Acórdão nº 980/05-2 de Tribunal da Relação de Guimarães, 01 de Junho de 2005

Magistrado ResponsávelCARVALHO MARTINS
Data da Resolução01 de Junho de 2005
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam, em Conferência, na Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães: I - A Causa: JOSÉ E... Autor no processo à margem identificado, não se conformando com a decisão proferida a fls. 359, que indeferiu o requerimento impetrante de uma segunda perícia, veio dela interpor – primeiramente - recurso de AGRAVO, alegando e formulando as seguintes conclusões: 1° O Autor requereu a prova pericial, tendo indicado logo o respectivo objecto.

  1. Este requerimento foi deferido e ordenada a realização da perícia.

  2. Por não concordar com o relatório pericial apresentado nem com os esclarecimentos prestados pelos peritos, veio o Autor requerer a realização da segunda perícia.

  3. “Qualquer das partes pode requerer que se proceda a segunda perícia... alegando, fundadamente as razões da sua discordância relativamente ao relatório pericial apresentado”, 5° sendo que a segunda perícia “tem por objecto a averiguação dos mesmos factos sobre que incidiu a primeira e destina-se a corrigir a eventual inexactidão dos resultados desta”.

  4. A realização de uma segunda perícia só pode ser recusada por o respectivo pedido não estar em tempo ou não estar fundamentado — isto é não apresentar as razões da discordância com o relatório pericial.

  5. Ao indeferir a realização de uma segunda perícia requerida pelo Autor — e pelas razões invocadas pelo M° Juiz a quo — o despacho recorrido violou os art°s 202° n°2 e 203° da CPR, art°s 1°e 8° do CC e os artigos 2° e 589° do CPC.

    Notificado das alegações de recurso apresentadas, Maria N... e marido, Manuel S..., veio oferecer a sua resposta, formulando, por sua vez, as seguintes conclusões: 1 - O presente recurso, é interposto quanto ao despacho de fls. 59, que indeferiu o pedido formulado pelo Autor, ora Recorrente, quanto à realização de uma segunda perícia.

    2 - Ora, os Recorridos, não têm qualquer reparo a fazer ao douto despacho do Meritíssimo Juiz a quo, sendo débeis as questões ora formuladas pelos Recorrentes e desprovidas de qualquer fundamento.

    3 - Andou bem o Meritíssimo Juiz a quo, ao indeferir tal pretensão.

    4 - Porquanto, aquando da apresentação dos meios de prova os Réus, apresentaram o rol de testemunhas, requeram a gravação da audiência de discussão e julgamento e a inspecção judicial ao local.

    5 - Já a produção da prova pericial foi requerida pelos AA., os quais indicaram por sua própria iniciativa o perito Senhor Engenheiro Sérgio Martins Castanho Correia, tendo formulado os Quesitos aos quais o mesmo deveria responder, aos quais os Réus, ora Recorridos, aderiram sem restrições.

    6 - E, uma vez apresentado o respectivo relatório pericial, solicitaram os esclarecimentos que bem entenderam.

    7 - No entanto e, porque, a resposta aos mesmos não satisfizeram a conveniência dos AA., solicitaram uma segunda perícia, para averiguação dos mesmos factos, sobre os quais incidiu a primeira perícia e, os subsequentes esclarecimentos.

    8 - A realização da segunda perícia, sobre os mesmos factos, não faz qualquer sentido, além disso, o que realmente os AA. pretendem, não é uma segunda perícia, mas sim, a obtenção de uma confirmação dos factos por si alegados, em detrimento dos já alegados pelo perito anteriormente nomeado por si.

    9 - Além disso, o requerimento apresentado pelos AA., ora Recorrentes, em nosso entender, coloca em causa de forma leviana, a seriedade e competência do Senhor Perito, que havia sido nomeado de livre e espontânea vontade por eles e, que é reconhecida pelas partes do processo e, também, pelo Tribunal judicial de Ponte de Lima.

    10 - Face ao exposto, é convicção do Recorridos, que andou bem o Meritíssimo Juiz a quo, quando indeferiu o requerimento de segunda perícia apresentado pelo AA., cujo objecto e quesitos formulados, já haviam sido devidamente respondidos e, subsequentemente, esclarecidos nos relatórios apresentados ao Tribunal.

    1. Os Fundamentos: Colhidos os Vistos legais, cumpre decidir: São ocorrências materiais, com interesse para a decisão da causa que: - O presente recurso, é interposto quanto ao despacho de fls. 59, que indeferiu o pedido formulado pelo Autor, ora Recorrente, quanto à realização de uma segunda perícia.

    - Aquando da apresentação dos meios de prova os Réus, apresentaram o rol de testemunhas, e requereram a gravação da audiência de discussão e julgamento e a inspecção judicial ao local.

    - A produção da prova pericial foi requerida pelos AA., -Os quais indicaram, por sua própria iniciativa, o perito Senhor Engenheiro Sérgio, -Tendo formulado os quesitos aos quais o mesmo deveria responder, - E a que os Réus, ora Recorridos, aderiram sem restrições.

    - Uma vez apresentado o respectivo relatório pericial, solicitaram os esclarecimentos que bem entenderam.

    - No entanto, insatisfeitos, os AA., solicitaram uma segunda perícia, para averiguação dos mesmos factos, sobre os quais incidiu a primeira perícia e, os subsequentes esclarecimentos.

