Sentença
Autor | Helder Martins Leitão |
Cargo do Autor | Advogado |
Páginas | 105-120 |
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Ouvidas as partes, os técnicos, os peritos, as testemunhas, os advogados e dadas as respostas à matéria de facto controvertida, 194 finda a audiência de discussão e julgamento, será proferida a sentença. 195
É desta, pois, que vamos tratar nas páginas subsequentes. Começando até por fornecer um exemplo de decisão para que, logo após, com a prática por trás, mais perceptivelmente se possa escrever.
- Quintino Pinto - intentou a presente acção sumária contra Fernando Oliveira Onofre e mulher Felismina Onofre, com os seguintes fundamentos:
O A. é dono e legítimo possuidor de um prédio urbano, sito na Rua dos Mastros, em Baião, e que confronta a nascente com o prédio dos réus.
- Em Novembro de ____ os réus fizeram obras no seu prédio, e construiram um muro a delimitar a sua propriedade da Rua dos Mastros.
- Ao construirem esse muro apoiaram-no no meio da parede da casa do autor, ficando essa parede a servir de seu suporte. Com isto, os réus ocuparam terreno do autor pois construiram o mesmo sobre um alicerce da casa, com a largura de cerca de 15 cms..
- O muro construído pelos réus está a provocar aberturas e fendas na parede da casa do autor, encontrando-se ainda sobrecarregado com videiras.
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Desocupação da parte do alicerce da casa do A. que os réus ocuparam.
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Demolição do muro de vedação na parte em que se encontra encostado na parede da casa do A..
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Indemnização dos prejuízos, a liquidar em execução de sentença. - Junta documentos, fotografias e procuração.
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Contestam os réus, impugnando toda a matéria no seu essencial, articulada pelo autor, pedindo a improcedência da acção.
Juntam fotografias, documentos e procuração. Procedeu-se à audiência preliminar. Os réus, ao abrigo do art. 506º do C.P.C., apresentaram novo articulado, daí resultando a elaboração de mais dois factos controvertidos.
Durante a audiência de discussão e julgamento procedeu-se a uma inspecção ao local, tendo decorrido dentro do ritualismo, legalmente, exigido.
As respostas aos factos controvertidos fixaram-se, após uma reclamação do autor que foi admitida.
Manteve-se a validade da instância.
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O autor é dono do prédio urbano sito na Rua dos Mastros, em Baião, inscrito na matriz sob o artigo 1820.
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Esse prédio confronta, a nascente, com o prédio dos réus.
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Em Novembro de _____, os réus fizeram obras no seu prédio.
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No prédio dos réus existem ramadas, junto a um muro, do lado nascente da casa do autor.
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A parede da casa do autor, do lado nascente, apresenta fendas.
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Em Novembro de ____, os réus reconstruíram um muro que delimitava a sua propriedade na Rua dos Mastros.
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No muro, os réus colocaram na sua parte superior uma grade artística e carapinharam a cimento o lado que dá para a Rua dos Mastros.
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O muro encosta no prédio do autor.
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As ramadas existentes estão apoiadas em tubo de ferro, pilares de granito e esticadores, tudo assente em terreno dos réus.
O autor pediu a desocupação da parte do alicerce de sua casa, ocupada pelos réus com a construção de um muro em Novembro de 1999, com consequente demo- lição, dessa parte do muro que se mantem encostado na parede da casa do autor e ainda uma indemnização a liquidar em execução de sentença, dos prejuízos sofridos.
Ao autor competia a prova dos factos alegados, nos termos do art. 342º do C. Civil.
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Ao não conseguir provar os factos sob os n.os 2, 3 e 4 e em função da matéria dada como provada, não há elementos de prova bastante e suficiente para integração da causa de pedir invocada.
O mesmo sucede em relação aos eventuais prejuízos sofridos.
Nos termos expostos, julga-se a acção improcedente, por não provada, absolvendo-se os réus dos pedidos formulados.
Custas pelo autor. Registo e notifique.
