Acórdão nº 1863/11.0TBFAR.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 04 de Julho de 2013

Magistrado ResponsávelANA PAULA BOULAROT
Data da Resolução04 de Julho de 2013
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

ACORDAM, NO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA I A e MA, intentaram contra C e G, acção declarativa de condenação com processo ordinário pedindo: 1. O reconhecimento da validade legal do contrato de transmissão de alvarás e respectivas cláusulas; 2. A declaração da situação de mora em que os Réus se constituíram; 3. A condenação dos Réus a pagar aos Autores a quantia de € 167 865,39 (cento e sessenta e sete mil oitocentos e sessenta e cinco euros e trinta e nove cêntimos), a título de valor do preço devido e não pago e juros de mora vencidos; 4. A condenação dos Réus a pagar aos Autores o valor de juros vincendos, contados desde a citação até efectivo e integral pagamento; Para o caso de os pedidos formulados não procederem, pedem subsidiariamente: 5. A declaração de incumprimento contratual por parte dos Réus e, consequentemente, a resolução do contrato; 6. Que os Autores sejam reconhecidos como únicos e legítimos titulares dos Alvarás de Licença de Utilização n.ºs YY/95 e KK/95, emitidos pela Junta Autónoma dos Portos do Sotavento do Algarve, em 03/10/1995; 7. A condenação dos Réus a entregar aos Autores os talhões n.ºs … da Ilha da Culatra, livres e devolutos de pessoas e bens; 8. Que o valor de € 89 783,62, já pago pelos Réus aos Autores convertido em valor de renda pago pelo uso e fruição dos talhões nºs YY e KK da Ilha da Culatra, desde 19/05/2002 até à data da entrega efetiva dos referidos talhões livres e devolutos de pessoas e bens; Caso estes pedidos também não procedam, pedem ainda os autores, subsidiariamente: 9. A declaração de invalidade legal do contrato, por nulidade, nos termos do artigo 280º, nº 1 do Código Civil; 10. Que os Autores sejam reconhecidos como únicos e legítimos titulares dos Alvarás de Licença de Utilização n.ºs YY/95 e KK/95, emitidos pela Junta Autónoma dos Portos do Sotavento do Algarve, em 03/10/1995; 11. A condenação dos réus a entregar aos autores os talhões n.ºs YY e KK da Ilha da Culatra, livres e devolutos de pessoas e bens; 12. Que o valor de € 89 783,62, já pago pelos réus aos autores seja convertido em valor de renda pago pelo uso e fruição dos talhões nºs YY e KK da Ilha da Culatra, desde 19/05/2002 até à data da entrega efectiva dos referidos talhões livres e devolutos de pessoas e bens.

Para tanto alegam em síntese que os Autores são os únicos titulares de duas licenças emitidas pela Delegação do Sul do Instituto Portuário e dos Transportes Marítimos, I.P. As referidas licenças têm como objecto a ocupação de parcelas do domínio público marítimo. Em 19 de Maio de 2002, os Autores celebraram com os Réus um contrato de transmissão das referidas licenças, obrigando-se os Autores a transferir para os Réus as licenças, contra o pagamento da quantia total de € 224 659,05, liquidável em cinco prestações. O Autor requereu ao Instituto Portuário do Sul autorização para se proceder à transferência da titularidade das licenças de utilização. No entanto, o Instituto Portuário e dos Transportes Marítimos informou os Autores, com conhecimento à Ré, do indeferimento da pretensão deduzida. Nos termos do contrato celebrado entre as partes, a circunstância de a titularidade das licenças de utilização permanecer na titularidade dos Autores por impedimento legal da sua transferência, não constituía motivo para aqueles serem penalizados ou obrigados a qualquer contrapartida. Os Réus continuaram, nos termos do acordo, a usufruir os talhões desde a data da assinatura do contrato. No entanto, os Réus não procederam ao pagamento integral do montante acordado, tendo apenas liquidado a quantia relativa às duas primeiras prestações. Em 14 de Setembro de 2010, os Autores interpelaram os Réus para o cumprimento do contrato.

Os réus contestaram e reconvieram. Em sede de defesa directa, pugnaram pela improcedência dos pedidos contra eles deduzidos.

Em sede reconvencional e apenas no caso de virem a ser condenados a entregar as parcelas em causa aos Autores, os Réus pedem a condenação daqueles a reembolsarem aos Réus a parte do preço já pago por estes, acrescida do montante de € 50 340,95 respeitante ao valor actualizado das obras que os mesmos levaram a efeito no imóvel.

