Acórdão nº 1454/07-1 de Tribunal da Relação de Évora, 15 de Janeiro de 2008

Magistrado ResponsávelGOMES DE SOUSA
Data da Resolução15 de Janeiro de 2008
EmissorTribunal da Relação de Évora

Acordam, em conferência, na Secção Criminal do Tribunal da Relação de Évora: A - Relatório: No recurso de contra-ordenação que correu termos no 3º Juízo do Tribunal de ... com o n°... , por despacho de 15 de Dezembro de 2006, foi decidido negar provimento ao recurso interposto pelo arguido V., mantendo na íntegra a decisão recorrida, e pela prática da contra-ordenação p. e p. pelos artigos 27 nºs 1 e 2-a.3, 136 e 146-i) do Código da Estrada, que o condenara na sanção de inibição de conduzir veículos a motor pelo período de 120 (cento e vinte) dias.

***Inconformado com a decisão daquele tribunal, o arguido interpôs o presente recurso, tendo formulado as seguintes conclusões: A -O pagamento voluntário da coima não impede a discussão da existência da contra-ordenação, tal como o arguido/recorrente veio efectivamente a fazer invocando a ilegalidade da prova, pois se o não se pudesse fazer estaríamos perante a violação do nº 10 e nº 1 do artigo 32° da CRP, sendo por isso inconstitucional o disposto no artigo 173°, nº 1 conjugado com o nº 4 do artigo 175° da CRP.

B -Esta interpretação e aplicação das normas do artigo 173°, nº 1 conjugado com o nº 4 do artigo 175°, ambas do C. da Estrada, no sentido de restringir a decisão à aplicação efectiva ou não da sanção acessória restringe os direitos de defesa do arguido e os direitos à tutela jurisdicional efectiva das decisões administrativas que lesem direitos e interesses legítimos, mostrando-se ferida de ilegalidade e de inconstitucionalidade, pois viola o disposto nos artigos 186° do Código da Estrada, artigo 59°, nº 1 e nº 3 do RGCO e art. 410°, nº 2 do C. P. Penal e art. 18°, nº 2 , 20°, nº 1 e art.32°, nº 1 e nº 10, todos da CRP.

C -De facto, o art. 141° contempla o regime da suspensão da sanção acessória mas as leis ao abrigo de leis de autorização não podem extravasar o nestas definido. E foi o que aconteceu no Decreto-Lei nº 44/2005, o qual acabou por instituir a não aplicação da suspensão da execução da sanção acessória nas contra-ordenações muito graves, encontrando-se por isso aquele ferido de inconstitucionalidade orgânica.

D -As decisões condenatórias devem ser fundamentadas de facto e de direito. A reincidência é fundamento para agravação da pena acessória, pelo que esta tem de ser fundamentada. A insuficiência da fundamentação dá lugar À nulidade prevista no art. 379°, nº 1 alínea c) do C. P. Penal, contrariamente ao defendido na decisão ora em recurso, o Mmº Juiz deveria ter declarado a nulidade da decisão administrativa condenatória.

E -Para que aprova extraída dos equipamentos usados na fiscalização de trânsito é necessário estarem aprovados os modelos pelo IPQ e a sua utilização pela DGV. Mas é também necessário que a sua utilização seja conforme ao despacho de aprovação pelo IPQ, bem como notificados à C.N.P.D, nos termos da lei em vigor. O seu uso fora destes parâmetros tem como consequência não fazerem fé em juízo, pelo que a prova deles extraída não pode ser considerada, devendo por isso o recorrente ser absolvido com fundamento no princípio in dubio pro reo.

*O Digno Magistrado do Ministério Público do Tribunal de Montemor-o-Novo apresentou resposta tendo concluído que a sentença deve ser mantida, apresentando as seguintes conclusões: 1º - A decisão sob recurso fez correcta aplicação da Lei e do Direito.

  1. - Por isso, deve ser mantida nos seus precisos termos.

*Neste Tribunal, o Exmº Procurador-geral Adjunto emitiu parecer no sentido de que deve ser mantida a decisão recorrida, negando-se provimento ao recurso, acompanhando a resposta do Exmº Procurador-adjunto em 1ª instância.

*Foi dado cumprimento ao disposto no art. 417º nº2 do C.P.P., não tendo havido resposta.

Foram colhidos os vistos.

Entretanto, veio o recorrente, por requerimento, arguir a prescrição do procedimento contra-ordenacional pelo decurso do prazo de dois anos contidos no art 188º do C.E., estribando-se num entendimento de que tal prazo é absoluto e não sujeito ao regime Geral das Contra-ordenações.

*B - Fundamentação B.1 - Pelo Tribunal recorrido, por despacho, foram dados como provados os seguintes factos: a) A Guarda Nacional Republicana levantou o auto de notícia n.º..., por o arguido, ora recorrente, no dia 28 de Abril de 2005, pelas 12 horas, ao Km 21 da A23, sentido este-oeste, ter conduzido o veículo ligeiro de passageiros, matrícula 50-04-ZI, pelo menos, à velocidade de 185 Km/h, correspondente à velocidade registada de 194,59 Km/h, deduzido o valor do erro máximo admissível, quando a velocidade máxima permitida neste local era de 120 Km/h.

b) No dia 28 de Abril de 2005, o recorrente, notificado da possibilidade de pagamento voluntário da coima pelo mínimo, do prazo e do modo de o efectuar, bem como das consequências do não pagamento, procedeu ao pagamento voluntário da coima; c) No registo individual de condutor do recorrente encontra-se averbada a prática pelo mesmo, em 15 de Outubro de 2003, de uma contra-ordenação grave, p. e p. pelos artigos 27.º, n.ºs 1 e 2, e 146.º, alínea b), do Código da Estrada, na redacção introduzida pelo Decreto-Lei nº 265-A/2001, de 28 de Setembro, sancionada com sanção acessória de inibição de conduzir pelo período de 30 (trinta) dias, p. e p. pelo artigo 139.º do mesmo diploma legal.

