Acórdão nº 06A3250 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 17 de Outubro de 2006
Magistrado Responsável | SEBASTIÃO PÓVOAS |
Data da Resolução | 17 de Outubro de 2006 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: "Empresa-A, CRL" intentou acção, com processo ordinário, contra AA, sua mulher BB e CC depois - e após excepcionar a sua ilegitimidade - acompanhada de seu marido DD.
Pediu que fosse declarada dona da fracção B (cave ....) do Lote nº... da Rua ... (ao Centro Cívico do Bairro do Rosário) em Cascais; que os Réus fossem condenados a reconhecer esse direito e a restituírem-lhe a fracção desocupada; que os Réus fossem condenados a indemnizá-la pela ocupação, em quantia a liquidar, deduzida a quantia de 557 721$60, correspondente ao crédito do Réu AA.
Na comarca de Cascais, os Réus foram absolvidos do pedido.
A Autora apelou para a Relação de Lisboa que julgou a acção quase totalmente procedente, condenando os Réus no pedido, à excepção do pagamento das despesas judiciais e extrajudiciais.
Inconformados, os Réus pedem revista.
"AA" e BB concluem assim as suas alegações: - A exclusão do recorrente da cooperativa é ilícita, uma vez que o mesmo não se encontrava em situação de incumprimento do contrato promessa celebrado pelas partes; - A exclusão é impugnável a todo o tempo por via de excepção nos termos do artigo 287º nº2 do CC; - O douto Acórdão recorrido viola assim o disposto no artigo 287º nº2 do CC; - Viola ainda o disposto nos artigos 487º e 489º do Código de Processo Civil, uma vez que a recorrente deduziu contra a exclusão a excepção da sua invalidade; - Admitir como efeito da exclusão a caducidade do contrato promessa, equivale a admitir um poder unilateral de revogação de contratos que a recorrida não tem e viola o disposto nos artigos 460º, 432º e 762º do Código Civil; - O Acórdão recorrido faz uma errónea interpretação e aplicação do Código Cooperativo (DL nº 218/82 de 2 de Junho - artigos 2º e 19º), ao aplicar a contratos perfeitamente válidos o regime da caducidade; - A cooperativa recorrida tem perfeita capacidade de exercício para efectuar a venda de um fogo a um não cooperante independentemente do seu objecto ser a construção e venda de habitações a cooperantes; - O Acórdão recorrido ao confundir capacidade com o objecto da cooperativa, viola o disposto no artigo 160º do CC e artigo 2º do Código Cooperativo; - O douto Acórdão recorrido enferma de nulidade por pronunciar-se sobre matéria não deduzida pela recorrida nas suas pretensões nos termos do artigo 668º nº1 d) do CPC; - E viola ainda o principio do contraditório ao não ser dada às Contrapartes a oportunidade de se pronunciarem sobre essa pretensão e fundamento de decisão, violando o disposto no artigo 3º do CPC.
Os Réus CC e DD, concluíram: - A exclusão do recorrente AA da recorrida/cooperativa é ilícita, da inexistência de incumprimento do contrato promessa celebrado pelas partes; - A exclusão é impugnável a todo o tempo por via de excepção nos termos do artigo 287º nº2 do CC; - O Acórdão recorrido viola assim o disposto no artigo 287º nº2 do CC; - Viola ainda o disposto nos artigos 487 e 489 do CPC, uma vez que a recorrente deduziu contra a exclusão a excepção da sua invalidade; - E, admitir como efeito da exclusão, a caducidade do contrato promessa, equivale a admitir um poder unilateral de revogação de contratos que a recorrida não tem e viola o disposto nos artigos 406º, 432º e 762º do CC; - O Acórdão recorrido faz uma errada interpretação e aplicação do nº2 do artigo 2º do Código Cooperativo, ao aplicar a contratos perfeitamente válidos o regime da caducidade; - E fundamenta a sua douta asserção no objecto social da recorrida/cooperativa; - É que de facto o aludido preceito legal não impede a recorrida de celebrar com terceiros contratos; - Apenas inibe que o faça sistematicamente; - O que não é o caso vertente; - O douto Acórdão recorrido viola o disposto no nº2 do artigo 660º do CPC, conjugado com o nº1 d) do artigo 668º do mesmo diploma legal; - Com efeito o douto Acórdão recorrido funda a responsabilidade civil extra contratual em factos não alegados pela recorrida no seu petitório; - Dos quais não devia tomar conhecimento por não constarem do pedido; - O que constitui nulidade que desde já se invoca a favor dos recorrentes; - Por outro lado, provado está que a recorrida sempre teve conhecimento do negócio jurídico dos ora recorrentes, bem como da ocupação da fracção dos autos; - Pelo que, também nesta sede inexiste responsabilidade civil extracontratual; - Ou qualquer outra; - Validando-se o negócio celebrado com os recorrentes CC e DD; - Improcedendo "in totum" o doutamente expendido no douto Acórdão recorrido; - Pelo que deve proceder o presente recurso; - Confirmando-se a douta sentença da 1ª instância.
