Acórdão nº 220/11.2GBTND.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 26 de Junho de 2013

Magistrado ResponsávelCORREIA PINTO
Data da Resolução26 de Junho de 2013
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam, em conferência, na 5.ª Secção (Criminal) do Tribunal da Relação de Coimbra: I) Relatório 1.

No âmbito do processo comum, com intervenção de tribunal singular, n.º 220/11.2GBTND, do 2.º Juízo do Tribunal Judicial de Tondela, foi julgado o arguido A...

, casado, avicultor, nascido em 16 de Dezembro de 1950, na freguesia (...), concelho de Tondela, filho de (...) e de (...), com domicílio no (...), Santiago de Besteiros, sendo-lhe imputada a prática, em autoria material, de um crime contra a preservação da fauna e das espécies cinegéticas, previsto e punido pelos artigos 6.º, n.º 1, alínea c), 26.º, n.º 1, e 30.º, n.º 1, da Lei n.º 173/99, de 21 de Setembro, alterada pelo Decreto-lei n.º 202/2004, de 18 de Agosto e pelo Decreto-lei n.º 2/2011, de 6 de Janeiro.

Realizada audiência de julgamento, foi proferida sentença (fls. 211 e seguintes) onde se conclui nos seguintes termos: «Pelo exposto, julgo procedente por provada a acusação pública, e, em consequência, decide-se:

  1. Condeno o arguido A..., como autor material de um crime de, na pena 60 (sessenta) dias de multa à taxa diária de € 6,00 o que perfaz o montante global de € 360,00 (trezentos e sessenta euros).

  2. Vai ainda o arguido condenado a pagar as custas do processo, com 3 UC de taxa de justiça.

  3. Declaro perdidos a favor do Estado os objectos apreendidos.» 2.1 O arguido, não se conformando com esta decisão, veio interpor recurso da mesma, formulando as seguintes conclusões (transcrição): 1ª.- Da prova produzida em sede de Audiência de discussão e Julgamento não poderiam ter sido dados como provados os factos 1.º, a parte final do 4.º, 6.º a 8.º, porquanto, o Tribunal, sem atender à prova aí produzida, limitou-se a dar como provado os factos constantes da acusação, sem atender às concretas provas – testemunhal – que impõem decisão diversa, como vai explanado nas conclusões que se seguem, havendo – erro notório na apreciação da prova e insuficiência para a decisão da matéria de facto provada, nos termos do artigo 410.º n.º 2 a) e c) do Código de Processo Penal.

    1. - Na verdade, da prova produzida em Audiência, nomeadamente do depoimento transcrito (pág. 5 e 11 deste recurso) do Agente D...

      , e conforme consta quer da acusação, quer dos factos provados – ponto 5, existe um facto sobre o qual não há dúvidas, ou seja, que foi o arguido quem por sua iniciativa se dirigiu à GNR, porém, existe contradição entre os dois agentes, porquanto, pelo D...

      é referido ter o arguido admitido ser o autor da colocação dos laços na sua propriedade, enquanto que o seu colega E...

      , que foi ao local, refere que o arguido não assumiu tal autoria.

    2. - Assim, não poderá o depoimento do Agente D... ser atendido para a formação da convicção do Tribunal, atendendo à Jurisprudência maioritária (Acórdão da Relação de Évora de 2 de Dezembro de 2003, o Acórdão da Relação de Coimbra de 18 de Fevereiro de 2004, os Acórdãos da Relação do Porto de 7 de Março de 2007 e de 19 de Setembro de 2008 e o Acórdão da Relação de Guimarães de 4 de Junho de 2007, também retirados de www.dqsi.pt.

      ) não é admissível, em todos os casos, a valoração de declarações prestadas pelo arguido perante órgãos de polícia criminal, nos termos dos Arts. 356º, n.º 7 e 357º do Código de Processo Penal, mesmo que antes da sua constituição como arguido ou do início do inquérito.

    3. - Quando assim não se entenda, considera a defesa que a testemunha D... não poderia depor sobre as conversas que teve com o arguido, ainda que este fosse, na altura, uma mera testemunha, daí que, no decurso da Audiência vários requerimentos foram ditados para a acta, porém sempre improcedentes, muito embora não devessem ser admitidas tais declarações, não só porque as mesmas não configuram um relato de diligências de investigação, mas antes um depoimento indirecto, o qual, diga-se, não foi confirmado pelo pretenso transmitente o Sr. A..., ora recorrente, que na altura era testemunha.

    4. - Além de que as declarações do Agente D... equivalem à leitura das declarações das testemunhas, em sede de audiência, que não podem ser lidas, no caso de oposição do arguido, o que aconteceu, devendo por isso, considerar-se tal depoimento em violação do artigo 356 n.º 2 e n.º 7 do CPP, já que a aplicação desta norma não se deverá cingir apenas às declarações reduzidas a escrito e assinadas pelo declarante, mas também àquelas que são transmitidas oralmente, como, no caso dos autos, aconteceu com as pretensas declarações que aquela testemunha diz ter recebido do recorrente.

    5. - E também quando assim não se entenda, sempre o depoimento do Agente D..., ao relatar factos que diz ter ouvido do arguido, deveria ser analisado com as demais provas, designadamente com a contradição manifestada pelo seu colega E..., que não apenas e só o depoimento daquele Agente.

