Acórdão nº 45/07.0TTLSB.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 22 de Setembro de 2011

Magistrado ResponsávelPINTO HESPANHOL
Data da Resolução22 de Setembro de 2011
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça: I 1.

Em 2 de Janeiro de 2007, no Tribunal do Trabalho de Lisboa, 2.º Juízo, 2.ª Secção, AA instaurou a presente acção declarativa, com processo comum, emergente de contrato de trabalho contra BB C. R. L., e CC, pedindo que as rés fossem condenadas, solidariamente, a pagar-lhe € 6.119,27 e a condenação da 2.ª ré a pagar-lhe «a quantia já vencida de € 3.523,35, sem prejuízo quanto a esta última da que se vencer até decisão final, e de juros contados à taxa legal de 4% ao ano, calculados desde a citação daquelas RR. e até integral pagamento».

Alegou, em resumo, que foi admitida ao serviço da 1.ª ré, em 1 de Outubro de 1983, como professora e que, em 4 de Maio de 2006, celebrou com a 1.ª ré um acordo de pagamento de dívida, que não foi cumprido, sendo que, em 8 de Maio de 2006, por protocolo assinado entre as rés, foi transmitido pela 1.ª ré à 2.ª ré o DD, estabelecimento onde leccionava, tendo aquele Instituto, no ano lectivo de 2006/2007, iniciado a sua actividade nas instalações da EE, pertencente à 2.ª ré, não lhe sendo atribuída qualquer função lectiva, nem paga a retribuição, desde Agosto de 2006.

Frustrada a conciliação empreendida na audiência de partes, as rés vieram contestar, concluindo pela improcedência da acção; a 1.ª ré alegou, em síntese, que não efectuou os pagamentos devidos à autora por falta de condições financeiras para tanto, já que entrou em processo de dissolução e liquidação, pelo que o cumprimento dos compromissos assumidos dependia do apuramento da sua situação económica e financeira, e que não foi distribuído trabalho docente à autora, pelo facto de esta ter sido despedida antes do início do ano lectivo de 2006/2007, uma vez que não tinha habilitações académicas que lhe permitissem continuar a leccionar naquele Instituto, tendo o respectivo contrato de trabalho cessado em 31 de Agosto de 2006; a 2.ª ré, por sua vez, aduziu que, nos termos do referido protocolo, apenas foi transmitido o DD e não a cooperativa ré, pelo que, não gozando aquele Instituto de autonomia técnica-organizativa, não pode ser considerado como um estabelecimento, termos em que o contrato de trabalho que a autora mantinha com a 1.ª ré não se transmitiu para si, sendo, por isso, parte ilegítima na acção.

A autora respondeu às excepções deduzidas, sustentando que as mesmas deviam ser julgadas improcedentes, tendo concluído como na petição inicial.

No despacho saneador, julgou-se improcedente a dita ilegitimidade da 2.ª ré.

Realizada a audiência de discussão e julgamento, foi proferida sentença que julgou a acção parcialmente procedente e condenou a 1.ª ré a pagar à autora a quantia de € 6.119,27, sendo a 2.ª ré absolvida do pedido, acrescendo à referida quantia juros de mora, contados à taxa legal, desde a data da citação e até integral pagamento.

  1. Inconformada, a autora apelou para o Tribunal da Relação de Lisboa, que julgou procedente o recurso de apelação e, alterando a sentença recorrida, julgou a acção procedente, condenando, solidariamente, as rés a pagar à autora € 6.119,27 e a 2.ª ré a pagar à autora € 3.523,35, «referente a retribuições vencidas entre Setembro e Dezembro de 2006, bem como as que, entretanto, se tenham vencido até decisão final, a liquidar em incidente próprio», tudo acrescido de juros de mora, calculados à taxa legal, desde a data de citação das rés e até integral pagamento.

    É contra esta decisão que a ré agora se insurge, mediante recurso de revista, em que formula as conclusões que se passam a discriminar: «I. Vem o Douto Acórdão do Tribunal “a quo” julgar procedente a acção intentada pela A., ora recorrida, [condenando] a R., ora recorrente, a pagar à primeira a quantia de € 3.523,35, referente a retribuições vencidas entre Setembro e Dezembro de 2006, bem como, as que entretanto se tenham vencido até decisão final.

    II. Com efeito, entendeu o Tribunal “a quo” que, sendo o DD um estabelecimento de ensino dotado de identidade própria, o mesmo constitui uma verdadeira unidade ou entidade económica.

    III. Salvo o devido respeito, não assiste razão ao Tribunal “a quo”, pois o DD não pode ser considerado como uma verdadeira unidade ou entidade económica com autonomia, uma vez que não se encontram preenchidos os critérios positivos da transmissão de estabelecimento.