Foram oferecidas contra alegações concluindo a recorrida: - Deve manter-se na totalidade o decidido no Tribunal da Relação; - A exclusão de cooperador do 1º recorrente AA por não pagamento de quotas administrativas é licita e não viola normas dos Estatutos da recorrida ou do Código Cooperativo ou quaisquer outras; - A exclusão de cooperador do 1º recorrente AA por falta de pagamento de amortizações é licita e não viola normas dos Estatutos da recorrida ou do Código Cooperativo ou quaisquer outras; - A exclusão sob qualquer das modalidades já não é impugnável por via de excepção ou qualquer outra, uma vez que não lhe é aplicável o nº2 do artigo 287º do CC e, portanto, não é violada esta norma; - A exclusão do 1º recorrente AA de cooperador não foi impugnada na 1ª instância e, portanto, sendo impugnada agora, ainda que por excepção, viola o nº1 do artigo 487º do CPC, uma vez que só pode ser feita nos articulados (contestação) em 1ª instância; - A exclusão foi notificada ao recorrente AA por três vezes, nomeadamente pela notificação judicial avulsa por carta de 9/12/92, que recebeu e pela citação dos autos para contestar; - O contrato promessa para além de resolvido por incumprimento e de caducado por virtude da exclusão, também foi ferido de caducidade nos termos do artigo 280º nº1, por força do 410º nº1, ambos do CC; - O Acórdão recorrido fez interpretação correcta do DL 218/82, ao declarar a caducidade do contrato; - A recorrida não tem capacidade de exercício para vender fogos a não cooperadores; - O Acórdão recorrido não confundiu capacidade com objecto da recorrida, pelo que não violou o artigo 160º do CC nem o artigo 2º do Código Cooperativo; - O Acórdão recorrido não enferma de nulidade nos termos do artigo 668º nº1 d) do CPC porque não se pronunciou sobre matéria não deduzida pela recorrida; - O Acórdão recorrido não violou o artigo 3º do CPC, uma vez que pode sempre ser usado o princípio do contraditório pelas partes; - Em momento algum o douto Acórdão recorrido violou o disposto no nº2 do artigo 660º conjugado com o nº1, alínea d) do artigo 668º, ambos do CPC; - A recorrida só teve conhecimento da ocupação da fracção pela recorrente CC, quando o mesmo lhe foi dado através da contestação dela própria recorrente; - A venda da fracção por parte do recorrente AA à recorrente CC violou frontalmente a clausula décima do contrato promessa sendo também causa da sua revogação (resolução) e consequente, responsabilidade extra contratual.
As instâncias deram por assentes os seguintes factos: - A Autora é dona da fracção autónoma identificada pela letra B, correspondente à cave .... do prédio do lote nº ... da Rua .... (ao Centro Cívico do Bairro do Rosário) em Cascais.
- O prédio em que se integra a referida fracção está descrito na 1ª secção da Conservatória do Registo Predial de Cascais sob o nº 24750 - 00079/040185, e a sua aquisição a favor da Autora está inscrita sob a cota G-1, Ap. 15/290573 (extracto da inscrição nº 32445, a fls. 8 do livro G-76) por o haver adquirido à Câmara Municipal de...
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