Acórdão nº 2079/09.0TTPNF.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 11 de Julho de 2012
Magistrado Responsável | EDUARDO PETERSEN SILVA |
Data da Resolução | 11 de Julho de 2012 |
Emissor | Court of Appeal of Porto (Portugal) |
Processo nº 2079/09.0TTPNF.P1 Apelação Relator: Eduardo Petersen Silva (reg. nº 165) Adjunto: Desembargador Machado da Silva Adjunto: Desembargadora Fernanda Soares Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação do Porto: I. Relatório B…, residente em …, Marco de Canaveses, intentou contra a Junta de Freguesia …, com sede no …, Marco de Canaveses, a presente acção declarativa, com processo comum, emergente de contrato individual de trabalho, pedindo: - Que seja considerada nula a cláusula do contrato de trabalho inicialmente celebrado entre a Autora e a Ré e convertido em contrato sem termo certo ou incerto.
- A não ser considerada nula tal cláusula ou a não ser convertido em contrato sem termo o contrato inicialmente celebrado, que seja convertido em contrato sem termo o contrato de trabalho celebrado em 15 de Setembro de 2003, quer por se considerar nula a cláusula que estipulou o termo, quer por força das respectivas renovações.
- Que seja reconhecido que o vínculo laboral é de carácter permanente e condenada a Ré a proceder à reintegração da Autora no seu posto de trabalho.
- Que a Ré seja condenada a pagar à Autora, a título de danos não patrimoniais, o montante de €5.000,00.
- Que a Ré seja condenada a pagar à Autora os salários devidos desde trinta dias antes de proposta a acção até ao trânsito em julgado da decisão final.
- Em alternativa, caso não se entenda que o contrato de trabalho se converteu em contrato sem termo, deve a Ré ser condenada a pagar à Autora uma compensação pela não renovação, no valor de €1.922,40.
- Que a Ré seja condenada no pagamento de juros, a contar desde a citação, até integral pagamento.
A final, a Autora requereu ainda, ao abrigo do disposto no artigo 234.º do Tratado da Comunidade Europeia, o reenvio prejudicial para o TJCE, a fim de se pronunciar quanto à interpretação da Directiva Comunitária nº 1999/70/CE, do Conselho, de 28 de Junho, respeitante ao acordo quadro CES, UNICE e CEEP relativo a contratos de trabalho a termo, transposta para o nosso ordenamento jurídico pela Lei 99/2003, de 27-8, sugerindo, entre outras questões que o Tribunal decida colocar, as seguintes dúvidas de interpretação: 1ª A Directiva aplica-se aos contratos ou relações de trabalho a termo celebrados com órgãos da administração pública e outras entidades do sector público? 2ª A interpretação do artigo 5º, nº 1, a) do acordo-quadro deve ser feita no sentido de que se opõe à utilização de contratos de trabalho a termo sucessivos? 3ª A interpretação da referida Directiva Comunitária deve ser feita de modo a proibir a conversão de contratos a termo em contrato sem termo no âmbito de uma relação de trabalho tal como se encontra descrita na Petição Inicial? Alegou a A., em síntese, que celebrou com a Ré, em 1 de Outubro de 2002, um contrato de trabalho a termo certo, pelo período de 10 meses, para desempenhar as funções de auxiliar de cozinha no Jardim de Infância …, de acordo com o horário de trabalho de 25 horas semanal, mediante a retribuição mensal ilíquida de €270,00.
Em 15 de Julho de 2003, terminou o ano escolar e o Jardim-de-infância encerrou para férias escolares.
No dia 15 de Setembro de 2003, Autora e Ré celebraram um contrato de trabalho a termo certo, com início em 15 de Setembro de 2003 e termo em 15/07/04, para exercer as funções de auxiliar de cozinha no Jardim-de-infância …, mediante a retribuição de €375,00, com o horário de trabalho de 35 horas semanal.
No final do ano lectivo, 15 de Julho de 2004, o Jardim-de-infância fechou para férias escolares e só reabriu em 15 de Setembro de 2004.
Neste período de tempo a Autora manteve-se em casa com o compromisso de que deveria comparecer ao serviço em 15 de Setembro de 2004, sendo que não foi comunicado à Autora a caducidade do contrato a termo celebrado em 15 de Setembro de 2003.
Em 15 de Setembro de 2004, com a abertura do ano escolar, a Autora retomou as suas funções de auxiliar de cozinha e apoio às crianças no prolongamento do horário escolar, continuando a exercer as mesmas funções de auxiliar de cozinha, mas foi reduzida a retribuição para o montante de €240.30 e foi reduzido o horário de trabalho para cinco horas por dia.
Em 15 de Julho de 2005, o ano escolar terminou e encerrou o Jardim-de-infância, pelo que a Autora permaneceu em casa até 15 Setembro de 2005, com o compromisso de que deveria comparecer na reabertura do Jardim-de-infância.
Nesta data retomou as funções que até então exerceu e continuou a receber a mesma retribuição de €240,30 e a cumprir o mesmo horário de trabalho que cumpriu no ano escolar anterior.
Em 15 de Julho de 2006, terminou o ano escolar, e a Autora foi para casa, com o compromisso assumido com o Presidente da Junta de Freguesia de se apresentar ao serviço em 15 de Setembro desse ano.
Em 15 de Setembro de 2006, a Autora retomou as suas funções que exerceu no ano escolar anterior, a auferir a mesma retribuição e a cumprir o mesmo horário de trabalho.
