Acórdão nº 0398/12 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 17 de Abril de 2013

Magistrado ResponsávelISABEL MARQUES DA SILVA
Data da Resolução17 de Abril de 2013
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo: - Relatório-1 – A…………, Lda, com os sinais dos autos, recorre para este Supremo Tribunal da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Viseu, de 28 de Dezembro de 2011, que julgou totalmente improcedente a oposição por si deduzida à execução n.º 2704200501011529, instaurada por dívidas ao INGA respeitantes a subsídios atribuídos no âmbito das Restituições à Exportação de Vinho, campanha de 1995, apresentando as seguintes conclusões: A. O presente recurso vem interposto da sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Viseu que julgou improcedente a oposição à execução fiscal n.

o 2704200501011529, em particular, porque aplicou o prazo geral ordinário de prescrição de vinte anos ao procedimento para reposição de quantias relativas a restituições às exportações de vinho realizadas na campanha de 1995, recebidas alegadamente de forma indevida B. A aplicação do prazo ordinário de prescrição de vinte anos ao domínio da reposição de restituições à exportação de vinho da campanha de 1995 é contrária à legislação comunitária com aplicação directa no ordenamento português e, bem assim, aos princípios da segurança jurídica, da não discriminação dos litígios comunitários relativamente aos litígios nacionais e da proporcionalidade, subjacentes tanto ao ordenamento jurídico interno, como ao ordenamento jurídico comunitário.

C. Ao adoptar este Regulamento n.

o 2988/95 e, em particular, o seu artigo 3.°, n.º 1, o legislador comunitário pretendeu instituir uma regra geral de prescrição aplicável nessa matéria mediante o qual renunciou, voluntariamente, à possibilidade de recuperar somas indevidamente recebidas do orçamento comunitário após o decurso do período de quatro anos, período durante o qual as autoridades dos Estado-Membros, actuando em nome e por conta do orçamento comunitário, deveriam recuperar (ou deveriam ter recuperado) essas vantagens indevidamente obtidas.

D. No caso dos presentes autos, estamos perante uma alegada irregularidade cometida pela A…………, aquando das exportações em causa no ano de 1995 (decorrente da não apresentação dos registos obrigatórios nos termos das regras comunitárias, nomeadamente de loteamento, misturas e aumento do título alcoométrico) que, lesando o orçamento do FEOGA-Garantia, determina a reposição da quantia recebida a título de restituições à exportação de vinho nessa campanha, ou seja, estamos perante uma situação subsumível ao campo de aplicação do mencionado Regulamento n.º 2988/95 e respectivo prazo de prescrição do procedimento de quatro anos a contar da data em que foi praticada a irregularidade.

E. O Tribunal de Justiça da União Europeia, chamado a pronunciar-se pelas instâncias jurisprudenciais dos diferentes Estados-Membros, tem plasmado o entendimento de que tal prazo de prescrição de quatro anos para o procedimento decorrente da prática de qualquer irregularidade que ponha em causa os interesses financeiros das Comunidades Europeias se aplica às medidas administrativas de recuperação de uma restituição à exportação, como a dos presentes autos - cf. Ac da 2.

a Secção do TJUE, de 29.01.2009 Josef Vosdíng Schlacht.

F. Considerando que: (i) os Regulamentos comunitários têm aplicação directa no ordenamento jurídico interno - cf. artigo 8.°, n.º 4 da CRP e artigo 189° do Tratado CE -; (ii) que o TJUE aplica, sem margem para dúvidas, o prazo prescricional previsto no artigo 3.º, n.

o 1, do Regulamento 2988/95 às medidas administrativas que visam a recuperação de uma restituição à exportação; (iii) e que inexiste, no ordenamento jurídico interno, qualquer disposição especial que, ao abrigo da possibilidade estabelecida no n.º 3 do artigo 3.º do mesmo Regulamento, preveja um prazo específico para a prescrição aplicável a um domínio como o do reembolso das restituições à exportação indevidamente recebidas em prejuízo de fundos comunitários, não pode senão concluir-se que o prazo de prescrição previsto no mencionado Regulamento deverá ter aplicação ao caso dos autos.

  1. Depois da entrada em vigor no ordenamento jurídico português da regra de prescrição geral e de efeito directo prevista no artigo 3.º, n.º 1, do Regulamento n.

    o 2988/95 - que supriu a falta de uma regra específica nessa matéria no ordenamento português -, não poderia continuar a ser aplicada na actuação contra qualquer irregularidade na acepção do referido Regulamento e na falta de uma disposição legislativa nacional que obrigasse a proceder internamente assim, uma regra de prescrição geral do Código Civil.

