Acórdão nº 01671/02 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 21 de Abril de 2005

Magistrado ResponsávelFREITAS CARVALHO
Data da Resolução21 de Abril de 2005
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam em conferência na Secção do Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo "A... - ..., SA", identificada nos autos, recorre da sentença de 6-05-02, do Tribunal Administrativo do Círculo de Lisboa, que julgou improcedente a acção declarativa, sob a forma ordinária, que intentou contra o Município de Tavira, em que pedia a condenação do Réu na quantia de 980.455.000$00, a título de danos emergentes, e de 659.246.102$00, a título de lucros cessantes, bem como juros moratórios vincendos contados à taxa legal desde a data da citação até efectivo e integral pagamento.

I. Nas alegações a recorrente formula as conclusões seguintes : 1 - Decidiu mal o Exmo. Juiz "a quo " na, aliás douta, sentença ao julgar a presente acção improcedente e não provada ao considerar "que não se verificam os pressupostos da obrigação de indemnizar invocados pela Autora (com base em responsabilidade obrigacional do Réu) dado que no que respeita às questões suscitadas se verifica: 2 - Quanto à ilicitude: - pelo que atrás vem alegado, este requisito está consubstanciado, contrariamente ao que se decidiu na douta sentença recorrida, considerando que a deliberação da Câmara Municipal de Tavira de 1982 violou o contrato celebrado com a Autora em 14/11/1970, face aos factos demonstrados e nomeadamente, ao contrário do que se entendeu na aliás douta decisão sob recurso, podia e pôde a Câmara Municipal estabelecer desde logo no contrato administrativo de compra e venda alguns efeitos jurídicos estabilizadores das características do empreendimento imobiliário sem prejuízo das competências dos seus próprios órgãos e dos órgãos do Estado; - também resulta não ser exacto que a Cláusula Segunda do contrato administrativo de compra e venda não firmasse qualquer situação jurídica activa na esfera da compradora e que o Município se tivesse reservado uma total liberdade de comportamento no tocante à determinação das soluções construtivas a dar à parte por ele alienada da Ilha de Tavira.

- O Município vinculou-se a não denegar futuros actos permissivos com fundamento em novas soluções por ele livremente assumidas mais tarde e contraditórias com aquelas a que se havia dado corpo no estudo da primeira fase de urbanização; - O emprego da fórmula «dentro do possível» não significa - ao contrário do que se entendeu na aliás douta sentença sob recurso - que o contrato não tivesse estabelecido qualquer prestação precisa do Município no tocante ao direito de construir por parte do Autora: - em primeiro lugar, não é incompatível com a precisão (liquidez e exigibilidade} da obrigação a sua submissão a condição ou condições resolutivas: neste caso, o impedimento que pudesse vir a resultar de qualquer acto de órgão estadual competente. A verificação da condição resolutiva extingue a obrigação. Mas, enquanto ela se não concretiza, a obrigação produz os seus efeitos.

- por outro lado, a precisão da obrigação não requer que ela abranja, desde logo, todos os aspectos da conduta futura de quem se vincula. O efeito próprio dos actos administrativos prévios é precisamente o de constituir desde logo uma decisão apenas sobre questões de que depende a decisão final que, de outro modo, seriam versadas ex novo apenas no momento conclusivo do procedimento.

3 - Quanto à causalidade: - A aliás douta sentença ao considerar irrelevantes os efeitos danosos do acto camarário de 1982 porque eles sempre viriam a resultar da entrada em vigor do PROTAL, em 1991, fez errónea aplicação do art.º 563º do Código Civil, dado que o entendimento esmagadoramente maioritário da doutrina é o de que - salvo norma excepcional - a causa virtual não releva para excluir a responsabilidade do autor da causa real do dano; - por outro lado nada na matéria de facto recolhida pela douta sentença sob recurso mostra que, não tendo surgido o impedimento em 1982, as obras não estariam concluídas ou em vias de conclusão quando o PROTAL entrou em vigor em 1991, Pelo que o dano resultou, efectivamente, para a Autora e ora recorrente do referido acto camarário transmitido à Direcção Geral do Turismo.

4 - Quanto à natureza da responsabilidade: - Também não merece ser mantida a douta sentença quando considera estar-se fora do campo da responsabilidade contratual, porquanto a deliberação de Câmara de 1982 sendo um acto preparatório não podia ser recorrido contenciosamente, já que à época ainda vigorava uma redacção da constituição (artigo 268º), que circunscrevia a garantia de recurso contencioso aos actos definitivos e executórios.

5 - Ao decidir assim, violou o artigo 71 n.º1 da LPTA e o princípio geral de direito administrativo da absorção pela responsabilidade contratual dos outros tipos de responsabilidade administrativa.

Não houve contra-alegações.

O magistrado do Ministério Público junto deste STA emitiu parecer no sentido do improvimento do recurso.

