Acórdão nº 09143/12 de Tribunal Central Administrativo Sul, 18 de Outubro de 2012
Magistrado Responsável | ANA CELESTE CARVALHO |
Data da Resolução | 18 de Outubro de 2012 |
Emissor | Tribunal Central Administrativo Sul |
Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul: I.
RELATÓRIO A...
, devidamente identificado nos autos, inconformado, veio interpor recurso jurisdicional da decisão do Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa, datada de 26/06/2012 que, no âmbito do processo cautelar de suspensão de eficácia movido contra o Município de Lisboa e as contrainteressadas, Associação de Moradores do Bairro Alto e a Associação de Comerciantes do Bairro Alto, julgou improcedente o processo cautelar, não determinando a suspensão de eficácia do despacho nº 138/P/2011, proferido pelo Presidente da Câmara Municipal de Lisboa, publicado no 1º Suplemento do Boletim Municipal da Câmara Municipal de Lisboa, em 17/11/2011, no que respeita ao estabelecimento comercial do requerente.
Formula o recorrente, nas respetivas alegações (cfr. fls. 445 e segs. – paginação referente ao processo em suporte físico, tal como as referências posteriores), as seguintes conclusões, que se reproduzem: “1. A Recorrente explora um estabelecimento comercial cuja atividade se desenvolve na zona do Bairro Alto, em Lisboa.
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Foi publicado o despacho 138/P/2011, em 18 de novembro de 2011, pelo Sr. Presidente da Câmara Municipal de Lisboa, publicado em Boletim Municipal, que determinou o fecho do estabelecimento do Recorrente às 00h00.
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O fecho do estabelecimento determinou a perda de clientela e receitas, e consequente impossibilidade de pagamento dos encargos mensais fixos e variáveis, pondo em risco a viabilidade de funcionamento do estabelecimento.
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A douta sentença julgou improcedente a providência cautelar, alegando que a Recorrente não provou os danos sofridos com a emissão do despacho e consequente redução do seu horário de funcionamento.
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Ignorando a prova documental junta aos autos e a prova produzida em audiência de discussão e julgamento; 6. Contudo, entende a Recorrente que tal juízo não é correto, uma vez que não é possível antes da emissão do despacho demonstrar os prejuízos decorrentes da sua aplicação.
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Tal demonstração foi feita, como não poderia deixar de ser, à posteriori mediante junção de relatório do TOC, à ação principal de que a presente providência é apenas que a Meritíssima juíza não podia ignorar atento o seu conhecimento processual e funcional do mesmo.
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Conforme jurisprudência recente, a “perda de clientela” corresponde a um prejuízo qualificado, um prejuízo de difícil reparação, porquanto, a posteriori, não será possível, nem calcular o valor das vendas concreto efetivamente perdido pela Recorrente no período em que se viu forçada a encerrar, nem 9. Proceder a uma quantificação da “clientela” que, pela restrição horária imposta, se perdeu para estabelecimentos da concorrência.
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Por outro lado, é evidente, que o fecho por duas horas numa zona com comércio maioritariamente noturno, conduziu a uma redução drástica das receitas da recorrente, o que foi evidenciado pelo depoimento das testemunhas.
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o requisito do periculum in mora encontra-se preenchido sempre que os factos concretos alegados pelo requerente permitam perspetivar a criação de uma situação de impossibilidade da restauração natural da sua esfera jurídica, no caso de o processo principal vir a ser julgado procedente.
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(…) as providências cautelares também devem ser concedidas quando, mesmo que não seja de prever que a reintegração, no plano dos factos, da situação conforme à legalidade se tornará impossível pela mora do processo, os factos concretos alegados pelo requerente inspirem o fundado receio da produção de “prejuízos de difícil reparação” no caso de a providência ser recusada.
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Tal foi o entendimento sufragado nas sentenças que decretaram as providências cautelares intentadas por um grupo de comerciantes em 2010, a propósito de uma tentativa por parte da requerida de reduzir os horários de funcionamento dos estabelecimentos, e que correram termos sob o nºs de processo 1606/10.5BELSB e 1545/10.0BELSB.
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Sendo que após a entrada em vigor do despacho e alcance dos prejuízos efetivamente sofridos, pretendeu o Recorrente substituir as testemunhas inicialmente arroladas, por outras com conhecimento funcional dos danos causados, o que foi recusado pela meritíssima juíza, por entender inaplicável o CPC.
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Obstando a que o recorrente fizesse prova de que deixou de conseguir suportar a renda do locado e teve que despedir trabalhadores.
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Limitando injustificadamente o direito do recorrente a provar o periculum in mora que indubitavelmente se verifica.