    - Que, nos termos expressos, a fls.359, o Senhor Juiz indeferiu; O Senhor Juiz manteve a decisão recorrida; Nos termos do art. 684°, n°3 e 690º, n°1, do CPC, o objecto do recurso acha-se delimitado pelas alegações do recorrente, sem prejuízo do disposto na última parte do n°2 do art. 669°, do mesmo Código.

    As questões suscitadas consistem em apreciar : 1. Da legitimidade, circunstancial, nos termos impetrados, de uma segunda perícia? 2.

    Ao indeferir a realização de uma segunda perícia requerida pelo Autor — e pelas razões invocadas pelo M° Juiz a quo —, o despacho recorrido violou os art°s 202° n°2 e 203° da CPR, art°S 1°e 8° do CC e os artigos 2° e 589° do CPC. ? Apreciando, pela ordem indicada, refira-se que A segunda perícia - art.589º CPC - não constitui uma instância de recurso. Visa, sim, fornecer ao tribunal novo elemento de prova relativo aos factos que foram objecto da primeira, cuja indagação e apreciação técnica por outros peritos (art. 590-a) pode contribuir para a formação duma mais adequada convicção judicial.

    A prova pericial - art. 591º CPC - é sempre livremente apreciada pelo tribunal, juntamente com as restantes provas que forem produzidas sobre os factos que dela são objecto (art. 389 CC). Não tem, inclusivamente, de haver qualquer prevalência dos resultados da segunda perícia sobre os da primeira e, embora aquela se destine a corrigir a eventual inexactidão dos resultados desta (art. 589-3), os resultados de ambas são valorados segundo a livre convicção do julgador. Dizia-o, antes do actual código, o anterior art. 611 e, antes deste, o equi valente art. 615 do CPC de 1939. A segunda perícia não tem o carácter de recurso do resultado da primeira. Uma e outra fornecem ao juiz elementos de prova que ele apreciará livremente, tido em conta o conjunto das restantes provas destinadas a formar a sua convicção. Como se dizia no CPC de 1939, o tribunal atenderá, para tanto, às circunstâncias e às demais provas que se produzirem.

    Não havendo hierarquia entre o resultado das duas perícias, o juiz pode preferir, de acordo com a convicção formada, o resultado da primeira, tal como pode acabar por decidir de acordo com a averiguação e a apreciação dos factos feitas por um perito que, numa ou noutra das perícias, tenha emitido isoladamente as suas conclusões. Pode, de resto, igualmente, o tribunal decidir sobre a matéria de facto de modo diferente do inculcado pelo relatório unânime dos peritos, por mais qualificados que estes sejam (acs. do TRP de 29.3.93, BMJ, 425, p. 627, e do TRE de 15.11.94, BMJ, 441, p. 421; José Lebre de Freitas, CPC, Anotado, Vol. 2º, pp. 520-523).

    Em qualquer circunstância, como inovação relevante do agora disposto no art. 591º, nº1, CPC, em confronto com o anterior art. 610°, salienta-se o facto de a segunda perícia só poder ter lugar, a requerimento das partes, quando sejam indicados os motivos concretos de discordância em relação aos resultados da primeira.

    E o que decorre do esquisso configurativo dos Autos, maxime, da posição assumida pelos recorrentes, é que se invocou, tão somente, que “qualquer das partes pode requerer que se proceda a segunda perícia... alegando, fundadamente as razões da sua discordância relativamente ao relatório pericial apresentado”, sem que qualquer outra referência problematizante fosse assumida, a pretexto de precisão ou rectificação pretendida, mais não ressumando de tal pretensão, que - em tais termos, e nesta “latitude” processual -, que a tentativa de objectivação de posição subjectiva de lide, que só a prova global e final determina.

    O que quer dizer que em termos valorativos, as peritagens configuram elementos meramente informativos. Do ponto de vista da jurisdicidade cabe sempre ao julgador a valoração definitiva dos factos pericialmente apreciados, conjuntamente com as demais provas (Ac. RE, de 15.11.1994: BMJ, 441.°-421).

    Colhe, por isso, resposta negativa a questão formulada com o nº1.

    Em decorrência, ao indeferir a realização de uma segunda perícia requerida pelo Autor — e pelas razões invocadas pelo M° Juiz a quo —, o despacho recorrido não violou os art°s 202° n°2 e 203° da CRP, art°s 1°e 8° do CC e os artigos 2° e 589° do CPC.

    Desde logo porque nenhum direito ou interesse legítimo de cidadão sai violado, nem sai beliscada a atribuição da linha de fronteira, que terá de atender não apenas à densificação doutrinal adquirida da função jurisdicional, aos casos constitucionais de reserva judicial — cfr. os arts. 72º, 2, 28, 1º, 33º,4, 34º,2, 36º,6, 46º,2, e 116º,7 — mas também ao apuramento, neste campo, de um entendimento exigente do princípio do Estado de direito democrático (art. 2º) ( J.J. Gomes Canotilho, Vital Moreira, CRP, Anotada, 3ª Edição Revista, pp. 792-793).

    Do mesmo modo, a decisão colhe a sua justeza na conformidade integral com o sistema jurídico que a propicia. A complexidade dos elementos que, nela depondo, a informam, torna-a possível, apenas, através do funcionamento da Ciência Jurídica que, assim, se afirma como prudencial. E à Ciência do Direito compete ainda assegurar o controlo das decisões, numa operação...

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