-
José Salcedas Abrenúncio. Após a discussão do aspecto jurídico da causa 196 é o processo concluso ao juiz para que profira a sentença.
Mas, não só. Com efeito, a conclusão dos autos ao juiz, neste estádio, tem uma dupla função:
exercício de acção fiscalizadora decisão
Prescrute o juiz, qualquer irregularidade na tramitação do processo, da qual lhe cumpra conhecer, oficiosamente, e terá que providenciar para o respectivo suprimento.
Na sentença há a considerar a forma externa e a estrutura intrínseca. As exigências da primeira, constam do seguinte normativo do C.P.C.:
«Artigo 157.º Requisitos externos da sentença e do despacho 1 - As decisões judiciais serão datadas e assinadas pelo juiz ou relator, que devem rubricar ainda as folhas não manuscritas e proceder às ressalvas consideradas necessárias; os acórdãos serão também assinados pelos outros juízes que hajam intervindo, salvo se não estiverem presentes, do que se fará menção.
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2 - As assinaturas dos juízes podem ser feitas com o nome abreviado. 197
3 - Os despachos e sentenças proferidos oralmente no decurso de acto de que deva lavrar-se auto ou acta são aí reproduzidos. A assinatura do auto ou da acta, por parte do juiz, garante a fideli- dade da reprodução.
4 - As sentenças e os acórdãos finais são registados em livro especial.»
Quanto à estrutura interna, há a considerar na sentença, três partes:
Relatório fundamentação decisão .A sentença começa por identificar as partes e o objecto de litígio, fixando as questões que importa solucionar.
Essencialmente e para além do aspecto puramente formal e secundário, a sentença deve definir, com precisão, os termos da controvérsia, desenhar com nitidez, o esquema do litígio.
O juiz é chamado a decidir um pleito? Importa, pois, que faça a concatenação desse pleito, fixe com toda a clareza a questão ou questões que a sentença tem de resolver.
É este o papel do relatório. As deficiências e anomalias de que enfermem os fundamentos e a decisão podem produzir a nulidade da sentença, enquanto que os defeitos do relatório são sobre este aspecto, irrevelantes, donde se conclui que, juridicamente, o relatório tem muito menor importância que os fundamentos e a decisão.
Uma decisão pode ser justa e estar fundamentada com toda a correcção, apesar de ser deplorável o relatório da sentença; em tal caso, a técnica geme, mas a justiça salvou-se, e é isto o que, sobretudo, interessa.
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Acompanhemos a pergunta feita por Alberto dos Reis, quando confrontado com o conteúdo do art. 659.º C.P.C.: porque é que este normativo ligou tanto apreço ao relatório, que se deu ao trabalho de indicar, minuciosamente, como deve ser elaborado?
Foi por uma razão de método e boa disciplina mental que se desceu até a formulação das directrizes a que deve obedecer o relatório.
Se o papel do relatório se resume, afinal, em pôr a questão ou questões que a sentença há-de decidir, não pode deixar de convir-se que, no plano da técnica, o valor e a influência daquele são consideráveis.
É ensinamento elementar que o modo por que se põe uma questão tem importância, por vezes capital e decisiva, para a solução que lhe vai ser dada.
Questão mal posta é, por via de regra, questão mal resolvida. Como se disse, pode suceder que o relatório seja imperfeito ou confuso e, todavia, os fundamentos e decisão estejam certos; mas o que há-de ser raro e excepcional é que o relatório esteja errado e que a decisão se mostre certa.
Pena é que os magistrados, por vezes, reconduzam o relatório a uma reprodução fiel do que as partes disseram.
Alguns tratadistas já se insurgiram contra esta prática, por a entenderem deprimente e prejudicial.198
Deprimente, porque não é curial que o juiz se transforme em mero copista, tanto mais que os articulados são muitas das vezes uns desarrazoados sem interesse, pobres e mesmo em mau português. 199
Poderá ser muito cómodo para o magistrado, mas também é muito mau para a sua figura.
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Prejudicial, porque lançando-se nos articulados, como soe...
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