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Não obstante a recorrida ter deduzido oposição sustentando a não aplicabilidade do despacho ao estabelecimento da recorrente e a falta de interesse em agir, veio a douta sentença a ignorar tal circunstância.
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Considerando inclusive que o estabelecimento do requerente vendia bebidas engarrafadas para consumo no exterior, apesar de constar em relatório elaborado pelos serviços de fiscalização da própria requerida factos que infirmam em absoluto o teor do depoimento da testemunha considerada pela meritíssima juíza.”.
Termina pedindo a procedência do recurso jurisdicional e revogada a sentença, que decrete a suspensão judicial de eficácia do despacho suspendendo.
* O requerido, notificado, apresentou contra-alegações, formulando as seguintes conclusões (cfr. fls. 473 e segs.): “- A Resolução Fundamentada foi emitida e junta aos autos no prazo legal de 15 dias, em cumprimento do disposto no nº 1 do artº 128º do CPTA.
- Contrariamente ao alegado pelo Recorrente no ponto 5, a entidade recorrida entende que a prova documental apresentada com o requerimento inicial é parca e diminuta para os factos que pretendia efetivar com a presente providência cautelar e nula quanto à prova dos prejuízos invocados.
- A prova testemunhal realizada em audiência não logrou provar os factos invocados, não passando de meros juízos de valor ou de opinião, não convencendo o Tribunal.
- O Requerente não se encontra numa situação de periculum in mora, pois caso contrário teria demonstrado os prejuízos que invocou.
- O requerente não cumpriu com o ónus da prova que lhe competia.
- A sentença ora recorrida não merece a censura que lhe é dirigida, pelo que deverá manter a sua eficácia na ordem jurídica.”.
Termina pedindo que seja negado provimento ao recurso interposto pelo requerente.
* O Ministério Público junto deste Tribunal notificado nos termos e para efeitos do disposto no art. 146.º do CPTA, emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso (cfr. fls. 507 e segs.), por a sentença não padecer das ilegalidades que lhe vêm assacadas.
* Discordando do parecer emitido pelo Ministério Público, pronunciou-se o requerente.
* O processo vai, sem vistos dos Exmos. Juízes-Adjuntos, à Conferência para julgamento.
II.
DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO - QUESTÕES A APRECIAR Cumpre apreciar e decidir a questão colocadaa pelo recorrente, sendo certo que o objeto do recurso se acha delimitado pelas conclusões das respetivas alegações, nos termos dos arts. 660º, n.º 2, 664º, 684º, nºs 3 e 4 e 690º, n.º 1 todos do CPC ex vi artº 140º do CPTA.
A questão suscitada resume-se, em suma, em determinar se a decisão judicial recorrida enferma de erro de julgamento quanto ao pressuposto periculum in mora.
III.
FUNDAMENTOS DE FACTO O Tribunal a quo deu como assentes os seguintes factos: “1 – Em 18.11.2011, foi proferido pelo Presidente da Câmara Municipal de Lisboa, o despacho n.° 138/P/2011 de 16/11/2011, cujo teor abaixo reproduz-se na íntegra (cfr. docº de fls. 24 e 25 dos autos, junto com o r.i.): “(…) O Bairro Alto é uma área habitacional e comercial em que se desenvolve uma intensa atividade de restauração e bebidas e de diversão noturna, sendo que em particular na zona delimitada pela Rua de O Século, pela Calçada do Combro, pela Rua da Misericórdia, pela Rua Pedro de Alcântara e pela Rua D. Pedro V, se encontram instalados e em laboração cerca de 300 estabelecimentos de restauração e bebidas.
Verifica-se, porém, que também em face da limitação à instalação de novos estabelecimentos de restauração e bebidas constante do Plano de Urbanização aplicável têm vindo a iniciar laboração no Bairro Alto estabelecimentos de venda a retalho, nomeadamente designados de lojas de conveniência, bem como outros, que, não constituindo igualmente estabelecimentos de restauração e bebidas, são em abstrato suscetíveis de se integrar no Grupo I do Regulamento dos Horários de Funcionamento dos Estabelecimentos de Venda ao Publico e de Prestação de Serviços no Concelho de Lisboa, aprovado por Deliberação n.° 87/AM/1997, e publicado no Boletim Municipal n° 191, de 1997/20/14 (doravante Regulamento).
(...) Com efeito, a atividade destes estabelecimentos e de outros que, embora vocacionados para um tipo de comércio distinto, procedem não obstante à venda de bebidas, tem-se traduzido essencialmente na venda de bebidas alcoólicas a retalho, com inicio nos períodos de maior afluência ao...
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