    6. - Pois o Agente E... (transcrições pág. 8 e 9 deste recurso), refere que o arguido negou diretamente para si ser o autor da colocação dos laços, e nunca ouviu que tivesse dito algo em contrário para o seu colega, pelo que não deveria o Tribunal considerar credível o depoimento do primeiro Agente inquirido, não só pela postura e versão do arguido, mas também por não ser aceitável, à luz da experiência, que alguém altere o seu depoimento em apenas minutos de forma tão convicta.

    7. - Na sentença, consta da motivação dos factos provados, que a testemunha “ E..., casado, agente da GNR presta serviço em Campo de Besteiros, o qual prestou depoimento de forma clara e coerente motivo pelo qual logrou convencer o Tribunal. Referiu que no dia em que arguido foi ao posto comunicar que tinha montado os uns laços e que ficou lá um cão preso.” Ora, da transcrição (pág. 8 e 9 deste recurso) do depoimento desta testemunha, verifica-se que o mesmo refere que o arguido nunca referiu para si que tivesse sido o autor da colocação dos laços, pelo que o Tribunal, além de não ter feito alusão a tal facto, motivou a sua convicção com base num depoimento indirecto, já que tal testemunha não identificou a pessoa a quem ouviu.

    8. - E mesmo que alicerçados na posição assumida no Tribunal da Primeira Instância, não poderá, no nosso entender e como atrás ficou exposto, ser admitido o depoimento da testemunha que diz que o arguido assumiu a autoria dos factos ( D...), quando a mesma é negada para o colega e negada pelo arguido em sede de Audiência, o qual voluntariamente se deslocou ao Posto da GNR para que a situação fosse solucionada, (transcrição pág. 5, 10 a 12 deste recurso) e ter apresentado uma versão credível, como se vem demonstrando.

    9. - Afirma o Tribunal que: “Ora, conjugados tais depoimentos com as regras da experiência diremos que, trabalhando o arguido como disse diariamente na Quinta onde disse ter o “epicentro da sua vida” (embora em concreto tivesse colocado esse epicentro num outro ponto da Quinta que não a estrema onde foram encontrados os laços), não seria crível que se não tivesse sido ele a colocar os laços no local não se tivesse já apercebido dos mesmos.” Esta conclusão não está de todo adequada às regras de experiência, porquanto, se a colocação dos laços tivesse ocorrido num apartamento, talvez este raciocínio tivesse aplicação, porem, estamos perante uma Quinta, que tal como consta desta conclusão e das declarações do arguido, da testemunha B..., e da testemunha C..., (transcrições pág. 13 a 23, 29 e 30 deste recurso) é de grande dimensão e o epicentro da sua vida ocorre a uma distância longe do local onde foram colocados os laços.

    10. - Refere a decisão recorrida que: “Diremos que a versão do arguido de que não pôs laços nenhuns, não logrou convencer o Tribunal. Tanto mais que se não tivesse sido o mesmo a colocar os laços, não se percebe porque o admitiria quando chegou a GNR a participar a ocorrência, nem se percebe como é que sendo ele o proprietário da quinta em cuja rede se mostravam colocados os laços e com os alegados riscos das suas ovelhas e demais animais não se tenha preocupado em apurar quem o teria feito ou até que se tivesse mostrado surpreendido com toda essa situação. Pois, como bem referiu o agente E..., não houve da parte do arguido qualquer reacção de surpresa, pelo contrário, a reacção foi de total colaboração para remediar a situação.” Desta conclusão também deveria o Tribunal questionar-se do porquê do arguido ter logo que chegou ao Posto confessado ser o autor da colocação dos laços perante o Agente D..., e minutos depois ter negado ao agente E.... (É que na verdade tal postura não se compagina com a atitude do arguido que vai ao posto dar conta de um facto, pedindo auxílio às entidades competentes); 12ª.- Afinal, da experiência e do comportamento humano quem é que se desloca perante as Autoridades admitindo o cometimento de um crime para um dos Agentes e minutos depois nega-o para outro Agente, mas a par deste comportamento pede auxílio a estes e é o mesmo, que posteriormente e sem qualquer auxílio mas tão só na presença destes que solta o animal, o que facilmente poderia ter feito logo que se apercebeu que o cão estava preso aos laços.

    11. - Mas mais, afinal é sobre o arguido que recai a incumbência de averiguar quem foram os autores do crime, ou seja, quem terá entrado na sua propriedade e colocado os laços? Mesmo, depois de ter dado conhecimento à Entidade Competente para o efeito? Parece-nos que não. Pois, arguido não tem o ónus de imputar os factos a terceiros para se desresponsabilizar, daí a existência de uma fase de inquérito para se apurar quem foram os agentes do crime, e nenhuma diligência quer nessa fase, quer na fase de Julgamento foi tomada, já que se partiu sempre da premissa que o depoimento do Agente D... foi credível.

    12. - Da sentença consta ainda e por forma a não dar credibilidade ao depoimento do arguido: “…ou até que se tivesse mostrado surpreendido com toda essa situação. Pois, como bem referiu o agente E..., não houve da parte do arguido qualquer reacção de surpresa, pelo contrário, a reacção foi de total colaboração para remediar a situação”. A...

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