Em 15 de Julho de 2007, o Jardim-de-Infância fechou, pelo que a Autora foi para casa até que reabrisse, com o compromisso assumido com o Presidente da Junta de Freguesia de se apresentar ao serviço em 15 de Setembro desse ano.
Em 15 de Setembro de 2007, a Autora retomou as funções que sempre exerceu no ano escolar anterior e a auferir a mesma retribuição do ano escolar anterior e manteve-se no mesmo local de trabalho até 15 de Julho de 2008, data em que terminou o ano escolar e encerrou o Jardim-de-infância, pelo que a Autora foi para casa com o compromisso assumido com o Sr. Presidente da Junta de Freguesia que quando reabrisse o ano escolar comparecia ao serviço.
No dia 15 de Setembro de 2008 a Autora compareceu ao trabalho e retomou as suas funções de auxiliar de cozinha e apoio às crianças da escola … e manteve a retribuição de €240,30.
No dia 15 de Outubro desse ano, foi realizada uma reunião entre a Junta de Freguesia e as trabalhadoras do Jardim-de-Infância, tendo o então Presidente da Junta proposto às trabalhadoras que assinassem um novo contrato de trabalho onde constava a data de 15 de Setembro, mas com novas cláusulas contratuais.
A Autora recusou-se a assinar esse contrato de trabalho enquanto que outras colegas de trabalho assinaram o contrato que lhes foi proposto assinar.
Da matéria supra alegada resulta que Autora e Ré celebraram dois contratos a termo certo pelo período de dez meses cada um, o primeiro com data de 1 de Outubro de 2002 e o segundo com data de 15 de Setembro de 2003 e termo em 15 de Julho de 2004.
Em 19.05.2009, a Ré enviou à Autora uma carta comunicando a caducidade do contrato para o dia 15 de Julho de 2009.
Aquando a comunicação da caducidade do contrato do trabalho da Autora, a Ré fez igual comunicação a todas as outras trabalhadoras com as quais tinha vínculo laboral.
No entanto, com excepção da Autora e de outra colega de trabalho, C…, todas as demais trabalhadoras às quais havia sido comunicada a caducidade de contrato de trabalho, celebraram, em Setembro de 2009, outro contrato de trabalho, para exercer as mesmas funções.
Apesar de ter comunicado a caducidade do contrato de trabalho, a Ré não pagou à Autora qualquer compensação pela caducidade do contrato de trabalho.
Em Julho de 2009, a Ré pagou à Autora a retribuição referente ao mês de Junho no valor de €286,07 e 15 dias de trabalho referente ao mês de Julho no valor de €160,72 e ainda €174,11 referente a subsídio de férias e €174,11 referente a subsídio de natal.
A comunicação de caducidade constitui um despedimento, motivado por mera represália, por a A. ter intentado uma acção laboral contra a Ré.
A Autora sentiu-se discriminada face às restantes colegas, castigada e humilhada por recorrer à justiça, e perdeu parte dos rendimentos familiares. Sentiu-se triste e ao mesmo tempo muito ofendida com a Ré, que havia dado expectativas de que com o acordo alcançado em Tribunal, o assunto se encontrava sanado e ultrapassado.
A Ré apresentou contestação, excepcionando a incompetência em razão da matéria e impugnando. A Câmara Municipal …, na sua acção em matéria educativa, incentivou e pôs em funcionamento Jardins-de-Infância em todas as freguesias do concelho, e porque não tem pessoal, nem meios económico-financeiros para sustentar e pôr em prática tal política em plenitude, pediu a colaboração das Juntas de Freguesia do concelho, e dos pais das crianças que contribuem mensalmente, com quantia simbólica. A Câmara Municipal concede a cada Junta de Freguesia um certo subsídio, competindo a esta a gestão do Jardim-de-Infância, pagando ao pessoal auxiliar e os gastos da cantina que o serve. Para tanto, a Ré teve que organizar em cada Jardim-de-Infância a respectiva cozinha e refeitório, contratando o pessoal mínimo indispensável.
Os Jardins-de-Infância laboram apenas 10 meses por ano, incluindo já as férias escolares, sendo que a Câmara Municipal celebra no início do ano escolar um protocolo com a Junta de Freguesia onde são definidos os direitos e deveres das partes, o qual vigora pelo período coincidente com o ano lectivo e sujeito a renovação expressa ou tácita.
O pessoal contratado para o funcionamento das cozinhas e dos refeitórios sempre teve conhecimento do protocolo e de que a sua actividade é anual e sempre aceitou e reconheceu que a cada ano correspondia um contrato autónomo e distinto.
A Autora foi contratada pela Ré dentro do referido condicionalismo, tal como os demais trabalhadores da cozinha e do refeitório, ou seja, todo o pessoal auxiliar, inexistindo qualquer quadro para ela na Junta de Freguesia.
A Ré, no âmbito do protocolo celebrado anualmente com a Câmara Municipal ou renovado anualmente, celebrava um contrato, por igual período, para cada ano lectivo e para cada trabalhador. Tal contrato a termo certo findava em 15 de Julho e era então emitida a respectiva declaração para o Fundo de Desemprego.
Assim, a cada ano lectivo correspondeu um contrato a termo certo, o qual não era renovável, nem podia transformar-se em contrato por tempo...
Para continuar a ler
PEÇA SUA AVALIAÇÃO