  2. As dívidas em questão encontram-se constituídas em data anterior à vigência do Regulamento n.

    o 2988/95.

    I. Ainda que se aceitasse a aplicação do prazo ordinário de prescrição de vinte anos à reposição das restituições à exportação de vinho em questão - que, como adiante se demonstrará, não se aceita -, sempre seria de chamar à colação a regra prevista no artigo 297.°, n.º 1, do Código Civil: é que estando a correr o prazo prescricional de vinte anos, em 26 de Dezembro de 1995 entrou em vigor, com aplicação directa no ordenamento jurídico português, o prazo prescricional de quatro anos previsto no artigo 3.°, n.

    o 1, do Regulamento n.º 2988/95.

  3. Segundo o disposto no artigo 297.º do CC, o prazo mais curto de prescrição vai aplicar-se ao prazo em curso, contando-se o novo prazo a partir da entrada em vigor da nova lei (a não ser que, segunda a lei antiga, faltasse menos tempos para o prazo se completar, o que não se verifica).

  4. Considerando que o Regulamento n.

    o 2988/95 entrou em vigor em 26.12.1995 (cf. artigo 11.° do mencionado Regulamento) e que as irregularidades que determinam a reposição ocorreram nas exportações realizadas no ano de 1995 (cf. procedimento administrativo junto aos autos e alínea A) dos factos considerados provados pelo Tribunal a quo), o novo prazo prescricional de quatro anos terminou em 26.12.1999 (quatro anos após a entrada em vigor do Regulamento n.º 2988/95), enquanto que a decisão administrativa de reposição da quantia em questão nos autos foi proferida somente a 21.07.2004 (cf. alínea B dos factos provados), razão pela qual se encontrava já transcorrido - há muito - o respectivo prazo prescricional, o que não podia senão ser declarado nos presentes autos, e ora se requer a este Venerando Tribunal.

    L. Ainda que se admitisse que esse prazo ordinário de prescrição de vinte anos correspondia ao prazo de prescrição estabelecido pelo legislador português ao abrigo da possibilidade prevista no n.

    o 3 do artigo 3.° do Regulamento n.

    o 2988/95 - no que não se concede e apenas se admite como mera hipótese de raciocínio - sempre este prazo seria atentatório do princípio da segurança jurídica, da proporcionalidade e da não discriminação dos litígios comunitários relativamente aos litígios nacionais, que vigoram e subjazem tanto ao ordenamento jurídico interno, como ao ordenamento comunitário.

  5. O princípio da segurança jurídica exige, no contexto de uma actuação contra uma irregularidade lesiva dos interesses financeiros da união Europeia e que dê origem a uma medida administrativa a determinar o reembolso, pelo operador, das restituições à exportação indevidamente recebidas, que a situação desse operador não seja indefinidamente susceptível de ser posta em causa e que, consequentemente, seja aplicado um prazo de prescrição à possibilidade de actuação contra essa irregularidade.

  6. Para cumprir a sua função de garantir a segurança jurídica, esse prazo aplicado deve ser conhecido antecipadamente ou, pelo menos, deve ser suficientemente previsível para o destinatário – cf. Ac. da 4.ª Secção do TJUE, de 05.05.2011, junto como doc. 1.

  7. A prática jurisprudencial em Portugal – que tem vindo a aplicar à reposição de restituições à exportação similares às dos presentes autos o prazo geral de prescrição de vinte anos (e não o prazo de prescrição de cinco anos previsto internamente para a reposição de dinheiros públicos, constante do DL n.º 155/92) -, não é anterior ao ano da prática da irregularidade aqui em causa, desconhecendo-se, com efeito, qualquer Acórdão deste Venerando Tribunal nesse sentido proferido nos anos de 1994, 1995 ou mesmo em anos posteriores da década de 90.

  8. A prática de aplicar à reposição de restituições à exportação não o prazo específico de reposição de dinheiros públicos previsto no artigo 40.º do DL n.º 155/92 – como era em larga medida expectável e como era prática relativamente à atribuição de outros subsídios públicos não exclusivamente comunitários -, mas o prazo geral de prescrição previsto no CC, viola o princípio da segurança jurídica, pelo menos em relação às condutas que, como a dos presentes autos, são anteriores ao primeiro dos Acórdãos internos que plasmou tal entendimento, razão pela qual tal prática e aplicação não poderiam vigorar no ordenamento interno...

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