*Com relevância para a causa, inexistem factos não provados.

*Apresentou, o tribunal recorrido, os seguintes elementos para fundar a sua convicção de facto: "A convicção do tribunal alicerçou-se, quanto aos factos provados em 1), no teor do auto de notícia junto a fls. 6 e da análise do documento constante de fls. 5; quanto aos factos provados em 2), no teor do documento junto a fls. 7, corroborado pelo arguido nas suas alegações; e quanto aos factos provados em 3), no teor do registo individual de condutor que se encontra junto a fls. 8".

*B.2 - Cumpre apreciar e decidir:.

Nos termos do art. 75º nº1 do DL nº 433/82, de 27/10, nos processos de contra-ordenação, a segunda instância apenas conhece da matéria de direito, não cabendo recurso das suas decisões. Isto é, este Tribunal funcionará, no caso, como tribunal de revista.

Por outro lado, o objecto do recurso penal é delimitado pelas conclusões da respectiva motivação - art.º 403, nº1, e 412º, n.º 1, do Código de Processo Penal.

São, assim, questões a abordar no presente recurso: 1 - A prescrição do procedimento contra-ordenacional.

2 - O pagamento voluntário da coima, ao impedir a discussão da existência da contra-ordenação, constitui violação do nº 10 e nº 1 do artigo 32° da CRP, sendo por isso inconstitucional o disposto no artigo 173°, nº 1 conjugado com o nº 4 do artigo 175° da CRP.

3 - A restrição da decisão à aplicação efectiva ou não da sanção acessória restringe os direitos de defesa do arguido e os direitos à tutela jurisdicional efectiva das decisões administrativas que lesem direitos e interesses legítimos, mostrando-se ferida de ilegalidade e de inconstitucionalidade, pois viola o disposto nos artigos 186° do Código da Estrada, artigo 59°, nº 1 e nº 3 do RGCO e art. 410°, nº 2 do C. P. Penal e art. 18°, nº 2 , 20°, nº 1 e art.32°, nº 1 e nº 10, todos da CRP.

4 - O art. 141° do C.E. - Decreto-Lei nº 44/2005 - ao instituir a não aplicação da suspensão da execução da sanção acessória nas contra-ordenações muito graves, encontra-se ferido de inconstitucionalidade orgânica, por extravasar a lei de autorização.

5 - A reincidência é fundamento para agravação da pena acessória, pelo que esta tem de ser fundamentada. A insuficiência da fundamentação dá lugar à nulidade prevista no art. 379°, nº 1 alínea c) do C. P. Penal.

6 -A utilização, como prova, dos equipamentos usados na fiscalização de trânsito devem ser notificados à C.N.P.D, nos termos da lei em vigor. O seu uso fora destes parâmetros tem como consequência não fazerem fé em juízo, pelo que a prova deles extraída não pode ser considerada.

*B.3 - O arguido, pelo requerimento de fls. 171-173, veio alegar que a contra-ordenação por si praticada já prescreveu em virtude de terem decorrido dois anos sob a prática daquela, argumentando que o prazo de dois anos previsto no artigo 188º do Código da Estrada é a única e exclusiva norma que rege a prescrição do procedimento contra-ordenacional no direito estradal, com exclusão das normas do Regime Geral das Contra-ordenações, pedindo que se declare a dita prescrição ou a nulidade do acórdão já lavrado, com o mesmo fundamento.

Verifica-se que, dos factos imputados ao arguido ressalta, com interesse para o conhecimento da questão suscitada, o que revelam os autos em termos de decurso processual e o facto provado sob 1), a saber: "A Guarda Nacional Republicana levantou o auto de notícia n.º ..., por o arguido, ora recorrente, no dia 28 de Abril de 2005, pelas 12 horas, ao Km 21 da A23, sentido este-oeste, ter conduzido o veículo ligeiro de passageiros, matrícula ..., pelo menos, à velocidade de 185 Km/h, correspondente à velocidade registada de 194,59 Km/h, deduzido o valor do erro máximo admissível, quando a velocidade máxima permitida neste local era de 120 Km/h.

No dia 28 de Abril de 2005 o recorrente procedeu ao pagamento voluntário da coima; A decisão da autoridade administrativa é de 09-11-2005.

O despacho preliminar do Mmº Juiz de 1ª instância é de 22-09-2006, notificado a 27-09-2006 e a decisão recorrida tem a data de 15-12-2006".

*Sobre esta matéria rege o artigo 188º do C.E. que determina que o procedimento contra-ordenacional estradal se extingue, por efeito da prescrição, logo que sobre a prática da contra-ordenação tiverem decorrido dois anos.

Os factos imputados ao arguido ocorreram em 28/4/05, pelo que será a partir desta data que deve ser contado o indicado prazo - corpo do artigo 27º do Regime Geral das Contra-ordenações para a contagem do prazo prescricional.

Ocorreu causa de interrupção da prescrição, pois que o recorrente foi devidamente notificado da decisão da autoridade administrativa de 09-11-2005 que procedeu à aplicação da coima.

Sobreveio, igualmente, causa de...

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