Acórdão nº 593/2002.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 27 de Outubro de 2011

Magistrado ResponsávelLOPES DO REGO
Data da Resolução27 de Outubro de 2011
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: 1. AA e mulher, BB, intentaram acção de condenação, na forma ordinária, contra CC e mulher, DD, pedindo a respectiva condenação no reconhecimento do direito de propriedade dos AA sobre um anexo e garagem que os RR ocupariam ilegitimamente e a sua restituição aos AA..

Contestaram os RR., alegando que o anexo foi construído pela R., filha dos AA., com a autorização destes, deduzindo reconvenção, pedindo que lhes seja reconhecida a aquisição do direito de propriedade por usucapião ou, subsidiariamente, a aquisição do terreno por acessão imobiliária, em virtude do aumento do valor do prédio trazido pelas obras que executaram.

No caso de proceder o pedido formulado pelos autores, pedem ainda a condenação destes na indemnização pelo valor das benfeitorias efectuadas no imóvel, no montante de € 13.312,38, além de juros de mora à taxa legal, bem como no reconhecimento do direito de retenção.

Os autores apresentaram réplica, contestando o pedido reconvencional, fundando-se na qualidade dos RR. de meros detentores do prédio em litígio.

Os réus treplicaram, reafirmando as suas posições iniciais.

Findos os articulados, os réus foram convidados a corrigir a reconvenção, no que diz respeito às áreas e confrontações do terreno, cuja aquisição pretendem ver declarada, o que fizeram.

Foi proferido despacho que: A - considerou como “não escritas” as menções constantes dos artigos 11° 42°, 70° e 75° do articulado de fls. 239 a 260 – contestação/reconvenção -, no que toca à área ocupada pelo anexo e garagem, e que decidiu deverem ser consideradas as áreas inicialmente indicadas; B - não admitiu o articulado-tréplica, por entender não ser o mesmo admissível, atento o disposto no n.° 1 do artigo 503° do Código de Processo Civil, uma vez que não foi apresentada qualquer excepção na defesa deduzida pelos AA..

O pedido reconvencional foi admitido.

Do despacho atrás referido. foi interposto agravo, parcialmente reparado, na sequência do que foram aditados novos factos, quer aos já assentes, quer à base instrutória, como consta da acta de fls. 670 e sgs.

Procedeu-se a julgamento , no termo do qual foi proferida sentença que julgou a acção nos moldes seguintes:

  1. Julga-se a acção procedente por provada e condenam-se os réus a reconhecer que os autores são os proprietários do prédio acima identificado sob os nºs 1 e 2, incluindo em relação aos anexos e garagem que os réus aí ocupam, bem como na entrega desses anexos e garagem, sem prejuízo do decidido na alínea c).

  2. Julga-se a reconvenção parcialmente procedente, por provada, e condenam-se os autores (réus desse pedido), a pagarem aos réus o montante que se apurar em liquidação ulterior, por benfeitorias realizadas, com o limite do valor apurado sob o n.º 26, com juros de mora à taxa legal desde a data em que tal ocorrer até pagamento.

  3. Reconhece-se aos réus o direito de retenção sobre o anexo e garagem pelo crédito antes indicado; julgando-se a reconvenção improcedente na parte restante de que absolvem os autores.

2. Desta sentença foi interposto pelos RR. recurso de apelação, a que a Relação concedeu parcial provimento e, em consequência, decidiu a acção nos seguintes termos: - julga-se a acção improcedente, por não provada, absolvendo os RR dos pedidos; - julga-se a reconvenção improcedente, por não provada, absolvendo-se os AA- reconvindos dos pedidos.

Começando por apreciar a impugnação deduzida contra a matéria de facto, a Relação introduziu, segundo a sua convicção, algumas alterações na factualidade tida por provada em 1ª instância ( cfr. fls. 927/947).

Passando a apreciar a matéria de direito, o acórdão recorrido inflectiu o sentido decisório da sentença recorrida no que respeita ao pedido formulado pelos AA de reivindicação do imóvel, entendendo que a anterioridade da posse dos RR sobre as edificações em litígio e a presunção legal daí emergente preclude a presunção resultante de posterior acto de registo do direito de propriedade, em que se alicerçava o pedido de reivindicação – considerando-se que os factos provados não permitem reconhecer, no confronto dos RR., que os AA eram titulares do direito de propriedade sobre as construções em causa.

E daqui resultou que viesse a ser julgado improcedente também o pedido de indemnização por benfeitorias que havia procedido na 1ª instância, no pressuposto de que os AA. seriam proprietários do prédio reivindicado.

Por sua vez, o pedido reconvencional foi também julgado improcedente, no que respeita à pretendida aquisição originária por usucapião, confirmando-se, nesta parte, a sentença recorrida. O acórdão recorrido assenta, quanto a esta questão, num duplo fundamento: - por um lado, qualificou a posse exercida pelos RR sobre a parcela do imóvel em litígio como sendo não titulada e de má fé, o que ditaria a aplicação do prazo máximo de 20 anos para a consumação da usucapião, não se mostrando o mesmo verificado; - por outro lado, entendeu que a precedente actuação dos AA., traduzida na notificação judicial avulsa, realizada em 1990, sempre teria interrompido a prescrição aquisitiva em curso, afirmando: Contudo, caso se entendesse terem os RR elidido a presunção da má-fé e que o prazo se completaria após 15 anos de posse, dir-se-ia que à usucapião são aplicáveis as regras relativas à interrupção e suspensão da prescrição, por força do art.º 1292.º Assim, nos termos do art. 323.º CC, a prescrição interrompe-se pela citação ou notificação judicial de qualquer acto que exprima, directa ou indirectamente a intenção de exercer o direito; ora, tendo os AA notificado judicialmente os RR, em 21-6-1990 solicitando-lhes a entrega do anexo, dúvidas não se suscita que essa notificação teve a virtualidade de interromper o prazo da aquisição por usucapião.

Não assiste razão aos recorrentes quando argumentam que a notificação, provinda de quem não demonstra ser proprietário, não poderia interromper o prazo, nem que a notificação “não contém de forma clara e inequívoca a intenção do exercício de um direito por parte dos requerentes dessa notificação, nem tampouco faz qualquer alusão à interrupção do prazo da usucapião.” Quanto à alusão ao prazo, diga-se que não precisavam os requerentes de dizer que queriam interromper qualquer prazo; isso é a relevância que a lei atribui ao acto de alguém dar a conhecer a outrém determinada realidade.

Quanto aos termos da notificação, junta a fls. 121: nela os requerentes intitulam-se proprietários de todo o prédio, incluindo o anexo e a garagem, acusam os RR de ocuparam ilicitamente o imóvel e, informando que pretendem vender o prédio, intimam-nos a desocuparem o prédio, no prazo de 15 dias. Ainda os advertem que, caso não cumpram, os requerentes “tomarão a liberdade de proceder de imediato às reparações a custo dos notificandos e à desocupação dos imóveis...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT