Acórdão nº 08847/12 de Tribunal Central Administrativo Sul, 05 de Julho de 2012

Magistrado ResponsávelCRISTINA DOS SANTOS
Data da Resolução05 de Julho de 2012
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

ICP-ANACOM – Autoridade Nacional das Comunicações e A... Portugal – Serviços de Consultoria e Informação, SA, ambas com os sinais nos autos, inconformadas com a sentença proferida pelo Mmo. Juiz do Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa dela vêm recorrer, concluindo como segue: - Recurso da A... Portugal – Serviços de Consultoria e Informação, SA: 1. O help desk é uma expressão informática que em termos práticos se traduz nas actividades de atendimento de telefonemas, na recepção de mensagens por via electrónica ou em suporte papel (fax), dos utilizadores que pretendam colocar questões.

  1. Por isso, quando, em qualquer contexto, é afirmado "o Help Desk da ANACOM" ou que o "Help Desk pertence à ANACOM", o que tal significa é que esta entidade é detentora desse serviço, embora quem o execute seja obviamente o prestador de serviços, no caso a Recorrente, enquanto adjudicatária.

  2. A proposta da Recorrente destina-se à execução de um conjunto de tarefas, desdobradas por diversas actividades, que de modo algum podem deixar de passar pela criação do Help Desk, bem como pela execução dos serviços de help desk e, concomitante e subsequentemente, pela sua gestão e manutenção.

  3. Daí poder afirmar-se que o help desk é pertença de quem o adquire - o ICP-ANACOM - mas sem deixar de ter presente que a sua execução cabe ao prestador de serviços contratado.

  4. Toda a proposta da Recorrente se cinge, portanto, à estrita vinculação ao Caderno de Encargos, nela se incluindo, obviamente, a execução pela Recorrente das tarefas de help desk do ICP-ANACOM.

  5. Existe uma contradição insanável na sentença: de páginas 18 a 25 analisa a noção de ambiguidade e de esclarecimentos, mas, depois, a páginas 25 afirma que afinal a questão central é outra, que desenvolve em três parágrafos, sem estabelecer qualquer ligação com o antes afirmado.

  6. A incorrecta identificação das questões que lhe competia solucionar, acrescida da contradição entre os fundamentos e a conclusão, implica, por força do artigo 94.°, n.° 1, do CPTA e alíneas b) e c) do n.° 1 do artigo 668.° do CPC, a nulidade da sentença.

  7. A formulação do Tribunal, utilizando de forma arrevesada duas negativas - construção que em bom português é sempre sinónimo da existência de uma alternativa (logicamente superior) -, revela que o Tribunal continuava a raciocinar com fundamento na existência de ambiguidades, e isto mesmo depois de ter afirmado que as mesmas não existiam.

  8. O que implica, igualmente por força do artigo 94.°, n.° 1, do CPTA e alínea c) do n.° 1 do artigo 668.° do CPC, a nulidade da sentença.

  9. Deu o Tribunal como assente, em K), factos sobre os quais depois se não pronunciou, constituindo essa omissão de pronúncia também uma violação do princípio do contraditório, o que implica ainda, por força do artigo 94.°, n.° 1, do CPTA e alínea c) do n.° 1 do artigo 668.° do CPC, a nulidade da sentença.

  10. A simples leitura e verificação do conteúdo dos slides 51 e 52, permite concluir em sentido oposto do que revela a sentença.

  11. É absurda a conclusão extraída do slide 55, porquanto nesse mesmo parágrafo da sentença que a contém, se conclui o contrário do que começa por ser afirmado.

  12. Verifica-se, pois, que os três exemplos apontados para fundar a decisão retirados da análise incompleta e errada dos slides 51, 52 e 55 permitem concluir precisamente o contrário do que foi expresso na sentença.

  13. Na verdade, o que dos citados três slides resulta inequivocamente é que a proposta da Recorrente se propõe executar todas as actividades inerentes ao help desk.

  14. Acresce que no slide 56 (seguinte ao 55) afirma-se expressamente a forma como serão resolvidas as consultas provenientes dos utilizadores, referindo, na indicação das "Actividades Principais", designadamente, a "Recepção da consulta encaminhada pelo Help Desk".

  15. Também os slides 86 e 87 o confirmam plenamente, em especial no que se refere ao "Funcionamento do Serviço de Desk" e a toda a descrição envolvente e explicativa do funcionamento das tarefas incluídas nessa prestação de serviços.

  16. De igual modo, todos os slides 85 a 91 se referem ao help desk como um serviço a cumprir durante a execução do contrato.

  17. O que significa que a análise de todos os demais slides, com destaque para os supra mencionados, permitiria confirmar, por evidente, que a Recorrente se propõe executar as funções do Help Desk.

  18. O help desk não é, como resulta do entendimento do julgador da primeira instância, um objecto que seja detido ou possa ser detido, sem ligação a um serviço prestado a utilizadores. É uma função que faz parte integrante da prestação de serviços e que se enquadra, desdobra e multiplica por diversas fases e actividades e com as outras fases e actividades.

  19. Deste modo, quando se refere que o help destk é detido pelo ICP-ANACOM ou que o ICP-ANACOM é detentor do help desk, o que está em causa é a assunção de que perante os utilizadores o help desk assim surge, assim se apresenta.

