Acórdão nº 99/06.6TTFAR.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 23 de Novembro de 2011

Magistrado ResponsávelPEREIRA RODRIGUES
Data da Resolução23 de Novembro de 2011
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

ACORDAM NO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA I. OBJECTO DO RECURSO E QUESTÕES A SOLUCIONAR.

No Tribunal do Trabalho de Faro, AA intentou a presente acção, com processo comum, emergente de contrato de trabalho, contra BB - Manutenção e Serviços Em Imóveis, Lda., pedindo que esta seja condenada a pagar-lhe o montante de € 91.258, acrescido da diferença entre € 6.887,91 e € 10.000 e o montante correspondente a 3.5% dos lucros anuais da mesma em 2003 e 2004 e 4% desses lucros em 2005, respectivamente, mas neste caso num montante nunca inferior a € 4.167 e juros de mora, à taxa legal, desde a data de citação até integral pagamento.

Alegou para tanto, em síntese, que entre 07.04.2003 e 12.04.2005, trabalhou a prazo certo por conta da Ré e que, não tendo o contrato sido renovado por vontade dela, a mesma não lhe pagou parte da retribuição acordada, violou o direito a gozar as férias que lhe cabiam e não lhe pagou o subsídio de Natal proporcional do ano da cessação do contrato.

Contestou a Ré, por excepção, invocando a compensação parcial do crédito alegado pelo Autor com um outro por ela titulado contra ele por danos causados no veículo que lhe estava distribuído; e, por impugnação, sustentou que o contrato cessou por despedimento do Autor e não por caducidade do contrato, pois que muito embora tivesse mandado uma carta ao Autor, em 12 de Abril de 2005, a comunicar a intenção de não renovar o contrato, em 26 de Abril apresentou ao Autor uma proposta [verbal] de continuidade do contrato, o que aquele não aceitou, pelo que através daquela proposta revogou a anterior declaração. Porque o Autor deixou de se apresentar ao serviço a Ré procedeu ao seu despedimento.

E invoca que o mesmo gozou as férias a que legalmente tinha direito e que só não lhe pagou parte do subsídio de Natal peticionado, porquanto deixou de comparecer ao trabalho.

Foi elaborado o despacho saneador, com dispensa da selecção da matéria de facto, e procedeu-se ao julgamento da causa, em cujo decurso se proferiu despacho a decidir que não seria possível a produção de prova testemunhal relativamente à revogação da comunicação de não renovação do contrato de trabalho a termo certo operada pela Ré e constante de fls. 21 dos autos.

Inconformada com este despacho, dele agravou a Ré, tendo concluído na sua alegação que: «1. O artigo 393.°, n.º 1, do Código Civil, não é aplicável à questão sub judice, pois, a declaração negocial que a Ré pretende provar por testemunhas (revogação da comunicação de não renovação do contrato de trabalho a termo certo) não tem de ser reduzida a escrito por força da lei ou estipulação das partes, porque a lei é totalmente omissa quanto à forma que deve revestir a revogação da comunicação de não renovação do contrato de trabalho a termo certo e as partes (Autor e Ré) não estipularam que a revogação da comunicação de não renovação do contrato de trabalho a termo certo tinha de ser reduzida a escrito.

  1. A jurisprudência tem sido unânime no sentido de que a validade da revogação pelo empregador da sua anterior declaração de caducidade não depende da observância de forma especial, devendo, portanto, aplicar-se o princípio da consensualidade da forma, estabelecida como regra geral no artigo 219.°, do Código Civil, sendo, portanto, admitida para a sua prova, quando verbal, a prova testemunhal.

  2. A revogação da declaração de caducidade do contrato de trabalho a termo, sendo uma declaração unilateral receptícia, não carece também de acordo do trabalhador, produzindo os seus efeitos com a sua comunicação a este, como tem decidido pacificamente a jurisprudência que apenas tem estabelecido como condição indispensável para a sua validade que, quando a revogação se efectua, a declaração de caducidade não tenha ainda produzido seus efeitos, ou seja, não se tenha ainda atingido o termo do contrato.

  3. A revogação da declaração de caducidade do contrato de trabalho a termo traduz-se numa declaração unilateral receptícia, cuja produção de efeitos não carece do acordo do trabalhador nem exige a forma escrita, pois, quanto a ela, não concorrem as razões determinantes de uma especial protecção do trabalhador, uma vez que a mesma vem manter a estabilidade do emprego, pelo que as exigências que lhe poderiam ser feitas apenas afectariam o próprio trabalhador, estariam em desacordo com as razões que ditaram a forma escrita e cairiam na previsão legal do artigo 221.°, n.º 2 do Código Civil, não estando, assim, tal revogação sujeita à forma legal prescrita para a declaração de caducidade do contrato de trabalho a termo.

  4. O artigo 394.°, n.º 1, do Código Civil, não é igualmente aplicável à questão sub judice, pois, o que se pretende provar por testemunhas (revogação da comunicação de não renovação do contrato de trabalho a termo certo) não é uma convenção, mas apenas uma declaração unilateral receptícia cuja produção de efeitos não carece do acordo do trabalhador nem de forma escrita, 6. E a revogação da comunicação de não renovação do contrato de trabalho a termo certo não seria uma convenção com um objecto contrário ou adicional ao conteúdo de documento autêntico ou particular, pois, não existe qualquer documento autêntico ou particular do qual conste que a comunicação de não renovação do contrato de trabalho a termo certo seria irrevogável.

