 3.3 pp.6/10 A revogação do art. 49.º n.º 2 LGT (cessação do efeito interruptivo do prazo de prescrição) não opera quanto aos processos em que já tenha decorrido o período superior a um ano de paragem do processo por acto não imputável ao sujeito passivo (arts. 90.º e 91.º Lei n.º 53-A/2006, 29 Dezembro) Na vigência da LGT devem ser consideradas as sucessivas causas de interrupção da prescrição; a redacção actual do art. 49.º n.º 3 LGT (conferida pelo art. 89.º Lei nº 53-A/2006, 29 Dezembro) aplica-se apenas ao segundo e subsequentes factos com eficácia interruptiva verificados após o início da vigência do diploma que introduziu a alteração da norma, considerando: a) o princípio geral da aplicação das leis no tempo (art. 12.º n.º 2 1.º segmento CCivil) b) a inexistência de carácter interpretativo atribuído pelo legislador à actual redacção do art. 49.º n.º 3 LGT, inculcando a sua natureza inovadora (acórdão STA SCT Pleno 28.05.2008 processo nº 840/07 cuja doutrina, aplicada a um caso de vigência do CPT, igualmente se aplica à LGT; Jorge Lopes de Sousa CPPT anotado e comentado Volume II 2007 p.198 e Notas sobre a aplicação no tempo das normas sobre prescrição da obrigação tributária 3.3.2.4 pp. 15/16) 2. Aplicando estas considerações ao caso concreto: As dívidas exequendas são provenientes de IVA (anos 1988 a 1992) a) os prazos de prescrição de cada uma das dívidas foram interrompidos pela instauração da execução em 8.10.1993 (probatório n.º 1); b) o efeito interruptivo manteve-se até ao início da vigência da LGT (1.01.1999), na medida em que não se demonstrou que o processo de execução tenha estado parado por facto não imputável ao contribuinte durante mais de um ano: a paragem resultou da dedução de impugnação judicial pelo contribuinte, associada à prestação de garantia bancária (art. 34.º n.º 3 CPT; probatório n.ºs 2/5) c) no início da vigência da lei nova (LGT) ainda não se tinha iniciado o prazo de prescrição de 10 anos da lei antiga (art. 34.º n.º 1 CPT); d) em consequência, é aplicável o prazo de 8 anos da lei nova, contado a partir do início da sua vigência em 1.01.1999; e) a citação efectuada em 21.01.1994 não tem efeito interruptivo, porque verificada na vigência do CPT (probatório n.º 13); f)...
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