Tramitação
Author | Helder Martins Leitão |
Profession | Advogado |
Pages | 201-214 |
Page 201
É no n.º 6, do art. 280.º da C.R.P. 534 que se encontra marcado o âmbito dos recursos para o Tribunal Constitucional, que os restringe à questão da insconstitucionalidade ou da legalidade, conforme os casos. 535
A questão de inconstitucionalidade ou de ilegalidade mais não é que a apreciação se determinada norma, em sua aplicação ao feito submetido a julgamento, 536 é contrária à Constituição ou aos princípios nela consignados, a uma lei com valor reforçado, a um estatuto regional ou a uma lei geral da República.
À tramitação dos recursos 537 para o Tribunal Constitucional são subsidiariamente aplicáveis as normas do Código de Processo Civil, em especial as respeitantes ao recurso de apelação.
E estas, estendem-se do art. 691.º ao art. 720.º, inclusive. 538
Posto isto, determinado o objecto e a lei aplicável, convirá, agora e aqui, enunciar quais as decisões dos tribunais de que pode recorrer-se para o Tribunal Constitucional.Page 202
E, são estas, as decisões recorríveis:
- que recusem a aplicação de qualquer norma, com fundamento em inconstitucionalidade
Foi dito atrás, na alínea = A = desta IV Parte, que abrigado no sistema misto, foi dada aos tribunais, a possibilidade de apreciar a constitucionalidade das leis aplicandas.
Ora, quando o tribunal determine a inaplicabilidade de qualquer norma, por a achar inconstitucional, o facto, pode, naturalmente, descontentar uma das partes.
Parte essa que pode, entretanto, reagir, recorrendo, precisamente, para o Tribunal Constitucional.
- que apliquem norma cuja inconstitucionalidade haja sido suscitada durante o processo
É de esclarecer que este recurso tão-somente pode ter lugar quanto a decisões que não admitam recurso ordinário, por a lei o não prever ou por já haverem sido esgotados todos os que no caso cabiam, salvo os destinados a uniformização de jurisprudência.
E, duas anotações são imprescindíveis para o completo entendimento do acabado de referir:
-
são equiparadas a recursos ordinários, as reclamações para os presidentes dos tribunais superiores, nos casos de não admissão ou de retenção do recurso, bem como, as reclamações dos despachos dos juízes relatores para a conferência;
-
entende-se que se acham esgotados todos os recursos ordinários, quando tenha havido renúncia, haja decorrido o respectivo prazo sem a sua interposição ou os recursos interpostos não possam ter seguimento por razões de ordem processual;
- que recusem a aplicação de norma constante de acto legislativo com fundamento na sua ilegalidade por violação de lei com valor reforçado
É um outro caso de decisão sobre constitucionalidade/inconstitucionalidade da apreciação dos tribunais, desta feita, na vertente da legalidade/ilegalidade, tudo decorrente da adopção, entre nós, do sistema misto, tal como o expuzemos páginas atrás.
- que recusem a aplicação de norma constante de diploma regional, com fundamento na sua ilegalidade por violação do estatuto da região autónoma ou de lei geral da RepúblicaPage 203
Bom, o que se disse no item antecedente aplica-se, por inteiro, neste caso, é questão de mudar a agulha, das leis do continente para as do estatuto da região autónoma. 539
- que recusem a aplicação de norma emanada de um órgão de soberania, com fundamento na sua ilegalidade por violação do estatuto de uma região autónoma
Como o leitor facilmente se aperceberá, é uma variante do item anterior, bastando substituir «norma constante de diploma regional», por «norma emanada de um órgão de soberania» e, depois, discorrer de igual forma.
- que apliquem norma cuja ilegalidade haja sido suscitada durante o processo
Haja sido suscitada na tramitação do processo com qualquer dos fundamentos referidos nos três itens imediatamente anteriores.
- que apliquem norma já anteriormente julgada inconstitucional ou ilegal pelo próprio Tribunal Constitucional
Demasiado lógico, para necessitar de adenda explicativa alguma, não fôra permitir-se uma qualificada desobediência.
- que apliquem norma já anteriormente julgada inconstitucional pela Comissão Constitucional, nos precisos termos em que seja requerida a sua apreciação ao Tribunal Constitucional
A Comissão Constitucional, com funções e desempenho análogos ao actual Tribunal Constitucional, erigiu-se, entre nós, entre os anos de 1976 a 1983.