  5. Ao decidir que não é possível nos autos a produção de prova testemunhal relativamente à revogação verbal efectuada pelo Dr. CC da denúncia contratual constante de fls. 21 dos autos, o douto despacho recorrido, salvo o devido respeito, fez uma errada aplicação dos artigos 393.°, e 394.°, do Código Civil, e violou o disposto nos artigos 219.° e 221.°, n.º 2, do mesmo Código Civil.» Termina pedindo a revogação do despacho recorrido, admitindo-se a produção de prova testemunhal relativamente à revogação verbal efectuada pelo Senhor Dr. CC da denúncia contratual constante de fls. 21 dos autos.

    O Autor contra-alegou pugnando pela manutenção do decidido.

    O processo prosseguiu e, realizada a audiência de julgamento, foi proferido despacho fixando a matéria considerada provada, que foi objecto de reclamações, na altura decididas.

    Proferida sentença, foi a acção julgada parcialmente procedente e condenada a Ré a pagar ao Autor a retribuição equivalente aos remanescentes a três dias de férias não gozadas do ano de 2003, aos vinte e dois dias de férias do ano de 2004, aos remanescentes cinco dias de férias do ano de 2005, aos nove dias proporcionais ao trabalho do ano da cessação do contrato e, por fim, dois dias de retribuição base e diuturnidades por cada mês de duração do vínculo.

    Inconformadas, ambas as partes apelaram e, tendo os autos prosseguido seus termos, veio a ser proferido Acórdão pelo Tribunal da Relação de Évora, no qual se acordou, por unanimidade, em a) considerar inútil a procedência do agravo, dado se concluir que o contrato do A cessou por caducidade operada pela R; b) julgar totalmente improcedente a apelação da R; c) julgar parcialmente procedente a apelação do A. sendo assim a R condenada a pagar-lhe a quantia de 4.745 euros a título de subsídio de Natal proporcional ao tempo de trabalho prestado em 2005: d) quanto ao mais manteve-se a decisão recorrida, devendo os direitos do A. ser fixados em função do vencimento mensal de € 11.387 que auferia.

    Mais uma vez inconformada, veio a Ré interpor recurso de Revista para este STJ, na parte em que considerou inútil a procedência do recurso de agravo e na parte em que julgou totalmente improcedente a apelação da Ré, apresentando doutas alegações, com as seguintes CONCLUSÕES: «1. Quanto à matéria do agravo o douto Ac. Recorrido, pela transcrição dos parágrafos 2.° a 5.° que a alegação de recurso faz a fls. 1, quase deu razão à Recorrente.

  6. E só não a deu, devido à aplicação que fez dos artigos 224.°, n.º 1 e 230.°, n.º 1 do Código Civil.

  7. Quanto ao artigo 224.°, n.º 1 apenas define a eficácia da declaração negocial que tem um destinatário.

  8. Porém é indispensável distinguir a eficácia da declaração negocial que tem o destinatário quando como no caso dos autos se trata de um acto unilateral e recipiendo.

  9. Neste caso, o efeito da declaração ao destinatário é condição da perfeição do acto, vinculando este à vontade unilateral do declarante. Só neste aspecto tem a eficácia referida no preceito.

  10. A produção de efeitos da declaração negocial só se verificará, porém, no caso do contrato a termo certo, no termo deste (artigo 288.° do Código de Trabalho de 2003 e da legislação imediatamente anterior).

  11. O elemento essencial para a justa solução desta situação jurídica reside na circunstância da declaração negocial constituir um acto unilateral para a perfeição do qual é apenas necessária a manifestação de uma vontade — a da entidade empregadora — nos termos da lei laboral bem como a comunicação à parte contrária.

  12. Trata-se, pois, de um acto unilateral e recipiendo como já foi referido.

  13. Aliás o carácter recipiendo do acto não exclui a sua unilateralidade (Galvão Teles, citação a fls. 3 da alegação de recurso).

  14. E se a declaração negocial é unilateral a sua revogação sê-lo-á também, desde que produzida até ao termo do prazo do contrato.

  15. A jurisprudência do Venerando Tribunal a quem tem entendido, uniformemente, que a declaração revogatória da entidade empregadora quanto à declaração negocial atrás caracterizada, é igualmente unilateral, não está sujeita a forma escrita e pode provar-se testemunhalmente.

  16. Por todos veja-se o Ac. do STJ de 06.01.1993 e no mesmo sentido os Acórdãos do mesmo Venerando tribunal de 09.03.1990 e 30.10.2002, citados no Acórdão de 27.05.2006, Acórdão este devidamente citado a fls. 4 desta alegação de recurso.

  17. O único limite estabelecido pela jurisprudência acima referida é a de que a revogação seja feita até ao termo do prazo do contrato.

  18. E não se diga que pelo facto de o Ac. do STJ de 27.04.2006 decidir no mesmo sentido para um caso de acordo entre as partes tal signifique a alteração da sua jurisprudência sobre o assunto.

  19. ...

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