    IV. Na verdade, o referido Instituto, enquanto entidade titular de uma licença para leccionar determinado curso, não pode ser considerado como uma unidade económica autónoma, sem mais, pois, para que possa ser considerado como um estabelecimento com identidade própria, terá de se atender a todos os meios, materiais e humanos, associados à actividade lectiva, já que esta não pode ser prosseguida sem aqueles.

    V. Assim, o Tribunal “a quo” só poderia considerar que tivesse ocorrido a transmissão do estabelecimento do DD, para além das autorizações de leccionar conferidas pelo Estado, se tivessem sido igualmente transferidas as instalações, os materiais e instrumentos de trabalho, designadamente, o mobiliário, livros e demais material de apoio, e por último, boa parte dos corpos docente e discente e demais pessoal administrativo, o que não ocorreu.

    VI. Na verdade, nem todo o corpo docente [se] integrou na recorrente, nem tão pouco, o corpo discente [se] integrou na totalidade na recorrente, assim como também não [se] integraram os materiais de trabalho, designadamente, o mobiliário, os livros e restante material de apoio.

    VII. Ora, não tendo ocorrido a transferência de tais elementos positivos, ou seja, não tendo ocorrido a transferência de meios materiais e humanos associados à actividade lectiva do referido Instituto, o Tribunal “a quo” não podia ter considerado que o referido Instituto constitui uma unidade produtiva autónoma, face à falta de elementos.

    VIII. Pelo que, no seguimento de diversa doutrina que, na falta de critérios positivados, vinha debatendo o conceito tentando delimitá-lo, por estabelecimento entendia-se quer a organização afectada ao exercício de um comércio ou indústria, que os conjuntos subalternos que correspondam a uma unidade técnica de venda, de produção de bens, ou fornecimento de serviços, desde que a unidade destacada do estabelecimento global seja dotada de uma natureza técnico-organizativa própria, constituindo uma unidade produtiva autónoma com organização especifica.

    IX. Ora, não tendo a R. BB transferido para a recorrente vários dos elementos que compõe o estabelecimento, fácil é de concluir que, jamais foi transferido qualquer estabelecimento.

    X. Na verdade, não tendo sido transferido quaisquer dos elementos que compõe um estabelecimento, jamais se poderá afirmar que o DD constitui uma unidade económica produtiva autónoma com organização específica.

    XI. É certo que, em 8 de Maio de 2006, a R. BB e a CC, ora recorrente, celebraram um protocolo, contudo, nos termos do mencionado protocolo, e tal como resulta da cláusula 7.ª, a R. BB responsabilizou-se pelo cumprimento de todos os encargos assumidos perante trabalhadores e docentes do DD.

    XII. Sucede porém que a produção dos efeitos do referido protocolo ficou sujeita à verificação de uma condição suspensiva, ou seja, a obtenção de autorização do Ministério da Tutela.

    XIII. Na verdade, a mencionada autorização só ocorreu em 27.10.2006, data da publicação em Diário da República do Despacho do Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior nr. 21.921/2006, que autorizou a transmissão da titularidade do DD da R. BB para a recorrente.

    XIV. Sucede que, contrariamente ao entendimento do Acórdão recorrido, não se transmitiram para a recorrente quaisquer direitos ou obrigações por força do disposto no art. 318.º do C.T.

    XV. Aliás, nos termos do disposto no art. 318.º do C.T., em caso de transmissão, por qualquer título, de titularidade da empresa, do estabelecimento ou de parte da empresa ou estabelecimento que constitua uma unidade económica, transmite-se para o adquirente a posição jurídica de empregador nos contratos de trabalho dos respectivos trabalhadores, bem como a responsabilidade pelo pagamento de coima aplicada pela prática de contra-ordenação laboral.

    XVI. Ora, nos termos da referida cláusula 7.ª do protocolo outorgado pela R. BB e a recorrente, a primeira assumiu todas as responsabilidades pelo cumprimento dos encargos assumidos com os docentes.

    XVII. Pelo que, a recorrente jamais seria responsável pelos montantes peticionados, pois, tendo a R. BB transferido somente, à recorrente, o DD, a dita transferência terá de ser entendida, como a possibilidade de a recorrente passar a leccionar o respectivo curso superior.

    XVIII. Perante o exposto, violou o Tribunal “a quo” o disposto no art. 318.º do C.T., uma vez que não ocorreu a transmissão do DD, uma vez que o mesmo não é dotado de uma identidade própria.» Termina afirmando que deve julgar-se procedente o recurso de revista e, em consequência, «a recorrente deve ser absolvida da condenação a pagar à recorrida a quantia de € 3.523,35, referente a retribuições vencidas entre Setembro e Dezembro de 2006, bem...

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