Para tanto, os Réus alegaram em suma que os Autores não só não diligenciaram pelo cumprimento do contrato como voluntária e expressamente desistiram desse cumprimento, conforme declaração que subscreveram. A transmissão dos alvarás dependia de autorização da entidade com jurisdição no domínio público marítimo onde as parcelas se inserem. Tanto os Autores como os Réus sabiam que tal autorização era sempre concedida, desde há muitas décadas, sem condições ou restrições, funcionando tal autorização, na prática, como uma mera confirmação do acordo efectuado entre transmitentes e transmissários, lavrando-se administrativamente o averbamento da alteração da titularidade do alvará. Contrariamente ao acordado, os Autores não outorgaram a procuração a favor de advogado nem iniciaram qualquer diligência com vista à obtenção da autorização do IPTM para a transmissão dos alvarás. Os Autores não reagiram à comunicação de pretensão de indeferimento da transmissão das licenças. Pelo contrário, manifestaram desistir das suas pretensões. Incorreram, pois, os Autores em incumprimento.

Alegam ainda os Réus que, enquanto na posse dos talhões de terreno em causa, foram efectuando na moradia aí edificada obras de recuperação e melhoramentos, valorizando-a. Os Réus têm pedido para que os Autores outorguem procuração que lhes confira poderes para obter a transmissão das licenças, o que os autores recusam sem obter a totalidade do preço. Ficou estipulado na cláusula 13ª do mencionado contrato, que “se os Alvarás não vierem a ser transferidos para os segundos por não ter sido dada autorização da entidade competente, os primeiros obrigam-se a continuar a cedência da posse/detenção dos talhões em causa sem qualquer contrapartida ou penalização e nos termos e pelo prazo que os segundos entenderem livremente adequados”, o que legitima a posse das parcelas de terreno em causa por parte dos Réus. São os Réus que pagam anualmente a taxa devida ao IPTM pela ocupação das parcelas em causa Na Réplica, os Autores contestaram o pedido reconvencional.

Foi produzida sentença a julgar parcialmente procedente a acção e a reconvenção nos seguintes termos: «a) Declarar que os autores são os únicos titulares dos alvarás de licença de utilização nº YY/95 e KK/95, emitidos pela Junta Autónoma dos Portos do Sotavento do Algarve em 3 de outubro de 1995; b) Condenar os réus a entregarem aos autores os talhões nº YY e KK da Ilha da culatra, livres e devolutos de pessoas e bens; c) Condenar os réus a pagarem aos autores a quantia correspondente à ocupação dos dois referidos talhões a liquidar em execução de sentença; d) Absolver os réus dos demais pedidos contra eles formulados; e) Condenar os autores a entregarem aos réus a quantia de € 89 783,62 e bem assim o valor correspondente às obras e melhoramentos (a que se fez alusão supra e que consistam em benfeitorias necessárias ou úteis realizadas antes da verificação da condição e que não possam ser levantadas sem detrimento da coisa) realizados pelos réus nos dois talhões supra identificados a liquidar em execução de sentença; f) Condenar os autores e réus nas custas da acção e reconvenção, fixando-se a responsabilidade dos primeiros em 35% e dos segundos em 65%.».

Inconformados com esta decisão, recorreram os Réus, per saltum, para este STJ, apresentando as seguintes conclusões: - Nos presentes autos de processo ordinário, vêm os réus interpor recurso de parte da decisão, mais concretamente das condenações transcritas nas alíneas c) e f) da decisão.

- Subsidiariamente, caso não seja dado provimento à impugnação da alínea c) da decisão, e apenas nesse caso, os Réus ora recorrentes impugnam a decisão contida na lª parte da alínea e).

- Os presentes autos têm como causa de pedir um intitulado “Contrato de transmissão de alvarás”.

- Discutida a causa o Tribunal “a quo” declarou a resolução de parte do contrato e a nulidade do restante, - Em conformidade, condenou os réus ora recorrentes a entregarem aos autores os talhões de terreno que tinham recebido daqueles na data da celebração do contrato, - E condenou os autores e restituírem aos réus a parte do preço por estes paga no início do contrato, no valor total de 89.783,62 €.

- Os recorrentes aceitam tais decisões.

- Não se conformam, contudo, com a decisão contida na citada alínea c) que condenou os réus a pagarem igualmente aos autores a quantia correspondente à ocupação dos dois referidos talhões.

- Entendem os recorrentes que este pagamento vai para além do que a lei manda restituir em consequência da nulidade do contrato.

- Com efeito, por remissão do art. 289º, nº 3 estabelece o art. 1270°, nº1, ambos do Código...

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