II .A decisão recorrida considerou provados os seguintes factos : 1. Pelo Decreto-Lei nº 47155 de 19.8.66, foi desafectada do domínio público marítimo e integrada no domínio privado do Estado, uma parte da Ilha de Tavira (área de 27,5 hectares) a fim de ser urbanizada de harmonia com os planos aprovados pelo Ministro das Obras Públicas; 2. A Direcção Geral da Fazenda Pública foi autorizada a ceder à Câmara Municipal de Tavira o terreno referido (artº 2º do mesmo diploma legal) o que fez.

  1. A A. adquiriu, em hasta pública efectuada pela Câmara Municipal de Tavira em 14 de Novembro de 1970, duzentos e quarenta e cinco mil metros quadrados do referido terreno desafectado.

  2. A referida aquisição foi feita através do contrato junto aos autos a fls. 22 e seguintes, celebrado em 14 de Novembro de 1970, cujo teor se dá como integralmente reproduzido.

  3. É o seguinte o teor da Cláusula Primeira: "O terreno alienado, com a área de duzentos e quarenta e cinco mil metros quadrados, destina-se a construções urbanas, incluindo estabelecimentos hoteleiros, equipamento recreativo, administrativo e comercial, zonas verdes, arruamentos, parques de estacionamento, etc. " 6. É o seguinte o teor da Cláusula Segunda: "O seu aproveitamento, nos termos da cláusula primeira, deverá obedecer dentro do possível ao estudo da primeira fase de urbanização elaborado pelo Prof. Arqtº Frederico George, sendo, contudo admitidas propostas de alteração, desde que as mesmas, depois de ouvido aquele técnico, mereçam a aprovação da Câmara e das entidades competentes".

  4. É o seguinte o teor da Cláusula Terceira: - "Todos os estudos relativos à urbanização, e dado o contrato em vigor entre os serviços Municipais e aquele técnico, devem ser da sua autoria (..) ficando no entanto a entidade adquirente responsável pelas indemnizações a que houver lugar, e bem assim, pelo já despendido em honorários pelo respectivo técnico, por trabalhos já elaborados".

  5. É o seguinte o teor da Cláusula Quarta: - "A entidade adjudicatária responsabilizar-se-á por todos os encargos correspondentes às infraestruturas urbanas tais como: a) rede viária e sistema de comunicação interna incluindo parques de estacionamento, ajardinamento e zonas verdes; b) distribuição de água potável; c) rede de distribuição de energia eléctrica de alta e baixa tensão; d) iluminação pública; e) rede de esgotos e seu tratamento; f) outras infraestruturas inteiramente indispensáveis ao bom funcionamento do complexo turístico".

  6. É o seguinte o teor da Cláusula Quinta: "Todos os trabalhos incluídos na cláusula quarta, que abrangem toda a área desafectada da Ilha - duzentos e setenta e cinco mil metros quadrados -, obedecerão a projectos a elaborar pela adquirente, sujeitos à aprovação da Câmara e das entidades oficiais que superintendem em tais obras, ficando, ainda, os competentes trabalhos sujeitos à fiscalização do Município e do Estado, podendo ser executados por fases, segundo ordem de prioridade aprovada pela Câmara".

  7. É o seguinte o teor da Cláusula Sexta: "Todos os terrenos onde venham a ser feitas a implantação da rede viária, sistema de comunicações internas, incluindo parques de estacionamento, ajardinamentos públicos e zonas verdes, serão a todo o tempo considerados propriedade da Câmara (..)".

  8. É o seguinte o teor da Cláusula Sétima: "Os projectos relativos às infraestruturas de urbanização, referidos na cláusula quarta, devem ser apresentados na Câmara Municipal de Tavira, no prazo de seis meses a contar da celebração desta escritura pública, e as obras correspondentes deverão estar concluídas dois anos meio após a data de aprovação dos projectos, salvo prorrogação da Câmara Municipal, em face dos motivos de força maior (..)".

  9. Consta, nomeadamente, do estudo elaborado pelo Prof. Arquitecto Frederico George (junto aos autos a fls. 27): "Fundamentalmente, o partido adoptado assenta no facto de a ocupação da Ilha ser restrita apenas ao terreno agora em estudo, assentando portanto no facto de se não prever na parte restante do areal qualquer tipo de ocupação urbana e na ligação do núcleo à terra; esta ligação que se propõe fazer por ponte, aproveita não só do lado da terra a estrada municipal que conduz a Tavira, bem como o ponto do canal em que a sua largura apresenta menos dimensão ( ..).

  10. No conjunto, a área do terreno propriedade da Câmara Municipal de Tavira e no qual se propõe a implantação do presente núcleo é de cerca de 27,5 ha. A sua capacidade é da ordem das 3.000 a 3.500 camas, incluindo-se neste número um mínimo de população residente.

  11. Deste modo, a densidade global do conjunto apresentará valores compreendidos entre os 110 e os 125 habitantes por hectare.

    Para conjuntos com uma dimensão como a do presente núcleo, preconiza-se que a proporção dos alojamentos hoteleiros e não hoteleiros seja respectivamente de 30 a 40% e de 50 a 60%.

    Deste modo, para um conjunto de 3.000 a 3.500 camas turísticas teríamos, 1.000 a 1.400 camas em unidades...

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