Acórdão nº 1696/08.0TBFAR.E1.S2 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 27 de Setembro de 2012

Magistrado ResponsávelFERNANDO BENTO
Data da Resolução27 de Setembro de 2012
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça RELATÓRIO A Associação Grupo Desportivo e Cultural dos AA demandou, em 27-06-2008, BB e mulher, CC em acção de processo ordinário, pedindo o reconhecimento do direito de propriedade sobre o prédio rústico composto de terra de cultura com árvores com a área de 11.700 m2, inscrito na matriz predial rústica da freguesia dos AA, concelho de São Braz de Alportel sob o art. 13.884 e descrito na Conservatória do Registo Predial sob o nº 0000000000 com fundamento em usucapião já que lhe teria sido verbalmente doado pelos RR em 15-11-1990 e a partir daí teria exercido actos de posse pública, pacífica durante o tempo necessário à usucapião, como única e exclusiva proprietária de tal imóvel.

Subsidiariamente, invoca a aquisição do direito de propriedade por acessão industrial imobiliária, já que teriam sido realizadas, por si e com autorização dos RR, obras nesse prédio no valor de € 206.167,50 euros, com vista à construção de um campo de futebol, sendo certo que o prédio tinha anteriormente o valor de € 1.500 euros e as ditas obras lhe acrescentaram valor daquele montante de € 206.167,50 euros, pelo qe o prédio teria agora o valor de € 207.667,50 euros.

Os RR defenderam-se por impugnação, reconduzindo as obras realizadas ao regime das benfeitorias por força do comodato do prédio que teriam celebrado e deduziram reconvenção, reivindicando o direito de propriedade sobre o imóvel e peticionado a sua restituição bem como a interdição da Autora de utilizar o prédio em actividades desportivas ou outras.

A Autora replicou, contestando a reconvenção e ampliando o pedido e a causa de pedir, pedindo subsidiariamente a condenação dos RR a indemnizá-la pelas benfeitorias realizadas.

Os RR treplicaram.

Foi deferida a ampliação do pedido, a fixação à causa do valor de € 207.6676,50 euros, a admissão do pedido reconvencional de restituição do prédio e a não admissão do pedido reconvencional de interdição da utilização do prédio pela Autora.

Seguidamente, foram discriminados os factos assentes dos ainda controvertidos.

Depois de iniciada a audiência de julgamento, e já no decurso da produção de prova, a MMa Juiz ordenou oficiosamente a gravação da prova.

Concluída a audiência e decidida a matéria de facto controvertida, foi proferida sentença que – depois de, na respectiva fundamentação, haver entendido que a Autora não adquiriu nem podia adquirir, por usucapião, o direito de propriedade sobre o prédio - julgou procedente o pedido deduzido subsidiariamente de reconhecimento do direito de propriedade adquirido por acessão industrial imobiliária, condenando-se os RR nesse reconhecimento mediante o pagamento pela Autora a eles da quantia de € 1.496,39 euros, actualizados sob pena de caducidade e julgando improcedente a reconvenção.

Os R.R. requereram que lhes fosse facultada cópia da gravação dos depoimentos prestados na audiência de discussão e julgamento, e, em seguida, arguiram a nulidade do depoimento de parte do R. com fundamento em não ter ficado gravado nem transcrito na acta da audiência de julgamento, mas tendo, apesar disso, o Tribunal fundado nesse depoimento de parte a sua decisão, ao que a A. se opôs, invocando que a gravação dos depoimentos não era obrigatória e nenhuma das partes a requerera.

O Mmo. Juiz indeferiu a arguida nulidade, com fundamento em não ter sido requerida a gravação da prova, o que teria significado renúncia das partes à reapreciação da matéria de facto pelo Tribunal superior, e na sua não obrigatoriedade, gravação que só teria sido decidida, por razões de ordem prática, depois de prestado o depoimento de parte do R.

Os RR apelaram para o Tribunal da Relação de Évora.

Debalde o fizeram, já que a sentença foi confirmada.

De tal acórdão interpuseram os RR recurso de revista excepcional que a Formação a que alude o nº 3 do art. 721-A do CPC admitiu.

Na sequência desse recurso, o STJ por acórdão de 06-09-2011, concedeu a revista e anulou a decisão recorrida, ordenando a baixa do processo à Relação a fim de se proceder à reforma do acórdão pelos mesmos Ex.mos Desembargadores, se possível, com apreciação da impugnação da matéria de facto.

Cumprindo o assim determinado, o processo voltou ao Tribunal da Relação de Évora onde foi proferido novo acórdão que, depois de apreciar e desatender a impugnação da matéria de facto, manteve o anteriormente proferido acórdão de confirmação da sentença de 1ª instância.

Novo recurso de revista excepcional interposto que a douta Formação aludida admitiu e que, como tal, foi distribuído.

Corridos os vistos e nada obstando ao conhecimento do recurso, cumpre apreciar.

FUNDAMENTAÇÃO Matéria de Facto As instâncias consideraram provada a seguinte matéria de facto: 1) O prédio rústico sito nos AA, Freguesia e Concelho de S. Brás de · Alportel, encontra-se descrito na Conservatória Reg. Predial de S. Brás de · Alportel sob o n° 0000000000 e inscrito na respectiva matriz sob o art.13884; 2) o prédio referido na alínea anterior e composto de terra de cultura com árvores, com a área de 11.700 m2, que confronta do Norte com DD, do Sul com o limite do Concelho, do Nascente com EE e do Poente com FF, e tem o valor patrimonial de € 53,68; 3) A A. não possui documento que lhe permita realizar o registo de aquisição a seu favor do referido prédio na Conservatória Reg. Predial de S. Brás de Alportel; 4) o prédio referido na alínea 1) encontra-se inscrito a favor dos R.R. desde ,19.5.1995; .

5) A A. é uma associação de carácter desportivo, recreativo e cultural, constituída por escritura pública no dia 15.11.1990, no Cartório Notarial de s. Brás de Alportel, e dotada de utilidade pública; 6) A A. utiliza o prédio referido na alínea 1) como campo de futebol, desde a data da sua constituição, ou seja, desde 15.11.1990; 7) A A. utilizou o prédio referido na alínea 1), inicialmente para a prática de futebol amador pelos sócios, e, posteriormente, também para a prática de futebol federado; 8) A A. utiliza e permite que os seus associados utilizem o prédio referido na alínea 1) desde 15.11.1990; 9) o prédio referido na alínea 1) foi adquirido pelos R.R. por sucessão : hereditária, por óbito de GG e de HH, pais do R. marido; 10) Os R.R., através de notificação judicial avulsa, notificaram a A. para, até ao dia 30.6.2008, proceder à devolução do terreno; 11) o negócio celebrado entre os R.R. e a A., referente à utilização do prédio referido na alínea 1), pelos primeiros à segunda, não foi reduzido a escrito; 12) Desde 15.11.1990 que a A. utiliza e frui o prédio referido na alínea 1), com exclusão de outrem, de forma contínua e ininterrupta, à vista de todos e sem oposição de quem quer que seja; 13) A A. tem como actividade principal a prática de futebol; .

14) A actividade referida na anterior alínea 13) era já praticada em meados de 1988, ainda antes da constituição da A., como entidade com personalidade · jurídica, por aqueles que vieram a ser os seus fundadores e futuros associados; 15) Os R.R. permitiram o uso do terreno para a prática de futebol, primeiro por aqueles que viriam a ser os corpos gerentes e associados da A. e, a partir de 15.11.1990 (data de constituição da A.), por esta; 16) Em meados de 1992, no prédio referido na alínea 1), a A.: - procedeu à limpeza do terreno; - Procedeu à abertura de caixa e ensaibramento do recinto de jogos; - Procedeu à execução de sistema de drenagem do recinto de jogos; - Fez vedações em rede de malha elástica nos topos do recinto de jogos, as quais foram assentes em murete de alvenaria no topo Sul e no terreno no topo Norte; - Procedeu à vedação do recinto de jogos em tubo galvanizado com sapata de betão; - Procedeu à abertura de caixa, ensaibramento e espalhamento de gravilha, em redor do recinto de jogos; - Procedeu à execução de um sistema de iluminação do campo de jogos, através de seis postes, com cerca de 14 metros de altura cada, possuindo cada poste dois projectores, cabos de alimentação e distribuição de energia, além de um quadro de manobra e comando; - Procedeu à construção de abrigos em estrutura tubular revestida a chapa metálica, pintada, para os elementos não activos das equipas em jogo; - Procedeu à construção de uma rede de rega do campo ao longo de toda a lateral Poente; - Procedeu à montagem de uma bancada metálica para a assistência oferecida pelo Futebol Clube Olhanense, com onze bancos e zonas de camarotes – com cerca de 24,00x7,00 atingindo uma altura aproximada de 4,90 metros, sendo a cobertura em chapa metálica perfilada e os assentos e circulação constituídos por lajetas de betão; - Colocou sete postes em tubo de aço galvanizado, fixados a bases de betão, equipados para içar bandeiras; - Procedeu à construção de um edifício preparado para posto médico e lavandaria; - Procedeu à construção de um edifício preparado para balneários/vestiários, bar, arrecadação e instalações sanitárias para o público; - procedeu à construção de uma plataforma, com pavimento de betão afagado, na frente dos edifícios mencionados nos dois pontos que antecedem.

17) Por carta datada de 6.12.1993, a A. solicitou à Comissão de Vistorias da Associação de Futebol do Algarve um pedido de vistoria ao campo de futebol, a fim de nele se poderem realizar provas oficiais, no escalão juvenil; I8) A A. organiza os eventos que têm lugar no prédio referido na alínea 1); 19) A A. procede à manutenção das infra-estruturas que construiu no prédio referido na alínea 1) e toma todas as decisões respeitantes ao mesmo; 20) Antes da realização das obras referidas na alínea 16}, ou seja, em · 15.11.1990, o prédio referido na alínea 1) valia 300.000$00 (€ 1.496,39); 21) As obras referidas na alínea 16) ascendem o valor de € 185.197,00; 22) As obras referidas na alínea 16) não podem ser retiradas sem danificar o · prédio referido na alínea 1); 23) As obras referidas na alínea 16) aumentaram o valor económico do prédio · referido na alínea 1) em € 185.197,00; 24) As obras referidas alínea 16) foram realizadas à vista de toda a...

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