As suas decisões, obviamente, não poderiam relegar-se para o rol das inutilidades, desde que, recepcionadas pelo actual Tribunal Constitucional. 540
- que recusem a aplicação de norma constante de acto legislativo com fundamento na sua contrariedade com uma convenção internacional, ou a apliquem em desconformidade com o anteriormente decidido sobre a questão pelo Tribunal ConstitucionalPage 204
Duas hipóteses: contradição com convenção internacional, uma; desconformidade com o já decidido sobre a mesma 541 pelo Tribunal Constitucional, outra.
Muito importante hoje em dia, dada a avalancha de normas internacionais recebidas no direito interno português.
Para finalizar esta apostilha, votada à enumeração das decisões passíveis de recurso para o Tribunal Constitucional, só mais estes dois breves apontamentos:
* não é admitido recurso para o Tribunal Constitucional de decisões sujeitas a recurso ordinário obrigatório, nos termos da respectiva lei processual 542
** se a decisão admitir recurso ordinário, mesmo que para uniformização de jurisprudência, a não interposição de recurso para o Tribunal Constitucional não faz precludir o direito de interpô-lo de ulterior decisão que confirme a primeira. 543
Sabendo-se quais as decisões recorríveis para o Tribunal Constitucional, importa saber quem lhes pode aproveitar, isto é, quem tem legitimidade para recorrer.
É o Ministério Público e as pessoas que, de acordo com a lei reguladora do processo em que a decisão foi proferida, 544 tenham legitimidade para interpor recurso.
Seja: haverá sempre que proceder a integração com a lei adjectiva em vigor aplicável ao processo donde se recorre.
Mas não só.
Para além desta operação, o recurso para o Tribunal Constitucional, para ser possível, necessita de se enquadrar num naipe de condições que vamos visitar.
E, assim:
Como atrás já se referenciou, cabe recurso para o Tribunal Constitucional, em secção, das decisões dos tribunais:
- que apliquem norma cuja inconstitucionalidade haja sido suscitada durante o processo e
- que apliquem norma cuja ilegalidade haja sido suscitada durante o processo com um destes fundamentos:Page 205
* recusa de aplicação de norma constante de acto legislativo com fundamento na sua ilegalidade por violação de lei com valor reforçado;
* recusa de aplicação de norma constante de diploma regional, com fundamento na sua ilegalidade por violação do estatuto da região autónoma ou de lei geral da República;
* recusa de aplicação de norma emanada de um órgão de soberania, com fundamento na sua ilegalidade por violação do estatuto de uma região autónoma.
Pois bem: estes recursos só podem ser interpostos pela parte que haja suscitado a questão da inconstitucionalidade ou da ilegalidade de modo processualmente adequado perante o tribunal que proferiu a decisão recorrida, em termos de este estar obrigado a dela conhecer.
O recurso é obrigatório para o Ministério Público:
* quando a norma cuja aplicação haja sido recusada, por inconstitucionalidade ou ilegalidade, conste de convenção internacional, acto legislativo ou decreto regulamentar;
* quando haja decisão que aplique norma já anteriormente julgada inconstitucional ou ilegal pelo próprio Tribunal Constitucional;
* quando haja decisão que aplique norma já anteriormente julgada inconstitucional pela Comissão Constitucional, nos precisos termos em que seja requerida a apreciação ao Tribunal Constitucional;
* quando haja decisão que recuse a aplicação de norma constante de acto legislativo com fundamento na sua contrariedade com uma convenção internacional, ou a apliquem em desconformidade com o anteriormente decidido sobre a questão pelo Tribunal Constitucional.
O Ministério Público pode abster-se de interpor recurso de decisões conformes com a orientação que se encontre já estabelecida, a respeito da questão em causa, em jurisprudência constante do Tribunal Constitucional.
Antes de passar à tramitação, três notas reputadas de interesse:
* o recurso interposto pelo Ministério Público, aproveita a todos os que tiverem legitimidade para recorrer;
* o recurso interposto por um interessado, aproveita aos restantes interessados; 545Page 206
* não pode haver recurso subordinado nem adesão ao recurso para o Tribunal Constitucional.
Antes de tratarmos da tramitação propriamente dita, o que, de imediato, se vai fazer, detivemo-nos no objecto, na lei aplicável, nas decisões recorríveis e na legitimidade.
Para, afinal, melhor se entender o percurso dos recursos de constitucionalidade e de legalidade.
E, desde logo, se exporá o ínsito no n.º 1, do art. 75.º da L.T.C.. Seja: o prazo para interposição de recurso. O qual é de dez dias, contados a partir da notificação da decisão, independentemente da natureza do processo ou da ordem dos tribunais em que tenha sido suscitada a questão de constitucionalidade. 546
Sendo que, a respectiva interposição interrompe os prazos para apresentação de outros recursos que, porventura, caibam da decisão, os quais só...
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