  20. Para além de todos os documentos e slides que constituem a proposta da Recorrente se encontrarem em consonância com o Caderno de Encargos, a Recorrente declarou e assinou, consciente e responsavelmente, a declaração anexa ao CCP, que contém uma inequívoca declaração de vontade de aderir, sem reservas, ao que dela é esperado na execução da prestação de serviços.

  21. A declaração negocial da Recorrente tem de ter o alcance que advém do disposto no artigo 236.° do Código Civil, porquanto "vale com o sentido que um declaratárío normal, colocado na posição do real declaratário, possa deduzir do comportamento do declarante".

  22. E, mesmo que alguma imperfeição tivesse subsistido, ela teria de ser interpretada e compatibilizada com a previsão do artigo 238.° e, consequentemente, avaliada positivamente, no sentido de ser conforme com a proposta, no seu conjunto, pois existe suficiente correspondência literal para apoiar a interpretação que a Recorrente expõe.

  23. A jurisprudência do Tribunal Central Administrativo do Sul e do Tribunal de Contas vão no sentido de permitir que a falta de indicação de determinados termos ou condições na proposta sobre aspectos de execução do contrato subtraídos à concorrência regulados no Caderno de Encargos não seja causa determinante de exclusão do procedimento por a situação não se subsumir na hipótese do art. 70° n° 2 b) CCP.

  24. Por isso, embora a situação subjudice não o configure, deveria o julgador de primeira instância ter analisado a referida expressão dos três slides nesta perspectiva.

  25. A sentença não avaliou a proposta no seu todo e esqueceu o verdadeiro sentido da declaração negociai emitida pela Recorrente, quer em primeiro lugar por aplicação do artigo 236.° do Código Civil, quer em segundo lugar ( ainda que apenas por hipótese de se admitir uma incorrecção ), pelo subsequente artigo 238°.

  26. Face à nota de rodapé n.° 6 da página 28 da sentença e tendo admitido a páginas 18 que a proposta continha "inicialmente ambiguidades", a consequência lógica e juridicamente correcta teria sido a de aceitar os esclarecimentos.

  27. Os esclarecimentos não foram para além da mera confirmação que a Recorrente tinha feito da correcta menção na proposta ao help desk do ICP-ANACOM, pois a resposta aos esclarecimentos apenas veio confirmar o verdadeiro sentido da afirmação da Recorrente.

  28. 29 Consequentemente, os esclarecimentos prestados são uma interpretação autêntica da menção aos serviços de help desk do ICP- ANACOM, sendo juridicamente relevantes em sede de análise e avaliação da proposta, no sentido de que ab initio a Recorrente se obriga a prestar esse serviço, assumindo como sua essa função.

  29. Contrariamente ao que o Tribunal a quo pretende, o acórdão T 195-08 do Tribunal Geral da União Europeia, de que a sentença cita apenas uma parte do n.° 4, vai no sentido de entender, como defende a Recorrente, designadamente nos seus n.°s 54 a 59, que, quando confrontada com uma proposta ambígua e se um pedido de esclarecimento sobre o conteúdo proposto puder garantir a segurança jurídica da mesma forma que a exclusão imediata da proposta, a entidade adjudicante deve pedir esclarecimentos ao proponente em causa, em vez de optar pela exclusão pura e simples da sua proposta.

  30. O direito ao esclarecimento da proposta encontra-se legalmente consagrado e a sua utilização no caso subjudice é inquestionável e sem margem para dúvidas. O entendimento contrário constitui, em consequência, um erro manifesto de apreciação da avaliação da prova e uma violação do artigo 72.°, n.° 2, do CCP 32. O que se verifica, pois, é que o esclarecimento da proposta tem o inteiro apoio da lei e vale como interpretação autêntica, pelo que a confirmação do sentido da sua proposta pela Recorrente tem de ser entendida no sentido de ser ela a executar o help desk.

  31. E, ainda que o entendimento do julgador fosse distinto, deveria, seguindo os princípios jurídicos aplicáveis, ter aceite o sentido que é mais favorável à Administração, concluindo não subsistirem razões para excluir a proposta da Recorrente, sobretudo depois de esta esclarecer de forma autêntica que assumia e cumpriria e de que forma essa assunção e esse cumprimento se conjugariam com os outros elementos da proposta.

  32. Embora se aceite que um receptor de boa fé pudesse ter dúvidas - como evidencia o facto de os slides terem sido deficientemente entendidos e interpretados pelo julgador da primeira instância - os esclarecimentos prestados confirmaram, na íntegra, a proposta apresentada e sem em nada a contradizer, porquanto a proposta apresentada e o esclarecimento em nada se contradizem, constituindo o esclarecimento uma interpretação autêntica e vinculativa para a Recorrente (artigo 238.° do C.Cv).

  33. A Recorrente o que fez foi apresentar à entidade adjudicante a interpretação comum no sector de help desk, enquanto termo técnico de conhecimento e de uso comum por todos os profissionais e utilizadores dos serviços de informação aos utentes, como é o caso deste contrato.

  34. Consequentemente, é errada a...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT